PSICOPATOLOGIA

05/05/2020 às 10:53
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE DIANTE DA PSICOPATOLOGIA HIPÓTESE DE INIMPUTABILIDADE.

PSICOPATOLOGIA

Rogério Tadeu Romano

No sistema penal pátrio, para a condenação penal é necessário comprovar a culpabilidade que é um juízo de reprovação de modo que somente poderia ser responsabilizado o sujeito quando poderia ter agido em desconformidade com a norma penal. Será mister saber, portanto, quando se pode atribuir ao agente a prática do crime, para se poder falar em censurabilidade da conduta.  

No Brasil, há excludente de culpabilidade, quando o agente estiver submetido a menoridade penal(menor de dezoito anos), for portador de doença mental ou desenvolvimento incompleto ou retardado, estiver em embriaguês completa por caso fortuito ou força maior, por ele desconhecer o efeito inebriante de substância que ingere ou quando desconhecendo uma particular condição fisiológica, ingere substância que contém álcool, ficando embriagado. A chamada embriaguês preordenada, actio libera in causa, onde o agente, com o fim precípuo de cometer o crime, embriaga‐se para buscar para buscar coragem para executar o ato criminoso, não há que se falar em exclusão da imputabilidade ou diminuição da pena.  

Seguiu o Brasil o sistema biopsicológico, ao invés dos sistemas biológico(segundo o qual aquele que apresenta uma anomalia psíquica é sempre inimputável), e do sistema psicológico(que verifica apenas as condições psíquicas do autor no momento do fato, afastada qualquer preocupação com relação a respeito da existência ou não da doença mental ou distúrbio psíquico‐patológico). No critério seguido, do que se vê do artigo 26 do Código Penal, deve‐se verificar, de início, se o agente é doente mental ou que tem desenvolvimento incompleto ou retardado.

Em caso negativo, não é inimputável. Em caso positivo, averigua‐se se ele era capaz de entender o caráter ilícito do fato; será inimputável se não tiver essa capacidade.   Há várias causas de exclusão da culpabilidade e uma delas é a esquizofrenia, sobretudo aquela que vem na forma paranóide, em que são comuns os impulsos em que o sujeito agride e mata por ser portador de mentalidade selvagem e primitiva, sujeitando‐se às explosões de fúria, mas que não escolhem nenhuma classe de delitos, podendo haver até um refinamento na execução do crime. Somam‐se outras doenças como a psicose maníaco‐ depressiva(que se marca na desorganização da sociabilidade), a paranoia(que afeta o pensamento e, sobretudo, as relações com o mundo exterior), dentre outras doenças, como a epilepsia(neuropsicose constitucional com efeitos determinantes de profundas alterações no estado da inteligência, da consciência, dos sentidos), a demência senil(em que surgem o enfraquecimento da memória, principalmente quanto a fatos recentes, a dificuldade de fazer julgamento das situações, episódicas depressões e ansiedades, mudanças de comportamento, etc), a psicose alcoólica(embriaguês patológica ou alcoolismo crônico).   

Bem disse Hélio Gomes(Medicina Legal, 18ª edição, pág. 175) que a esquizofrenia é uma psicose endógena, caracterizada, essencialmente, por um enfraquecimento psíquico especial, de marcha progressiva, sobrevindo, em geral, na adolescência, sem nunca comprometer a saúde física do portador da doença.   Realmente, os especialistas dizem que há duas modalidades evolutivas desse mal: uma na qual a doença sobrevém cedo, é precedida por muitos sinais de alarma e evolve de modo grave, irreversível; outra, onde a doença sobrevém de modo mais ou menos súbita, sem grandes sinais de alarma e sem marcha muito grave, com remissão satisfatória ao fim de certo tempo, tratando‐se de crise eventual e transitória.   O incidente de insanidade mental, destinado a saber se o agente é ou não inimputável, dirá se essa patologia ocorreu, para o caso, e se o investigado poderá ser, se comprovada a materialidade e autoria do crime, submetido a uma medida de segurança, que se assenta na periculosidade que, como ensinou Nelson Hungria, é um estado positivo, mais ou menos duradouro, de antissociabilidade, que se funda no perigo de reincidência.    Pela Lei 7.209/84, ou a periculosidade é presumida, ex vi legis, no caso de inimputáveis, ou deve ser reconhecida pelo juiz ao condenar o semi‐imputável(se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar‐ se de acordo com esse entendimento ‐ artigo 26, parágrafo único, CP ‐ quando poderá reduzir a pena de 1/3 a 2/3, conforme o grau de perturbação, ou impor medida de segurança).   

