O homem é um animal que adora tanto as novidades que se o rádio fosse inventado depois da televisão haveria uma correria a esse maravilhoso aparelho completamente sem imagem.
Millôr Fernandes
Resumo: O presente artigo buscar fazer uma análise das características processuais, no âmbito trabalhista, acerca do processo após a reforma trabalhista.
Abstract: This article seeks to make an analysis of the procedural characteristics, in the labor scope, about the process after the labor reform.
Palavras chave: Processo; Reforma, Custas, litigância.
Keywords: Process; Reform, costs, litigation.
- Introdução.
Não é apenas no Brasil que as modificações de sua legislação laboral, em outras partes do mundo a proteção aos direitos dos trabalhadores também foi marcado por lutas e conquistas.
Lembremos da épica história narrada por C.S Lews descrever o romance alegórico as Crónicas de Nárnia descortina um mundo imaginário onde o mal e o bem, em uma visão maniqueístas de poderes opostos e incompatíveis encontram-se em constante batalha.
Nesse artigo tratarei dessa luta de gladiadores, a reforma trabalhista sob esse viés que sempre caracterizou as relações de trabalho, o confronto entre capital e proletariado em sua dimensão política-histórica caracterizada pela eterna crise sistêmica entre as relações de empregado e empregador, a falsa percepção a respeito da flexibilização dos direitos trabalhista e a atual ideologia política governamental que reduziu direitos previstos em lei sem o necessário debate social, não demonstrando transparência e boa-fé na condução do processo legislativo.
Com o advento da lei 13.467/17 houve significativa modificação na legislação que regula o direito laboral brasileiro. Paradigmas foram substituídos, regras dogmáticas alteradas, de forma abrupta, ou seja, o processo legislativo tramitou em caráter de urgência e a realidade do direito do trabalho brasileiro deu um salto para um novo mundo.
Após a sanção presidencial a sociedade começa a tomar consciência da lei e de seus impactos nas relações sociais, novos mecanismos de acesso ao Judiciário, novas figuras contratuais de trabalho, restrições e precarizações de direitos, deixando claro que as referidas mudanças revelam a força ideológica do agrupamento político e interesses prevalecentes do capital.
De fato, houve uma mudança de paradigma no direito do trabalho.
Importante destacar a contribuição de Thomas Kuhn (1998), que ao conceituar o paradigma afirma que “é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade cientifica consiste em homens que partilham um paradigma.”
A discussão em torno da urgente mudança no direito do trabalho e a promulgação da nova lei comtemplou novos paradigmas a comunidade que convive com as normas que regulam essa área especializadas do direito, em especial, o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade, a compensação de jornada sem negociação coletiva, ampliação do banco de horas, admissão de trabalho da emprega gestante e da lactante em ambiente insalubre, trabalho intermitente, quitação anual das verbas trabalhistas, dentre outros.
Desde o surgimento do fenômeno industrialização há no mundo uma constante evolução das regras e normas que regem as relações interpessoais desse fato social, e, longe de combatê-la, em verdade, necessitamos dessa constante renovação, pois se trata do resultado do progresso humano.
O Estado, ao desempenhar a sua função política, administrativa e judiciária, faz a história imprime seu selo ideológico na produção de regras que regem as relações laborais, nos limites de sua atuação, em especial no direito laboral criando normas que protegem o hipossuficiente na relação laboral, não sendo diferente em outras partes do mundo.
O objetivo desse artigo é examinar os impactos da reforma trabalhista marcada pela ideologia restritiva neoliberalista que no rastro do movimento de flexibilização dos direitos trabalhista, apresentou a sociedade brasileira a Lei 13.467/2017 com inúmeros dispositivos passiveis de inconstitucionalidades, bem como mensurar a precarização dos direitos dos trabalhadores refletido em diversos dispositivos da nova lei.
Jack Balkin (1987) argumenta que ideias e conceitos se alteram à medida que são introduzidas em novos contextos sociais e políticos ao longo do tempo. E afirma que os juristas devem estar interessados utilizar técnicas desconstrutivas pois fornecem métodos para criticar as normas legais existentes; em particular, uma leitura desconstrutiva revelará como os argumentos oferecidos para suportar uma determinada regra minam-se.
Além disso, as técnicas desconstrutivas podem mostrar como os argumentos que justificam a inclusão no ordenamento jurídico de normas são informados e disfarçam o pensamento ideológico.
