BRASIL E CHILE: embasamento legal dos programas governamentais do pré-natal do homem nos sistemas de saúde
Autores:
Evelyn Priscila Santinon Sola, Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva, Maryam Michelle Jarrouge Trintinália, Alejandra T. Matamoros, Ludmila S. Rodrigues, Thayla Victória F. Luciano, Gustavo Henrique Morais, Renan Silva Martins.
RESUMO: A participação ativa do pai/parceiro durante o controle de pré-natal é um movimento crescente no Brasil, Chile e em outros países do mundo. Busca possibilitar o envolvimento integral dos pais/parceiros no processo gestacional de seus filhos, incluindo-os no planejamento de saúde reprodutiva, familiar e coletiva. Tem a garantia legal dos programas governamentais, por vezes desconhecidos da população. O Brasil e o Chile, ambos localizados na América Latina, garantem a realização do pré-natal do homem sob o amparo de diferentes programas governamentais. Objetivo: Conhecer os embasamentos legais dos programas governamentais que regimentam o pré-natal do homem no Brasil e no Chile. Método: Levantamento bibliográfico sobre a temática proposta, por meio de pesquisas; artigos; livros; guias que discutam sobre a pauta. Considerações finais: A prática estimulada do pré-natal do parceiro se mostrou significativamente equiparada entre o Brasil e o Chile, apesar do Brasil contar com garantias legais que abarcam a participação efetiva do homem no contexto da paternidade, bem como programas criados especificamente que estimulam a melhoria da qualidade da saúde gestacional e do recém-nascido. O Chile conta com um dos melhores modelos mundiais de assistência à gestante “Chile crece contigo”, apesar de não ter em sua legislação a garantia legal da inclusão do pai/companheiro no processo gestacional.
Palavras-chave: Programas Governamentais; Pré-natal; Legislação como assunto; Saúde do Homem; Direitos Civis.
INTRODUÇÃO
Atualmente tem sido discutido o envolvimento consciente e ativo do pai/parceiro no período pré-natal, que além do apoio emocional à gestante, favorece a criação de vínculo afetivo com o bebê. Historicamente, tanto o planejamento reprodutivo quanto às ações em saúde voltadas ao momento da gestação, parto e puerpério foram pensadas e direcionadas às mulheres e às gestantes, enfocando o binômio mãe-filho. Todavia, os homens efetivamente participam desse processo, ou assim desejam fazer, acompanhando todas as fases de uma gravidez, incluindo a decisão compartilhada de ter um filho e de participar do período gestacional e de desenvolvimento da criança, apoiado no artigo 18 da Convenção sobre os Direitos da Criança, que estabelece que “…ambos os pais têm obrigações comuns em relação à educação e desenvolvimento da criança” (UNICEF, 1990)
A implementação do pré-natal masculino faz parte de um movimento crescente no Brasil e no mundo que defende o envolvimento integral dos homens na gestação, no parto, no cuidado e na educação dos filhos. O pré-natal masculino foi criado com a intenção de promover a adesão dos usuários do sexo masculino nas unidades de saúde, utilizando estratégias educativas voltadas à participação paterna na gestação, parto e nascimento, e ao mesmo tempo, auxiliar na melhoria do acesso e acolhimento desta população.
No pré-natal, as informações disponibilizadas nas consultas proporcionam condições ao parceiro de entender as mudanças que ocorrem com a mulher nesse período e também orientá-los sobre o direito de acompanhar a gestante nas consultas pré-natais e no parto, um direito assegurado no Brasil pela Lei nº 11.108/2005, que propicia o momento oportuno para o cuidado à sua saúde, mediante fornecimento de orientações e realização de teste e exames, servindo também como uma estratégia para aproximar os homens da medicina preventiva (Brasil, 2005).
Quando pensado em outros países da América Latina, o Chile é um dos principais destaques em relação à essa temática.
No Chile a Lei 20.379/2009 cria o sistema intersetorial de proteção social e institucionaliza o subsistema de proteção integral para crianças "Chile crece contigo", implementado em 2009 durante o primeiro governo de Michelle Bachelet, que articula várias iniciativas intersetoriais, contando com a participação de diversas instituições, benefícios e programas voltados para crianças, com o objetivo de gerar uma rede de apoio ao desenvolvimento adequado de meninas e meninos desde o pré-natal até os 9 anos (Chile, 2009a; Chile 2009b).