 A medida de segurança não deixa de ser uma sanção penal, que visa preservar a sociedade da ação de delinquentes portadores de graves doenças. Em verdade, o juiz ao proferir    a sentença de    absolvição imprópria, em decorrência da imputabilidade, aplica a medida de segurança(artigo 97).   De acordo com a redação que era antes dada ao Código Penal, na parte geral, as medidas de segurança podiam ser aplicadas, isoladamente, aos inimputáveis e, cumuladas com penas, aos semi‐imputáveis e aos imputáveis, considerados perigosos. Com a Lei 7.209/84, substituiu‐se a aplicação para os semi‐imputáveis e imputáveis do chamado sistema do duplo binário, que conduz a aplicação de pena ou de medida de segurança, para o sistema vicariante em que se pode aplicar somente pena ou medida de segurança para os primeiros e unicamente a pena para os demais. A medida de segurança, que tem um caráter preventivo assistencial, ficará reservada aos inimputáveis, que são aqueles que, por anomalia psíquica, não podem responder judicialmente nos termos da lei.   A medida de segurança ou consistirá em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou em tratamento ambulatorial, onde cumpre ao sentenciado comparecer ao hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, nos dias que lhe forem determinados pelos médicos, submetendo –se à modalidade terapêutica prevista(artigo 101 da Lei 7.210/84), sempre que for cominada medida e que o fato objeto de sanção estiver sujeito à pena de detenção(artigo 97 do CP), o que não é a hipótese do fato narrado, pois o homicídio está sujeito a pena de reclusão.   A discussão é se a medida de segurança possa durar enquanto houver essa periculosidade. A medida de segurança não pode ter caráter perpétuo, como já disse o Ministro Marco Aurélio(HC 84.219/SP).  

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

O  Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 2.083.336/SP, externou que o artigo 97, § 1º, do Código Penal(a duração da internação ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade e que o prazo mínimo deverá ser de um a três anos), que fala em duração da medida de segurança, deve ser interpretado no sentido de que o tempo de cumprimento da medida de segurança, na modalidade internação ou tratamento ambulatorial, deve ser limitado ao máximo da pena abstratamente cominada ao delito perpetrado e não pode ser superior a trinta anos.  

Da leitura do artigo 75 do Código Penal, tem‐se que o cumprimento de penas privativas de liberdade não pode ser superior a trinta anos e quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade, superiores a tal limite máximo, a posição predominante, na jurisprudência, é no sentido de que o tempo de cumprimento das citadas penas não pode ser superior a tal montante.  

Volto-me a psicopatologia.

Psicopatologia é uma área do conhecimento que objetiva estudar os estados psíquicos relacionados ao sofrimento mental. É a área de estudos que está na base da psiquiatria, cujo enfoque é clínico. É um campo do saber, um conjunto de discursos com variados objetos, métodos, questões: por um lado, encontram-se em suas bases as disciplinas biológicas e as neurociências, e por outro se constitui com inúmeros saberes oriundos da psicanálise, psicologia, antropologia, sociologia, filosofia, linguística e história.

A psicopatologia enquanto estudo dos transtornos mentais é referida como psicopatologia geral. 

Dito isso, remeto o comentário a discussões traçadas por estudiosos com relação a personalidade do atual presidente da República.

Trago o comentário feito por Miguel Reale Jr., em artigo para o Estadão, em 2 de maio do corrente ano:

“Já opinei ser a interdição um caminho eventual para Bolsonaro. Não estava a fazer blague. As atitudes habituais permitem supor possível transtorno de personalidade, falha profundamente estudada por Odon Ramos Maranhão, titular de Medicina Legal (Psicologia do crime, 2.ª ed. Malheiros, 1995, cap. 7) e objeto de classificação pela CID-10, a Classificação Internacional de Doenças da OMS, em livro específico sobre doenças mentais (Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento, editor Artes Médicas, pág. 199).

Nessa classificação, o transtorno de personalidade antissocial tem por características a “indiferença insensível face aos sentimentos alheios; uma atitude flagrante e persistente de irresponsabilidade e desrespeito a regras; a baixa tolerância à frustração; a incapacidade para experimentar culpa e propensão a culpar os outros”.

Poderia haver, eventualmente, transtorno de personalidade paranoide, cujos sintomas seriam, por exemplo, “combativo e obstinado senso de direitos pessoais; tendência a experimentar autovalorização excessiva e preocupação com explicações conspiratórias”.

Outra publicação respeitada éo DSM-5, da Associação Psiquiátrica Americana, que em http://www.niip.com.br/wp-content/uploads/2018/06/Manual-Di agnosico-e-Estatistico-de-Transtornos-Mentais-DSM-5-1pdf.pdf, nas páginas 645 e seguintes, estuda os tipos de transtornos da personalidade, cabendo destacar: “1- paranoide, caracterizado por desconfiança e suspeita tamanhas que as motivações dos outros são interpretadas como malévolas; 2- antissocial, cujo padrão é desrespeito e violação dos direitos dos outros; 3- narcisista, que apresenta sentimento de grandiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia”.

Atentemos para o comportamento reiterado de Bolsonaro, ao longo do tempo, em favor de situações que geram dor, em apoio a manifestações pelo fechamento do Congresso e do STF, chegando a agir, como presidente, para não se apurar devidamente a organização do ato de domingo 19 de abril; em campanha contra o isolamento social, única medida possível para reduzir mortes; usando a trágica expressão, “e daí?” acerca do aumento do número de mortes; no gosto pelo aplauso popular, pois, no domingo 15 de março, ao ser ovacionado em frente ao Planalto falou: “Isso não tem preço”.

São esses os sinais indicativos de possível enquadramento nas categorias psiquiátricas acima lembradas, o que cumpre ser verificado por experts em medida adotada em defesa do País.

No meio da pandemia, um pandemônio.

Comportamentos de Bolsonaro indicam possível anormalidade de personalidade.”

Caso haja responsabilização do atual presidente da República por delitos criminais comuns no exercício do mandato, em razão do oficio, as considerações acima traçadas poderão ser consideradas.

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos