SURGIMENTO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO E SUA APLICAÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA E BRASILEIRA

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A teoria desenvolvida por Günter Jakobs pautou-se, principalmente, na supressão ou relativização dos direitos e garantias fundamentais de acordo com os delitos praticados pelo agente e, mesmo criticada, é aplicada em vários países, inclusive o Brasil.

Resumo: A Teoria do Direito Penal do Inimigo remonta à época da Grécia Antiga, momento em que já havia uma conceituação prática de quem seriam os inimigos da sociedade, sendo atribuído um tratamento diferenciado em relação aos cidadãos. Assim, a teoria desenvolvida pelo alemão Günther Jakobs no século XX teve origens antigas e sua aplicação pautou-se, principalmente, na supressão ou relativização dos direitos e garantias fundamentais de acordo com os delitos praticados. Tal teoria foi criticada por muito tempo, e julgada até os dias atuais, porém, ressalta-se que mesmo em Estados Democráticos, o Direito Penal do Inimigo é empregado em diversos países, incluindo o Brasil, tanto de forma sutil, quanto de modo explícito. Dessa maneira, o tema em questão coloca em xeque os direitos e garantias individuais e coletivos e a segurança social na prevenção e punição de crimes mais gravosos.

 

INTRODUÇÃO

A teoria do jurista alemão Günter Jakobs, conhecida como “Direito Penal do Inimigo”, vêm tomando forma há mais de 30 anos e sendo espalhada ao redor do mundo, conquistando a atenção dos mais diversos juristas. É possível dizer que essa teoria possui como objetivo uma prática diferente do Direito Penal, a qual divide a população em dois conjuntos: “cidadãos” e “inimigos” do estado, e que o segundo grupo sofreria cerceamento de garantias processuais e de direitos inatos aos cidadãos.

A presente pesquisa busca compreender e listar diferentes aspectos e características desta teoria, compreendendo o seu surgimento, e como ela é utilizada na prática. Além disso, apresenta exemplos de como o Direito Penal do Inimigo foi aplicada em duas potências mundiais, bem como de que forma a teoria é empregada no âmbito do Direito Penal Brasileiro, principalmente na Lei 8.072/90, conhecida como Lei de Crimes Hediondos e na Constituição da República Federativa do Brasil.

 

RECUPERAÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO

A primeira pena que possui sua aplicação registrada está descrita na Bíblia, no livro de Gênesis em seu capítulo 3, versículo 8, o qual versa sobre a expulsão de Adão do paraíso por ter comido do fruto proibido, fazendo com que Deus se afastasse dos homens.

Desde os primórdios da humanidade o homem viola as regras de convivência social, ferindo as normas da coexistência coletiva, o que fatalmente causou a criação de um código de normas e condutas sociais. O Código de Hamurabi é conhecido como o mais antigo conjunto de leis, escrito por volta de 1.770 a.C, e carrega o nome do sexto rei da Babilônia, responsável pela criação da legislação que dispunha sobre assuntos ligados a relações de trabalho, família, propriedades, escravidão e de crimes.

A famosa “Lei de Talião” está descrita no Código, que consiste na reciprocidade do crime, podendo ser descrita pela célebre frase “Olho por olho, dente por dente”. Apesar de não mais refletir a realidade da sociedade, afinal, foi escrito há mais de 3.700 anos, o docuumento não pode deixar de ser considerado importante para a história e evolução do Direito como um todo.

Outra importante constituição para a história do Direito é a Grande Carta das liberdades ou concórdia entre o Rei João e os barões para a outorga das liberdades da Igreja e do reino inglês, também conhecida apenas como Magna Carta, assinada em 1215 pelo rei inglês João sem Terra. Foi considerada a primeira constituição escrita da Inglaterra, e tinha como objetivo garantir os direitos da população e limitar o poder inglês, servindo como inspiração para a criação de diversas outras constituições.

Talvez a mais famosa das constituições da história seja a Constituição Estadunidense de 1787, sendo, certamente, uma das mais importantes. Vigorando até hoje, a constituição norte-americana quebra um paradigma histórico, visto que foi resultado de um processo de emancipação das Treze Colônias após a vitória contra os ingleses na Guerra da Independência dos Estados Unidos.

