Breves comentários sobre as velocidades do Direito Penal

28/04/2020 às 14:05
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Sobre direito penal.

                        Consonante ao que se intitula processo de expansão do Direito Penal pode-se visualizar três velocidades, três enfoques diferentes que podem ser concebidos ao Direito Penal, conforme os ensinamentos de Jésus-Maria Silva Sánchez1.

                        A teoria das velocidades do Direito Penal foi apresentada primeiramente pelo professor catedrático da Universidade de Pompeu Fabra de Barcelona, o espanhol Jesús-Maria Silva Sánchez, revelando existir uma nítida preocupação com a consolidação de um único “Direito Penal moderno”. Com isso, busca-se evitar a modernização generalizada pela expansão e flexibilização dos princípios político-criminais e regras de imputação inerentes às penas privativas de liberdade. 2

                         Silva Sánchez partiu do pressuposto de que o Direito Penal, no interior de sua unidade substancial, é composto de dois grandes blocos, distintos, de ilícitos: o primeiro, das infrações penais às quais são cominadas penas de prisão, e, o segundo, daquelas que se vinculam aos gêneros diversos de sanções penais. 2

                        Esclarece Silva Sánchez1 que todos os ilícitos guardam natureza penal e devem ser processados e julgados pelo Judiciário, não sendo possível a retirada das infrações penais para serem cuidadas pelo denominado “Direito Administrativo sancionador”. 

                        Como visto, essa foi a primeira noção pelo reconhecimento das velocidades do Direito Penal, abarcando apenas as 1.ª (primeira) e 2.ª (segunda).  

                        Posteriormente, formou-se a 3.ª (terceira) velocidade do Direito Penal, a qual é uma fusão das velocidades supracitadas. 

                        Segundo parte considerável da doutrina, a 3.ª (terceira) velocidade teria sido igualmente desenvolvida por Silva Sánchez.  

                        Todavia, de outra banda, alguns autores entendem que ela somente teria sido exposta com minúcias por Günther Jakobs, professor catedrático de Direito Penal e Filosofia do Direito na Universidade de Bonn - Alemanha, o qual traçou lineamentos de uma teoria denominada de Direito Penal do inimigo.  

                        Controvérsias à parte, importante é que o professor Silva Sánchez definiu o Direito Penal do inimigo como a 3.ª (terceira) velocidade do Direito Penal.  Seria essa terceira velocidade a privação de liberdade e suavização ou eliminação de direitos e garantias penais e processuais. 

                        É importante, além disso, destacar que há autores que afirmam que o criador da teoria do Direito Penal do inimigo teria sido Mezger e não Jakobs, em razão das influências dos movimentos nazistas e fascistas existentes à época. Entre esses autores destaca-se Rogério Greco. 

                        Observadas tais premissas, parte-se para uma melhor abordagem acerca das velocidades do Direito Penal: 

                        A primeira velocidade seria aquela tradicional do Direito Penal, que tem por fim último a aplicação de uma pena privativa de liberdade. Nessa hipótese, como está em jogo a liberdade do cidadão, deverão ser observadas todas as regras garantistas, sejam elas penais ou processuais penais, e até constitucionais. 

                        A segunda velocidade tem-se o Direito Penal à aplicação de penas não privativas de liberdade, a exemplo do que ocorre no Brasil com os Juizados Especiais Criminais, cuja finalidade, de acordo com o art. 62 da Lei n.º 9.099/95, é, precipuamente, a aplicação de penas que não importem na privação da liberdade do cidadão, devendo, pois, ser priorizadas as penas restritivas de direitos e a pena de multa.  

                        Nessa segunda velocidade do Direito Penal poderiam ser afastadas algumas garantias, com o escopo de agilizar a aplicação da lei penal. 

                        A terceira velocidade do Direito Penal tem como escopo central o chamado Direito Penal do Inimigo. 

                        O Direito penal do inimigo é, segundo nosso entendimento, uma teoria enunciada por Günther Jakobs, um doutrinador alemão que sustenta tal teoria com base nas políticas públicas de combate à criminalidade nacional e/ou internacional. 

                        A tese de Jakobs está fundada sob três pilares, a saber: 

a) antecipação da punição do inimigo;

                        b) desproporcionalidade das penas e relativização e/ou supressão de certas garantias processuais;

                        c) criação de leis severas direcionadas à clientela (terroristas, delinqüentes organizados, traficantes, criminosos econômicos, dentre outros) dessa específica engenharia de controle social. 

                        Jakobs refere-se ao inimigo como alguém que não admite ingressar no Estado e assim não pode ter o tratamento destinado ao cidadão, não podendo beneficiar-se dos conceitos de pessoa. A distinção, portanto, entre o cidadão (o qual, quando infringe a Lei Penal, torna-se alvo do Direito Penal) e o inimigo (nessa acepção como inimigo do Estado, da sociedade) é fundamental para entender as idéias de Jakobs. 

                        De tal modo, resumindo o raciocínio com Jésus-Maria Silva Sánchez1, ter-se-ia:  

                        I) A primeira velocidade, representada pelo Direito Penal ‘do cárcere’, em que haveriam de ser mantidos rigidamente os princípios político-criminais clássicos, as regras de imputação e os princípios processuais;  

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                        II) A segunda velocidade, para os casos em que, por não se tratar de prisão, senão de penas de privação de direitos ou pecuniárias, aqueles princípios e regras poderiam experimentar uma flexibilização proporcionada a menor intensidade da sanção. 

                        III) A terceira velocidade aquela interligada com o direito penal do inimigo. Embora ainda com certa resistência, tem-se procurado entender o Direito Penal do Inimigo como uma terceira velocidade. Seria, portanto, uma velocidade híbrida, ou seja, com a finalidade de aplicar penas privativas de liberdade (primeira velocidade), com uma minimização das garantias necessárias a esse fim (segunda velocidade).

 Referências:

 1 SANCHEZ, Jesús - María Silva. A expansão do Direito Penal, Tradução de Luiz Otávio de Oliveira Rocha. Série As ciências criminais nas sociedades pósindustriais. Volume 11. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002. apud BONHO, Luciana Tramontin. Noções introdutórias sobre o direito penal do inimigo. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1048, 15 maio 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8439>. Acesso em: 17 fev. 2010.

 2 MASSON, Cléber. Direito penal: parte geral. v. 1. São Paulo: Método, 2010. p. 80-90.

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