1. INTRODUÇÃO
É imperioso destacar, no início deste trabalho que o tempo e o direito estão intimamente conectados. Com o decorrer do tempo, ocorre tanto aquisição de direitos (prescrição aquisitiva), assim como também a extinção da pretensão jurídica (prescrição extintiva)2.
Nesta esteira, a prescrição intercorrente é um típico exemplo de extinção da pretensão jurídica pelo decorrer do tempo. Cumpre, neste momento, ressaltar que a prescrição é um dos pilares fundamentais da segurança jurídica em nosso ordenamento pátrio buscando combater a eternização dos processos executórios e a visando a celeridade processual, duas questões de extrema importância e que, mesmo após advento do novo código de processo civil, ainda não foram dirimidas.
O NCPC trouxe uma proposta central que propunha simplificar os processos “lato senso” a fim de torná-los mais céleres e eficazes, por obvio celeridade nos processos executórios é algo extremamente debatido pois trata-se da efetivação do direito decorrente da tutela de conhecimento, ou seja a efetividade da tutela de conhecimento depende intrinsecamente da fase executória.
Nas palavras do ilustre Flavio Tartuce, "se o titular do direito permanecer inerte, tem como pena a perda da pretensão que teria por via judicial. Repise-se que a prescrição constitui um benefício a favor do devedor, pela aplicação da regra de que o direito não socorre aos que dormem, diante da necessidade do mínimo de segurança jurídica nas relações negociais.”
Porém, aplicar a prescrição intercorrente, não é questão de defesa do executado e sim meio pelo qual se visa garantir segurança jurídica ao ordenamento pátrio. Pondo fim às execuções infindáveis, vez que a suspensão indefinida do processo acarreta na perpetuidade das execuções e consequente insegurança jurídica4.
Ademais por meio deste trabalho cumpre demonstrar a importância de facilitar a configuração do instituto com o intuito de acabar com inúmeras execuções infrutíferas que se tornam infindáveis que por obvio só desgastam o judiciário dado o fato de que claramente não será efetiva.
2. CONCEITO DE PRESCRIÇÃO
Com o objetivo de compreender a origem do instituto processual, se faz necessário fazer algumas considerações acerca do conceito de prescrição em sentido amplo, e sobre o tema o ilustre professor Sílvio de Salvo Venosa refere a prescrição extintiva, prescrição propriamente dita, leva diretamente à perda da pretensão de agir por seu titular negligente, ao fim de certo lapso de tempo, e pode ser encarada como uma força destrutiva.5
A prescrição dentro do âmbito civil pode ser dividia em três grandes ramos, sendo eles, a prescrição da pretensão do direito em si, que concerne ao processo de conhecimento, a prescrição do direito de ingressar com a demanda, e a prescrição intercorrente, objeto de nosso estudo.
De início cumpre inaugurar este tópico citando o grande autor Orlando Gomes que definiu com maestria o conceito, Orlando Gomes define a prescrição “lato sensu” como "o modo pelo qual um direito se extingue em virtude da inércia, durante certo lapso de tempo, do seu titular, que, em consequência, fica sem ação para assegurá-lo".6
Em um primeiro momento cumpre inaugurar esta etapa realizando uma análise à prescrição da pretensão “lato senso”. Ao fazermos a leitura do art. 189. do código civil de 2002 se depreende que o dispositivo legal, acima referido, é extremamente simples e claro ao estabelecer que violado direito, adquire-se uma pretensão e esta pretensão se extingui com a prescrição sobre o referido artigo o autor Nelson Nery refere que a prescrição é causa extintiva da pretensão de direito material pelo seu não exercício no prazo estipulado pela lei.
Segue o entendimento do ilustre professor Nelson Nery:
(...) O texto da lei é claro ao dar como objeto da prescrição a pretensão de direito material e não a ação, de modo que a classificação e a conceituação de prescrição e decadência apresentadas por Câmara Leal, restaram superadas pelo direito positivo vigente. É bom lembrar que o direito brasileiro, pelo que se depreende do teor do CC 189, acolhe a teoria da actio nata, segundo a qual o dies a quo da prescrição da pretensão se inicia quando da violação do direito subjetivo.8
Ainda sobre o tema cumpre ressaltar o entendimento de Fiuza sobre a origem do conceito de pretensão adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro que segundo o referido autor é um desdobramento do conceito de pretensão adotado pela doutrina alemã, com raízes no século XIX, quando fora promulgado o Código Civil Alemão. Nessa época, como dito, ao Direito Processual não se outorgava a autonomia e a independência dos dias atuais. E por conta disso tentando adequar o instituto aos dois ramos do Direito (o Civil e o Processual Civil) que o novo Código absteve-se de se referir à prescrição da ação, passando a referir-se à prescrição da pretensão. Introduzindo a ideia de que a prescrição seja a extinção da pretensão, pretensão definida aos moldes do Direito Alemão oitocentista, como o poder de submeter o devedor inadimplente.9
Quanto a prescrição da pretensão executória, a prescrição de efetivar aquilo que foi concedido na fase de conhecimento nos deparamos com o art. 523. do CPC que de certo modo convalida o princípio da inércia do judiciário, nos termos em que afirma que "o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente". Deste modo, é interesse do exequente tomar a iniciativa para propor o início da fase executória de satisfazer o direito que lhe foi garantido na fase de conhecimento. Prescreve, no mesmo lapso temporal do prazo para ingressar com ação, nos termos da súmula 150 do STF, a pretensão de exigir aquilo que lhe foi concedido.
2.1. Conceito de prescrição intercorrente
Destarte cumpre inaugurar a este tópico citando o ilustre mestre Artur Torres que refere em sua obra a prescrição intercorrente como um dos temas mais importantes no que tange ao processo executório, “O Art. 921. trata, segundo pensamos, de um dos mais importantes ( e espinhosos ) temas inerentes á tutela executiva: a prescrição intercorrente”.
Nas palavras do ilustre professor Marinoni a prescrição intercorrente é aquela que ocorre durante o decorrer do processo e, não antes de seu inicio, como ocorre com a prescrição tradicional. A rigor não se trata de prescrição em si já que sua caracterização só ocorre durante o processo e, isto, impede sua caracterização como extinção de uma nova pretensão, tratando- se, portanto, de uma figura anômala mais parecida com a perempção ou com a preclusão do que com a prescrição de fato, que realiza a extinção do processo pela ausência de ação da parte.11
Nesta mesma esteira Alice Monteiro de Barros em sua obra voltada para o direito do trabalho ensina que a prescrição intercorrente é a que se verifica “durante a tramitação do feito na Justiça, paralisado por negligência do autor na prática de atos de sua responsabilidade”[12 ]
O estabelecimento da prescrição intercorrente é a legitima deflagração do desinteresse processual no curso dos processos executórios. Nas palavras do ilustre professor Daniel Amorim Assumpção neves a prescrição intercorrente é a prescrição contada durante a execução, tanto no processo autônomo como no cumprimento de sentença, dependendo da desídia do exequente na localização dos bens do executado13.
Carlos Roberto Gonçalves retrata a prescrição intercorrente como a prescrição que ocorre quando o Autor diante de um processo já iniciado permanece inerte, de forma continua e sem interrupção, durante tempo suficiente para perder sua pretensão. Quando interrompida a prescrição o prazo voltará a fluir normalmente do último ato do processo ou do próprio ato que a interrompeu (a citação válida, v.g.), devendo o processo ser impulsionado pelo autor.14
Ainda neste mesmo sentido o nobre mestre Humberto Theodoro Junior cita que:
A prescrição intercorrente justifica-se pelo argumento de que a eternização das execuções é incompatível com a garantia constitucional de duração razoável do processo e de observância de tramitação conducente á rápida solução dos litígios (CF, art. 5º LXXVIII). Tampouco, se pode admitir que a inércia do exequente , qualquer que seja sua causa, redunde em tornar imprescritível uma obrigação patrimonial. O sistema de prescrição adotado pelo nosso ordenamento jurídico, é incompatível com pretensões obrigacionais imprescritíveis. Nem mesmo se subordina a prescrição civil a algum tipo de culpa por parte do credor na determinação de inércia no exercício da pretensão. A prescrição, salvo nos casos legais de suspensão e interrupção, flui objetivamente pelo simples decurso do tempo.15
Ou seja, ao que tange à prescrição intercorrente parece ser unanime entre os doutrinadores citados que a prescrição intercorrente trata-se de um dispositivo hibrido habilitado juridicamente, disposto no ordenamento pátrio, hábil e capaz de fiscalizar a duração dos processos executórios, sejam eles trabalhistas cíveis, penais ou ate mesmo fiscais, trazendo um ônus real ao exequente seja ele quem for em caso de inatividade.
3.1. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE E OS PRINCIPIOS DO PROCESSO CIVIL
Quando falamos em execução falamos obrigatoriamente em satisfatividade, pois executar implica aplicar a justiça, onde a prescrição intercorrente é um mecanismo limitador do direito de executar caucado no princípio constitucional da razoável duração do processo, princípio acrescentado pela emenda 45 de 2004/CF.
É direito do Autor requerer aquilo que lhe foi garantido na fase cognitiva. Ocorre que pela vigência do princípio da utilidade17, bem como o da segurança jurídica, a prescrição intercorrente vem para limitar a duração de execuções que claramente terminarão por ser infrutíferas.
Nesta esteira cumpre, neste momento, fazer uma breve relação dos princípios constitucionais fundantes do direito processual para com a prescrição intercorrente.
Sobre os princípios constitucionais Cassio Scarpinella Bueno18, refere que os princípios constitucionais se ocupam especificamente com a conformação do próprio direito, assim compreendido como o método de exercício da função jurisdicional, sendo eles que fornecem as diretrizes do modo de ser, do dever ser, processual sob a perspectiva constitucional.
O primeiro princípio processual constitucional que concerne intimamente à prescrição intercorrente é o princípio da duração razoável do processo, mais conhecido como eficiência processual. Neste sentido Daniel Amorim Assumpção Neves aduz que a duração razoável do processo não se confunde com a celeridade processual, sendo correto considerar que o processo pode não ser célere, mas deve demorar o tempo estritamente necessário para entrega da prestação jurisdicional. Com intuito de auferir eventual demora excessiva considerar-se-á a complexidade da causa, postura dos litigantes e de seus patronos, bem como a estrutura e volume de trabalho do órgão jurisdicional19.
Nesta definição clara do princípio se verifica que a prescrição intercorrente está instituída dentro do sub quesito verificador da demora excessiva denominado pelo autor supra referido como “postura dos litigantes”. A postura do exequente é o fator primordial fundador do princípio da prescrição intercorrente, o deixar de agir deflagra seu desinteresse processual, sendo completamente descabido o estado manter um processo em que o principal interessado, o exequente, não demonstra interesse de agir.
De outro modo temos o princípio da efetividade do processo que, em síntese, volta-se para os resultados da tutela jurisdicional, sendo outro princípio que compõe os fundamentos fundadores da prescrição intercorrente. Segundo Cassio Scarpinella Bueno a efetividade do processo é medida pela sua capacidade de tornar real os direitos controvertidos, ameaçados ou lesionados. É o que na perspectiva do modelo constitucional é suficientemente alcançado pelo inciso LXXVIII do art. 5º da CF/88.18
A principal ponte que une o referido princípio ao instituto da prescrição intercorrente reside no fato de que no momento em que se verifica que o processo não será efetivo, e ainda o exequente não demonstra interesse na demanda executiva, não há mais motivo ensejador para que o processo siga tramitando. Manter um processo por tempo indeterminado nos escaninhos do judiciário acarretaria insegurança jurídica.
3.2. A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Em nosso ordenamento pátrio, até o advento da promulgação do novo Código de Processo Civil, a prescrição intercorrente só estava devidamente positivada nas execuções fiscais. No processo de execução cível o instituto já era referido, mas embasado apenas por meio de entendimentos jurisprudenciais e doutrinários.