Tal Carta-Magna foi inspirada nos pensamentos de liberdade, influenciados amplamente pelas ideias iluministas. Além disso, com o advento da constituição foi aberto um livre caminho para a autonomia dos estados, para que pudessem criar suas leis, e vale ressaltar que em mais de 200 anos de existência a constituição sofreu poucas – porem necessárias – modificações. Dentre as alterações pode-se destacar as leis que puseram fim à escravidão e a criação do voto feminino na década de 1920. Essas mudanças reforçam a ideia de que por mais estável que uma lei possa ser, Direito é algo mutável, e não estático. Como cita Coulanges:

Não está na natureza do direito ser absoluto e imutável. O direito modifica-se e evolui como qualquer obra humana. Cada sociedade tem seu direito, com ela se formando e se desenvolvendo, como ela se transformando e, enfim, com ela seguindo sempre a evolução de suas instituições, de seus costumes e de suas crenças. (1961, p. 211)

Da mesma forma, o Direito da Antiga Roma deixou contribuição valiosas para as diversas áreas do Direito, em especial para o Direito Penal, com heranças deixadas como as conceituações de Culpa e Dolo, Legítima Defesa, Estado de Necessidade e 

Imputabilidade. Além disso, as penas de Suplicium[1], Danun[2] e Poena[3] também remontam àquela época, sendo aplicada nas legislações atuais

Assim, a ciência do Direito sofre diversas modificações com o tempo, as quais são necessárias devido à evolução da sociedade. Porém, percebe-se também que os pensamentos e ordenamentos antigos servem de base para a legislação aplicada na contemporaneidade como destaca o doutrinador Luis Regis Prado: “O Direito não pode ser corretamente compreendido no contexto da sociedade atual ignorando-se o seu passado. Com efeito para bem entender uma legislação, é indispensável o conhecimento de sua evolução histórica.” (PRADO, 2011 – pag. 84).

 

SURGIMENTO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO

O Direito Penal do Inimigo teve sua primeira aparição em 1995 em uma palestra ministrada pelo jurista alemão Günther Jakobs na cidade de Frankfurt, Alemanha. Porém, o conceito de “inimigo” já era trabalhado há muito tempo, desde a Grécia Antiga, principalmente pela sociedade de Esparta, chegando a ser discutido também por filósofos conhecidos e estudados até os dias atuais, como Immanuel Kant e Thomas Hobbes.

Primeiramente, Kant defendia que o estado de natureza era um estado de guerra e mesmo não havendo violências concretas os indivíduos viviam em constante ameaça, de forma que o estado de paz apenas seria alcançado com o estado civil, em que haveria o controle social e os homens não seriam hostis uns com os outros. Ademais, argumentava que o inimigo era aquele que não fazia parte do estado social, pertencendo ainda ao estado de natureza, visto que não transmitia segurança aos demais.

Portanto, Kant considerava como legítimo qualquer ataque ao indivíduo que, mesmo não cometendo nenhum delito, não faça parte do Estado civil, pois ele representa uma constante ameaça aos demais, não possuindo a qualidade de pessoa.

Da mesma forma, Hobbes via o estado de natureza como um estado de guerra, em que todos são inimigos e há a ausência de lei. Que diante disso, os indivíduos decidiram abrir mão de parcela de sua liberdade e fundar o Estado – a partir do contrato social – a fim de acabar com o estado de guerra em que viviam e desfrutar de uma vida mais segura e tranquila. Assim, aqueles que aceitaram o contrato social para a constituição de um Estado estariam sujeitos às leis civis, feitas para os cidadãos, enquanto aqueles que recusaram ou renunciaram ao pacto seriam os inimigos e não estariam sujeitos a elas, podendo ser tratados da forma que os representantes do Estado bem entendessem.

Com isso, os prejuízos causados a quem era visto como inimigo não poderiam ser considerados como pena, vez que ele não está sujeito à lei e, portanto, não pode descumpri-la. Assim, a punição deveria ser exercida em desfavor dos indivíduos “não como súditos civis, porém como inimigos de governo, não pelo direito de soberania, mas pelo de guerra” (HOBBES, 1997, p. 237), ou seja, a punição não seria de acordo com a lei civil, mas sim pela lei natural.

Por fim, Hobbes também defendia que quando o dano a um inimigo, mesmo sendo inocente, for em prol do Estado e não houver violação de um pacto pretérito,

não será considerado desrespeito à lei da natureza, pois o inimigo ameaça as leis civis e, dessa maneira, medidas devem ser tomadas para evitar que lesões ocorram.

Assim, percebe-se a influência de tais pensadores na formulação da teoria do Direito Penal do Inimigo, uma vez que o conceito de “inimigo” está enraizado desde o período antigo, o qual desqualificava como sujeito de direitos alguns indivíduos específicos de acordo com suas escolhas, ações e ameaças que representam.

