Efeitos das nulidades da fase de investigação preliminar sobre a ação penal

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O artigo trata dos efeitos das nulidades da fase de investigação preliminar sobre a ação penal.

Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça as nulidades surgidas no curso da investigação preliminar não atingem a ação penal dela decorrente. - Jurisprudência em teses edição nº 69

Essa orientação foi adotada no seguinte julgado:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. COMUNICAÇÃO FALSA DE CRIME. CONDENAÇÃO RATIFICADA EM SEDE DE APELAÇÃO. TRANSCRIÇÃO PARCIAL DA SENTENÇA. POSSIBILIDADE. SUPOSTOS VÍCIOS NA FASE INQUISITORIAL NÃO MACULAM A AÇÃO PENAL. PRECEDENTES. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO.

1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício.

2. Não padece de nulidade, necessariamente, o acórdão que contém transcrições de alguns termos da sentença penal, a fim de reforçar a fundamentação utilizada para manter a condenação do paciente, com é o caso em apreço.

3. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é uníssona no sentido de que eventuais nulidades referentes à fase pré-processual (investigativa) não contaminam a ação penal, sobretudo quando a condenação tem lastro em provas examinadas na fase judicial, como é o caso dos autos. Precedentes.

4. A possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo ao paciente não foi alvo de deliberação pela Corte Estadual, o que impede a sua análise diretamente por este Sodalício, sob pena de se configurar a prestação jurisdicional em indevida supressão de instância. Precedentes (HC 357.885/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 23/8/2016, DJe de 31/8/2016).

5. Habeas corpus não conhecido.

(HC 506.059/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 06/02/2020, DJe 14/02/2020)

Nulidade é uma sanção[1] aplicada aos casos de descumprimento da tipicidade processual penal, que impede a produção de efeitos de atos praticados sem atenção aos limites normativos.[2]

Limites para a arguição e reconhecimento das nulidades

As nulidades só podem ser alegadas pela parte que possa ter interesse no seu reconhecimento. Assim, a parte não poderá pretender o reconhecimento de nulidade pelo descumprimento de uma formalidade que só interessaria à parte contrária.[3]

Também não se admite que a parte pretenda o reconhecimento da nulidade de um ato praticado por ela mesma, ou seja a parte não pode arguir uma nulidade causada por ela própria.[4]

Ainda é relevante destacar que, conforme indicado no art. 566 do Código de Processo Penal, não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa[5]. Essa disposição segue a orientação de que só será possível reconhecer a nulidade que causar prejuízos.

Momento para arguição das nulidades relativas

As nulidades relativas da primeira fase instrutória do procedimento de competência do tribunal do júri, ocorridas após a apresentação da resposta à acusação, sob pena de preclusão temporal, devem ser arguidas nas alegações finais orais.

As nulidades relativas da instrução dos procedimentos de competência do juiz singular, ocorridas entre o oferecimento da denúncia e a citação do acusado, sob pena de preclusão, devem alegadas por ocasião do oferecimento da resposta à acusação. Já as nulidades relativas que ocorrerem após a apresentação da resposta à acusação devem ser arguidas nas alegações finais, orais ou por memoriais, sob pena de preclusão.

As nulidades relativas da decisão de pronúncia devem ser alegadas no recurso em sentido estrito.

Nos procedimentos de competência do tribunal do júri, as nulidades relativas ocorridas após a preparação do processo para julgamento em plenário deverão ser arguidas logo após o anúncio do julgamento em plenário do júri.

As nulidades relativas ocorridas durante a instrução dos processos de competência originária dos tribunais devem ser arguidas nas alegações escritas, conforme previsto no art. 11 da lei nº 8038/90, ou na sustentação oral, de acordo com o art. 12, inciso I, da lei nº 8038/90.

As nulidades relativas na sentença de primeiro grau, ou em momento posterior, deverão ser alegadas nas razões de recurso ou logo depois de anunciado o julgamento do recurso.

