O que leva uma pessoa a praticar atos tão extremos como assassinatos em série? A questão é genética, psíquica ou psicológica? Traumas infantis podem ter consequências tão horrendas? Quanto pai e mãe precisam errar para criar um monstro? (CASOY, 2017, p.20).
RESUMO
O presente estudo, é um breve resumo sobre a aplicabilidade da lei penal brasileira nos crimes de assassinato em série, mais conhecidos como Serial Killers; assim como a dificuldade encontrada pelos profissionais do Direito em lidar com estes tipos de indivíduo com a tamanha escassez da lei brasileira, ademais sua imputabilidade enquanto diagnosticado com transtorno de personalidade (psicopatia). Para isso, é importante destacar a necessiade dos profissionais na área da psiquiatria e psicologia forense, já que se trata de seres humanos com comportamentos antissociais, sendo analisados casos reais acontecidos no Brasil e no mundo. O método desenvolvido para a realização do trabalho foi o dedutivo, utilizando pesquisa em materiais bibliográficos, analises e comparações doutrinarias sobre o tema, documentários e arquivos reais sobre casos concretos.
QUEM É UM SERIAL KILLER E COMO TUDO COMEÇOU
Os assassinos em série, conhecidos como serial killer, são criminosos que cometem homicídios como o próprio nome já diz, em série/sequência, de forma fria e calculada e sem nenhum motivo ou circunstância que tenha o motivado.
Serial Killers são os assassinos que cometem uma série de homicídios com algum intervalo de tempo entre eles. Suas vítimas têm o mesmo perfil, a mesma faixa etária, são escolhidas ao acaso e mortas sem razão aparente. Para criminosos desse tipo, eles são objeto da sua fantasia. Infelizmente, eles só param de matar, até onde se sabe, quando são presos ou mortos (CASOY, 2017, p. 21).
Este tipo de crime “esfria” entre um e outro, não necessariamente acontece nos mesmos períodos e épocas, normalmente não conhecem suas vítimas, mas tem a necessidade do controle delas e ou de mata-lá. As vítimas normalmente não influencia com suas atitudes, apenas tem o padrão de vítima que ele procura, ou somente sua vulnerabilidade.
A expressão serial killer é relativamente nova. Foi usada pela primeira vez nos anos 1970 por Robert Ressler, agente aposentado do FBI (Federal Bureau of Investigation, órgão americado responsável por todas as investigações criminais federais) e grande estudioso do assunto. Ele pertencia a uma unidade do FBI chamada Behavioral Sciences Unit (BSU – Unidade de Ciência Comportamental), que tinha sua base em Quantico, Virgínia. (CASOY, 2017, p. 22).
Essa unidade referida acima, deu continuidade ao trabalho do psiquiatra James Brussell, que foi um dos primários no estudo da mente criminosa. Deu inicio com a montagem de uma biblioteca de entrevistas gravadas com assassinos em série já condenados e presos nos EUA. Foram entrevistados em diversas penitenciárias os mais famosos seriais killers como Emil Kemper, Davi Berkowitz e Charles Manson.
Os seriais killers foram divididos em quatro tipos, segundo estudiosos e a doutrina:
a) Visionário: um indivíduo insano e psicótico, que ouve vozes e as obedecem, além de ter alucinações e visões;
b) Missionário: Socialmente não demonstra ser um psicótico, mas por dentro em seu interior tem a necessidade de se livrar do que julga errado ou imoral. Este tipo escolhe um determinado grupo para matar, como exemplo: homossexuais;
c) Emotivo: esse sente prazer em matar, mata por diversão, utilizando de métodos sádicos e cruéis;
d) Sádico: o assassino sexual, que mata por desejo. Neste o prazer está diretamente ligado ao sofrimento da vítima, o que lhe causa prazer sexual.
Segundo o Dr. Joel Norris, PhD em Psicologia e escritor, existem seis fases do ciclo do assassino em série:
a) Fase Áurea: quando o assassino começa a perder a compreensão da realidade;
b) Fase da pesca: quando o assassino procura sua vítima;
c) Fase galanteadora: quando o assassino seduz ou engana sua vítima;
d) Fase da captura: quando a vítima cai na armadilha;
e) Fase do assassinato ou totem: auge da emoção para o assassino;
f) Fase da depressão: após o assassinato.
Quando o assassino entra no último estágio que é o da depressão, ele inicia novamente o proceso voltando a primeira fase (áurea).
Há diversos fatores psicológicos que os serial killers tem em comum: sua ação, vítima e seus métodos, o que podem dizer muito a respeito do seu passado. Como por exemplo, um trauma tido na infância, como bullying e abusos podem explicar de forma geral o perfil de sua vítima.
Na infância, nenhum aspecto isolado define a criança como um serial killer potencial, mas a chamada “terrível tríade” parece estar presente no histórico de todos os serial killers: enurese em idade avançada, abuso sádico de animais ou outras crianças, destruição de propriedade piromania. (CASOY, 2017. p. 27).
Há outras características que são comuns dos psicopatas na adolência, o que não quer dizer que somente eles as possuem, contudo, são elas: devaneios diurnos, masturbação compulsiva, isolamento social, mentiras crônicas, rebeldia, pesadelos constantes, roubos, baixa autoestima, acessos de raiva exagerados, problemas relativos ao sono, fobias, fugas, propensão a acidentes, dores de cabeça constantes, possessividade destrutiva, problemas alimentares, convulsões e automutilações relatadas pelos próprios serial killers aos especialistas.
Uma das características marcantes são as respostas emocionais ou afetivas alteradas na sua linguagem (HIATT e NEWMAN, 2006). Os psicopatas produzem uma linguagem tecnicamente correta que mascara ou esconde os seus déficits experimentais já apoiaram em grande parte essa noção (CLECKLEY, 1941).
SERIAL KILLER NO BRASIL
No Brasil, não há órgãos e nem especialistas na área, o que prova o preconceito em relação a aceitação de que existem indivíduos capazes de praticar atos tão cruéis, sem nem sequer uma provocação da vítima, já que na maioria das vezes os assassinos nem conhecem as vítimas e não há sequer uma demonstração de arrepedimento por parte destes.
A polícia tem muita dificuldade em aceitar a possibilidade de um serial killer estar em ação. Certo preconceito permeia as investigações de crime em série. Isso já aconteceu inúmeras vezes no passado, com consequências nefastas. Em outros países, com uma análise acurada do motivo ou da falta dele, do risco-vítima e risco-assassino, modus operandi, assinatura do crime a reconstrução da sequência de atos cometidos pelo criminoso, os serial killers são caçadores antes que cometam tantos crimes. (CASOY, 2017, p. 387).
Além do mais, o serial killer possui uma marca invariavél que mostra um importante aspecto para a configuração de um assassino em série: sua assinatura. Eles sempre fazem questão de deixar sua marca como um troféu.
Desta forma, a polícia civil brasileira, deveria ter um órgão especializado nesses casos, porém, a pouca ciência forense que existe no Brasil não é incentivado e divulgado, já que a mente humana não possui fronteira geográfica.
O HCTP – Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico é um estabelecimento penal para o qual são destinadas as pessoas que cometeram fato típico, mas são inimputáveis ou semi-imputáveis elencados no art. 26 do CP e que são submetidos à medida de segurança, conforme estabelece o art. 99 da LEP/1984. Sendo obrigatória a realização do exame psiquiátrico e demais exames para o tratamento dos internados. O tratamento ambulatorial será nele realizado ou em outro local com dependência médica adequada.
A sua característica estrutural é de um hospital-presídio, que tem por objetivo o tratamento psiquiátrico e a custódia do internado, sendo que para isso, sua liberdade de locomoção é restringida. Tal ambiente deve ser salutar, para possibilitar condições de melhora ou de restabelecimento. (MIRABETE, 2004, s/n).
Vale ressaltar que há diferença entre um doente mental e um individuo que possui somente transtorno de personalidade. Vejamos a diferença no proximo tópico.
DOENÇA MENTAL x TRANSTORNO DE PERSONALIDADE (PSICOPATIA)
Psicopatas são indivíduos que podem estar inseridos no nosso meio e dificilmente sabemos. São oportunistas que vivem se fazendo de vítima, pessoas que sabem fingir arrependimento e remorço, porém não passa de fingimento, tanto que podem ser políticos, empresários e até mesmo religiosos, sem nem sequer deixar vestigíos de seu verdadeiro sentimento interno. De forma que é mais fácil reconhece-lo por suas ações e não por suas palavras.
Os psicopatas têm uma visão narcisista e exageradamente vaidosa de seu próprio valor e importância, um egocentrismo realmente espantoso, acreditam que tem direito a tudo e consideram-se o centro do universo, seres superiores que tem todo o direito de viver de acordo com suas próprias regras. “Não É que eu não cumpro as leis”, disse um dos sujeitos de nossa pesquisa. “Eu sigo minhas próprias leis. Nunca violo minhas próprias leis.” Em seguida, descreveu essas regras nos seguintes termos: “escolhendo a numero um”. (HARE, 2013, p.53).
Psicopatas, são famosos por seu enorme poder de simular arrependimento, a facilidade em ludibriar advogados, juízes, promotores e possuem significativa chance de conseguir sua liberdade. Entretanto, devido à personalidade deles, dificilmente voltaram a sociedade ressocializados. Estima-se, inclusive, que 70% deles reincidem depois de soltos.
