Juiz de Garantias: é necessário? Vale a pena?

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Qual o objetivo do juiz de garantias?

Ainda em 2019, o Congresso Nacional aprovou o chamado “Pacote Anticrime”, sancionado na véspera do Natal. Perfaz-se, então, a Lei n. 13.964 de 2019, que deve entrar em vigor neste mês de janeiro de 2020. Aprovou-se, de fato, uma mescla de alguns projetos e textos, e não exclusivamente o que fora proposto de início.

O Congresso agregou ao projeto original a figura do denominado “juiz de garantias” (art.3-B). Esta figura não é propriamente novidade, haja vista que já constava do Anteprojeto de Código de Processo Penal, de 2010 (art.14), para exercer o “controle de legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais”.

Através da estrutura proposta, cinge-se a persecução penal em duas fases distintas: a de investigação (coleta de provas, cautelares etc.) e a de julgamento. Atuam, pois, dois juízes com funções bem delineadas e diferentes.

Na legislação comparada, modelos mais próximos à lei brasileira são o do Chile – com a fase de investigação a cargo do juez de garantía (art.14, Código Organico deTribunales) e a fase processual sob a tutela dos tribunales de juicio oral en lo penal ( art. 17, Codigo Organico de Tribunales); e o da Colômbia – em que a função de juez del control de garantías é exercida por outro juiz penal municipal,na fase investigatória, como controle de legalidade, em contrapeso à atuação do Ministério Público (art.39, Ley de 2004, alterado pelo art.48, Ley 1453/2011).

Na Europa continental, há instituto similar no contexto de outra sistemática processual, mais orgânica e ajustada, sendo a jurisdição de instrução e a jurisdição de julgamento separadas, com pequenas variações entre os vários países. Em França, por exemplo, o Código de Processo Penal estabelece a primeira, com o juiz de instrução de primeiro grau (art.79 – 84-1) e a câmara de instrução de segundo grau (art.191-218), que exerce o controle de legalidade dos atos instrutórios, e a segunda, de julgamento, com outros juizados e cortes (art.231-267). Na Alemanha e Itália, enquanto o Ministério Público aparece responsável pela investigação criminal, o juiz da fase de instrução (Ermittlungsrichter), e o juiz das investigações preliminares detém o controle judicial das etapas da persecução penal. Já, na Espanha e Bélgica, a matéria não vem consignada de modo muito diverso.

O tema, altamente polêmico, encontra aqui prós e contras, e é objeto de acalorados artigos, debates, opiniões e “achismos” costumeiros tanto na imprensa como nas redes sociais.

Assim, busca-se de um lado evitar a “contaminação” do juiz pela prova, com ganho de imparcialidade, maior controle dos direitos do imputado, restrição de poder, e, de outro lado, apontam-se vício de inconstitucionalidade, dificuldades práticas de implementação, falta de estrutura judiciária, maior burocracia, prejuízo de investigação em curso, aumento de despesa etc.

Do ponto de vista puramente técnico, convém dizer que a previsão legal aperfeiçoa o sistema processual penal em prol das garantias fundamentais do acusado.

Porém, como soe ocorrer, inserta-se a destempo instituto novo – sem a devida análise e preparação – eivado de inconstitucionalidade, com exígua vacatio legis, falto em estrutura, que pode não só aumentar o gasto público como turbar o funcionamento do já não muito célere complexo judiciário.

Tal impetus legislativo – casuístico e improvidente -, diga-se de passagem, tipicamente brasileiro, é bastante e duramente sentido por todos aqueles que militam na justiça criminal ou dela dependem.

Sobre os autores
Diego Prezzi Santos

Doutor em Direito pela Faculdade Autônoma de São Paulo (FADISP). Mestre em Direito pelo programa de mestrado em ciências Jurídicas do Centro Universitário de Maringá (CESUMAR). Pós-graduado pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Professor do programa de pós-graduação na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Professor da Fundação Escola do Ministério Público (FEMPAR). Professor na Faculdade Arhur Thomas (FAAT). Professor no Centro Universitário de Maringá (CESUMAR). Professor no Instituto Catuaí de Ensino Superior (ICES). Parecerista e avaliador em revistas científicas. Possui graduação em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Membro associado do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI). Membro associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). Advogado com experiência em direito penal e processo penal.

Luiz Regis Prado

Professor Titular de Direito Penal . Universidade Estadual de Maringá (UEM); Professor Titular do Programa de Doutorado da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (FADISP). Pós-doutorado em Direito Penal. Universidade de Zaragoza (Espanha); Pós-doutorado em Direito Penal Ambiental Comparado. Universidade Robert Schuman de Strasbourg (França). Doutor e Mestre em Direito. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Doutor honoris causa em Direito. Universidade Nacional de San Agustín (Peru). Professor visitante do Instituto de Direito Comparado e Penal da Universidade de Firenze (Itália); da Universidade Robert Schuman de Strasbourg (França); da Universidade de Zaragoza (Espanha), da Universidade Nacional de Educação à Distância; da Universidade de Castilla-la-Mancha (Espanha). Consultor jurídico da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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