Apesar do modelo chileno ser reconhecido mundialmente, não estabelece um programa de controle pré-natal exclusivamente para o pai, sendo este mediado pelo relacionamento deste com a mãe a partir do compartilhamento com a mulher em todas as fases relacionadas à gravidez, parto e pós-parto.
Frente às diferenças legais preconizadas como direito do pré-natal do homem entre o Brasil e Chile, surge o objetivo desta pesquisa, que certamente agregará a compreensão e reflexão sobre os direitos à saúde do homem e da família abordados nestes dois países.
OBJETIVO
Conhecer os embasamentos legais dos programas governamentais que regimentam o pré-natal do homem no Brasil e no Chile.
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E VIGOR: O PRÉ-NATAL DO ACOMPANHENTE
Nos últimos anos, debates e ações sobre a importância do envolvimento e participação ativa do pai/parceiro(a) durante o pré-natal. Esse período de gestação é de grande importância para todas as pessoas envolvidas a fim de que essas mudanças e alterações no estilo de vida de todos transcorra de forma tranquila mesmo com todos os impactos promovidos por este novo ser que se aguarda.
Tradicionalmente, as consultas de pré-natal propõem cuidados voltados e centralizados ao binômio mãe-bebê; porém, diversos estudos comprovam a importância da participação e engajamento ativo do parceiro(a) em todo esse processo.
A Lei n° 10.241, promulgada pelo governo do Estado de São Paulo, em seu Artigo 2°, item XVI, de 17 de março de 1999, foi uma das primeiras voltadas para a humanização da assistência ao parto, abarcando a presença do pai, nos exames pré-natais e no momento do parto como um direito dos usuários dos serviços de saúde. (São Paulo, 2009; Silva et al, 2011)
Para solucionar tal problemática, a partir da Portaria GM/MS no 1.944, de 27 de agosto de 2009, consolidada pela Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), que tem como diretriz a promoção de ações de saúde que contribuam significativamente para a compreensão da realidade singular masculina nos seus diversos contextos socioculturais e político-econômicos, respeitando os diferentes níveis de desenvolvimento e organização dos sistemas locais de saúde e tipos de gestão de Estados e Municípios, as consultas de pré-natal passaram a abranger o pré-natal do parceiro, inserção estimulada pelo Sistema Único de Saúde, que representa uma inclusão e grande avanço na implementação da estratégia Pré-Natal do Parceiro (Brasil, 2009).
Essa Portaria incluiu o tema paternidade e cuidado, promovendo ações direcionadas ao planejamento reprodutivo como uma ferramenta para qualificar a atenção a gestação, ao parto e ao nascimento, favorecendo os vinculos afetivos, entre a gestante e o companheiro bem como entre o homem e o filho (BRASIL, 2009).
Nesse mesmo sentido, a Lei Federal nº 11.108/2005 garante às parturientes o direito a acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, no parto e no pós-parto imediato no Sistema Único de Saúde (SUS), sendo este acompanhante aquele de escolha da gestante, seja homem ou mulher (Brasil, 2005).
Anos após o sancionamento da referida Lei, entra em vigor a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n° 36/2008, que coloca que os serviços de saúde públicos, privados, civis e militares passam a ser obrigados a permitir a presença de um acompanhante que a mulher deseje no trabalho de parto, parto e pós-parto, além de possuir uma cadeira específica para esse acompanhante (Brasil, 2008).
Apesar das leis acima citadas, percebe-se que seu direcionamento é voltado para a presença acompanhante no momento do parto, seja este o companheiro ou não, já que a escolha depende da mulher, tendo a atenção pré-natal sido foco exclusivamente da Lei 10.241/99, que valoriza a presença do pai nas consultas e no parto.
Assim, é perceptível a desvalorização da participação do homem no processo gestacional de seu filho(a), mesmo no papel de progenitor.
Nesse sentido, o Ministério da Saúde do Brasil normatizou em 2012 o programa de pré-natal do homem que favorece a detecção precoce de doenças, sua prevenção e estímulo à a paternidade ativa e cuidadora, do momento da concepção ao pós-parto e futuro sequente (Brasil, 2012).
Nesse contexto, o Pré-Natal do Parceiro se propôs a ser uma das principais ‘portas de entrada’ dos serviços ofertados pela Atenção Básica em saúde para esta população, enfatizando ações relacionadas à prevenção, promoção, autocuidado além da promoção de estilos de vida mais saudáveis.
