Acordo de não persecução penal após a denúncia: possibilidade

03/04/2020 às 14:20
Leia nesta página:

A viabilidade da proposta do acordo de não persecução penal após a denúncia

A Lei n. 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, alterou o Código de Processo Penal e introduziu mais uma ferramenta na chamada justiça “consensual” ou “negociada”, a exemplo dos benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo previstos nos arts. 76 e 89 da Lei n. 9.099/1995.

 A medida despenalizadora descrita como “acordo de não persecução penal - ANPP”, segundo Guilherme de Souza Nucci, “atenua, ainda mais, o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública incondicionada”, por se tratar de “reflexo da nova política criminal” (Pacote anticrime comentado: Lei n. 13.964/2019. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 60).

 Há, no entanto, dúvida sobre a propositura do ANPP após o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público.

Pois bem. Em uma leitura atenta do art. 28-A do CPP, observa-se que o legislador, ao ditar as regras do acordo, utilizou para a construção do dispositivo legal a palavra “arquivamento” e, por diversas vezes, “investigado”.

São palavras que, como se sabe, não são utilizadas para se referir a ações penais em andamento.

 Ainda, no art. 28-A, §§ 8º e 9º, do CPP, o legislador fez referência ao “oferecimento da denúncia”, isso para o caso de o juiz se recusar a homologar o acordo, ou para o caso de descumprimento da avença por parte do investigado.

 Em uma interpretação literal e isolada do artigo em tela é possível notar que a intenção do legislador foi a de possibilitar o ANPP somente antes da propositura da ação penal, ou seja, durante procedimentos investigatórios e antes do oferecimento da denúncia.

 No entanto, necessário lembrar que as regras que regem o ANPP possuem natureza mista/híbrida, uma vez que são compostas por normas de caráter processual penal (como o acordo deverá ser realizado) e penal/material (impõe a extinção de punibilidade do agente em caso de cumprimento da avença).

Assim, como a nova lei prevê a extinção da punibilidade no caso de cumprimento do acordo pelo investigado, cuja regra tem natureza penal/material, a norma do art. 28-A do CPP deve retroagir, a fim de atender ao disposto no art. 5º, XL, da CF/1988: “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

Sobre o assunto, o art. 2º, parágrafo único, do Código Penal, estabelece: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”.

Não poderia haver outra solução, pois o ANPP é mais benéfico que uma condenação criminal, na medida em que, como dito, “o juízo competente decretará a extinção de punibilidade” do agente caso cumpra integralmente a avença (art. 28-A, § 13º, do CPP).

Por esses motivos, após a denúncia, até antes da sentença, também é viável o oferecimento do ANPP, desde que preenchidos os requisitos legais, sendo irrelevante a data da prática do fato delituoso.

Sobre o autor
Fabiano Leniesky

OAB/SC 54888. Formado na Unoesc. Advogado Criminalista. Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal. Pós-graduado em Advocacia Criminal. Pós-graduado em Ciências Criminais. Pós-graduado em Direito Probatório do Processo Penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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