CLÁUSULA DE BARREIRA E MODULAÇÃO DA REPRESENTAVIDADE DEMOCRÁTICA

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O presente artigo tenta apresentar a análise da cláusula de barreira inserida através da Emenda Constitucional n. 97/2017, a regra de transição incidente nas eleições de 2018, 2022 e 2026 e sua aplicabilidade definitiva nas eleições de 2030.

CLÁUSULA DE BARREIRA E MODULAÇÃO DA REPRESENTAVIDADE DEMOCRÁTICA

 

RESUMO – O presente artigo tenta apresentar a análise da cláusula de barreira inserida através da Emenda Constitucional n. 97/2017, a regra de transição incidente nas eleições de 2018, 2022 e 2026 e sua aplicabilidade definitiva nas eleições de 2030. Além dessa análise, fazer menção à cláusula de desempenho inserida na Lei 9.096/95 e o entendimento do STF na época. Mostrar as consequências e as alternativas dos partidos minoritários e o objetivo principal da referida Lei.

 

Palavras chaves: Lei – barreira – julgamento – emenda .

ABSTRACT – This article attempts to present the analysis of the barrier clause inserted through Constitutional Amendment no. 97/2017, the transition rule applicable in the 2018, 2022 and 2026 elections and its definitive applicability in the 2030 elections. In addition to this analysis, mention is made of the performance clause included in Law 9,096 / 95 and the STF's understanding at the time. Show the consequences and alternatives of minority parties and the main objective of that Law.

 

Keywords : Law - barrier - judgment - amendment

 

Introdução:

 

A humanidade desde longos tempos sempre procurou decidir a vida coletiva tomando decisões que influenciariam a vida em comunidade. A história foi moldando as instituições. A participação popular nas decisões políticas comunitárias foi delineando o conceito de democracia e evoluindo até alcançar o estágio da democracia representativa, onde o cidadão concede a um representante o poder de tomar decisões políticas que irão influenciar na sua esfera de sobrevivência comunitária. Surgem assim, os parlamentos, onde os deputados, representantes do povo, são escolhidos, através de sufrágio, para a deliberação e elaboração de leis.

 

Essa representatividade foi ao longo da história sofrendo interferências normativas de modo a explicitar a forma e o modo como esse exercício do mandato seria utilizado. Que regras os partidos políticos teriam de obedecer para que os candidatos eleitos pudessem exprimir com legitimidade o poder conferido pelo povo?

 

A Constituição brasileira tem como um de seus pilares fundamentais o pluripartidarismo que se constitui numa tecitura diversificada por partidos com idéias diferentes, ora mais próximos ora mais distantes, criando uma complexa rede partidária no cenário político nacional. Em determinado momento ficou tão fácil criar um partido que as siglas se multiplicavam da noite para o dia e o surgimento desmesurado implicava no aumento da divisão da fatia financeira dos recursos provenientes do fundo partidário e bem como do aumento da divisão da visibilidade proporcionada na propaganda partidária gratuita existente no radio e na televisão.

                             

Na tentativa de colocar um freio a esse cenário de oportunismos partidários fez-se necessária a criação de uma rede de contenção normativa para solidificar o real significado da representatividade democrática e evitar a diluição dos recursos públicos, os quais estavam servindo mais para financiar pseudo-campanhas do que em fortalecer os partidos verdadeiramente comprometidos com a democracia. Nessa bipolaridade de interesses surgiram dispostivos normativos e julgamentos da Corte Suprema acerca da cláusula de desempenho e culminou com o surgimento da Emenda Constitucional n. 97/2017 que definiu a cláusula de barreira como norma de natureza constitucional.

 

A Democracia 

A democracia é o espelho que reflete a alma participativa do cidadão, representando o feixe coletivo volitivo da vontade social. O universo deliberativo ganha peso igualitário, depois de uma evolução histórica, onde nem sempre a isonomia sufragante se fazia presente. Destarte, se faz relevante que o cidadão tenha consciência do seu papel enquanto agente participativo nas decisões que irão influenciar na sociedade, pois o representante escolhido para representar o povo, no parlamento, tem um poder legiferante enorme e deve estar sintonizado aos anseios de quem lhe conferiu referido encargo.