Por outro lado, é possível afirmar também que a ideia pugnada por Balkin também pode ser refletida ao revés, desconstruir direitos. A reforma capitalista e neoliberal não seria uma lesão consolidada e desconstrutivista dos direitos dos trabalhadores?
Pois bem.
Nesse ponto, a Lei 13.467/2017 reflete o pensamento ideológico em regular as relações de trabalho, notadamente, pelo neoliberalismo, que por via direta abalou as estruturas do direito do trabalho, abrindo espaço ao interesse do que detém a força superior e dominante.
Destarte, a presente análise dialogará com as técnicas desconstritivas em uma reflexão em que evidenciará o pensamento ideológico que motivou a legislador para trazer para sociedade brasileira a “deslealdade” legislativa.
Jack Balkin (1987) diz que “os limites da justiça, são determinados pelos limites de quem é humano em oposição a quem é meramente “animal”, a reforma trabalhista é um exemplo que não se respeitou o limite do humano, do frágil, do tangível pelas limitações do cansaço, daquele que se esvai em seu esforço humano no fim do dia laboral, do respeito a trabalhadora humana que gera mais uma vida que ingressará no mundo que o recepcionará em um ambiente desumano e sem limites.
Historicamente os avanços normativos pós industrialização criou um campo de proteção aos direitos dos operários, fruto dos movimentos sociais em busca de humanização e dignidade nas relações entre capital e proletariado.
O complexo ramo do direito laboral tem como escopo a proteção aos direitos fundamentais do trabalhador, constitui garantias de que a ordem jurídica não retrocederá em desfavor do cidadão, com as exceções prevista na magna carta.
A Constituição cidadã estabelece que um dos objetivos fundamentais da República é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária que garanta o desenvolvimento nacional e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
O texto constitucional confirma que nossa sociedade é multifacetária, com realidades sociais distintas. O Brasil é um país em desenvolvimento social. Dado relevante que se deve ter em conta quando se fala sobre mudança legislativa laboral, o que parece ter sido relegado a segundo plano na tramitação do projeto de lei da reforma trabalhista.
Segundo Vólia Bomfim (2014), o Welfare legitimou a pretensão universalista dos direitos dos trabalhadores em razão da centralidade do trabalho na organização da sociedade industrial. Originariamente a atuação estatal é justamente proteger o hipossuficiente da famigerada lei do mercado.
“O Welfare State representa o direito que tem toda pessoa de ser protegida contra abusos do poder econômico, garantindo-lhe, por exemplo, renda mínima, alimentação, educação, saúde, habitação, independentemente da condição social do ser humano, tudo como forma de direito politico e não como caridade.” (BOMFIM, apud STREK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e hermenêutica. p.64)
Muito se vem discutindo a respeito de mudanças na legislação trabalhista brasileira, tendo como fundamentos diversos dos fatores, dentre eles, a modificação da economia, a abertura de mercado, a livre concorrência, a saúde das empresas, a flexibilidade das leis, a redução de direitos trabalhista, a sujeição do sistema econômico brasileiro ao interesse do capital e a adoção da ideologia de mercado.
Entretanto, como diz Boaventura Santos (1998) “Precisamos de um Estado cada vez mais forte para garantir os direitos num contexto hostil de globalização neoliberal”.
Sabemos que o interesse do capital não corresponde ao interesse do trabalhador, pois o empregador, que pelo princípio da alteridade assume os riscos do negócio não tem interesse em remunerar de forma condigna aos trabalhadores ou proporcionar condições de saudáveis do ambiente de trabalho. Evidente que as normas justrabalhistas que formam um bloco mínimo de segurança devem ser referendas pelo Estado, ainda mais em países subdesenvolvidos, como é caso do Brasil.
Nesse sentido, Balkin afirma que a lei reflete visões sociais que envolvem privilégios de concepções particulares da natureza humana.
Assim, pode-se afirmar que o processo de mudança das normas trabalhistas brasileiras está inserido em um processo maior de flexibilização do mercado de trabalho, ou seja, novos mecanismos legais são impostos a sociedade decorrente da mudança da economia mundial.
Em verdade, de um fenômeno mundial de precarização normativa das relações de trabalhista, com suporte ideológico político, econômico e social.
Além disso, é de se perceber que a característica marcante do direito do trabalho é proteção ao hipossuficiente.
