Penhora de bens do cônjuge da parte executada: uma análise à luz dos regimes de bens.

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O presente artigo visa tratar da possibilidade de penhora de bens do cônjuge da parte executada, a partir da análise dos regimes de separação de bens, comunhão parcial de bens, aqui tangendo a união estável, e de comunhão universal de bens.

SUMÁRIO.

1. INTRODUÇÃO.

2. SEPARAÇÃO DE BENS.

3. COMUNHÃO PARCIAL DE BENS E UNIÃO ESTÁVEL.

4. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.

5. EXCEÇÕES E PRESUNÇÃO DA DÍVIDA EM PROVEITO DA FAMÍLIA.

6. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA.

7. CONCLUSÃO.

 

INTRODUÇÃO.

Em uma análise generalista sobre o tema é plausível, de plano, concluir pela possibilidade da penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada.

Isso porque há em nosso ordenamento jurídico dispositivos legais que versam sobre a situação em discussão de forma muito clara.

Primeiramente, o Código Civil, quando trata da administração dos bens comuns, expõe que estes ficam obrigados por dívidas realizadas em proveito da entidade familiar:

Art. 1.663. A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

§ 1o As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.

Art. 1.664. Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal.

Similarmente, no que toca à união estável, a Lei nº 9.278/96:

Art. 5º Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.

§ 2º A administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito.

No mesmo sentido, o Código de Processo Civil, em seu artigo 790, IV, traz expressamente a possibilidade de sujeição dos bens do cônjuge/companheiro que não é parte no processo à execução:

Art. 790. São sujeitos à execução os bens:

IV - do cônjuge ou companheiro, nos casos em que seus bens próprios ou de sua meação respondem pela dívida;

Percebe-se, da análise das normas expostas, que Código Civil e o Código de Processo Civil, principalmente, trazem disposições deveras claras sobre o tema, surgindo pouca margem para a existência de dúvidas.

Em decorrência desse fato, é impressionante que, mesmo atualmente, advogados não pleiteiem a penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada, e, dentre os poucos pedidos existentes, boa parte acabe sendo indeferida pelos magistrados.

Surpreende, outrossim, diante de uma promissora possibilidade de a parte executada estar ocultando seus bens por meio de seu cônjuge/companheiro, que os advogados persistam em despender grande quantidade de tempo e dinheiro em medidas pouco (ou nada) efetivas (ou que são muito situacionais ou que sequer se prestam a diligenciar bens) para o real objetivo do processo de execução, a saber, a satisfação do crédito, como: suspensão da CNH da parte executada, Bacen CCS, SREI, SINAL (PRF), E-OFÍCIO, DI-MOF, DE-CRED, entre outros.

Desse modo, passa-se a um estudo mais aprofundado do tema, a fim de clarificar o assunto e viabilizar um possível ótimo caminho para um dos maiores infortúnios dos advogados e partes, a satisfação do crédito.

SEPARAÇÃO DE BENS.

Em sentido contrário ao dos artigos 1.663 e 1.664, no que se refere ao regime de separação de bens o Código Civil dispõe que estes serão administrados unicamente por cada um dos cônjuges, na medida de sua propriedade. Confira-se:

Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.

Nas palavras de Pablo Stolze Gagliano[3]:

“Este regime tem como premissa a incomunicabilidade dos bens dos cônjuges, anteriores e posteriores ao casamento”.

Levando em consideração o tema sob análise, imprescindível a lição de Araken de Assis[4]:

"Os patrimônios dos cônjuges, neste regime, permanecem separados, e, por isso mesmo, nada mais natural que respondam exclusivamente com seus bens particulares pelas dívidas assumidas antes ou depois do casamento, seja qual for a origem do débito".

É preciso pontuar, ainda que brevemente, acerca da aplicação da Súmula 377 do STF, a qual detém a seguinte redação:

“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.

Muito embora haja discussão sobre a aplicabilidade da Súmula 377 do STF desde a promulgação do atual Código Civil, fato é que é consenso na jurisprudência pátria a sua eficácia, o que se evidencia, sobretudo, pelo recente EREsp 1.623.858/MG da Segunda Seção do STJ. Tal julgado, cujo tema foi incluído no Informativo 628 do STJ, sendo colacionado a seguir, sedimentou a forma de interpretação referida Súmula:

Casamento contraído sob causa suspensiva. Separação obrigatória de bens (CC/1916, art. 258, II; CC/2002, art. 1.641, II). Partilha. Bens adquiridos onerosamente. Necessidade de prova do esforço comum. Pressuposto da pretensão. Moderna compreensão da Súmula 377/STF. (EREsp 1.623.858-MG, Rel. Min. Lázaro Guimarães Desembargador Convocado do TRF 5ª Região, por unanimidade, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018).

O ponto a ser feito diz respeito à compreensão de que a Súmula 377 do STF somente se aplica ao regime de separação legal ou obrigatória de bens (artigo 1.641 do Código Civil), e não ao regime de separação convencional de bens (artigo 1.678 do Código Civil).

Tal entendimento é deveras necessário, ante a existência de diversos julgados aplicando irrestritamente a Súmula 377 do STF para ambas as espécies de regime de separação de bens.

Felizmente, há muito (mesmo antes do atual Código Civil) existem decisões no STJ fazendo a devida distinção entre os regimes e a correta aplicação da Súmula 377 do STF.

Colaciona-se excerto do voto do Ministro Relator Fontes de Alencar em sede do REsp 15.636/RJ[5], que esclarece a problemática:

"É verdade que a Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal estabelece que no regime de separação legal de bens comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, mas é indiscutível que tal verbete não tem aplicação, quando as partes livremente convencionam a separação absoluta dos bens presentes e futuros, através do pacto. Por outro lado, a Súmula não pode ser interpretada ampliativamente, mas, sim, dentro dos limites exatos do que nela se contém."

No mesmo prisma:

CASAMENTO. REGIME DA COMPLETA SEPARAÇÃO DE BENS. PACTO ANTENUPCIAL. COMUNICAÇÃO DOS AQÜESTOS. - Pretensão de interpretar-se o alcance de cláusula inserta no pacto antenupcial. Inadmissibilidade no apelo especial (súmula nº 05-STJ). - Estipulado expressamente, no contrato antenupcial, a separação absoluta, não se comunicam os bens adquiridos depois do casamento. A separação pura é incompatível com a superveniência de uma sociedade de fato entre marido e mulher dentro do lar. Precedentes (REsp's nºs 2.541-0/SP e 15.636-RJ) - Incidência, ademais, do verbete sumular nº 07-STJ. Recurso especial não conhecido. (REsp 83.750/RS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 19/08/1999, DJ 29/11/1999, p. 165).

Ainda, importante o REsp 1.481.888/SP[6], mais atual, que reiterou e renovou a jurisprudência já consolidada, destacando que havendo livre manifestação de vontade das partes no sentido da adoção do regime de separação de bens, constituindo, portanto, situação alheia à prevista no artigo 1.641 do Código Civil, “revela-se inaplicável o teor da Súmula 377 do STF”.

Não sendo o foco do presente artigo, deixaremos de realizar maior digressão sobre o tema, sobretudo considerando que existem diversos textos que abordam o assunto de forma exaustiva, cabendo apenas ressaltar a existência das duas hipóteses: a da separação legal de bens, em que se aplica a Súmula 377 do STF, e a da separação convencional de bens, em que não se aplica a Súmula 377 do STF.

Assim, em suma, não é possível a penhora de bens do cônjuge da parte executada quando estes são casados sob o regime da separação convencional de bens, mesmo que a dívida tenha se dado em proveito da família, uma vez que não há comunhão de bens (nem mesmo dos que adquiridos na constância do casamento). Já na separação legal de bens, é possível a penhora de bens do cônjuge do executado, observando que a comunhão de bens se restringe àqueles adquiridos na constância do casamento a título oneroso (desde que comprovado o esforço comum sua aquisição), por força da Súmula 377 do STF e de sua contemporânea compreensão, bem como respeitando a meação.

A seguir, será abordado de maneira um pouco mais extensa acerca da separação convencional de bens (doravante somente separação de bens), a nosso ver mais presente no cotidiano das relações sociais brasileiras.

Antes de colacionar alguns julgados sobre o tema, vale destacar dois trechos, o primeiro, do voto do Juiz de Direito Substituo de Segundo Grau Gil Francisco de Paula Xavier Fernandes Guerra, em sede da Apelação Cível n.º 897.207-0 (TJPR), e o segundo, do voto do Desembargador Augusto Lopes Cortes, em sede da Apelação Cível n.º 565.951-0 (TJPR):

“De igual forma improcede a alegação de que o apartamento seria penhorável por não ter sido demonstrado que a dívida contraída não teria beneficiado a família, pois, ainda que assim o fosse, é obstada sua constrição pelo regime de bens adotado pelos cônjuges no casamento.”

“Em que pese os fundamentos expostos pelo ilustre magistrado singular, a sentença recorrida não tem como ser mantida. Com efeito, resta evidente que se tem uma execução de uma dívida contraída pelo executado marido da embargante, que mesmo na hipótese de representar uma garantia que favorece estabelecimento familiar, não pode resultar em penhora sobre o veículo que consta em nome da apelante em face do regime de separação de bens.

É sabido que os bens do cônjuge casado em regime de separação de bens, não respondem pelas dívidas contraídas pelo outro, ainda que o tenham sido em benefício da família. ”

Sobre o assunto, seguem exemplos de julgados:

AGRAVO DE INTRUMENTO - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - DECISÃO QUE RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE PARTE DOS IMÓVEIS ARRESTADOS. IMÓVEL DE MATRICULA Nº 4552 - ALEGAÇÃO DE QUE O EXECUTADO POSSUI OUTROS IMÓVEIS E QUE, PORTANTO, A PENHORA NÃO OFENDE AO DIREITO DE MORADIA - DESCABIMENTO - IMÓVEIS PERTENCENTES À CÔNJUGE DO EXECUTADO - CASAMENTO REGIDO PELO REGIME DE SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS - COMPROVAÇÃO DE QUE A FAMÍLIA RESIDE NO IMÓVEL ARRESTADO - IMPENHORABILIDADE CONFIGURADA - ARTIGO , CAPUT, DA LEI Nº 8.009/90. IMÓVEL DE MATRÍCULA Nº 141.072 - PLEITO DE AFASTAMENTO DA REGRA DE IMPENHORABILIDADE POR ANALOGIA AO ARTIGO , VII, DA LEI Nº 8.009/90 - DESCABIMENTO - ROL TAXATIVO - INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA - PRECEDENTES - IMÓVEL, ADEMAIS, ALIENADO EM FAVOR DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - COMPROVAÇÃO DE QUE SE TRATA DE IMÓVEL NO QUAL RESIDE A ENTIDADE FAMILIAR - IMPENHORABILIDADE CONFIGURADA. RECURSO DESPROVIDO.

(TJPR - 14ª C.Cível - AI - 1590699-5 - Curitiba - Rel.: Desembargador Fernando Antonio Prazeres - Unânime - J. 14.12.2016).

APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO - DÍVIDA CONTRAÍDA PELO MARIDO DA EMBARGANTE - IMÓVEL PENHORADO PERTENCENTE À EMBARGANTE - CASAMENTO REGIDO PELO REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS - BEM PARTICULAR DA ESPOSA QUE NÃO RESPONDE PELA DÍVIDA DO CÔNJUGE - INCLUSÃO DO IMÓVEL NA DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA DO EXECUTADO QUE TEM FINALIDADE APENAS FISCAL - SENTENÇA QUE DECLAROU A NULIDADE DA PENHORA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.

(TJPR - 14ª C.Cível - AC - 897207-0 - Curitiba - Rel.: Juiz Gil Francisco de Paula Xavier Fernandes Guerra - Unânime - J. 20.03.2013).

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO C/C COBRANÇA DE ALUGUÉIS. DECRETAÇÃO. FIADOR QUE DÁ GARANTIA EM FAVOR DE SEU ESTABELECIMENTO. RESTAURANTE. POSTERIOR CASAMENTO EM REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS. PENHORA SOBRE VEÍCULO DE PROPRIEDADE DA MULHER. PROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS, COM INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Os bens próprios do cônjuge casado em regime de separação de bens, não respondem pelas dívidas e garantias contraídas pelo outro, ainda que o tenham sido em benefício da família.

(TJPR - 11ª C.Cível - AC - 565951-0 - Maringá - Rel.: Desembargador Augusto Lopes Cortes - Unânime - J. 20.05.2009).

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. INTEMPESTIVIDADE DO INCONFORMISMO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. PENHORA DE BEM PERTENCENTE A CONJUGE COM O QUAL A AGRAVANTE É CASADA SOB REGIME DE SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS. EXCLUSÃO. EXEGESE DO ART. 591 DO CPC. GARANTIA CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE PROPRIEDADE. NULIDADE. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. Incidindo a penhora sobre patrimônio não pertencente ao devedor, imperativa sua exclusão, sob pena de violação da garantia patrimonial prevista pelo art. 591 do CPC e frustração do escopo jurídico do processo. Ademais, nula é a penhora, mormente, verificando-se que o proprietário do bem não detém qualidade ou condição de garantidor do débito exequendo e, ainda, de não ter participado da demanda de conhecimento em que se impôs a sanção condenatória.

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(TJPR - 12ª C.Cível - AI - 392395-5 - Curitiba - Rel.: Desembargador José Cichocki Neto - Unânime - J. 26.09.2007).

 

COMUNHÃO PARCIAL DE BENS E UNIÃO ESTÁVEL.

O novo Código Civil, em seu artigo 1.723, repetiu o artigo da Lei 9.278/96, ao estatuir que “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”, ressalvando as hipóteses dos artigos 1.521 e 1523 do Código Civil, que tratam das circunstâncias de impedimentos matrimoniais e causas suspensivas que limitam a liberdade dos nubentes de escolherem o regime de bens do casamento, respectivamente.

Desse modo, os requisitos essenciais à união estável seriam: estabilidade, continuidade da relação, publicidade e objetivo de constituição de família. A respeito da diversidade de sexos, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais homoafetivos.

A doutrina e jurisprudência trataram de complementar o conceito de união estável trazido pelo Código Civil e pela Lei da União Estável. Resumidamente, trata-se da união entre duas pessoas, sem vínculo matrimonial, mas que convivem como se casados fossem, constituindo assim, uma família de fato.

