Cinco impactos do Coronavirus no Direito de Família que necessitam de soluções urgentes

15/04/2020 às 13:35
Leia nesta página:

Problemas que o Coronavírus tem causado às ações judiciais no Direito de Família, e a necessidade de que se tomem medidas para minimizá-los.

O Coronavírus surgiu do nada e, como um raio, alterou as vidas das pessoas de uma maneira inimaginável. Como advogado de família, tento abordar nesse artigo as consequências que o COVID-19 tem acarretado nos processos judiciais, antecipando problemas nefastos que, ao meu ver, necessitam de atenção imediata do Conselho Nacional de Justiça.

1) Os Tribunais continuam em atividade e liminares para casos urgentes ainda podem ser obtidas. Contudo, as audiências foram canceladas e os prazos suspensos, o que certamente significará um maior atraso na resolução dos processos judiciais, com acumulação de serviço que aumentará muito a morosidade das já sobrecarregadas Varas da Família. Haverá um gargalo inevitável em processos de divórcio, pensão alimentícia e guarda. Quais as providências que estão sendo tomadas para minimizar esses efeitos?

2) É óbvio que a maior parte das famílias já está sentindo o terrível impacto financeiro da crise. As pensões alimentícias não serão pagas, e o resultado será o aumento exponencial de pedidos judiciais de cobrança e prisão por débito alimentar. Por outro lado, é certo que, em face do Coronavírus, os devedores de alimentos estão momentaneamente protegidos por determinação que proibe seu recolhimento ao sistema prisional. Isso esvazia o poder da cobrança e terá reflexos imensos nos processos de pensão alimentícia. Serão criados mecanismos para contrabalançar o prejuízo que isso causará à sobrevivência de crianças e adolescentes?

3) Os casos de pensão, guarda e visita foram atingidos em cheio, já que, além da diminuição de renda, a determinação de isolamento levantou obstáculos ao contato social, inclusive em relação a membros da própria família – e isto inclui papais e mamães que exercem direitos de visitas. Haverá acusações de lado a lado que darão muito pano para a manga em processos judiciais e poderão atrasar sua conclusão. Estamos preparados para enfrentar esse volume de processos? Investir em mediadores seria uma boa alternativa?

4) Apesar dos Tribunais estarem funcionando, a Defensoria Pública e a OAB não estão realizando atendimentos normais, o que significa que o acesso à justiça para a população de baixa renda está muito comprometido. Na prática, o efeito causado momentaneamente equivale à negativa de acesso à Justiça. Isso gerará um acúmulo monstruoso de demandas que afetará a todos os que dependem desse serviço. Há alguma política definida para atendimento dessa população quando a quarentena acabar?

5) A população mais carente terá prejuízo manifesto em relação à solicitação de ordens de restrição pela Lei Maria da Penha, pois dependem também da Defensoria Pública. Ao mesmo tempo, a convivência forçada da quarentena potencializou os conflitos familiares, com significativo aumento da violência doméstica. Some-se a isso o problema das Delegacias, que operam de forma mínima em sistema de emergência (já não o faziam antes?) e até mesmo deixaram de atender determinado tipos de casos. Tudo isso será um gargalo que irá, igualmente, impedir a proteção e o acesso à justiça a uma parcela muito significativa da sociedade. Vidas estão em risco. Qual é a política para enfrentamento imediato desses casos de violência doméstica?

Os impactos do Covid-19 no Direito de Família serão sentidos por muito tempo, e em meu entender os segmento social mais atingido será o das mulheres com menor poder aquisitivo. São elas que estão mais sujeitas à violência doméstica, que dependem mais do serviço da Defensoria Pública em casos de família e que têm na pensão alimentícia um apoio indispensável para sobrevivência dos filhos.

Mas as mulheres carentes não serão as únicas a sofrerem com isso. É necessário que desde já pensemos em soluções e políticas para minimizar os efeitos negativos que as medidas de combate ao Coronavírus causarão à Justiça e à população mais vulnerável. 

Sobre o autor
Mario Solimene Filho

Advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP - Largo de São Francisco), turma de 1994, com especialização em Direito Privado e Processo Civil. Inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, São Paulo, sob o número 136.987. Pós graduado (Pg.Dip.) e Mestre (MMus) pela University of Manchester e Royal Northern College of Music, Reino Unido (2003-2006). Curso de Extensão em Direitos Humanos Internacionais sob supervisão de Laurence Helfer, J.D, Coursera, School of Law, Duke University, EUA (2015). Inscrito como colaborador da entidade Lawyers Without Borders (Advogados Sem Fronteiras) e membro da International Society of Family Law (Sociedade Internacional de Direito de Família). Tomou parte em projetos internacionais pela defesa da cidadania e Direitos Humanos na Inglaterra, Alemanha, Israel e Territórios da Palestina. Fluente em Inglês, Espanhol, Italiano e Alemão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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