Ação de exibição de documentos e a inaplicabilidade da tutela de urgência

23/04/2020 às 22:33
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A finalidade do artigo, é esclarecer acerca da inaplicabilidade da tutela de urgência, na ação de exibição de conhecimento, pelo procedimento comum.

1. Introdução

O Código de Processo Civil de 1973 previu dois tipos de exibição de coisa ou documentos, sendo um deles, no procedimento cautelar (art. 844, CPC/73), e outro no procedimento comum, de forma incidental (art. 355 e ss., CPC/73).

Sabe-se que o Código de Processo Civil de 2015, não replicou o procedimento cautelar. O que ele fez, foi enquadrar algumas hipóteses de cautelar autônoma do artigo 800 e seguintes do CPC/73, como sendo uma das espécies da tutela de urgência. Desse modo, no que se referente à exibição de documento ou coisa, ao ser editado, o Código de Processo Civil apenas replicou o procedimento incidental (aquele que era tratado nos artigos 355 e ss, do CPC/73).

2. A “ação de exibição” e a tutela de urgência

Conforme mencionado anteriormente, o Código de Processo Civil de 2015 aboliu as cautelares autônomas, deixando de replicar o procedimento do artigo 800 e seguintes, do Código de Processo Civil de 1973, substituindo, pela tutela de urgência antecipada ou cautelar.

Por outro lado, o caderno processual de 2015, fez menção à exibição de documento, em seu artigo 396, o qual preceitua que, “o juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder”.

É evidente que o requerimento para exibição de documento, na forma do artigo 396, deve ser utilizado quando da especificação de provas, na fase instrutória, ou até mesmo na fase postulatória (na petição inicial ou contestação), isso porque o artigo 396 está classificado como sendo uma das espécies de provas, contidas no capítulo XII, do Código de Processo Civil.

Costumeiramente vemos no Judiciário, a famosa “ação de exibição de documento ou coisa”, com a adoção do procedimento comum, e até mesmo com pedido de tutela de urgência antecipada.

Destaca-se que o artigo 301 do Código de Processo Civil, não prevê como sendo objeto de tutela de urgência cautelar, a exibição de documentos, daí, portanto, entendo não ser possível a adoção de tutela de urgência cautelar para se obter, unicamente, a exibição de documento ou coisa.

Ademais, entendo ainda, que a adoção da tutela de urgência de natureza antecipada (art. 300, CPC), também se revela inadequada para o pedido exclusivo de exibição de documento, haja vista que, para obtenção da tutela de urgência, deve a parte comprovar os elementos que evidenciem a probabilidade do direito, o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, e ainda, a reversibilidade dos efeitos da decisão, nos termos do §3º do artigo 300, do diploma processual.

Ora, a “ação de exibição”, possui como pedido principal, a apresentação do documento ou da coisa, e neste sentido, a parte autora não se pode valer da tutela de urgência antecipada, pois, após a apresentação do documento/coisa, a irreversibilidade da tutela é inevitável.

Tribunais têm decidido pela concessão da tutela de urgência, em ação de exibição, pelo procedimento comum, o que acaba por viciar gerar um vício no procedimento.

A 20ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de São Paulo, por exemplo, julgou em 05/06/2017, o Agravo de Instrumento 2017982-03.2017.8.26.0000, o qual foi interposto “contra a r. decisão, cuja cópia se encontra a fls. 29, que deferiu o pedido de liminar para que o agravante exiba “os documentos solicitados na inicial, em cinco dias, sem prejuízo da discussão da ação que vier a ser ajuizada no futuro”. O relator concedeu efeito suspensivo no Agravo de Instrumento, para suspender o cumprimento da liminar deferida pelo juízo “a quo”, e ao final, o recurso foi provido em parte, apenas para afastar a exibição de determinados documentos objetos da lide.

O julgador, ao conceder tutela de urgência para determinar ao réu a apresentação do documento ou coisa, viola o artigo 7º do Código de Processo Civil, esgotando-se integralmente a prestação jurisdicional, atingindo o pedido principal da ação (que é a de exibir o documento ou coisa), sem sequer conferir à parte adversa, a oportunidade do exercício de seu direito ao contraditório, à ampla defesa, e ao devido processo legal, os quais são garantidos pela própria Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LV.

Diferente seria, por exemplo, o pedido incidental de exibição de um contrato de financiamento, cumulado ao pedido de revisão de cláusulas contratuais, para a parte ré, nos termos do artigo 398 do Código de Processo Civil, apresentar o documento no prazo de cinco dias, isso porque, a revisão (pedido principal da ação), está condicionada à análise do contrato (elemento de prova do processo).

Daí, portanto, entendo não ser cabível a aplicação dos artigos 300 e 301, do Código de Processo Civil, na “ação de exibição de documento”, pelo procedimento comum, a fim de evitar um comportamento evidentemente inquisitório, o que não é admitido no direito processual brasileiro.

3. Considerações finais

Embora possa o pedido de exibição de documento, ser tratado na ação de produção antecipada de provas, nada impede o ajuizamento da “ação de exibição”, pelo procedimento comum, o qual possui uma série de atos próprios, onde após o ajuizamento da ação, o juiz designará ou não a audiência de conciliação ou mediação, mandando, em seguida, citar o réu para comparecer ao ato, e apresentar contestação no prazo legal, para, após a apresentação da defesa, passar à fase instrutória, onde as partes elencarão as provas que pretendem produzir nos autos.

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Em se tratando de “ação de exibição” pelo procedimento comum, não pode o julgador conceder a tutela de urgência para determinar ao réu a apresentação do documento ou da coisa, sob pena de infringir os princípios básicos do contraditório, ampla defesa e devido processo legal, transformando o procedimento comum, em um verdadeiro procedimento inquisitório, de modo a entregar ao autor, o pedido principal formulado na ação.

Sobre o autor
Gabriel Pires de Sene Caetano

Formado em Direito, pela Universidade do Estado de Minas Gerais. Pós graduando em Advocacia Empresarial, pela PUC/MG. LinkedIn: https://br.linkedin.com/in/gabriel-pires-de-sene-007800140 Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5738207084168072 Contato: [email protected]

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