Conclui-se, por isso, que a união estável é uma situação de fato, e não um estado civil. Isso significa dizer que, mesmo não existindo um documento que comprove o fato, não quer dizer que a união não exista.

Também não significa que ela não poderá ser provada, uma vez que é possível demonstrar o vínculo através de contas correntes conjuntas, testemunhas, disposições testamentárias, apólice de seguro, entre outras possibilidades dispostas em lei.

Frise-se que, ainda que seja possível registrar em cartório a união estável, esse documento terá caráter meramente declaratório e não constitutivo. Trata-se apenas de registro de um fato anterior, e que caso não haja verdadeiramente uma união estável, não passará de uma declaração falsa.

Apesar de a união estável ser uma situação de fato, a escritura é importante por oficializar alguns aspectos, em especial, o regime de bens aplicável à união.

Se os companheiros vivem em união estável sem a elaboração de uma escritura pública ou se nela nada estiver estabelecido em relação ao regime de bens, serão aplicadas as regras da comunhão parcial.

Nesse caso, os bens recebidos por um dos conviventes por meio de doação, de herança, de sub-rogação de bens particulares ou de bens anteriores à união, não serão objeto de meação pelo outro companheiro, permanecendo como bens particulares.

A legislação civil é bastante flexível ao tratar de direitos patrimoniais privados, sendo possível optar por um dos regimes patrimoniais de bens previstos no Código Civil, como, por exemplo, comunhão universal de bens, separação absoluta de bens, participação final nos aquestos, ou optar por um regime misto, especialmente elaborado para aqueles conviventes.

Contudo, neste artigo, ao tratarmos da penhora de bens do cônjuge do executado em regime de união estável, a análise dar-se-á à luz da regra geral do regime de comunhão parcial de bens, cumprindo, assim, com o disposto no artigo 1.725 do Código Civil.

Imperioso consignar que a presente discussão não se refere ao percentual de propriedade do cônjuge sobre o bem do executado que foi constrito, mas se o bem do cônjuge pode responder pela dívida contraída pelo companheiro na constância da união estável e/ou no regime de comunhão parcial de bens, respeitando a sua meação.

Comunhão Parcial de Bens é o regime que vigora no casamento caso os habilitantes não se manifestem em contrário ao oficial do Registro Civil quando dão entrada ao processo de habilitação, ou sendo este nulo ou ineficaz (art. 1.640, caput, do CC), segundo Flávio Tartuce[7]. Significa o compartilhamento em igual proporção de um mesmo patrimônio, vale dizer, o patrimônio adquirido após a celebração do casamento civil.

Desse modo, todos os bens adquiridos durante a união pertencerão a ambos os cônjuges, não importando quem comprou ou em nome de quem foi registrado. Nesse regime, é irrelevante qual foi a efetiva contribuição financeira de cada cônjuge para a formação do patrimônio, presume-se a conjugação de esforços, a colaboração mútua. Como o marco inicial da comunhão é a data da celebração do casamento, em regra, o patrimônio que cada cônjuge possuía antes do matrimônio não é compartilhado com o outro.

Há, assim, na maior parte dos casos, a coexistência de três massas patrimoniais distintas: a primeira, formada pelos bens comuns do casal (adquiridos na constância do casamento); a segunda, formada pelos bens particulares de um dos cônjuges (adquiridos antes do casamento) e a terceira, formada pelos bens particulares do outro cônjuge (adquiridos antes do casamento).

A presente discussão vale-se da primeira hipótese.

O ordenamento jurídico assegura, na forma do que dispõe o artigo 843 do Código de Processo Civil, à exemplo, a reserva da quota-parte dos direitos de aquisição do bem penhorado ao cônjuge alheio à execução, devendo ser observada a data em que houve o início da convivência em comum do casal.

Consoante entendimento jurisprudencial, a dívida contraída pelo companheiro, na constância da união estável, presume-se assumida em benefício do casal quando a companheira não prova o contrário ao defender sua meação:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. APELAÇÃO CÍVEL. CONSTRIÇÃO JUDICIAL. IMÓVEIS. CÔNJUGE. MEAÇÃO. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. DÍVIDA. COMUNICABILIDADE. PROVEITO COMUM. ÔNUS DA PROVA. EXCLUSÃO DE COMUNHÃO. NÃO COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. 1 Nos termos do art. 674, § 2º, inciso I, do Código do . Processo Civil, compete ao cônjuge valer-se dos embargos de terceiro apenas para defender a posse de seus bens próprios ou de sua meação, e não para discutir acerca do mérito da dívida executada em desfavor de seu cônjuge. 2. A jurisprudência é uníssona ao afirmar que se presume assumida em benefício do casal a dívida contraída pelo marido, quando a mulher, na defesa de sua meação por 3. O objeto dos embargos de terceiro não semeio de embargos de terceiro, não prova o contrário refere aos proventos de trabalho pessoal do cônjuge, o que implicaria a exclusão da comunhão, mas à dívida contraída pelo cônjuge no fomento da atividade profissional, a qual foi realizada em proveito da entidade familiar. 4. Negou-se provimento ao recurso.