Nesse contexto, tanto a Rede Cegonha quanto a Lei do Acompanhante (Lei n. 11 contribuem positivamente para a inserção dos homens nas consultas de pré-natal, consolidando a mudança crucial do paradigma do binômio mãe-criança para o trinômio pai-mãe-criança. Para isso, as equipes de saúde devem incentivar o envolvimento do pai/parceiro e sua participação desde o teste de gravidez, passando pelo puerpério até o acompanhamento do desenvolvimento integral do filho/a (Brasil, 2005; Brasil, 2011).
A Portaria 1474/2017 inclui e altera procedimentos na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses/Próteses e Materiais do Sistema Único de Saúde (SUS), frente a necessidade de incorporar o pré-natal do companheiro, possibilitando que seja quantificado o número de homens que realizam o procedimento e, por conseguinte, a efetividade da estratégia. Foram, portanto, incluídos código e procedimentos para inserir dados avaliativos sobre a saúde dos parceiros, onde é preconizado a solicitação de exames preventivos e de rotina, testes rápidos, atualização de vacinas, orientação sobre gravidez parto pós-parto, amamentação e direito do(a) parceiro(a) (BRASIL, 2017).
Também devem ser privilegiados com o cumprimento dessa legislação os parceiros homoafetivos, que devem ser incluídos no pré-natal, sob a mesma proposta de estreitar laços afetivos entre o casal e o filho, bem como ter uma aproximação com os profissionais de saúde.
Em paralelo a essas implementações, há construções sociais de gênero voltadas às masculinidades que promovem o não envolvimento efetivo dos homens devido aos papéis estereotipados sobre a masculinidade que afastam os homens dos cuidados com a saúde e a não construção necessária de relações humanizadas com suas parceiras durante o cuidado em saúde destas. O que prejudica o vínculo masculino e envolvimento efetivo do trinômio se torna inalcançável.
No Brasil para que haja o fortalecimento da presença do parceiro, segundo o Ministério da Saúde, é necessário que as unidades de saúde estejam preparadas para o acolhimento desse pai/parceiro desde o momento de chegada da mulher com suspeita de gravidez, incluindo o preparo da equipe de saúde e a inclusão dos pais/parceiros nas rotinas e atividades vinculadas à gestação e garantindo sua participação efetiva em todas as fases do período gestacional.
É garantido pelo Ministério da Saúde o direito à exames e procedimentos a serem realizados pelos pais/parceiros no momento da gestação de suas companheiras e, caso sejam detectadas alterações em algum desses exames, o pai/parceiro deve ser referenciado para o tratamento dentro da rede SUS. O mesmo procedimento deve ser adotado caso o profissional verifique a necessidade de outros exames.
Também como garantia do direito à saúde, o Brasil foi um dos primeiros países a oferecer a licença-paternidade no mundo em 1943, segundo a Organização Internacional do Trabalho – OIT (Brasil, 1943). A partir de 1988, essa licença é de cinco dias remunerados (Brasil, 1988). A licença-paternidade promove um maior envolvimento dos pais em relação aos cuidados dos filhos, o qual se estende para além do período de licença e reproduz reflexos importantes na vida das crianças. Há evidências que referem que o aumento da licença-paternidade também ajudaria a mudar o comportamento das famílias quanto à divisão de tarefas domésticas e a diminuir a diferença entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
MODELO CHILENO DE ASSISTÊNCIA OBSTÉTRICA: "CHILE CRECE CONTIGO"
A Lei chilena n. 20.379/2009 de proteção social "Chile crece contigo", tem como missão acompanhar, proteger e apoiar integralmente as crianças, do momento de sua gestação até 9 anos de idade (Chile, 2009a; Chile, 2009b).
Esse programa procura garantir a participação do pai em todas as etapas da parentalidade, apoiado na crença que o vínculo entre pai e filhos(as) existe mesmo antes do nascimento e que a participação do companheiro no controle da gravidez, consultas e grupo do pré-natal, bem como sua presença no momento do parto facilitam esse processo, promovendo assim a ocupação de um papel primordial na construção da família, incentivando a participação do homem na corresponsabilidade do planejamento familiar, nascimento, cuidado e parentalidade dos filhos.
No entanto, no Chile não existe uma iniciativa para estabelecer um programa de controle pré-natal exclusivamente para o pai, apesar da promoção de sua participação na gravidez, onde o relacionamento entre pai e filho é mediado pelo relacionamento deste com a mãe a partir da expressa disposição e compartilhamento com a mulher de todas as instâncias relacionadas à gravidez, seja nos cuidados de saúde, no acompanhamento de ultrassonografias, consultas de pré-natal, preparação para o parto e até mesmo na organização do lar para recepção do bebê.
