O Projeto de Lei de Alteração do ITCMD Paulista

11/05/2020 às 16:52
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Primeiras Impressões sobre o Projeto de Lei Estadual 250/2020 que altera o ITCMD no Estado de São Paulo

O Projeto de Alteração da Legislação Paulista do ITCMD. 1. Em 16/04/2020 os deputados estaduais Paulo Fiorilo e José Américo apresentaram à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo o Projeto de Lei nº 250/2020, o qual Altera a Lei Estadual nº 10.705, de 28 de dezembro de 2000, que dispõe sobre o Imposto sobre a Transmissão "Causa Mortis" e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD. 2. O referido projeto foi publicado no Diário da Assembléia de 17/04/2020, tramitando pelo regime ordinário, ou seja, o regime de tramitação comum sem urgência ou prioridade, encontrando-se, ainda, em fase inicial de discussão e deliberação. 3. Além da tramitação ordinária, trata-se de um projeto que contempla a majoração de tributo, motivo pelo qual há de ser observado o Princípio da Anterioridade Anual e Nonagesimal, conforme o disposto no artigo 150, inciso III, alíneas “b” e “c” da Constituição Federal. Aliás, neste sentido é o próprio teor do artigo 4º do projeto de lei ora em análise. 4. Sendo assim, as alterações no ITCMD propostas apenas entrarão em vigor, no mínimo, em 01/01/2021, no caso de a lei aprovada ser publicada no Diário Oficial do Estado com 90 dias de antecedência, ou seja, até 03/10/2020. 5. Além disso, há de se ressaltar o Princípio da Irretroatividade, estabelecido no artigo 150, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, ou seja, a nova lei apenas será aplicada às doações concretizadas e às sucessões abertas a partir da data do início de sua vigência. 6. Portanto, nada justifica o pânico espalhado pela mídia diante da apresentação deste projeto de lei, já que se trata de projeto em tramitação ordinária com a observância das regras da anterioridade e da irretroatividade, havendo tempo suficiente para discussão e debate, assim como para as lícitas providências de planejamento tributário e sucessório. 7. Contudo, há de se atentar para as incongruências do projeto apresentado, tanto no que se refere aos seus objetivos, assim como em relação ao seu conteúdo. 8. Primeiramente, há de se considerar a ementa do projeto de lei apresentado, segundo a qual o projeto visa a mitigação dos efeitos da pandemia do novo coronavírus - COVID 19 no âmbito do Estado de São Paulo. 9. De acordo com a justificativa do projeto de lei, os deputados autores arguem que estamos em um momento em que o Estado precisa apoiar as pessoas mais vulneráveis e carentes, tanto no socorro sanitário às vítimas da pandemia do coronavírus como no apoio financeiro àqueles cuja renda cessou em virtude das medidas de isolamento social, sendo assim necessário o aumento da arrecadação a ser destinada à área da saúde pública. 10. Não obstante as nobres razões apresentadas pelos deputados, a questão da mitigação dos efeitos da pandemia do coronavirus – COVID 19 é de natureza excepcional e temporária, ainda que perdure por longo período, não justificando uma majoração de tributo permanente, na forma como proposta. 11. Neste sentido, a proposta padece de justificativa plausível, ultrajando os princípios gerais do direito da razoabilidade e proporcionalidade, já que para uma situação temporária e excepcional impõe uma medida permanente de majoração tributária, e, onera ainda mais o exercício de um direito fundamental de âmbito constitucional, ou seja, o direito à herança. 12. Enfim, o projeto estabelece a progressividade das alíquotas do ITCMD, no intervalo entre 4% a 8% sobre a base de cálculo estipulada, o que não se trata de novidade, pois vários Estados da Federação Brasileira já adotam inclusive a alíquota máxima de 8%, perfeitamente estipulada na Resolução nº 9/1992 do Senado Federal, resolução esta a qual também prevê que as alíquotas poderão ser progressivas, em função do quinhão que cada herdeiro efetivamente receber, nos termos da Constituição Federal. 13. Destaca-se que o artigo 145, § 1º, da Constituição Federal determina que, sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados de acordo com a capacidade econômica do contribuinte. 14. Discute-se a possibilidade de um imposto de natureza real, ou seja, incidente sobre bens e patrimônio sem levar em consideração condições particulares do contribuinte, ter alíquotas progressivas, ou se apenas poderiam ser progressivas as alíquotas de impostos pessoais, como o imposto de renda, por exemplo. 