Contratos administrativos: por escopo e por prazo determinado

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08/05/2020 às 12:15
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5. CONTRATOS POR OBJETO OU DE ESCOPO

A questão da vigência dos contratos de escopo é um pouco mais complexa do que a dos contratos por prazo. Primeiramente necessário consolidar o entendimento acerca do conceito dessa espécie contratual.

O mestre Floriano Marques Neto, citado por Carlos Fernando Mazzoco, conceitua contratos de escopo como sendo aquele em que a Administração tem em vista o obtenção de um bem determinado. Eis suas palavras:

Nos contrato ditos de escopo, a Administração contrata tendo em vista a obtenção de um bem determinado. O escopo do contrato estará consumado quando entregue o bem. Certo deve estar que a fixação do prazo é relevante para que a Administração possa exigir do particular executante um mínimo de eficiência e celeridade necessário para a satisfação do interesse público. Mas, nesse caso, o tempo em que vai se desenrolar a execução do contrato não é essencial.

Os contratos por escopo ou por objeto são formas contratuais que se exaurem com o cumprimento de seu objeto, sendo que o prazo estipulado em seu texto destina-se a estabelecer uma data limite para a entrega do objeto concluso.

O professor doutor Ronny Charles, em excelente trabalho, leciona que significante parte da doutrina considera que nos casos de contratos por objeto, a extinção se dá pela entrega do objeto.

Dessa forma, o prazo estipulado no instrumento contratual é somente moratório, não representado o fim do pacto negocial, e sim somente o prazo firmado para a sua execução e entrega do objeto final.

Nada obstante, existe jurisprudência do TCU apontando que nos casos de contrato de escopo ainda não finalizado, seu prazo deve ser prorrogado antes do de seu término, sob pena de impossibilidade de ser prorrogação. Segue trecho do acórdão:

8. A principal tese jurídica da defesa é que o aditamento de prazo não é necessário nos chamados contratos de escopo, em que o objeto é a aquisição de um determinado bem ou benfeitoria, a exemplo de uma obra, como no caso. Não abono tal tese, (...), não só porque contradiz a remansosa jurisprudência desta Corte, mas também porque é contrária à Lei 8.666/1993, cuja disciplina acerca do assunto, estabelecida no art. 57, veda a duração indeterminada do contrato administrativo e permite a prorrogação apenas nos acasos ali relacionados. É dizer: considera-se extinto o contrato que atingiu o termo final do prazo de duração nele fixado. Daí a necessidade de prorrogá-lo, por um dos motivos previstos em lei, ainda durante sua vigência.

9 . Porém, não se pode deixar de admitir que, de fato, para os contratos visando obra certa, essas exigências legais têm apenas o objetivo de evitar a prorrogação indefinida ou abusiva dos contratos, sem responsabilização de alguma das partes. Na disciplina da Lei 8.666/1993, o contrato administrativo há de produzir efeitos a partir de sua celebração, vedada, entre outras práticas, a de suspender prazos de execução sob alegação de falta de recursos sem qualquer responsabilização dos agentes administrativos.

Nessa linha, se extinto o prazo sem o objeto contratual finalizado, deve ser realizado novo contrato, e não sua prorrogação.

Nessa esteira são os escritos do saudoso Hely Lopes Meirelles:

“A extinção do contrato pelo término de seu prazo é a regra nos ajustes por tempo determinado. (...)

O prazo é de eficácia do negócio jurídico contratado, e, assim sendo, expirado o prazo, extingue-se o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público ou na simples locação de coisa por tempo determinado. Há, portanto, prazo de execução e prazo extintivo do contrato. Neste último caso, a expiração do prazo de vigência, sem prorrogação, opera de pleno direito a extinção do ajuste, exigindo novo contrato para continuação das obras, serviços ou compras anteriormente contratados. O contrato extinto não se prorroga, nem se renova: é refeito e formalizado em novo instrumento, inteiramente desvinculado do anterior.” (g. n.)

Por conseguinte, deve o administrador público tomar as cautelas necessárias com a realização dos negócios da administração pública, pois esta a atividade administrativa sujeita a demora no tramite de seus processos, o que justifica a recorrente necessidade de fiscalização e gestão responsável.

Por fim, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Contas Federal, é dever do administrador público evitar aditamentos e prorrogações indefinidas ou abusivas, ainda que o prazo nos contratos de escopo tenha um caráter meramente moratório. O respeito aos prazos contratuais vai de acordo com o interesse coletivo.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme abordado ao longo deste trabalho, vimos que a administração pública, quando celebra ajustes com particulares, se vale do contrato administrativo.

Verificamos assim, seu conceito, princípios aplicáveis, sua vigência, além da diferenciação entre contrato de prazo de contrato de escopo.

Podemos pontuar, com base no principio constitucional da eficiência, que em ambos os ajustes (de prazo e de escopo), torna-se imprescindível a observância de seu prazo de vigência, sob pena de extinção.

Inclusive, essa é uma visão que se coaduna com a administração do tipo gerencial inaugurada com o Decreto-lei nº 200/67 e inserida na Constituição atual com a Emenda 19/98.

Por seu turno, a Lei de Responsabilidade Fiscal, grande avanço em matéria de responsabilidade fiscal e infelizmente ainda muito descumprida, especialmente nessa época de crise financeira mundial, prescreve constituir a responsabilidade na gestão fiscal de ações planejadas, as quais englobam o correto cumprimento de prazos, em especial nos contratos administrativos.