O Chile promove a realização gratuita da primeira ultrassonografia para confirmação da gravidez, após o início do controle pré-natal, definido antes das 14 semanas de gestação. Essa consulta é realizada no tempo de uma hora com a mulher, onde é entregue a Agenda de Saúde da Mulher, que será essencial no desenvolvimento da gravidez, o material "Comenzando a crecer" e o "Guia de Paternidad Activa" para o pai, se a gestante estiver acompanhada de seu parceiro(a).
A realização de exames é estipulada apenas caso o seu Exame de Medicina Preventiva (EMPA) não esteja atualizado. Este exame inclui uma avaliação periódica da saúde, voluntária e gratuita, que faz parte dos benefícios do AUGE-GES (O Plano de Acesso Universal a Garantias Explícitas do Chile) que, consiste, conforme estabelecido pela Lei nº 19.966/2004, um regulamento que refere que a cada 3 anos novas patologias são adicionadas ao sistema de saúde, o que garante acesso às ações de promoção, proteção e recuperação da saúde para os beneficiários do Fundo Nacional de Saúde (FONASA) e das Instituições de Saúde Previdenciária (ISAPRES), correspondente ao sistema de saúde privado chileno (Chile, 2004).
Este teste permite a detecção oportuna de doenças de alta ocorrência no país, com a finalidade de atuar imediatamente através de seu controle e tratamento. Fazem parte das patologias pesquisadas nesse contexto o alcoolismo, tabagismo, obesidade, hipertensão arterial, diabetes e sífilis. Lembrando que ao atualizar o EMPA, o homem fará a Classificação do Grupo ABO - Rh se a mulher for RH (-).
Por outro lado, dentro da legislação chilena, estipula-se na lei de proteção à maternidade, que os seguintes direitos são contemplados ao pai:
1. Licença remunerada de cinco dias no caso do nascimento de um filho, que pode ser utilizado no momento do parto, em dias corridos, exceto finais de semana ou feriados, ou esses 5 dias podem ser distribuídos dentro do primeiro mês a partir da data de nascimento. Neste último caso, ele pode distribuir os cinco dias remunerados nas oportunidades que o trabalhador considerar adequadas, de forma contínua ou parcelada.
Essa solicitação deve ser feita pelo pai, por escrito ao empregador, que não pode negá-la, mas pode exigir que o fato que o motiva seja credenciado, o que pode ser efetivado com a certidão de nascimento do menino ou menina concedida pelo Serviço de Registro Civil e Identificação. Se a licença for exercida no dia da entrega, o credenciamento será feito posteriormente
2. Licença remunerada de cinco dias em casos de adoção de uma criança, contada a partir da sentença final que concedeu o direito.
3. Licença pós-natal. Trata-se de um direito que consiste no pagamento de um benefício, que permite ao trabalhador continuar recebendo sua renda durante o período em que faz uso da licença de maternidade. Equivale à remuneração total e subsídios que o trabalhador recebe, dos quais deduções serão deduzidas. O valor máximo é de 66 UF.
Têm direito ao subsídio:
- Os trabalhadores dependentes que se encontram:
- Com 6 meses de afiliação à seguridade social;
- Que tenham pago 3 mensalidades nos 6 meses anteriores à licença.
Os trabalhadores independentes que se encontram:
- Com 12 meses de afiliação à seguridade social;
- Tenham pago 6 cotas nos 12 meses, contínuas ou não, antes do início da licença;
- Tenham pago a contribuição relativa ao mês anterior à licença.
4. No caso da morte da mãe durante o parto ou no período após o nascimento, caberá ao pai cumprir a licença pós-natal ou o restante dela para os cuidados da criança e o subsídio correspondente
5. Direito à creche mantida ou financiada pela empresa de vínculo empregatício (pai ou mãe), seja por executória do empregador (quando com 20 ou mais trabalhadores na empresa) ou por decisão judicial, quando confiado cuidados de uma criança com menos de dois anos de idade.
Frente aos dados relatados do programa chileno de atenção à saúde da gestante “Chile crece contigo”, estudos mostram que a presença do pai/companheiro vem gradualmente aumentando no cuidado pré-natal, tendo em 2008 sido atendidas 226.893 controles pré-natais com a presença do pai/companheiro, enquanto em 2009 aumentou para 277.914 esse número.
BRASIL/CHILE: DIFERENTES PROGRAMAS E O MESMO OBJETIVO
Apesar da divergência de legislação entre Brasil e Chile, salienta-se que os dois países tem buscado atender essa lacuna da participação efetiva do pai/parceiro no processo gestacional, incluindo nesse contexto o nascimento e pós-parto.
Programas brasileiros foram desenvolvidos com o passar dos anos, tendo seu início mais efetivo a partir de 2005, mas continuamente buscando essa melhoria da assistência obstétrica, com inclusão da saúde do homem como uma diretriz (Brasil, 2005).
O Chile deu continuidade ao seu programa criado em 2009 , “Chile crece contigo”, fortalecendo suas diretrizes e mantendo excelência no cuidado à saúde materna, porém ainda com uma lacuna em relação a participação do pai/parceiro na assistência obstétrica, já que não há garantia legal de sua inclusão nesse processo, apesar de todo o incentivo existente no programa em questão (Chile, 2009a; Chile, 2009b).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Frente a importância do envolvimento consciente e ativo dos pais/parceiros(as) em todas as ações voltadas ao planejamento reprodutivo e sua ocorrência comparativa à participação masculina nos controles de pré-natal chileno, fica evidente a equiparada situação vivenciada durante essa fase reprodutiva imensuravelmente significante entre o Brasil e o Chile. Com exceção de algumas características próprias dos países como a diferença entre os sistemas de saúde, as implantações destes se assemelham. Os dois sistemas apresentam estímulos que buscam trazer o pai/parceiro para o sistema de saúde, usando a estratégia de pré-natal do homem como uma “porta de entrada” para criar este vínculo com o sistema de saúde.
A participação ativa do pai/parceiro durante o controle de pré-natal é um movimento crescente não só no Brasil como em muitos outros países, o qual defende que os homens podem e devem ser envolvidos integralmente em todo planejamento reprodutivo, familiar e suas particularidades, e que este envolvimento consciente, em todas as etapas da gestação, pode ser determinante para a futura criação, educação transmitida e fortalecimento dos laços afetivos proporcionados por este maior envolvimento. Contudo, o direcionamento de grande parte das responsabilidades relacionadas à reprodução e aos cuidados das crianças são ainda encaminhados às mulheres, com homens, ainda hoje, afastando-se de alguns de seus compromissos e deveres, como exemplo, a paternidade propriamente dita.
Diante disso, o pré-natal do homem enfrenta algumas barreiras durante sua realização muitas vezes devido às imposições sociais e culturais vivenciadas por estes que os afastam dessa prática por mais que tenham interesse e demonstrem desejo de participar de todos os momentos da gravidez; sendo necessário então, um rompimento de estereótipos e desconstruções sociais de gênero que possibilitem o vínculo paterno em todos os estágios desse momento indescritível, possibilitando todos os prazeres e aprendizados que giram em torno deste universo.
Além disso, deve se estimular a participação do pai/parceiro durante todo esse processo gestacional e de nascimento, visto ser fundamental para o bem estar psicossocial da mãe, do bebê e para si mesmo.
Sabe-se que há uma clara relação entre assistência ao controle pré-natal e atitudes de gênero, sendo pais com maior nível educacional mais participativos em relação as tarefas domésticas e com atitudes mais equitativas de gênero, aqueles que frequentemente participam mais efetivamente dos controles pré-natais (Aguayo, 2012).
Isso pode ser pensado frente ao ideal de um “novo” pai, que transcenda aquele mantenedor da família e o inclua como um cuidador frente ao seu filho e ao lado de sua parceira(o).
Para o homem, é necessário visualizar a paternidade sob novo contexto, vislumbrando diferentes arranjos familiares, inclusive aqueles homoafetivos. É necessário um novo olhar da sociedade, começando pelos homens nela envolvidos.(Ribeiro et al, 2016).
Faz-se necessário estímulos inclusivos que quebrem esses obstáculos através de ações como a sensibilização e qualificação dos profissionais da saúde para acolherem e envolverem o pai/parceiro nesse processo; possibilitando que os benefícios dessa interação sejam enaltecidos e os direitos do bebê, pai e mãe sejam esclarecidos em relação a participação do pai/companheiro nesse processo.
Por fim, é de extrema relevância ressaltar a importância da reflexão sobre as construções sociais de gênero relacionadas à masculinidade, almejando o fim de papéis estereotipados que afastam os homens da gestação, do parto, saúde, do cuidado e afeto e da construção de relações mais equitativas e humanizadas em suas parcerias sexuais e afetivas, além de reconhecer e respeitar os rearranjos familiares.
REFERÊNCIAS
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