 

TEORIA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO

Como mencionado, Günther Jakobs foi o responsável por disseminar a teoria do Direito Penal do Inimigo, a qual teve sua primeira manifestação em uma palestra realizada pelo alemão em 1985 na Jornada de Professores de Direito Penal, em Frankfurt. Em sua primeira aparição sobre o tema, Jakobs posicionou-se de forma crítica quanto à ideia, a fim de demonstrar o enrijecimento da legislação penal alemã, sendo contrário aos dispositivos que previam a incriminação que fosse antecipada à lesão do bem jurídico.

Inicialmente, sua defesa era de que as ações anteriores à conduta ilícita, como a cogitação, não seriam puníveis através do princípio de proteção dos bens jurídicos, concepção oposta à legislada pelo Código Penal adotado. O jurista argumentava que todo indivíduo deve ter uma esfera em que o controle estatal não possa ser aplicado, o qual estaria localizado no subjetivo de cada um, ou seja, no pensamento ou cogitação, tornando impossível ao legislador atribuir penas à assuntos internos de cada um:

(...) o direito penal de um Estado de Liberdades não trata do controle dos aspectos internos, incluindo-se os motivos, e sim do controle externo. A pergunta acerca do interno somente é permitida para a interpretação daqueles fenômenos externos que já são, de qualquer modo, perturbadores. De acordo com isso, para que uma conduta possa ser punível deve ser entendida como uma perturbação independente da parte subjetiva (...) (JAKOBS, 2003, p. 118).

Nesta versão inicial, conhecida como “Fase crítica”, percebe-se que a visão de Günther Jakobs em um primeiro momento é de crítica aos rudes dispositivos da legislação alemã. Entretanto, no ano de 1999, na Conferência de Milênio, em Berlim, o jurista e professor muda drasticamente seu posicionamento, passando a fundamentar uma tese contrária a defendida anteriormente, a qual confere maior visibilidade mundialmente.

Em seu novo entendimento tendo como base as teorias filosóficas de Hobbes e Kant, Jakobs classifica e divide o direito em duas categorias: o Direito Penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo.

O Direito Penal do Cidadão é aquele dirigido às pessoas que não são inimigos, ou seja, aqueles que aceitaram se submeter ao Estado e possuem o status de cidadão. Portanto, o Direito é aplicado ao grupo de indivíduos que possuem o conceito fundamental de “pessoa” e no momento em que um cidadão infringe a norma, lhe é atribuída uma pena como forma de reestabelecer o Direito. Assim, o infrator será punido como tal e após cumprir sua sanção, continuará com sua qualidade de cidadão, podendo viver em sociedade novamente.

Já quanto ao Direito Penal do Inimigo, Jakobs defende sua aplicação àqueles que possuem comportamento delituoso, ocupação ou práticas mais gravosas (como crimes sexuais, terrorismo, tráfico de drogas e afins) e, por isso, se afastou do Direito, renunciando ao contrato cidadão, oferecendo riscos ao Estado e colocando em perigo a segurança e a paz social, não apresentando garantias à sociedade de que cumprirá as leis impostas pela legislação. Conforme explicita o jurista:

[...] é quando, em sua conduta (nos crimes sexuais) ou em sua vida ativa (criminalidade econômica, criminalidade organizada, narcocriminalidade) ou mediante integração de uma organização (terrorismo, criminalidade organizada ou narcocriminalidade novamente), tenha se envolvido de forma supostamente duradoura com o crime. (JAKOBS, 2003, p. 90)

Portanto, caberia a esse grupo um tratamento diferente, sendo implantado medidas severas e um regime mais rígido.

Tais concepções estão pautadas dentro do conceito trazido pela Teoria do Direito Penal do Inimigo que estabelece diferenciação entre o conceito de indivíduo e de pessoa. Enquanto a ideia de “indivíduo” é vista como algo natural e inerente a todos, a concepção de “pessoa” está inserida em um contexto sociocultural, em que existem direitos e obrigações que são responsáveis por manter a ordem. Assim, o indivíduo está abarcado pelo Direito Penal do Inimigo, ao passo que a pessoa se insere no Direito Penal do Cidadão.

Diferentemente de seu pensamento inicial, Jakobs começa a defender a Teoria do Direito Penal na Sociedade dos Riscos, a qual penaliza os atos preparatórios, anteriores ao ato ilícito em si, pelo simples fato de haver a possibilidade de que a ameaça se concretize em lesão. Sua teoria está pautada diante da insegurança dos acontecimentos futuros, que são imprevisíveis e, portanto, passíveis de receio.

