Direito Penal e o Covid-19.

30/04/2020 às 18:16
Leia nesta página:

Esclarecimentos sobre aplicação do Direito Penal em tempos de Coronavírus.

Estamos vivendo um momendo crítico causado por uma pandemia, originada pelo vírus chamado COVID-19, popularmente conhecido por ‘coronavírus’, com ele vieram leis, decretos, medidas provisórias e portarias, levando a população a uma insegurança e dúvidas tanto em relação a crise econômica, quanto sobre o significado dos atos dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Esclarecer a população sobre todos os atos do Governo é uma tarefa difícil, ainda mais para quem não é operador do direito e tem como fonte de pesquisa as redes sociais de onde os autores das publicações, na maioria das vezes, não se fundamentam em fonte segura.

Diante disso, visando esclarecer o significado de alguns atos, faz-se necessário a apresentação de forma ordenada do passo a passo da origem dos decretos ao qual estamos submetidos.

Da mesmo forma, cabe esclarecer ao empresário e a pessoa comum, as obrigações e consequências caso venha a desobedecer as ordens do Governo.

Dito isso, passemos a analisar a Lei de nº 13.979/2020, que trata de medidas de urgência, isolamento, quarentena e tratamento compulsório, que tem por objetivo a proteção da coletividade.

A duração dessas medidas de proteção, não poderão ultrapassar o tempo declarado pela Organização Mundial de Saúde, perdurando seus efeitos enquanto houver risco de contágio.

Algumas pessoas estão com dúvidas quanto ao isolamento, a referida lei em seu artigo 2º, inciso I, diz que.

I - isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus;

De outro modo, em seu inciso II, a lei aponta como deverá ser a quarentena, vejamos.

II - quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus.

Cabe ressaltar que, a lei ainda prevê o tratamento compulsório em algumas situações, que são.

III - determinação de realização compulsória de:
a) exames médicos;
b) testes laboratoriais;
c) coleta de amostras clínicas;
d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou
e) tratamentos médicos específicos;

Portanto, não poderá o possível infectado se recusar em realizar os exames, testes, coleta, vacinação e tratamentos que determina a lei.

Essas foram as informações mais relevantes da lei nº13.979/2020, destaca-se que ela tem natureza administrativa.

Ao passo seguinte, os estados criaram decretos, firmando em cada Estado uma forma de prevenção e restrições a sua população.

Outro ato do Governo Federal que é extremamente importante, é a Portaria Interministerial de nº 05/2020, que dispõe sobre a compulsoriedade das medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública, que foi prevista na lei supracitada.

Em leitura da portaria, observa-se que é determinado em caso de descumprimento das medidas impostas pelos orgãos públicos, com o intuito de evitar a disseminação do coronavírus, a possibilidade do cidadão incorrer nos artigos 268 e 330 do Código Penal, vejamos o que diz os artigos.

Art. 268 - Infringir determinação do Poder Público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena - detenção, de 1 mês a 1 ano, e multa.
Parágrafo único: A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.

Nesse artigo é importante uma observação ainda maior no parágrafo único, onde o dispositivo descreve um aumento na pena quando o agente for da área da saúde.

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:
Pena - detenção, de 15 dias a 6 meses e multa.

Aqui estamos diante do infração penal de desobediência, a doutrina encontra-se dividida em relação a cumulo dos artigos apresentados, pois de uma lado defende-se que a desobediência seria o meio para a consumação do art. 268, devendo insidir o princípio da consunção/absorção, já outra parte da doutrina entende que não se deve aplicar tal princípio, pois cada um visa um bem jurídico diferente.

Cabe ressaltar que, no caso da desobediência, a ordem deve ser legal, portanto, em caso de ordem ilegal não estaria o agente incorrido para o crime de desobediência.

Para ilustrar melhor essa ilegalidade, imaginemos um prefeito de determinada cidade, mande contruir um muro fechando para visitantes ou para aqueles que saíram para trabalhar, nesse caso, aquele que desobedecer e vier a pular o ‘muro’ não estaria desobedecendo pois a ordem seria ilegal.

No artigo 268, seria o empresário ou comerciante que viesse a abrir o seu estabelecimento comercial que está dentre os proibidos para funcionar neste momento, este é um crime formal e de perigo abstrato, ou seja, não precisa a propagação acontecer para estar tipificado o delito.