Por outro lado, a Corte de Contas Federal possui entendimento acerca da necessidade de prorrogação tempestiva dos acordos administrativos, a fim de se evitar a prorrogação indefinida ou abusiva dos contratos, sem responsabilização de alguma das partes, de forma ainda que o tempo não comprometa as condições originais da avença.

Noutra quadra, a Procuradoria Jurídica da União possui entendimento no sentido de ser obrigação do advogado público federal, nos processos de prorrogação de prazo, analisar se não houve a extrapolação do atual prazo de vigência, bem como eventual ocorrência de solução de continuidade nos aditivos precedentes.

Ademais, a própria Lei Federal nº 8.666/93 veda a existência de contratos administrativos com prazo indeterminado. A novel lei de licitações permite a existência de contratos por prazo indeterminado na hipótese em que a administração seja usuária de serviço público oferecido em regime de monopólio (art. 109), situação já defendida pela doutrina administrativista.

Nesse espírito, não merece prosperar a doutrina que advoga a tese de que a fixação do prazo é relevante apenas para que a Administração possa exigir do particular executante um mínimo de eficiência e celeridade necessário para a satisfação do interesse público, porque contraria ao princípio constitucional da eficiência.

Nesse diapasão, ambas as espécies de contrato, de prazo e de escopo, deverão obedecer aos prazos dispostos em seu texto, sob pena de comprometimento das condições originais de avença, verbi gratia, com a ocorrência de sucessivos reajustes ou repactuações, além de aditamentos baseados na modificação do projeto ou das especificações e em decorrência de acréscimo de seu objeto.

Entretanto, infelizmente, a Lei Federal nº 14.133/2021 estabeleceu, sem seu artigo 111, que na contratação que previr a conclusão de escopo predefinido, o prazo de vigência será automaticamente prorrogado quando seu objeto não for concluído no período firmado no contrato, em sentido diametralmente oposto ao defendido neste trabalho.

Nada obstante, é dever do administrador público agir com responsabilidade e eficiência no trato da coisa pública, respeitando especialmente os prazos contratuais, sob pena de subversão do Estado Constitucional de Direito estreado em 1988.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MEIRELLES, Hely Lopes. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

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Notas

[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 2014, p. 468.

[2] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Administrativo. 2011, p. 482

[3] MARINELA, Fernanda. BOLZAN, Fabrício. (Org.). Direito Administrativo: Licitações e Contratos. 2012, pg. 32.

[4] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. op. cit. 2011, p. 39.

[5] MARINELA, Fernanda. BOLZAN, Fabrício. (Org.). op. cit. 2012, pg. 33.

[6] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

[7] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2012, p. 866.

[8] BALTAR NETO, Fernando Ferreira; TORRES, Ronny Charles Lopes de. Direito Administrativo. 2014, pg. 62.

[9] AGU. Orientação Normativa nº 36. Advocacia Geral da União. 13 de dezembro de 2011. Disponível em: <https://www.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/418797>. Acesso em: 20 dez. 15.

[10] CNJ - SÚMULA 191 - TCU. Conselho Nacional de Justiça. 26 de outubro de 1982. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/sobre-o-cnj/composicao/626-gestao-planejamento-e-pesquisa/controle-interno/sumulas/18302-sumula-191-tcu>. Acesso em: 21. dez 2015.

[11] Tribunal de Contas da União. LICITAÇÕES & CONTRATOS: Orientação e Jurisprudência do TCU. 2010. Disponível em: <https://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2057620.PDF>. Acesso em: 22 dez. 2015. pg. 772.

[12] AGU. Orientação Normativa nº 3. Advocacia Geral da União. 01 de abril 2009. Disponível em: <https://www.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/189164>. Acesso em: 20 dez. 15.

[13] JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit.. 2012, p. 829.

[14] MAZZOCO, Carlos Fernando. Duração do Contrato Administrativo. Portal e-gov. Disponível em: <https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/19885-19886-1-PB.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2015.

[15] TORRES, Ronny Charles Lopes de. Leis de Licitações Públicas comentadas. 2013, pg. 504.

[16] BRASIL. Tribunal de Contas da União. RELATÓRIO DE AUDITORIA. OBJETO DE CONTRATO CONFIGURANDO DESVIO DE FINALIDADE. TREINAMENTO DE EMPREGADOS DE CONCESSIONÁRIAS DE ÁREAS DE AEROSHOPPING. CELEBRAÇÃO DE ADITIVOS QUANDO O CONTRATO ENCONTRAVA-SE EXTINTO. ADITIVOS CONTRATUAIS COM EFEITO RETROATIVO. CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS COM EFEITO RETROATIVO. RELEIÇÃO DAS RAZÕES DE JUSTIFICATIVA. MULTA. PEDIDO DE REEXAME. ALEGAÇÕES RECURSAIS SUFICIENTES A ENSEJAR A REFORMA DO ACÓRDÃO COMBATIDO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO. APROVEITAMENTO DAS ALEGAÇÕES RECURSAIS PARA OUTROS RESPONSÁVEIS. COMUNICAÇÃO. Acórdão: 3131/2010 - Plenário. Relator Ministro Augusto Nardes. 24 de novembro de 2010. Tribunal de Contas da União. Disponível em: < https://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20150818/AC_1997_32_15_P.doc >. Acesso em: 23 dez. 2015.

[17] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 2006, p. 245.

Sobre o autor
Celso Bruno Abdalla Tormena

Criminólogo e Mestrando em Direito. Procurador Municipal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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