Maria é casada com João. Ambos servidores públicos aposentados. Ele com proventos de R$ 4.000,00. Ela com proventos de R$ 5.000,00. Maria é portadora de deficiência grave. João falece em janeiro/2020. Indaga-se: À luz da reforma da previdência, como se dará a acumulação da pensão por morte que Maria tem direito com a aposentadoria que já percebe?
Vamos ao raciocínio:
Segundo o §2º do art. 24 da EC 103/19, Maria poderá escolher o benefício maior para recebe-lo integralmente e terá direito à uma parte do benefício menor, apurado cumulativamente por percentuais decrescentes sobre faixas de salários mínimos.
Assim, terá direito de receber integralmente o benefício de maior valor, R$ 5.000,00, e terá direito à uma parte do benefício de menor valor, R$ 4.000,00. Eis, em suma, a regra da acumulação trazida pela reforma.
Entretanto, Maria é portadora de deficiência grave. E na forma do que estabelece o art. 23, §2º, I e II da EC 103/19, para os portadores de deficiência grave, o valor da pensão será equivalente a 100% da aposentadoria recebida pelo “de cujus”, limitado ao teto do RGPS, somado à uma cota familiar de 50% acrescida de cotas de 10% por dependente, sobre o valor da aposentadoria que supere o teto do RGPS.
Portanto, na pensão por morte deixada para o portador de deficiência, faz-se dois cálculos: paga-se 100% até o teto do RGPS e, caso haja valores que ultrapassem este teto, calcula-se, sobre estes valores, 50% de cota familiar acrescida de 10% de cotas por dependente.
Ora, Maria é portadora de deficiência grave e a pensão deixada por João é de apenas R$ 4.000,00, valor inferior ao teto do RGPS. Ela tem direito a receber 100% dos R$ 4.000,00. Tem direito a receber a pensão integralmente, pois aqui não há valores que superam o teto do RGPS. Portanto, não se aplica a segunda parte do cálculo, estabelecida no inciso II do § 2º do art. 23 da EC 103/19.
No presente case, há um aparente conflito entre o que estabelecem os artigos 23 e 24 da EC 103/19. O primeiro, assegura 100% do valor da pensão, já que Maria é portadora de deficiência. O segundo, determina que ao benefício de menor valor, no caso, a pensão, seja pago somente uma parte, cuja apuração se dará cumulativamente por percentuais decrescentes sobre as faixas de salários mínimos.
O conflito é aparente, de fato, pois nesta manifesta queda de braço, o disposto no art. 24, há de prevalecer.
Ora, a garantia de 100% do valor da pensão para o dependente portador de deficiência restringe-se ao cálculo de pensão enquanto benefício isolado. Esta regra está devidamente assegurada no art. 23, §2º, I da EC 103/19. Assim, no presente case, se Maria não fosse também aposentada, teria direito a 100% do valor da pensão calculada, sem qualquer redução.
Ocorre, entretanto, que além da pensão, há também a aposentadoria. E estes benefícios serão pagos cumulativamente dentro da nova sistemática criada pela reforma. Destarte, ao acumular dois benefícios, aposentadoria e pensão, o valor do menor, mesmo pago a portador de deficiência, deverá se submeter à sistemática de cálculo estabelecida no §2º do art. 24 da EC 103/19, nos seguintes moldes:
a) Perceberá 100% do benefício maior: R$ 5.000,00;
b) Perceberá o benefício menor calculado da seguinte forma:
Direito a 100% do primeiro salário mínimo = R$ 1.039,00
+ 60% do valor que exceder 1 salário-mínimo, até o limite de 2 SM (60% x R$ 1.039,00 = R$ 623,40)
+ 40% do valor que exceder 2 salários mínimos, até o limite de 3 SM (40% x R$ 1.039,00 = R$ 415,60)
+ 20% do valor que exceder 3 salários mínimos, até o limite de 4 SM (20% x 1.039,00 = R$ 207,80)
TOTAL = R$ 2.285,80
c) Soma dos dois benefícios: R$ 5.000,00 + R$ 2.285,80 = R$ 7.285,80.
Eis, portanto, como deve ser calculada a pensão de dependente portador de deficiência, quando acumula este benefício com uma aposentadoria.