(TJDFT. Acórdão 1206327, 07312102920188070001, Relator: LEILA ARLANCH, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 9/10/2019, publicado no DJE: 17/10/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada.).

EMBARGOS DE TERCEIRO. IMÓVEL. ARREMATAÇÃO. COMUNHÃO DE BENS. MEAÇÃO. DÍVIDA CONTRAÍDA EM BENEFÍCIO DA ENTIDADE FAMILIAR. PRESUNÇÃO. ÔNUS DA PROVA.

I - No regime da comunhão universal de bens, a dívida contraída por um dos cônjuges está garantida pelo patrimônio do casal, ressalvadas as exceções legais.

II - Consoante entendimento jurisprudencial, a meação pode ser resguardada se ficar comprovado que a dívida contraída por um dos cônjuges não beneficiou a entidade familiar, ônus do qual a pois se presume que o óleo diesel adquirido para ser utilizado naembargante não se desincumbiu, fazenda pertencente ao casal, que foi arrematada em hasta pública, valorizou o patrimônio comum

III - Apelação desprovida.

(TJDFT. Acórdão 1132208, 20180110108202APC, Relator: VERA ANDRIGHI, 6ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 10/10/2018, publicado no DJE: 30/10/2018. Pág.: 416/454).

Conforme exposto anteriormente, com relação ao regime de comunhão parcial de bens, o artigo 1.659 do Código Civil dispõe sobre a exclusão de bens da comunhão, estabelecendo, por sua vez, os artigos 1.663 e 1.664, do mesmo diploma, que os bens comuns devem responder pelas dívidas que geraram proveito ao casal e à família:

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III - as obrigações anteriores ao casamento;

IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Art. 1.663. A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

§ 1º As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.

§ 2º A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 3º Em caso de malversação dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges.

Art. 1.664. Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal.

Assim, as dívidas contraídas durante a constância do casamento sob o regime da comunhão parcial de bens presumem-se em benefício da família, de forma que a solidariedade somente pode ser afastada mediante prova em contrário.

Esse entendimento está em consonância com o consolidado pelo STJ:

"Tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é a de que cabe ao meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, haja vista a solidariedade entre o casal." (AgRg no AREsp n. 427.980/PR, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/2/2014, DJe 25/2/2014)”.

Nesse contexto, a meação não pode ser resguardada se não comprovado que a dívida contraída pelo companheiro não beneficiou a entidade familiar (art. 373 CPC), presumindo-se, assim, que o bem valorizou o patrimônio comum.

Logo, conclui-se que se presume a existência de copropriedade dos bens em nome dos cônjuges, porventura adquiridos na constância do casamento ou na união estável, na modalidade de comunhão parcial de bens, de forma que é possível a penhora de cota-parte pertencente ao executado, vez que os proventos ou demais valores oriundos de outras formas de auferir renda, advindos de ambos os cônjuges, cedo ou tarde comporão o núcleo de ativos financeiros comum do casal, em virtude do regime de comunhão parcial de bens sob qual seu matrimônio está fundado, conforme o Código Civil cristalinamente dispõe.

Assim sendo, em observância as disposições legais atinentes ao caso, se demonstra possível a penhora de bens do cônjuge da parte executada, desde que resguardada a meação.

 

COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.

O Código Civil trata sobre o regime de comunhão universal de bens em seu artigo 1.667:

Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.

Sobre o tema, ensina Flávio Tartuce[8]:

Regra básica do regime: comunicam-se tanto os bens anteriores, presentes e posteriores à celebração do casamento, ou seja, há uma comunicação plena nos aquestos, o que inclui as dívidas passivas de ambos (art. 1667 do CC).

Com efeito, os bens da comunhão, que no caso do regime de comunhão universal são todos os presentes e futuros dos cônjuges, respondem pelas obrigações contraídas por estes. Em decorrência, presume-se que os bens encontrados em nome do cônjuge da parte executada são comuns do casal, e, consequentemente, passíveis serem penhorados.

Em consequência, observando as disposições legais atinentes ao caso, bem como o entendimento pacífico na jurisprudência pátria sobre o tema, possível a penhora de bens do cônjuge da parte executada, desde que resguardada a meação.