15. No que se refere ao IPTU e ao ITBI, o Supremo Tribunal Federal já decidiu pela inconstitucionalidade do estabelecimento de alíquotas progressivas. Destaca-se a Súmula nº 656 do E. STF: ”É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o Imposto de Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel.” 16. Porém, no que se refere ao ITCMD, o Supremo Tribunal Federal analisou a questão alterando seu entendimento, em acórdão relatado pela Eminente Ministra Dra. Carmen Lucia, de 06/02/2013, com repercussão geral, nos autos do Recurso Extraordinário nº 562.045-RS, cuja ementa é abaixo transcrita: EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. LEI ESTADUAL: PROGRESSIVIDADE DE ALÍQUOTA DE IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE BENS E DIREITOS. CONSTITUCIONALIDADE. ART. 145, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRINCÍPIO DA IGUALDADE. MATERIAL TRIBUTÁRIA. OBSERVÂNCIA DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. 17. No referido caso, foi declarada a constitucionalidade, sob o prisma do artigo 145, § 1º, da Constituição Federal, com repercussão geral, do artigo o art. 18 da Lei do Estado do Rio Grande do Sul nº 8.821/1989, que instituiu um sistema progressivo de alíquotas para o ITCMD. 18. Também o E. STJ, em julgamento de 18/12/2019, relatado pelo Eminente Ministro Dr. Francisco Falcão, no julgamento do RESP nº 1583659-RS, fundamentou-se no acima mencionado julgado do E. STF para também manter a progressividade da alíquota do ITCMD prevista na legislação tributária gaúcha. 19. No entanto, no meu ponto de vista pessoal a questão permanece no que se refere às doações, pois a Resolução do Senado Federal nº 9/92 dispõe sobre a possibilidade de alíquotas progressivas em função do quinhão que cada herdeiro efetivamente receber, ou seja, trata da hipótese de sucessão causa mortis e não de doações inter vivos, sendo que o E. STF não analisou a matéria sob este prisma e fundamento. 20. Por outro lado, o projeto não apenas majora o tributo ao estabelecer a progressividade das alíquotas, mas também amplia o limite de isenção tributária, no que deve ser aplaudido, embora mantenha o limite atual da isenção para doações, ou seja, 2.500 UFESP. 21. Neste sentido, o atual limite de isenção para a hipótese de imóvel de natureza residencial, urbano ou rural, deixado pelo autor da herança, no qual os herdeiros residem ou caso não possuam outro imóvel, dobra, passando de 5.000 UFESP para 10.000 UFESP. 22. O limite de isenção para a hipótese de um único imóvel deixado passa de 2.500 UFESP para 4.000 UFESP. O limite de isenção para depósitos bancários e aplicações financeiras passa de 1.000 UFESP para 1.800 UFESP. O limite de isenção para ferramentas, equipamentos agrícolas de uso manual, roupas, aparelho de uso doméstico e demais bens móveis de pequeno valor passa de 1.500 UFESP para 4.000 UFESP. 23. O projeto também isenta o ITCMD quando ocorre a extinção do usufruto, isenção esta também prevista na atual legislação apenas para a hipótese de extinção por falecimento do instituidor do usufruto. Depreende-se, portanto, que a isenção ocorre em todas as hipóteses de extinção do usufruto. 24. Porém, no que se refere à base de cálculo do ITCMD nas doações, houve alteração pelo projeto de lei ora abordado. Assim nas doações com reserva de usufruto a base de cálculo que era de ⅔ do valor do bem passa a ser o valor integral do bem. 25. Ademais, na transmissão da nua-propriedade, atualmente, a base de cálculo corresponde ao montante de ⅔ do valor do bem em qualquer hipótese. Com o projeto, passa a haver uma distinção, se o donatário não tiver sido o último titular do domínio pleno fica mantida a base de cálculo em ⅔, mas se o transmitente for o último titular do domínio pleno, a base de cálculo passa a ser o valor integral do bem. 26. Diante de todo o exposto, entendemos que, embora seja justa, necessária e esperada a ampliação do limite de isenção do ITCMD proposta no projeto de lei estadual nº 250/2020, não é adequado, razoável e proporcional, o estabelecimento permanente da progressividade de alíquotas do ITCMD com o propósito expresso, conforme a ementa e a justificativa da proposta, de atender a uma situação excepcional e temporária qual seja a mitigação dos efeitos da pandemia do coronavirus – covid 19, sem embargo da nobreza do propósito. AA. Bassim Chakur Filho, OAB/SP 106.309, advogado e Presidente da Comissão de Direito das Sucessões da OAB – Jabaquara/Saúde.

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