Os portadores de personalidade psicopática são enfermos e, quando cometem delitos, devem ser enquadrados no parágrafo único do art. 26 do Código Penal, ou, se o agente necessita de tratamento curativo, ser recolhido em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico. Isto porque a anomalia consubstanciada em personalidade psicopática não se inclui na categoria das doenças mentais, lato sensu, e sim, nunca modalidade de irregularidade psíquica, que se manifestou ao cometer o delito, despida de qualquer formação alucinatória ou delirante, capaz de gestar a psicose ou a neurose que torna o indivíduo inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento. (CROCE, 2004, p.647)
Diferente dos psicóticos (doentes mentais), pois a psicose é uma distonia mental, ou seja, um estado anormal de funcionamento psíquico. O que ocorre é a perda do contato com a realidade, dependendo da intensidade da psicose. Ou seja, o psicopata não é um doente mental, mas o psicótico sim.
Conforme entendimento dos Tribunais brasileiros, a medida de segurança não deve ultrapassar o máximo de pena cominada em abstrato ao delito:
AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRAZO MÁXIMO DE INTERNAÇÃO. TRINTA ANOS. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL. ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE.1. Em atenção aos princípios da isonomia, proporcionalidade e razoabilidade, aplica-se, por analogia, o art. 75 do Diploma Repressor às medidas de segurança, estabelecendo-se como limite para sua duração o máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado, não se podendo conferir tratamento mais severo e desigual ao inimputável, uma vez que ao imputável, a legislação estabelece expressamente o respectivo limite de atuação do Estado. (Habeas Corpus nº 2010/0015753-5/SP.)
No mesmo sentido:
PENAL. MEDIDA DE SEGURANÇA. LIMITE DE DURAÇÃO. PENA MÁXIMA COMINADA ABSTRATO DO DELITO COMETIDO. ORDEM CONCEDIDA.1. Fere o princípio da isonomia o fato de a lei fixar o período máximo de cumprimento de pena para o imputável, pela prática de um crime, e determinar que o inimputável cumprirá medida de segurança por prazo indeterminado, condicionando o seu término à cessação da periculosidade. 2. Em razão da incerteza da duração máxima da medida de segurança, está-se claramente tratando de forma mais severa o infrator inimputável quando comparado ao imputável, para o qual a lei limita o poder de atuação do Estado. 3. O limite máximo de duração de uma medida de segurança, então, deve ser o máximo da pena abstratamente cominada ao delito no qual foi a pessoa condenada. 4. Na espécie, o paciente foi condenado por tentativa de estupro, cuja pena máxima cominada é de reclusão de 6 anos e 8 meses. Não obstante, encontra-se internado há mais de 15 anos. 5. Ordem concedida para declarar extinta a medida de segurança aplicada em desfavor do paciente, em razão de seu integral cumprimento. (Habeas Corpus nº 2007/0232120-2/SP).
A verdade é que depende do entendimento do magistrado em relação ao laudo pericial e a forma como ele irá aplicar a pena ou a medida de segurança em cada caso, já que não há um dispositivo ou uma estrutura apta para estes casos.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Acórdão. Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 2010/0015753-5/SP. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ>. Acesso em 17 de mai. 2019.
______. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão. Habeas Corpus nº 2007/0232120-2/SP. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ>. Acesso em 17 de mai. 2019.
______. Organização mundial de saúde. Folha informativa - Transtornos mentais. Disponível em:<https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5652:folha-informativa-transtornos-mentais&Itemid=839>. Acesso em: 23 mai. 2019.
CASOY, Ilana. Arquivos serial Killers: Louco ou Cruel? e Made in Brazil. – Rio de Janeiro: DarkSide Books, 2017
CROCE, Delton. Manual de Medicina Legal. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
FERNANDES, Mateus. Doenças que ocasionam imputabilidade no direito penal. Disponível em:<https://mateusfernandesoficial.jusbrasil.com.br/artigos/470586623/doencas-que-ocasionam-imputabilidade-no-direito-penal>. Aceso em: 23 de mai. 2019.
HARE, Robert D. Sem consciência: o mundo perturbador dos psicopatas que vivem entre nós / Robert D. Hare ; tradução: Denise Regina de Sales. – Porto Alegre: Artmed, 2013.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. rev. e atual. até 31 de março de 2004. São Paulo: Atlas, 2004.
SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado. – Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.
______. Mentes criminosas: o psicopata mora ao lado. São Paulo: Principium, 2014.
______. Mentes Perigosas – O Psicopata Mora Ao Lado. Ed. Fontanar, Rio de Janeiro : 2008.