Entretanto, não podemos esquecer que o direito do trabalho deve equilibrar os interesses divergentes, pois o capital depende do trabalhador e o trabalhador do capital, vice-versa, nesse ponto o Estado é o ponto de equilíbrio nessa relação.
É correto afirmar, portanto, que a Lei 13.467/2017 apresenta-se claramente como instrumento a serviço dos interesses dos empregadores e resultará em maior lucratividade e aumento significativos de seus rendimentos, a exemplo do novos modelos de contratos de trabalho, prestação de serviços por pessoa jurídica, a não integração ao salários de benefícios, trabalho em condições insalubres para gestantes, fim das horas in itinere, revogação de regras sobre a jornada de trabalho, dispensa das homologações pelos sindicatos, dentre outras que ferem princípios como da razoabilidade, lealdade e transparência.
Em um sistema unificado em que o mundo globalizado enfrenta crises decorrentes das ideologias política e econômicas, o mínimo que se espera do Estado que preocupa-se em construir uma sociedade justa, erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais, é proteger os direitos dos trabalhadores e principalmente a dignidade.
Hannah Arendt (2007) em sua obra a Condição Humana traz uma extraordinária contribuição a respeito da dignidade humana do trabalhador quando destaca o valor da pessoa humana e aponta como essencial para a vivência em um mundo caracterizado por existir socialmente.
Sustenta Arendt que trabalho é uma atividade própria do ser humano (fabricar, construir, etc.), sendo essa atividade não natural, cria e construí um mundo através de sua ação.
Arrendt acrescenta que:
O trabalho é a atividade correspondente ao artificialismo da existência humana, existência esta não necessariamente contida no eterno ciclo vital da espécie, e cuja mortalidade não é compensada por este último. O trabalho produz um mundo artificial de coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural. Dentro de suas fronteiras habita cada vida individual, embora esse mundo se destine a sobreviver e transcender todas as vidas individuais. A condição humana do trabalho é a mundanidade. (ARENDT, 2007, p. 15)
Assim, o labor é uma atividade essencial sendo mediada pela necessidade do homem em se manter enquanto interage em seu processo biológico, muitas vezes é o único bem que possui, o fruto do seu trabalho, o que exige o respeito ao bloco mínimo de proteção aos direitos socais alcançados frente ao capitalismo desumano.
Por essa essencialidade do labor sustenta Jorge Luiz Souto Maior (2017) que “Por isso a proteção do ser humano que trabalha, e não o trabalho em si, é que constitui o objeto central da investigação jurídica.”
Entretanto, uma coisa é certa: vivenciamos uma crise no direito do trabalho. O Brasil é um país de desenvolvimento desigual, há regiões extremamente marcada pelo subdesenvolvimento, pobreza, misérias e mesmo que vivenciamos o desenvolvimento em alguns setores da sociedade é comum nos noticiários a informação de práticas atentatórias aos direitos dos trabalhadores como por exemplo a redução de empregados a condição análoga de escravos.
Marcio Tulio Viana, concorda que o direito do trabalho se encontra em um período crítico de crise existencial decorrente do reflexo alucinante da reforma trabalhista:
Nesse contexto meio esquizofrênico, que o bombardeia com elementos estranhos, o Direito do Trabalho começa a viver uma crise de identidade. Afinal, ele sempre nos disse que “trabalho não é mercadoria”, assim como nos ensinava a aplicar a norma mais favorável ao trabalhador e a desconfiar dos acordos de vontade. Hoje, no entanto, ele respalda a terceirização, que mercantiliza o trabalhador; faz concessões à autonomia coletiva e até mesmo ao acordo individual de vontades, sem cuidar do equilíbrio entre os atores sociais; e faz acenos em direção à declaração formal de vontade, sem criar mecanismos que garantam sua vontade real. (VIANA, 2017)
Nesse contexto de desarmonia conceituais, acrescidos da desarmonia social, a reforma trabalhista consagrou a ideia do negociado prevalecer sobre o legislado, em total descompasso com a realidade brasileira e fragilidade de homens e mulheres neste país que sofrem nas mãos inescrupulosas de políticos desonestos e descompromissadas com a realidade social.
A Constituição da República Brasileira estabelece que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social”, essa é a perspectiva central e que não se pode perder de vista, ou seja, melhorar a condição social dos trabalhadores.
Muito se comemora, por muitos profissionais da área trabalhista, após a reforma da lei obreira, acerca dos assuntos de litigância de má fé, honorários de sucumbência, custas e justiça gratuita. Porém, para refletirmos será que realmente essas alterações foram um avanço ou um retrocesso? Vamos tecer ponto a ponto.