Por fim, as nulidades relativas praticadas durante o julgamento em plenário do júri, em audiência ou em sessão de julgamento, devem ser arguidas imediatamente depois de sua ocorrência, sob pena de preclusão.

Referências

ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Processo Penal parte especial, 7ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Boletim do IBCCrim n. 223, São Paulo, jun. de 2011.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Glosas ao “Verdade, Dúvida e Certeza”, de Francesco Carnelutti. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Mentalidade Inquisitória e Processo Penal no Brasil. Vol. 3. Florianópolis: Empório do Direito, 2017.

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria da garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

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KHALED JUNIOR, Salah H. A busca da verdade no processo penal: para além da ambição inquisitorial. São Paulo: Atlas, 2013.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único I, 5ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017.

LOPES JUNIOR, Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

LOPES JUNIOR, Aury. Prisões Cautelares. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

PACELLI, Eugenio. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência, 9ª ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017. PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal, 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2017.

TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal, 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017.

VERRI, Pietro. Observações sobre a tortura. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

 

 


[1] “Nulidade é a sanção aplicada pelo juiz em razão da verificação de um ato processual defeituoso. A sua imposição terá lugar toda vez que o desatendimento de norma processual penal cause prejuízo a direito das partes ou quando haja presunção legal de tal prejuízo por se cuidar de formalidade essencial.” TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal, 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 1492.

[2] “Em face desse conceito, percebe-se que a nulidade é matéria privativa de ato processual, não incidindo, portanto, em atos pra· ticados ao longo do inquérito policial, que é mero procedimento administrativo voltado para caracterização da justa causa da ação penal. Se alguma prova produzida no inquérito desatende algum requisito exigido por lei essa prova em específico não terá efeito, será desconsiderada, devendo ser necessariamente repetida em juízo, não contaminando, porém, a futura ação penal a ser oferecida.” ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Processo Penal parte especial, 7ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 325.

[3] “[...] por ocasião do estudo da teoria das nulidades, o que deve ser evitado é o excessivo formalismo, exigindo-se dos sujeitos do processo a observância de formas inúteis que nada contribuem para a solução da demanda, nem tampouco para a existência de um processo penal justo, sob pena de desvirtuamento da própria finalidade do processo, que é a de servir como instrumento para a aplicação do direito penal objetivo.” LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único I, 5ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 1583.

[4] “Interesse para o reconhecimento da nulidade: do mesmo modo que é exigido interesse para a prática de vários atos processuais, inclusive para o início da ação penal, exige-se tenha a parte prejudicada pela nulidade interesse no seu reconhecimento. Logo, não pode ser ela a geradora do defeito, plantado unicamente para servir a objetivos escusos. Por outro lado, ainda que não seja a causadora do vício processual, não cabe a uma parte invocar nulidade que somente beneficiaria a outra, mormente quando esta não se interessa em sua decretação.”NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 888.

[5] “[...] a nulidade é matéria privativa de ato processual, não incidindo, portanto, em atos praticados ao longo do inquérito policial, que é mero procedimento administrativo voltado para caracterização da justa causa da ação penal. Se alguma prova produzida no inquérito desatende algum requisito exigido por lei essa prova em específico não terá efeito, será desconsiderada, devendo ser necessariamente repetida em juízo, não contaminando, porém, a futura ação penal a ser oferecida.” ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Processo Penal parte especial, 7ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 325.

 

Sobre os autores
Antonio Evangelista de Souza Netto

Juiz de Direito de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Pós-doutor em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutor em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2014). Mestre em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2008). Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP. Professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Professor da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo - EMES. Professor da Escola da Magistratura do TJ/PR - EMAP.

Jeffrey Chiquini

Coautor: Jeffrey Chiquini. Advogado criminalista. Especialista em direito penal e processual penal. Professor de processo penal da Escola da Magistratura Federal do Paraná.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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