Nesse prisma:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO EXECUTADO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO SOB O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. PENHORA DE BENS EM NOME DA ESPOSA DO EXECUTADO. POSSIBILIDADE. REGIME DE BENS QUE IMPORTA NA COMUNICAÇÃO DAS DÍVIDAS E DOS BENS. PATRIMONIO COMUM QUE RESPONDE PELO DÉBITO EXECUTADO. DECISÃO AGRAVADA REFORMADA PARA DEFERIR A BUSCA DE ATIVOS FINANCEIROS VIA BACENJUD E VEÍCULOS VIA RENAJUD, EM NOME DA ESPOSA DO EXECUTADO.

O casamento consolidado pelo regime de comunhão universal de bens importa na comunicação de todos os bens do casal, o que inclui as dívidas passivas de ambos (art. 1.667 do Código Civil). Por essa razão, presume-se que os bens encontrados em nome do cônjuge do executado são comuns do casal e, portanto, passíveis de penhora. Sendo pacifico o entendimento da jurisprudência, com relação à meação, de que compete ao meeiro demonstrar que a dívida não reverteu em benefício da família, especialmente em se tratando de matrimônio contraído no regime da comunhão universal. Agravo de Instrumento provido.

(TJPR - 15ª C.Cível - 0025344-35.2018.8.16.0000 - Chopinzinho - Rel.: Desembargador Jucimar Novochadlo - J. 19.09.2018). (Grifo nosso).

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA DA MEAÇÃO DO CÔNJUGE. POSSIBILIDADE. EMBARGANTE CASADA SOB O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. DÉBITO CONSTITUÍDO DURANTE A UNIÃO. CONTRAÇÃO DA DÍVIDA EM PROL DA ENTIDADE FAMILIAR. PRESUNÇÃO NÃO ELIDIDA PELA PROVA DOS AUTOS. ÔNUS DA EMBARGANTE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

(TJPR - 12ª C.Cível - 0018067-09.2017.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: Juiz Alexandre Gomes Gonçalves - J. 16.05.2018). (Grifo nosso).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - PENHORA - PATRIMÔNIO CONJUNTO - DEVEDOR CASADO SOB O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS - RESPEITO À MEAÇÃO DO CÔNJUGE ALHEIO À DÍVIDA - POSSIBILIDADE - AGRAVO PROVIDO.

De acordo com o art. 1.667 do Código Civil de 2002, o casamento realizado adotando a comunhão universal de bens implica na adoção, entre os cônjuges, de uma unicidade de patrimônio, sejam seus aspectos ativos, sejam seus aspectos passivos. Portanto, a totalidade do patrimônio de ambos responde pelas dívidas contraídas, respeitando-se a meação de cada um.

(TJPR - 7ª C.Cível - AI - 1582329-3 - Bandeirantes - Rel.: Desembargador Luiz Antônio Barry - Por maioria - J. 14.02.2017). (Grifo nosso).

AÇÃO DE EXECUÇÃO. PRELIMINAR. PREJUDICADO O PEDIDO DE CONCESSÃO DE GRATUIDADE E REFORMA DE CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. PENHORA DA MEAÇÃO DE CÔNJUGE DO EXECUTADO. REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. POSSIBILIDADE. EXEGESE ARTS. 1.670 E 1.663 DO CÓDIGO CIVIL.

A meação do cônjuge do executado responde pela dívida contraída pelo cônjuge executado em proveito da família e, para fins de liberação da meação da penhora que recairá sobre o imóvel do casal, é o cônjuge detentor de metade do patrimônio quem deve demonstrar que a dívida não foi contraída em benefício da entidade familiar e que o débito se reverteu em proveito exclusivo do cônjuge-executado.

Agravo conhecido em parte e, na parte conhecida, provido.

(TJ-SP 20920632020178260000 SP 2092063-20.2017.8.26.0000, Relator: Sandra Galhardo Esteves, Data de Julgamento: 08/01/2018, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/01/2018). (Grifo nosso).

 

EXCEÇÕES E PRESUNÇÃO DA DÍVIDA EM PROVEITO DA FAMÍLIA.

Primeiramente, importante consignar que, obviamente, a possibilidade de penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada, muito embora existente em nosso ordenamento jurídico nas hipóteses descritas alhures, não é irrestrita. Em outras palavras, há limites legais para a penhora, que vão além do regime de bens escolhido pela parte executada em conjunto com seu cônjuge/companheiro.

Em resumo, são duas hipóteses de impenhorabilidade dos bens do cônjuge/companheiro da parte executada, a primeira ligada à dívida e a segunda ao bem penhorado: quando a dívida foi contraída na administração dos bens particulares do devedor e em benefício desses (artigo 1.666 do Código Civil)[9]; quando o bem penhorado está previsto em algum dos róis dos constantes nos artigos 1.659 e 1.668 do Código Civil.

Nesse sentido, não se pode olvidar que, restando comprovado que o débito foi contraído pela parte executada na administração de seus bens particulares e em benefício destes, ou verificando-se que o bem penhorado se enquadra em alguma das previsões dos róis constantes nos artigos 1.659 e 1.668 do Código Civil, afasta-se a responsabilidade do cônjuge/companheiro pela dívida ou do bem pela satisfação do crédito.

Assim sendo, surge a questão: a quem incumbe demonstrar que a dívida foi contraída em proveito da família?

A dívida se presume em proveito da família, cabendo ao cônjuge o ônus da prova em contrário, especialmente em se tratando de regime de comunhão universal de bens.

Nesse diapasão, mesmo antes do atual Código Civil, já lecionava Teori Zavascki[10]:

A aplicação do conjunto dos preceitos normativos sobre responsabilidade patrimonial dos cônjuges desperta, no domínio processual, alguns problemas que ainda desafiam a argúcia dos doutrinadores e, especialmente, dos juízes. O primeiro deles é o que diz respeito ao ônus da prova de ter, a dívida, beneficiado ou não a família. A orientação firmada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é a de que, na constância da sociedade conjugal há de se presumir, como regra, que as dívidas assumidas por qualquer dos cônjuges o são em benefício comum do casal, de modo que cabe ao cônjuge que pretende salvar a meação o ônus de provar o contrário.

Hodiernamente, vale a lição de Fredie Didier Jr.[11]:

A doutrina e os tribunais superiores estabeleceram uma presunção relativa de que as transações feitas pelo cônjuge são para ganho familiar, lançando sobre o outro cônjuge o ônus de provar o contrário - incumbindo à esposa, por exemplo, provar que o título serve para saldar a dívida de jogo ou decorre de despesas com a concubina do marido (exemplo: com jóias, automóvel etc.).

A presunção da dívida em favor da família é um dos pilares que sustentam a possibilidade da penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada. Isso porque seria praticamente impossível a concretização de tal medida se coubesse ao exequente o ônus da prova, vez que este em tese desconhece por completo como se dá a gestão dos bens da parte executada e de seu cônjuge/companheiro

É indispensável trazer à luz excerto do voto da Desembargadora Themis de Almeida Furquim em sede da Apelação 1646943-9[12]:

E tal presunção tem razão de ser, considerando que a construção do patrimônio do casal é feita em conjunto, pelo que os benefícios, assim como as dívidas, são responsabilidade de ambos, a menos que haja prova em sentido contrário. Outrossim, à parte credora se torna impossível comprovar que a dívida foi contraída em benefício da família, diante da ausência de qualquer acesso não apenas à contabilidade familiar, mas também aos costumes daquela entidade familiar.

Sobre o tema, o entendimento é pacífico na jurisprudência pátria:

DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. MEAÇÃO. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO CÔNJUGE VARÃO. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA.

1. Tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é a de que cabe ao meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, haja vista a solidariedade entre o casal. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido.

(AgRg no AREsp 427.980/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 25/02/2014).

EXECUÇÃO. PENHORA. MEAÇÃO DA MULHER. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO MARIDO. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA.

A mulher casada responde com sua meação, pela dívida contraída exclusivamente pelo marido, desde que em benefício da família. - Compete ao cônjuge do executado, para excluir da penhora a meação, provar que a dívida não foi contraída em benefício da família.

(AgRg no AgRg no Ag 594642/MG STJ/3T Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS - j em julgado de 21.2.2006).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO PARA FINS RESIDENCIAIS. DÍVIDA CONTRAÍDA EM PROL DA ENTIDADE FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO. CASAMENTO EM REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. PESQUISA DE BENS EM NOME DO CÔNJUGE NÃO EXECUTADO (BACENJUD/RENAJUD). POSSIBILIDADE.

1. Agravo de instrumento contra decisão que indeferiu pedido de pesquisa de bens em nome da esposa do executado nos sistemas à disposição do Tribunal (BACENJUD e RENAJUD).

2. Da análise do artigo 1.643 e seguintes do Código Civil extrai-se a intenção do legislador em proteger credores e terceiros, permitindo que o patrimônio familiar responda pelas obrigações e dívidas contraídas para a manutenção da família, presumindo que, sendo em benefício do núcleo familiar, houve o consentimento de ambos os cônjuges.

3. O artigo 790, inciso IV, do Código de Processo Civil permite a penhora dos bens do cônjuge que não é parte na execução quando "seus bens próprios ou de sua meação respondam pela dívida".

4. Ausente prova de que a dívida contraída não foi revertida em proveito da entidade familiar - ônus que competia ao cônjuge meeiro -, viável a pesquisa de bens de propriedade da esposa do executado, mesmo que esta não componha o pólo passivo da ação, e ainda que não tenha se obrigado pelo pagamento do débito objeto da demanda. Precedentes.

5. No caso concreto, a exequente comprova que o devedor é casado sob o regime da comunhão parcial de bens, revelando-se possível a pesquisa e a eventual constrição dos bens de seu cônjuge para satisfazer dívida oriunda de contrato de locação para fins residenciais, ressalvado eventual óbice legal ulteriormente manifestado.

6. Recurso conhecido e provido.

(TJDFT. Acórdão 1217039, 07180275720198070000, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 13/11/2019).

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. DIALETICIDADE. RECURSO QUE NÃO IMPUGNA TOTALMENTE OS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. CONHECIMENTO PARCIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE DIREITOS POSSESSÓRIOS SOBRE IMÓVEL IRREGULAR. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO CÔNJUGE CASADO EM COMUNHÃO DE BENS PRESUNÇÃO DE QUE SE REVERTEU EM PROVEITO DA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA QUE RECAI SOBRE O AUTOR RECURSO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO. (...) 3. Diante de dívida contraída pelo cônjuge, incumbe ao consorte, em sede de embargos de terceiro, o ônus da prova de que disso não resultou benefício para a família. 4. APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA.

(TJFDT. 20150410097349APC, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, 4ª TURMA. Acórdão 1144716 CÍVEL, data de julgamento: 12/12/2018).

EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA.

É claro que a penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada, nada obstante perfeitamente possível nas hipóteses traçadas alhures, é medida de caráter excepcional, tendo em vista que desconhecida a forma pela qual a família gere suas finanças.

Está na própria essência do Código de Processo Civil conciliar, na medida do possível, a satisfação do crédito e a conservação do patrimônio e da dignidade financeira do executado.

O artigo 805 do Código de Processo Civil dispõe que a execução deve se dar pelo meio menos gravoso em relação à parte executada, quando o exequente possui diversos meios para concretizá-la. Outrossim, o artigo 835 do Código de Processo Civil estabelece uma ordem preferencial de penhora de bens da parte executada, no mesmo sentido de meio menos gravoso. Por fim, ainda consta no artigo 833 um rol de bens impenhoráveis, a fim de, preservar certa qualidade de vida econômica para a parte executada.

Ora, se há na estrutura subjacente do Código de Processo Civil elementos que indicam um entendimento de não excessiva oneração da parte executada, quanto mais ao seu cônjuge/companheiro. Em consequência, deve prevalecer o procedimento executivo comum, visando em primeiro lugar a satisfação do crédito diretamente com os bens da parte executada, para somente em seguida diligenciar os bens de seu cônjuge/companheiro.

Nesse sentido, ao nosso ver, seria razoável primeiramente diligenciar os bens do executado pelos meios tradicionais (Bacenjud, Renajud e Infojud), esgotando as possibilidades menos gravosas tanto para a parte executada, mas sobretudo ao seu cônjuge/companheiro, para apenas proceder com a busca de bens deste.

CONCLUSÃO.

Sintetizando o que delineado ao longo do presente artigo, a penhora de bens do cônjuge/companheiro da parte executada:

I) No regime de separação convencional de bens, não é possível.

II) No regime de separação legal de bens, é possível.

III) No regime de comunhão parcial de bens, é possível.

IV) Na união estável, é possível.

V) No regime de comunhão universal de bens, é possível.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

ASSIS, Araken de. Manual da execução. 18 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2016. p. 321.

DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil: execução. 7ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017, vol. 5.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011;

GAGLIANO, P. S.; FILHO, R. P. Novo curso de direito civil: Direito de família. As famílias em perspectiva constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 371.

NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado, 10.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 8ª ed. Editora Método, 2018, p. 1188 a 1229.

ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao código de processo civil. Coord. Ovídio Araújo Baptista da Silva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, vol. 8, p. 269.


 

[3] GAGLIANO, P. S.; FILHO, R. P. Novo curso de direito civil: Direito de família. As famílias em perspectiva constitucional, Rodolfo Pamplona Filho. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 371.

[4] ASSIS, Araken de. Manual da execução. 18 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2016. p. 321.

[5] (REsp 15.636/RJ, Rel. Ministro FONTES DE ALENCAR, QUARTA TURMA, julgado em 16/02/1993, DJ 12/04/1993, p. 6071).

[6] REsp 1481888/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/2018, DJe 17/04/2018.

[7] Manual de Direito Civil. 8ª ed. Editora Método, 2018, p. 1229.

[8] Manual de Direito Civil. 4ª ed. Editora Método, 2014, p. 1188.

[9] Art. 1.666. As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns.

[10] ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao código de processo civil. Coord. Ovídio Araújo Baptista da Silva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, vol. 8, p. 269.

[11] DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil: execução. Salvador: JusPodivm, 2009, vol. 5, pp. 262-263.

[12] TJPR - 14ª C.Cível - AC - 1646943-9 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Regional de Nova Esperança - Rel.: Desembargadora Themis de Almeida Furquim - Unânime - J. 03.05.2017.

Sobre os autores
Giulia Zanini Mareze Dias

Acadêmica de Direito na Universidade Federal do Paraná.

Vinicius Dino de Sousa

Acadêmico de Direito na Universidade Federal do Paraná.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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