O código processual de 1973 foi omisso em relação à prescrição intercorrente tendo somente sido instituída no ordenamento jurídico pátrio a partir de 1980 com a promulgação da lei de execuções fiscais o dispositivo, por meio do Art. 40. da LEF, e, com o passar do tempo, veio vagarosamente ganhando espaço no âmbito cível a partir da ideia central de segurança jurídica.
A omissão do código processual de 1973 foi prontamente sanada com a promulgação do novo código processual em 2015. A prescrição intercorrente, hoje positivada pelo NCPC, é um instituto trazido da LEF onde sua aplicação já estava consolidada muito antes do advento do código de 2015, por meio do Art. 4020 da lei em comento. Nesta direção cumpre demonstrar o entendimento de Artur Torres, o referido autor aduz que a sistemática adotada pelo NCPC para as execuções cíveis stricto sensu é semelhante com a adotada pela LEF desde 1980, que serviu de base para a promulgação da súmula 31421 do STF22.
Segundo Araken de Assis:
O NCPC tratou expressamente da prescrição intercorrente, no inciso V, do art.921, 4. A falta de bens penhoráveis do executado e a inércia do exequente em exigir seu crédito, dão ensejo à suspensão da execução e, subsequentemente, à prescrição intercorrente. Caso transcorra o lapso temporal da prescrição correspondente à obrigação exequenda, extinguir-se-á a execução pela perda da pretensão deduzida em juízo pelo exequente (art. 924. v)23.
Ou seja, com advento do NCPC, o instituto da prescrição intercorrente fora devidamente positivado nas execuções cíveis por meio dos Arts. 921. e 924.
Pela leitura dos dispositivos referidos se observa que o legislador ao positivar o instituto da prescrição intercorrente no processo executório cível, se bastou em replicar o conceito já aplicado desde 1980 nas execuções fiscais não trazendo em seu escopo determinações essenciais tais como os marcos interruptivos e suspensivos que delimitariam a aplicação do instituto e consequentemente facilitariam sua aplicação em inúmeros processos infindáveis que seguem abarrotando as mesas do judiciário.
4. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE
Com a positivação do instituto da prescrição intercorrente no código de processo civil de 2015 ficou estabelecido por meio da inteligência do Art. 921. NCPC que dentro do prazo máximo de um ano não se localizando bens do devedor o processo será arquivado de ofício pelo julgador, e, ato contínuo tendo decorrido este prazo, a que se refere o §1º, sem que haja manifestação do exequente, inicia-se o prazo de contagem da prescrição intercorrente
Acerca do assunto Artur Torres entende que é relevante destacar que o conteúdo do Art. 921. § 1º disciplina a hipótese de suspensão do feito executivo aplicável ao cumprimento de sentença, marco inicial importantíssimo da prescrição intercorrente, porém não do prazo da prescrição intercorrente propriamente dita, visto que esta depende da apuração do prazo da prescrição executiva. Entretanto, em linhas gerais podemos concluir que no silêncio do exequente e transcorrido o prazo de prescrição acima referido, o julgador de ofício ou a requerimento, analisando o caso, decretar a prescrição intercorrente e ato contínuo, extinguir a execução.24
Neste sentido segue o entendimento de Daniel Assumpção Neves onde aduz que em paralelo o § 2º do Art. 921. prevê que decorrido o prazo máximo de um ano sem que haja localização de bens passiveis de penhora, os autos serão encaminhados para o arquivo, tratando-se de norma com interesse unicamente cartorial, que não influencia o termo inicial de contagem do prazo da prescrição intercorrente.25
Nesta mesma esteira Araken de Assis relata que o caso mais usual é o previsto no Art. 921, inciso III, do NCPC onde suspende-se a execução pelo prazo de um ano, inexistindo bens penhoráveis, não fluindo prazo prescricional nesse período de suspensão. Tendo fim este prazo do Art. 921. § 1º, começará a correr o prazo da prescrição intercorrente26.
