IRPF - ilegitimidade da tributação majorada de aposentadorias e pensões de brasileiros residentes no exterior

12/05/2020 às 14:33
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Vários precedentes judiciais já reconheceram a inconstitucionalidade da tributação mais gravosa dos rendimentos de aposentadoria e pensão de brasileiros que foram morar em outro país.

Inúmeras decisões já foram proferidas pelo Judiciário no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade do art. 7º da Lei nº 9.779/99, com a redação conferida pela Lei nº 13.315/16, que estabeleceu um regime novo e específico de tributação pelo IRPF para os rendimentos de aposentadoria e pensão de brasileiros residentes no exterior, resultando em exigência mais gravosa, com grande aumento da exação fiscal.

A norma em questão vigora desde 01/01/2017 e determina a tributação dos rendimentos da inatividade - aposentadoria e pensão - percebidos por brasileiros que moram no exterior mediante a desconsideração das alíquotas escalonadas e da faixa de isenção da tabela progressiva mensal do IRPF prevista na Lei nº 11.482/07, a qual é aplicada para a tributação dos brasileiros residentes no Brasil.

Com efeito, a Lei nº 13.315/16, ao alterar a redação do art. 7º da Lei nº 9.779/99, impôs a utilização da alíquota única e majorada de 25% para fins de apuração do IRPF sobre a totalidade desses rendimentos.

A União Federal - Fazenda Nacional, por intermédio da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, confere aplicação ao dispositivo, determinando que as fontes pagadoras de aposentadorias e pensões, inclusive o INSS, na qualidade de responsáveis tributários, procedam à retenção mais gravosa do IRPF para os aposentados e pensionistas que foram morar em outro país.

Ocorre que tal retenção sobre a integralidade dos rendimentos de aposentadoria e pensão e com alíquota majorada de 25%, justificada na mera circunstância da residência no exterior, viola valores, princípios e regras da Constituição Federal, sendo, pois, ilegítima.

Destarte, os aposentados e pensionistas estão questionando judicialmente a tributação a maior e obtendo decisões favoráveis, com o afastamento da regra específica da Lei nº 13.315/16, por sua inconstitucionalidade, e a determinação da aplicação da sistemática normal de tributação, pautada na tabela progressiva mensal da Lei nº 11.482/07.

Entendem os magistrados que a norma de tributação mais gravosa afronta os princípios constitucionais da igualdade/isonomia tributária, da capacidade contributiva e do não confisco, consagrados nos arts. 5º, “caput”, 145, § 1º, 150, incs. II e IV, da Carta Magna.

Isso porque não existe um critério lógico, razoável, proporcional e relevante de discriminação a autorizar a tributação majorada instituída pela Lei nº 13.315/16. E, por força constitucional, é de todo vedado o tratamento diferenciado a contribuintes que estejam em situações equivalentes, salvo quando haja justificativa pertinente e juridicamente legítima. Isto é, são descabidas discriminações arbitrárias.

A circunstância de residir ou não no Brasil não resulta em diferentes situações tributárias. Tratam-se, em ambos os casos, de brasileiros aposentados e pensionistas com uma mesma fonte de renda, o RGPS/INSS. E o fato da obtenção do benefício previdenciário junto ao Regime Geral de Previdência Social significa que houve labor e contribuição em território nacional pelo tempo mínimo necessário, seja pelo aposentado, seja pelo instituidor da pensão, que, certamente, contribuiu para o crescimento do País, o sistema previdenciário e a concretização da função social do trabalho.

Além disso, os contribuintes diferenciados pela norma em análise encontram-se em um mesmo patamar econômico. Residir no exterior não muda o histórico do contribuinte nem o seu padrão de renda, mantendo-se a mesma capacidade econômica. Aliás, para os aposentados e pensionistas que passam a morar fora do Brasil, esta capacidade sofre considerável redução, como decorrência do câmbio desfavorável.

Morar no exterior, definitivamente, não é justo motivo para que os aposentados e pensionistas brasileiros passem a ser taxados de forma mais pesada. Daí resulta a configuração de verdadeira medida de penalização.

Deveras, dada a natureza do IRPF, somente é legítima a sua incidência diferenciada quando o critério de discrímen estiver fundamentado na capacidade contributiva ou em qualquer um dos elementos da sua hipótese de incidência.

É que vige no Sistema Tributário Nacional o princípio da capacidade contributiva, de acordo com o qual cada um deve arcar com a tributação via impostos na exata medida da sua possibilidade. Ou seja, em se tratando da cobrança de imposto, a exemplo do IRPF, o único critério válido de gradação reside na condição econômica do contribuinte.

O instrumento de concretização da capacidade contributiva é a progressividade, consagrada no art. 153, § 2º, inc. I, da Constituição Federal, traduzindo técnica de incidência de alíquotas variadas, cuja majoração dá-se na medida em que aumenta a base de cálculo do imposto. Por isso, a progressividade foi alocada pelo constituinte como critério de mensuração do Imposto de Renda e as alíquotas progressivas do IRPF encontram-se fixadas na tabela da Lei nº 11.482/07.

Também a previsão de faixa de isenção a ser deduzida da base de cálculo é uma expressão da capacidade contributiva e da técnica da progressividade.

Resta evidente, portanto, que a exigência do IRPF dos brasileiros aposentados e pensionistas residentes no exterior com a alíquota única e majorada de 25% colide com o princípio da capacidade contributiva e o caráter progressivo do Imposto de Renda, constituindo cobrança ilegítima.

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O tratamento diferenciado apenas se justifica no fato de o contribuinte possuir maior ou menor renda, não guardando qualquer pertinência com a circunstância de o aposentado ou pensionista passar a viver no exterior. O simples fato de o contribuinte morar fora do Brasil não traduz, por si só, qualquer circunstância juridicamente relevante para fins de tributação diferenciada dos seus rendimentos da inatividade.

O uso do art. 7º da Lei nº 9.779/99, com a redação da Lei nº 13.315/16, gera tratamento diferente para condições contributivas idênticas, sujeitando a maior taxação contribuintes que percebem iguais rendimentos, de modo a se caracterizar confisco tributário.

Outrossim, o regime diferenciado em questão viola três fundamentos da República Federativa do Brasil, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, consagrados no art. 1º, incs. II, III e IV, da Constituição Federal.

Há precedentes favoráveis aos aposentados e pensionistas no âmbito da Justiça Federal da 4ª Região, que exerce jurisdição sobre Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, especialmente dos magistrados dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, inclusive das Turmas Recursais, com a ordem para que os brasileiros que moram no exterior sofram a mesma tributação dos brasileiros que permanecem no Brasil.

Nesse cenário, os brasileiros aposentados e pensionistas residentes no exterior podem ingressar com ação judicial para afastar a tributação majorada dos seus rendimentos da inatividade, reaver as quantias já retidas de forma indevida nos últimos cinco anos e obter liminar para a cessação imediata da retenção a maior.

Sobre a autora
Lucianne Coimbra Klein

* Consultora e Advogada Tributário e Cível inscrita na OAB/SC sob o nº 22.376, graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC no ano de 2006. * Pós-Graduada em Direito Tributário pela UNIDERP no ano de 2009. * Conta com mais de 15 anos de atuação efetiva em consultoria e advocacia no ramo do Direito Tributário, militando nas esferas federal, estadual e municipal e no campo aduaneiro, e no ramo do Direito Civil, especialmente nas áreas empresarial, societária e de inventários judiciais e extrajudiciais. * Experiente no campo da tributação de operações com criptoativos, a exemplo das criptomoedas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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