O primeiro tema é a litigância de má fé.
Importante ressaltar que a litigância de má fé, hoje tratada na CLT, nos artigos 793 A a 793 D, traz punições as partes e testemunhas que se utilizam de subterfúgios tenebrosos para conseguir algum direito inexistente. Ocorre que já estamos diante de uma falha, pois não é punido o advogado que utiliza desses métodos para conseguir seus objetivos.
Cediço afirmar que na área trabalhista, mesmo com todas as informações disponibilizadas a todos (lê-se internet) não traz de forma clara o direito inerente de cada empregado/trabalhador, com isso o obreiro fica “na mão” do profissional de direito de sua confiança. Desta forma, a lealdade, assim como a boa fé, deverá ser um pressuposto de todos, inclusive dos advogados.
A lei deve ser igual para todos os envolvidos do processo, não é mesmo?
Nessa linha de pensamento, Josley Soares, Juiz de São Paulo, defende: “parece que seria oportuna e de bom tom a inserção na lei processual trabalhista de algo como previsto no artigo 5º do NCPC que dispõe sobre a boa-fé objetiva processual para todos aqueles que de algum modo participarem do processo, ou mesmo a enumeração dos deveres das partes e participantes do processo (art. 77 NCPC) mas assim não quis a reforma, lei 13.467/2017 e parou no meio do caminho, tratou apenas das penalidades.”
Sobre as hipóteses específicas de litigância de má-fé, descritas no artigo 793 A, traz as situações de forma taxativa, ou seja, dando amplitude para a “criatividade” das partes de “inventarem” novas formas de pleitear com má fé. O ideal seria que a lei fosse exemplificativa. Outro ponto complexo na lei.
Chama a atenção o inciso V, do artigo 794 – B da CLT em que contempla a hipótese amplamente genérica quando entende ser litigante de má-fé aquele que procede de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo.
Nesse sentido, na doutrina, a consciência da inexistência de justificativa para o procedimento tomado. Pode-se inserir aqui, por exemplo, aquele de apresenta incontáveis contraditas contra as testemunhas da parte contrária, mas desde sempre sabia que não havia fatos sérios subjacentes a referidas contraditas e que não havia provas aptas para sua comprovação.
Quais são as consequências, da litigância de má-fé, descritas no artigo 793-C?
Conforme o texto de lei, poderá o juiz condenar o litigante em 1,1%, mas não em 1% ou ser mais arrojado e forma fundamentada subir o patamar da multa para 9,9% que não poderá, contudo, ser 10%, pela redação literal e inexplicável da norma que aqui se reproduziu. Estamos diante de um erro tamanho do legislativo.
Em contraponto, pergunta-se se existe a possibilidade de indenização, a outra parte, além da multa? São poucas as decisões que contemplam a indenização enfrentam o drama da possibilidade de sua fixação independentemente de prova de prejuízo, posição de parte da doutrina, como por exemplo o Professor Bedaque, e do próprio STJ, como se colhe Informativo 565, na decisão exarada no EREsp 1.122.262-ES da relatoria do Ministro Felipe Salomão, de 04/08/2015.
A responsabilidade do advogado é possível? Nessa linha, algumas decisões, mesmo no campo trabalhista (art. 81 NCPC e art. 769 da CLT) terminam por envolver na condenação além da parte também o advogado que lhe representa ao argumento de que o advogado também é interveniente do processo.
Porém, insta salientar o que dispõe o artigo 32 da Lei 8906/94 que: em caso de lide temerária o advogado será responsável solidário com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.
Desta forma, exige condenação do advogado por dolo ou culpa no exercício profissional em ação própria e não incidentalmente no âmbito de uma reclamação trabalhista, entendimento que parece ser o mais razoável.
No sentido do exposto, cabe mencionar o trecho da sentença proferida em 7/2/13, pela juíza Anna Beatriz Matias Diniz de Castilho Costa da 5ª vara do Trabalho de Vitória/ES no processo nº 0053600-05.2012.5.17.0005, no qual a Reclamante foi condenada em litigância de má-fé:
(...) A petição inicial é temerária, trazendo elementos imaginários e destituídos de qualquer fundamento fático e jurídico. A artimanha é sempre muito semelhante; mentir, ocultar a verdade ou exagerar.
Ocorre que o Judiciário realmente não pode tolerar tal sorte de comportamento. São muitos os que têm sede de Justiça. Este Poder está abarrotado de processos. São inúmeras as pessoas que efetivamente precisam da mão pesada do Estado para reparação/prevenção de direitos. E tipo de demanda prejudica a coletividade, visto que faz com que a Justiça perca tempo e dinheiro desnecessariamente, retardando o atendimento daqueles que efetivamente carecem e clamam por Justiça. (...)
A crença na hipossuficiência da parte reclamante, bem como na gratuidade da Justiça não raro motivam, na prática, o descompromisso com a verdade no processo. Faz crescer a sensação de impunidade, da ausência de responsabilização, principalmente financeira. Entretanto, tal premissa não é verdadeira. Atentos a isto, os juízes do trabalho têm imposto penalidades aos que litigam de má-fé, inclusive condenando-os à perda da gratuidade da Justiça. Com isso, gera-se aos reclamantes graves prejuízos, diante da conduta maliciosa, principalmente na interposição de recursos.
Corroborando o exposto, menciona-se os julgados n° 0001700-29.2014.5.12.0012 e 0000810-44.2014.5.09.0022. Cabe ainda verificarmos o posicionamento do Juiz Giani Gabriel Cardozo da 1ª vara do Trabalho de Gravataí/RS ao proferir sentença em 17/10/2014 no processo nº 0000804-64.2013.5.04.0231:
(...) Atitudes como esta demonstram o desrespeito do autor com o Poder Judiciário e merecem ser alvo de sanção, de forma a evitar que se repita.
Dessa forma, aplico multa de 1% por litigância de má-fé (Art. 18, caput, CPC) e condeno o autor ao pagamento de indenização, na razão de 10% (Art. 18, § 2º, CPC), ambas calculadas sobre o valor da ação (R$ 70.000,00), valores que serão executados nesta ação e revertidas às reclamadas.
(...) O autor declinou não ter condições de suportar custas processuais, mas por ter incorrido em litigância de má-fé não faz jus ao benefício da Justiça gratuita.
É indevida a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita ao litigante de má-fé, por absoluta incompatibilidade entre estes dois institutos. A gratuidade da Justiça está intimamente ligada à lealdade processual, de sorte que o seu beneficiário não está dispensado de agir eticamente, sob pena de a sociedade ter que arcar com os custos daquele que impulsiona a máquina judiciária obtendo vantagens indevidas. Rejeito. (...)
Segundo ponto: Honorários de sucumbência.
A base legal para determinado direito esta no artigo 791 da CLT, em que determina:
“Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.
§ 1o Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.
§ 2o Ao fixar os honorários, o juízo observará:
I - o grau de zelo do profissional;
II - o lugar de prestação do serviço;
III - a natureza e a importância da causa;
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
§ 3o Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.
§ 4o Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
§ 5o São devidos honorários de sucumbência na reconvenção.”
Analisando a lei acima, é salutar referir no caso de um empregador que descumpre a lei e deve R$ 200 mil ao empregado, impor-lhe a obrigação de pagar mais R$ 30 mil pela reparação de honorários advocatícios (15 %), representa uma situação bem menos gravosa do que impor a mesma obrigação (de pagar R$ 30 mil) ao empregado (15%) que sempre cumpriu suas obrigações contratuais e apenas não obteve o reconhecimento judicial do direito que imaginava possuir.
A dita “Reforma Trabalhista” instituída pela Lei n. 13.467/2017, sofre inúmeras críticas de estudiosos e doutrinadores, pois eles afirmam que a referida reforma desponta a um direcionamento de retrocesso, segregação e sedimentação da desigualdade entre as pessoas.
Profundamente dissociada das ideias matrizes da Constituição de 1988, como a concepção de Estado Democrático de Direito, a principiologia humanística e social constitucional, o conceito constitucional de direitos fundamentais da pessoa humana no campo justrabalhista e da compreensão constitucional do Direito como instrumento de civilização, a Lei n. 13.467/2017 tenta instituir múltiplos mecanismos em direção gravemente contrária e regressiva (DELGADO, 2017, p. 39).
Em decorrência desse diapasão, o Procurador Geral da República propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade à Lei 13.467/2017 (ADI 5766). Essa ADI requer a declaração de inconstitucionalidade do art. 790-B, caput e §4º, e 791-A, §4º da CLT que responsabiliza a parte vencida pelo pagamento de honorários, ainda que beneficiário da justiça gratuita. Nesse sentido, a ADI 5766 declara:
Com propósito desregulamentar e declarado objetivo de reduzir o número de demandas perante a Justiça do Trabalho, a legislação avançou sobre garantias processuais e viola direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária, como pressuposto de acesso à jurisdição trabalhista. Assim o fez ao alterar os arts. 790-B, caput e §4º e 791-A §4º, da Consolidação, e autorizar o uso de créditos trabalhistas auferidos em qualquer processo, pelo demandante beneficiário da justiça gratuita, para pagar honorários periciais e advocatícios de sucumbência. (2017, p. 5-6).
A pessoa jurídica também possui direito aos benefícios da Justiça Gratuita, conforme entendimento da jurisprudência do TST, constatada na seguinte redação:
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. EMPREGADORA. PESSOA JURÍDICA. PROVA CABAL DE HIPOSSUFICIÊNCIA. Na linha dos precedentes desta Corte, a concessão da gratuidade de Justiça ao empregador depende de prova de dificuldades financeiras. No caso em exame, a reclamada não fez prova robusta de sua insuficiência econômica, de forma que não há como se conceder prerrogativa pleiteada, por ausência de prova contundente acerca da dificuldade financeira declarada. Com efeito, a reclamada, embora tenha declarado, nas razões do agravo de instrumento, sua incapacidade econômica, não fez prova cabal de sua insuficiência financeira. (TST. AIRR 0000723-77.2015.5.12.0052; 2ª Turma; rel. Min. José Roberto Freira Pimenta. DEJT 17.3.2017)
O nosso próximo tema são as custas processuais.
A base legal será:
Art. 789. Nos dissídios individuais e nos dissídios coletivos do trabalho, nas ações e procedimentos de competência da Justiça do Trabalho, bem como nas demandas propostas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição trabalhista, as custas relativas ao processo de conhecimento incidirão à base de 2% (dois por cento), observado o mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos) e o máximo de quatro vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, e serão calculadas:
De uma forma objetiva, ficou excelente para as empresas que detém de processos vultosos, tendo em vista que valores altos de condenação a empresa pagará de custas o limite de 4 vezes o teto da previdência. O que parece muito, mas dependendo da situação e do pedido pode ser pouco.
Será que esse dispositivo legal foi pensando no empregado?
Recordo- me da frase de Friedrich Nietzsche “As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras.”
Nessa linha de pensamento, o jurista e filósofo italiano Norberto Bobbio apresenta a questão de garantia dos direitos fundamentais ao enfatizar a necessidade constante de garantir direitos fundamentais que são constantemente atacados por Estados sob o argumento de inviabilidade de cumprimento:
Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados. (BOBBIO, 1992)
Com esse singelo trabalho, buscamos trazer uma nova visão acerca dos pontos acima descritos. Vale, meu caro leitor, não se satisfazer com aquilo que é imposto a nós sem que façamos uma reflexão de todas as consequências que podem surgir.
A parte sucumbente no objeto de perícia será responsável pelo pagamento dos honorários periciais:
“Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
1º Ao fixar o valor dos honorários periciais, o juízo deverá respeitar o limite máximo estabelecido pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho.
2º O juízo poderá deferir parcelamento dos honorários periciais.
3º O juízo não poderá exigir adiantamento de valores para realização de perícias.
4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no 39 caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.”(NR)
O texto súmula 236 do TST traz o seguinte verbete “A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão do objeto da perícia.” Inspirou o texto da Reforma Trabalhista.
Destaca-se que nos termos do artigo acima citado ainda que beneficiária da justiça gratuita, caso o beneficiário não tenha créditos para suportar a despesa, a União deverá assumir imediatamente. Caso tenha créditos, deverá ser retido do crédito que tenha direito judicialmente.
- Conclusão.
O presente artigo teve como objetivo elencar as mudanças ocorridas com a reforma trabalhista destacando o idealismo restritivo que motivou as alterações legislativas, com ênfase na precarização dos direitos já conquistados pelos trabalhadores.
A nova lei 13.467/2017 é um documento legislativo marcado pela ideologia neoliberalista transparecendo os interesses da classe dominante como um interesse coletivo, o que em verdade não se consubstancia a realidade do povo brasileiro que vive em um país de realidades distintas.