 

MARCOS CLÁUDIO ACQUAVIVA parafraseando Georges Burdeau bem define sinteticamente o conceito de democracia:

 

“ Democracia é o processo político que autoriza a permanente participação, livre e consciente, direta ou indireta, da comunidade, na deliberação dos governantes.” ( Acquaviva, Marcus Cláudio in Teoria Geral do Estado. Editora Saraiva. 1994 )

 

Raimundo Augusto Fernandes Neto e Jânio Pereira da Cuha avistam uma verdadeira crise democrática, a ensejar a um só tempo um sentimento de aversão e menosprezo à política, abalando os alicerces dos pilares democráticos e colocando em contínuo descrédito os representantes do povo.¹

“ A sensação é a de que o Estado não mais responde às garantias que prometeu ao cidadão no contrato social. O Estado não é responsivo  aos anseios por segurança, saúde, educação, oportunidade de trabalho e seguridade garantidas ao cidadão, que restrigniu sua liberdade, respeitando as leis e pagando tributos. É certo afirmar com efeito, que sistemas políticos que não funcionam bem – que são ineficazes no combate à pobreza e desigualdade, que são corruptos e ineficazes na redução do crime e dos quais o cidadão comum não se sente representado – engendram cidadãos que apresentam baixos níveis de apoio ao regime político (.....)

Aflora com efeito, um fenômeno paradoxal: a política e sua representação institucional – os partidos – passaram a ser considerados como algo desprezível, atraindo um sentimento social de aversão ao que é político, que assim, decide em dissonância  relativamente ao interesse público de quem representa.”  (CUNHA, JÂNIO PEREIRA & FERNANDES NETO, RAIMUNDO AUGUSTO in A nova Cláusula de Barreira e a sobrevivência das minorias. https://www.scielo.br)

 

ADI 1351/DF e entendimento do STF – Em 2006 o Supremo Tribunal Federal foi provocado a julgar a ação direta de inconstitucionalidade para analisar a constitucionalidade da cláusula de desempenho prevista na Lei 9.096/95 ( Lei dos Partidos Políticos ). Na época os Ministros entenderam pela inconstitucionalidade da cláusula de desempenho previsto na supracitada Lei.

 

Emenda Constitucional n. 97/2017 e Cláusula de Barreira – A emenda constitucional n. 97/2017 alterou o § 3º do Art. 17 da Constituição Federal objetivando frenar o fragmentarismo político reinante no cenário político nacional. Criar um partido tinha se tornado um negócio rentável, a facilidade de criação, sejam programáticas sejam jurídicas, era um fator estimulante e muitos políticos viram nisso um fator de arrecadação de recursos públicos e de visibilidade para se perpetuarem no poder ou aumentar o patrimônio pessoal.

 

A emenda constitucional 97/2017  alterou o artigo 17, § 3º da CF/88, o qual passou a ter a seguinte redação:

 

“ Art. 17.. § 3º. Somente terão direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente:

 I – obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo 3% ( três por cento ) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% ( dois por cento ) dos votos válidos em cada uma delas; ou

II – tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.”  

Com tal diretriz, o partido político precisa obedecer a este percentual de desempenho para fazer jus às benesses dos recursos provenientes do fundo partidário e ao acesso gratuito da propaganda partidária no rádio e televisão.

 

Destaque-se que o mandato do candidato eleito estará assegurado, o que será impedido é o acesso aos recursos do fundo partidário e o acesso à propaganda  partidária gratuita no rádio e na televisão. O candidato eleito não poderia ver seu mandato conferido legitimamente pela vontade soberana do povo obstaculizado por um grau de desempenho insatisfatório de seu partido. Tal direito está expressamente previsto no art. 17, § 5º da CF/88.