De outro modo, temos uma dúvida recorrente que grande parte da população sempre questiona, e que vale a pena discutir, sendo o capítulo do Código Penal que trata da Periclitação da vida e da saúde.

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O covid-19 é o assunto do momento, sem dúvidas, e dizer que a informação sobre os sintomas ainda é desconhecidos seria inaceitável.

As pessoas que estiverem com os sintomas deverão seguir a determinação do Governo Federal e da Organização Mundial de Saúde, ou seja, ficar em quarentena após procurarem o hospital mais próximo.

Mas e no caso dessa pessoa resolver sair e continuar com a vida normal?

Bom, nesse caso a conduta desse cidadão estaria tipificada nos artigos 131 e 132 a depender da situação, passamos a analisar cada um deles.

Art - 131. Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:
Pena - reclusão, de 1 a 4 anos, e multa.
Art - 132. Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto ou iminente:
Pena - detenção, de 3 meses a 1 ano, se o fato não constituir crime mais grave.
Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/6 a 1/3 se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimmento de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.

Aqui estamos diante de um crime de perigo, sendo assim, não precisa contaminar ninguém para incorrer no artigo, basta apenas praticar um ato capaz de produzir o contágio.

Cabe dizer também que, é preciso analisar se a intenção do portador do vírus tinha a intenção, pois nesse caso, se quisesse matar ou causar lesão, essa restará configurada se vier a se consumir.

Acontece que o Coronavírus via de regra é tratável, diferente do HIV, por exemplo, que não seria possível a reversão da saúde do outrem.

Ao passo seguinte, existem pessoas que se aproveitam desse momento difícil para vender seus remédios/ vitamínas, como se pudessem trazer de volta a saúde do enfermo ou até mesmo a cura para o COVID-19, nesse caso estamos diante do charlatanismo, presente no artigo 283 do Código Penal, vejamos.

Art. 283. Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível:
Pena - detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa.

Não é díficil encontrar casos assim, o Conselho Federal de Medicina vem investigando casos em que médicos apareceram prometendo certas vitamínas como meio de cura e prevenção.

Ainda em relação ao Médico, cabe trazer aqui o crime de omissão de notificação de doença, que podemos encontrá-lo no artigo 269 do Código Penal, diz assim.

Art. 269. Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória:
Pena - detenção de 6 meses a 2 anos, e multa.

 Incorrerá nesse crime o Médico que ao se deparar com um portador do Coronavírus, não notificar a autoridade sanitária, não é muito comum, mas poderá ocorrer naquelas pequenas cidades onde por infelicidade, algum prefeito venha a tentar ocultar essa informação a fim de evitar um alarme na cidade.

Várias são as situações em que podemos nos deparar com um crime nesse momento de COVID-19, outro exemplo bastante recorrente em nosso meio é o caso do fabricante de álcool gel.

O fabricante de álcool gel estará incorrendo em um crime gravíssimo, que tanto faz fabricar ou adunterar, restará configurado o crime previsto no artigo 273 do Código Penal, passama vê-lo.

Art. 273. Falsificar, corromper, adunterar ou alterar produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais:
Pena - reclusão, de 10 a 15 anos, e multa.

Em seus parágrafos e incisos diz que incorrem nas mesmas penas quem importar, vender, expor a venda, ter em depósito, de qualquer forma distribuir.

A pena para esse crime segundo os tribunais superiores, é desproporcional, e o Superior Tribunal de Justiça está determinando que a pena a ser aplicada nesse crime deverá ser a do tráfico de drogas (art. 11.343/2006), por serem crimes contra a saúde pública.

Por fim, cabe dizer que a leitura da lei é obrigatória, pois aqui foram as observações que julguei serem mais relevantes para esclarecer algumas dúvidas recorrentes sobre o COVID-19.

Sobre o autor
Marco Costa

Advogado Criminalista, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário IESB, Pós-Graduado em Ciências Criminais (FACEMINAS), especialista em Estatuto da Criança e do Adolescente e as Medidas Socioeducativas (Faculdades Integradas de Itararé – FAFIT), especialista em Licitações e Contratos (CENED), especialista em Direito Constitucional (CENED), Escritor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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