É certo que o excesso de direitos poderá gerar o desemprego comprometendo a saúde das empresas, privando o empregador de gerar novos postos de trabalho e aumentando o desequilíbrio econômico nacional, entretanto, encontrar o ponto de equilibro entre interesses distintos é a tarefa que o Estado deve se preocupar e esse desafio é enfrentado pelo direito do trabalho.
A presente reforma trabalhista sem sombra de dúvida é de cunho ideológico restritivo e acompanha as mudanças que vem ocorrendo no cenário mundial decorrente da globalização e, por conseguinte, as alterações normativas foram marcadas pela impossibilidade de debates qualificados com a sociedade e seus segmentos.
Notou-se que a ausência do diálogo social entre o parlamento e as entidades de classe, em um país continental, eram uma medida que se impõem como necessária, pois o Brasil é caracterizado por regiões completamente distintas em vários fatores econômicos e sociais, sendo temerário a legitimidade da referida norma legislativa laboral e em afronta as recomendações da Organização Internacional do Trabalho.
No atual momento que muito se discute o direito do trabalho e a crise que esse segmento do ordenamento jurídico vem atravessado frente a realidade econômica, a reforma legislativa representa insegurança jurídica.
Em relação ao cerne do problema apresentado, a reforma trabalhista representou a vitória dos interesses da classe dominante nutrida pelos anseios neoliberais de implantação de normas que visar precarizar as normas justrabalhista, ainda mais que o governo brasileiro não permitiu o debate democrático a respeito de cada dispositivo que se pretendeu modificar, desrespeitando as bases de sustentação do direito do trabalho, principalmente a dignidade humana do trabalhador que sendo a parte hipossuficiente e quem mais sofrerá com a mudança provocada na legislação laboral.
Em conclusão, não há dúvidas da importância de se discutir um tema tão sensível como os direitos sociais do trabalhador, ainda mais quando se percebe que esses direitos estão sendo violados, seja na perspectiva histórica de conquistas por melhores mecanismos de enfrentamento e resistência ao capitalismo, seja por zelar pela manutenção do que já foi conquistado.
Encerro, com a seguinte frase, escrita há 2400 anos, por uma pessoa especial- ARISTÓTELES- use ela apenas não para o direito, mas para sua vida: O ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete.
Prof. Me. Gleibe Pretti
Referências.
_______. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 219 do Tribunal Superior do Trabalho. Súmulas da Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do Trabalho. Coordenadoria de Jurisprudência. 2018. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/sumulas>. Acesso em: 05 out. 2018.
_______. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 329 do Tribunal Superior do Trabalho. Súmulas da Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do Trabalho. Coordenadoria de Jurisprudência. 2018. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/sumulas>. Acesso em: 05 out. 2018.
_______. Código de Processo Civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
_______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nos 1/1992 a 99/2017 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão nºs 1 a 6/1994. 40. ed. Com índice. Brasília: Centro de Documentação e Informação (CEDI). 2018. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/html>. Acesso em: 07 set. 2018.
_______. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Dispõe sobre a consolidação das leis do trabalho. Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
_______. Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970. Dispõe sobre normas de Direito Processual do Trabalho. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
ARENDT, Hannah; Condição Humana, A. tradução de Roberto Raposo. A condição humana, v. 10, 2007.
BALKIN, Jack M., "Deconstructive Practice and Legal Theory" (1987). Faculty Scholarship Series. Paper 291.
CAIRO Jr., José. Curso de Direito do Trabalho. 13 ed. Salvador. Editora JusPodivm, 2017.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, DL 2003, 2003.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2015.
LEWIS, Clive Staples. As crônicas de Nárnia. WWF Martins Fontes, 2015.
MAIOR, Jorge Luiz Souto. A “CLT de Temer” & Cia. Ltda, 2017. Disponível em:< https://www.anamatra.org.br/artigos/25548-a-clt-de-temer-cia-ltda/>. Acesso em: 04 de set. 2017.
SANTOS, Boaventura Sousa. Boaventura defende o Estado forte. In: Correio do Povo. Secção Geral. Porto Alegre, 6 de abril de 1998
SCHIAVI, Mauro. Reforma Trabalhista e o Processo do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2017.
VIANA, Marcio Tulio. Livre-nos da livre negociação: aspectos subjetivos da reforma trabalhista. Disponível em:< https://www.anamatra.org.br/artigos/ artigos/25658-livre-nos-da-livre-negociacao-aspectos-subjetivos-da-reforma-trabalhista />. Acesso em: 04 de set. 2017.
KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 5ª ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1998.