Ou seja, em linhas gerais, o entendimento acerca da leitura do Art. 921. § 1º acima referido parece ser claro quanto ao termo inicial de contagem do prazo prescricional intercorrente, sintetizando os conceitos citados pelos autores supra referidos obtemos que o start inicial do prazo prescricional intercorrente seria o fim do prazo de suspensão de um ano que por sua vez se inicia com a não localização de bens ou impossibilidade de citação do executado.
Porém, resta cristalino que muitas dúvidas são suscitadas quando tratamos do marco inicial de fruição do prazo prescricional como exemplo temos a hipótese de aplicação do instituto aos processos que já estavam em tramitação anteriormente à vigência do NCPC.
Sobre o tema supracitado, recentemente, a 2ª seção do STJ concluiu o julgamento do IAC - Incidente de Assunção de Competência que versava sobre o cabimento da prescrição intercorrente e eventual necessidade de intimação prévia do credor e da necessidade de oportunizar ao credor dar andamento ao processo paralisado por prazo superior àquele previsto para a prescrição.
Diante deste julgamento foram aprovadas as teses propostas pelo relator Marco Aurélio Belizze que seguem in verbis:
1.1. Incide a prescrição intercorrente, nas causas regidas pelo CPC de 1973, quando o exequente permanece inerte por prazo superior ao de prescrição do direito material vindicado, conforme interpretação extraída do art. 202, parágrafo único, do Código Civil de 2002.
1.2. O termo inicial do prazo prescricional, na vigência do CPC/1973, conta-se do fim do prazo judicial de suspensão do processo ou, inexistindo prazo fixado, do transcurso de um ano (aplicação analógica do art. 40, § 2º, da Lei 6.830/80).
1.3. O termo inicial do art. 1.056. do CPC/2015 tem incidência apenas nas hipóteses em que o processo se encontrava suspenso na data da entrada em vigor da novel lei processual, uma vez que não se pode extrair interpretação que viabilize o reinício ou a reabertura de prazo prescricional ocorridos na vigência do revogado CPC/1973 (aplicação irretroativa da norma processual).
1.4. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, inclusive nas hipóteses de declaração de ofício da prescrição intercorrente, devendo o credor ser previamente intimado para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição.
No julgado estabeleceu-se então, a partir da tese 1.4 que, pelo princípio do contraditório, a intimação pessoal28 do credor, acerca da extinção de ofício, se faz necessária, e ainda quanto à contagem do prazo prescricional para os processos oriundos do CPC de 1973, vide tema 1.2, criou-se entendimento de que o termo inicial conta-se do fim do prazo judicial de suspenção do processo ou em caso de inexistência o transcurso de um ano.
Deve-se registrar que, a despeito do arquivamento do feito, poderá o autor, após localizar bens em nome do devedor passíveis de adimplir a dívida, peticionar requerendo o prosseguimento do feito (§ 3º). Desse modo, afirma-se que a efetividade (como verdadeiro mote da função jurisdicional executiva) permanece sobremaneira atendida.
Alcançado o prazo prescricional sem qualquer providência requerida pelo exequente, deverá o magistrado, suscitando a questão de ofício ou mediante requerimento da parte, reconhecer a ocorrência de prescrição intercorrente e determinar a extinção do processo executivo (§ 5º e artigo 924, V).
4.1. MARCOS INTERRUPTIVOS DO PRAZO PRESCRICIONAL
Acerca da leitura minuciosa do Art. 921 § 4º29 e ato contínuo, decorrido o prazo de que trata o § 1º sem manifestação do exequente, após o arquivamento sem baixa da se início ao prazo de fruição da prescrição intercorrente.
A partir da leitura do dispositivo em comento obtemos a determinação do termo inicial de contagem do prazo prescricional. Ocorre que no que tange às movimentações processuais que são realizadas posteriormente ao início da contagem do prazo prescricional e quais, respectivamente são hábeis a interromper30 ou eventualmente suspender31 a prescrição intercorrente. O código processual civil de 2015 foi omisso, produzindo, portanto, uma lacuna legislativa que se não adequadamente preenchida pelos atores do direito pode acabar por enfraquecer o instituto.
A necessidade de positivar quais atos são hábeis a interromper a prescrição intercorrente se faz extremamente necessária para evitar que o exequente unicamente realize movimentações processuais imprestáveis, movimentações com o único intuito de interromper ou suspender o curso da prescrição intercorrente, movimentações totalmente desprovidas de utilidade ou benefício ao processo executório.
Humberto Theodoro Júnior, sobre o tema, ressalta que o ato de prévia intimação do exequente ao decreto de prescrição intercorrente, já consumado, evidencia apenas o dever de obediência ao princípio do contraditório em seu aspecto contemporâneo conhecido como princípio da não surpresa, abrindo portanto oportunidade para o exequente alegar questões de contagem do prazo prescricional bem como alegar interrupções e suspensões ao prazo prescricional fato que poderia modificar a contagem do prazo prescricional em seu benefício.
Ou seja, a correta determinação dos movimentos processuais hábeis a interromper ou suspender o curso natural da prescrição se faz extremamente necessária tanto para possibilitar e efetivar de maneira clara instituto, tanto para fins de defesa por parte exequente na oportunização do contraditório.
No âmbito das execuções fiscais onde o conceito e aplicação da prescrição intercorrente já se encontra em fase muito mais madura, a determinação das movimentações processuais hábeis a interromper ou suspender o curso da prescrição também não foram enumeradas pela LEF. Como cita Marcelo Polo essas diretrizes foram determinadas ao longo do tempo por meio de construções jurisprudenciais e doutrinárias a partir da natureza do próprio instituto.
Seguindo o entendimento de Marcelo Polo, no âmbito das execuções fiscais a causa interruptiva própria do instituto seria o impulso efetivamente útil ao prosseguimento do processo executivo que se traduz, pelo conceito de utilidade efetiva, na concretização da citação do devedor ou efetiva penhora de bens, a mera diligencia não concretizada não configura marco interruptivo hábil a romper a fruição do prazo prescricional, sendo necessária sua efetivação, e, a partir daí os efeitos da interrupção retroagiriam à data do pedido. São ainda causas típicas de interrupção os atos do próprio executado, como sua entrada espontânea no processo ou ainda, nomeação de bens à penhora como exemplo prático.
Com a omissão legislativa acerca dos marcos interruptivos do dispositivo, da mesma maneira que no âmbito das execuções fiscais, a falta legislativa se supriu por meio de entendimentos doutrinários no âmbito executório cível, digamos “comum” certamente a mesma discussão logo surgirá e caberá aos atores do direito estabelecer por meio de entendimentos quais os marcos interruptivos ou ainda suspensivos do decurso de prazo prescricional.
5. Conclusão
Se faz necessário, destarte, elogiar o novo código processual que de forma expressa positivou o instituto da prescrição intercorrente que já vinha sendo aplicado por analogias e entendimentos jurisprudenciais, sendo questão relevante, o legislador deveria ter buscado melhorar a aplicação do instituto e não meramente replicar o conceito trazido do art. 40. da LEF que já vinha trazendo problemas e dúvidas quanto a sua aplicação.
A prescrição intercorrente é um instituto que tem como condão proteger o ordenamento jurídico da insegurança gerada pela perpetuação ad infinitum de causas onde o detentor de um direito já perdeu o interesse de efetivá-lo, ocorre que mesmo positivado por meio do Art. 924. inciso V o instituto ainda sofre resistência de aplicação e dúvidas acerca de seus limites temporais.
Como já explicitado, demonstrar os marcos temporais hábeis a suspender ou interromper o curso do prazo prescricional intercorrente são tarefas que do modo como o legislador positivou o instituto, vem gerando inúmeras questões de aplicação, assim como de maneira semelhante causam no âmbito das execuções fiscais.
Cumpre ainda, ressaltar que a aplicação do instituto é questão fundamental para livrar o judiciário de inúmeras ações que não trarão resultado. Postergar a duração dos processos ad infinitum, por mera persecução punitiva ao executado é legitimo atentado à segurança jurídica do ornamento pátrio.
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