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“Art. 17, § 5º . Ao eleito por partido que não preencher os requisitos previstos no § 3º deste artigo é assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que os tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de distribuição dos recursos do fundo partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e televisão.”

 

Esses parâmetros de contenção previstos na cláusula de barreira irão incidir de maneira efetiva nas eleições de 2030 e a emenda constitucional n. 97/2017 no seu art. 3º, parágrafo único, I, II e III contém normas de transição que vão modulando progressivamente a barreira nas eleições de 2018, 2022 e 2026.

 

“Art. 3º.

Parágrafo único. Terão acesso aos recursos do fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão os partidos políticos que:

I – na legislatura seguinte às eleições de 2018:

a)     Obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo 1,5% ( um e meio por cento ) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com o mínimo de 1% ( um por cento ) dos votos válidos em cada uma delas; ou

b)     Tiverem elegido pelo menos nove Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação;

 

I I – na legislatura seguinte às eleições de 2022:

a)     Obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo 2% ( dois por cento ) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com o mínimo de 1% ( um por cento ) dos votos válidos em cada uma delas; ou

b)     Tiverem elegido pelo menos onze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação;

 

III – na legislatura seguinte às eleições de 2026:

a)     Obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo 2,5% ( dois e meio por cento ) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com o mínimo de 1,5% ( um e meio por cento ) dos votos válidos em cada uma delas; ou

b)     Tiverem elegido pelo menos treze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.”

 

CONCLUSÃO

A cláusula de barreira é um instrumento de proteção jurídica indispensável na busca da construção de um sistema político fundamentado verdadeiramente na representatividade democrática. É uma teia de contenção que impede políticos maliciosos que objetivam abocanhar fatia do bolo financeiro do fundo partidário como mecanismo de dilatação patrimonial própria e que se apropria de espaço midiático proporcionado pela propaganda partidária gratuita para continuar no plano da visibilidade eleitoral.

A Política praticada por esses políticos é de pura promoção pessoal e patrimonial. A cláusula de barreira ao ganhar status constitucional define as regras do jogo e serve para impedir essas táticas partidárias. Só irá conseguir sobreviver no universo político, no que pertine ao acesso de recursos públicos do fundo partidário e à propaganda partidária gratuita, partidos com um grau de desempenho que revelem uma homogeneidade de identificação entre o partido e o eleitorado. Busca-se acabar com as tentativas oportunistas da criação de partidos da noite para o dia. Siglas que muitas vezes são completamente descohecidas para o eleitorado. Os partidos minoritários terão que adequar-se a referidas normas, sob pena de serem aglutinados pelo sistema. A estratégia de fusão partidária seria uma alternativa para esses pequenos partidos.  

 

O certo é que até a implementação definitiva nas eleições de 2030, as eleições anteriores servirão de termômetro institucional do perfil democrático da câmara dos deputados e dos eleitores.

REFERÊNCIAS:

Constituição Federal Brasileira;

Emenda Constitucional n. 97/2017;

Lei 9.096/95;

CUNHA, JÂNIO PEREIRA & FERNANDES NETO, RAIMUNDO AUGUSTO in A nova Cláusula de Barreira e a sobrevivência das minorias. https://www.scielo.br

https://www.direitonet.com.br;

https://m.migalhas.com.br;

https:///www.nexojornal.com.br;

FERNANDES NETO, RAIMUNDO AUGUSTO in A nova cláusula de barreira e a sobrevivência das minorias ( www.scielo.br );

https://www.elegis.com.br;

LEÃO VIANA, JOÃO PAULO SARAIVA in Fragmentação partidária e a cláusula de barreira: dilema dos sistema político brasileiro.

ACQUAVIVA, MARCOS CLÁUDIO in Teoria Geral do Estado. Ed. Saraiva. 1994.

 

Sobre o autor
Marcílio Marcelo Leão Santos

Analista Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado do Pará;Pós-graduado em Direito Processual Civil pela UNINTER Ministrante de Cursos de Direito Penal e Processo Penal no Instituto de Ensino de Segurança Pública do Pará - IESP

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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