OS IMPACTOS DO CORONAVÍRUS NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS: implicações da Medida Provisória n° 927/2020 no direito a férias

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Este trabalho tem por escopo analisar as mudanças no direito a férias, contantes na Medida Provisória n° 927/2020, com o objetivo de verificar em que medida regras foram flexibilizadas, extintas ou acrescidas.

INTRODUÇÃO

Os efeitos provocados pelo novo coronavírus (sars-cov-2) nas relações humanas são diversos. O isolamento social é apontado como a medida mais eficaz ao combate da pandemia. A ordem à qual estávamos habituados mudou em larga medida, em razão disso impactos são sentidos nas relações trabalhistas.

Dessa forma, de modo a minimizar os prejuízos sociais ocasionadas pelo distanciamento social, foram aprovadas as Medidas Provisórias 927, 936 e 944, dispondo sobre meios para assegurar empregos, auxílios para desempregados e a abertura de linhas de crédito para empresas.

Pensando nisso, este trabalho tem por escopo analisar as mudanças provocadas no direito a férias, previsto no capítulo IV da Consolidação das Leis do Trabalho, verificar em que medida regras foram flexibilizadas, extintas ou acrescidas.

Diante disso, com o objetivo de elucidar tais questões, buscou-se na legislação pátria os fundamentos legais aplicáveis. O estudo centrou-se nas modificações e acréscimos relativos ao direito de férias dispostos na Medida Provisória n° 927/2020.

1. A PANDEMIA

Com o passar dos dias a escala dos prejuízos ocasionados pela pandemia cresce. Ainda não se sabe ao certo a profundidade da problemática. Tem-se efeitos já ocasionados, o desemprego crescente, ante a significativa diminuição de circulação do capital, colocando em risco o sistema o qual estamos inseridos.

No Brasil temos o estado de calamidade pública determinado pelo decreto legislativo 6/2020. Tem-se a posição adotada pelo ministério da saúde, o qual reconheceu o estado de emergência de saúde pública, através da Lei n° 13.97/2020.

Sendo assim, o Estado cumprindo o seu dever de zelar e socorrer aqueles que necessitam, bem como na tentativa de manter ou minorar os danos ao status quo aprovou diversas medidas, dentre as quais apontamos as MPs n° 936, 927 e 944, que dispõe de forma incisiva sobre a manutenção do emprego e da renda.

2. O DIREITO A FÉRIAS

As férias podem ser conceituadas como prologando período de descanso do empregado, no qual não poderá prestar serviços e perceberá a remuneração (GARCIA, 2019, p. 898).

A Constituição Federal de 1988 assegura em seu art. 7°, inciso XVII, o “gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal”.

Observa-se que no gozo deste direito o empregado não poderá prestar serviços ao empregador bem como para qualquer outro (CLT, art. 138, caput), pois é incompatível com a natureza das férias.

Sendo assim, as férias têm por objetivo propiciar um período longo de descanso ao empregado, de modo a evitar problemas de saúde decorrentes do cansaço excessivo.

Adiante passaremos a análise das novas disposições, as quais se utilizam do direito a férias com a finalidade de preservar o emprego e a renda (MP 927/2020, art. 3°).

3. FLEXIBILIZAÇÕES E REGRAS ADICIONAIS

O escopo geral das novas disposições relativas ao direito do trabalho cinge-se a regularização de situações críticas, flexibilização de regras estabelecidas na CLT e a adaptação de procedimentos às medidas de distanciamento social.

O direito a férias insere-se nesta realidade, de modo que a legislação o coloca como uma hipótese ao empregador a manutenção de empregos. Observam-se novos regramentos em suas duas formas, individual e coletiva.

3.1. FÉRIAS INDIVIDUAIS 

Conforme ressaltado anteriormente os empregados devem usufruir a cada ano trabalho de um período de férias, com o recebimento da respectiva remuneração do contrato de trabalho. As férias individuais são aquelas concedidas em um único empregado, sem correlacionar o mesmo período a um setor, um estabelecimento ou uma empresa.

3.1.1. Regras Anteriormente Previstas

Destacam-se as seguintes regras anteriormente previstas em nossa legislação: (i) A cada 12 meses concedesse um período de 30 dias (art. 130, CLT); (ii) a comunicação das férias deverá ser feita, por escrito, com no mínimo 30 dias de antecedência (art. 135, CLT); (iii) o empregado perceberá a remuneração devida a época da concessão e o acréscimo de 1/3, os quais deverão ser pagos até 2 dias antes do início do respectivo período (art. 145, CLT).

3.1.2. Flexibilizações

Destacadas de forma suscinta as regras anteriormente previstas, notam-se as flexibilizações: (i) a possibilidade de antecipar as férias individuais (art. 3°, II, MP 927) ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido (art. 6°, §1°, II, MP 927); (ii) as férias devem ser comunicadas ao empregado com no mínimo 48h de antecedência (art. 6°, MP 927);

A modificação mais sensível é percebida na forma de remuneração. Temos que (iii) o empregado fará jus a remuneração normal, que poderá ser paga até o 5° dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias (art. 9°, MP 927); (iv) o adicional de 1/3 poderá ser pago até a data limite de pagamento da Gratificação Natalina (Décimo Terceiro Salário) (art. 8°, MP 927).

3.1.3. Regras Adicionais

Aliadas as regras que tiveram por objetivo a flexibilização da legislação em trabalhista, apontamos a inserção de regras adicionais, as quais acrescentam novas diretrizes ao instituto. 

Inicialmente temos que (i) as férias não podem ser gozadas em períodos mínimos de cinco dias corridos (art. 6°, §1°, MP 927); (ii) permite-se ainda a negociação sobre a antecipação de período futuros, por meio de acordo individual (art. 6°, §2°, MP 927).

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3.2. FÉRIAS COLETIVAS

Trata-se de férias concedidas a todos os empregados de uma empresa, estabelecimento ou determinado setor (CLT, art. 139). Quanto a essa modalidade não é possível verificar mudanças muitos profundas. 

Destacamos que (i) apenas é necessário notificar empregados com no mínimo 48h de antecedência (art. 11, MP 927); (ii) não são aplicáveis o limite máximo de dois períodos anuais de no máximo 10 dias corridos (art. 139, §1°, CLT, c/c art. 11, MP 927); por é dispensável a comunicação prévia ao órgão local do ministério da economia, bem como aos sindicatos representativos da categoria (art. 12, MP 927).

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Ante o exposto, percebe-se que as férias em tempos de pandemia foram modificadas constituindo-se como opções viáveis a dispensa de empregados. Ainda que contrária a natureza básica do instituto, evitar o desemprego nos parece uma motivação válida a tal flexibilização.

Flexibilização esta que não retirar totalmente os direitos do trabalhador, mas o adapta a realidade social imposta. De certo o que se vê a tergiversação da natureza do direito de férias e um tempo tão conturbado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 4 mai 2020a.

BRASIL, Decreto-lei nº 5.452, 1° de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho, Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em 4 mai 2020b.

BRASIL, Medida Provisória n° 927, de 22 de março de 2020. Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm. Acesso em 4 mai 2020c.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

Sobre o autor
Leonardo Silva de Oliveira Bandeira

Advogado. Graduado em Direito pela Faculdade da Amazônia Ocidental. Pós-graduado em Prática da Advocacia Cível, com habilitação em Docência do Ensino Superior pela Faculdade da Amazônia Ocidental.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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