Em suma, a teoria jacobiana fundamenta-se na imposição de um Direito Penal que pune o indivíduo não por sua conduta, mas por aquilo que ele representa para os demais, ou seja, pela possibilidade de violação aos bens jurídicos da sociedade atribuindo periculosidade ao indivíduo que se afastou do Direito e concretizará os crimes cogitados. Ao contrário, os cidadãos apenas cumprem a pena dos fatos pretéritos, os quais já foram cometidos e são passíveis de sansão.

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Direito Processual Penal

Da mesma forma, no que diz respeito a parte processual penal, os cidadãos e inimigos receberiam tratamentos diferenciados, sempre favorecendo aqueles em detrimento destes, de acordo com a teoria de Jakobs.

Em que pese o âmbito processual não tenha sido abordado pelo jurista alemão na mesma profundidade que a própria teoria do Direito Penal do Inimigo, o direito processual do inimigo possui especificidades que diferenciam, de forma prática, as pessoas dos indivíduos, tratando-se de um desdobramento da teoria principal.

Conforme explica Juarez Cirino dos Santos (p. 11), ao cidadão caberia o sistema acusatório, o qual institui que a pessoa que apresenta provas e defende o acusado não é a mesma que julgará o caso, havendo uma separação entre a função de acusar e julgar, assegurando a imparcialidade do juiz. Ademais, a característica que mais chama a atenção está pautada no fato de que o réu é sujeito de direitos, e não sujeito de investigação, sendo assegurados os direitos e garantias fundamentais do acusado, o qual será julgado conforme o devido processo legal.

Por outro lado, ao inimigo seria atribuído o sistema inquisitório, no qual a função de acusar, julgar e defender está nas mãos de apenas uma pessoa – o juiz – o qual busca evidências para fundamentar seu subjetivismo, de acordo com uma ideia pré-constituída, podendo fabricar provas que condenem o réu pelo crime cometido. Para tais indivíduos, inexiste garantias constitucionais, pois são tratados como objetos, e, nesse caso, há presunção de culpa, sendo atribuída a condenação, até que se prove sua inocência.

Em suma, o jus puniendi é exercido pelo Estado através do processo penal, e tal poder impõe ao cidadão e ao inimigo tratamentos de acordo com a qualificação de cada um, estabelecendo, ou não garantias, de forma que, no campo processual, ao inimigo pode ser atribuída a prisão preventiva com fundamento no combate a um perigo, medidas processuais que restringem as liberdades fundamentais – como a interceptação telefônica – sem a devida ciência do acusado, possibilidade de decretação da incomunicabilidade de presos perigosos, entre tantas outras.

 

Características

Diante de todo o exposto, já foi possível verificar algumas características do Direito Penal do Inimigo, entre elas a punibilidade adiantada diante de meros atos preparatórios de um crime a ser praticado no futuro pelo inimigo, tratando-se de um dos principais aspectos defendidos pela teoria.

Além disso, a aplicação da pena aos cidadãos difere grandemente das aplicadas aos inimigos. A sansão atribuída ao cidadão é proporcional ao crime cometido por ele e possui um caráter integrador, para que o Estado efetive seu poder como um ente disciplinador e permitindo que o cidadão infrator continue a viver em sociedade.

Porém, no que diz respeito aos inimigos, as penas empregadas remetem à uma medida de segurança, caracterizado pela inexistência de limites em sua aplicação. A fundamentação para o uso de medida de segurança se dá sob o pretexto de que o inimigo não é uma pessoa e, portanto, a racionalidade não está presente, sendo-lhes atribuídos transtornos mentais pautados, sobretudo, na renúncia da legislação estatal.

Ademais, cabe salientar que o adiantamento da pena não é considerado para que haja sua redução, após a condenação. Mas, de qualquer forma, na maioria dos casos, a condenação se baseia na suposição de que o indivíduo exerceria certas condutas delitivas, mesmo não havendo qualquer comprovação plausível.

A terceira característica primordial da teoria do inimigo diz respeito a aplicação da pena estabelecida com a supressão ou flexibilização de garantias fundamentais, sejam elas penais ou processuais penais.

A flexibilização de um direito diz respeito à uma aplicação limitada de tal direito, podendo ser definitiva ou temporária, de acordo com as circunstâncias. Em tese, a flexibilização aplicada nos casos de limitação de direitos é a flexibilização legal, a qual está prevista em lei e é usada nos casos de conflito com outros direitos ou garantias. Porém, há também a flexibilização casuística que não possui amparo legal para sua aplicação e a mesma é muito questionada por ser relacionada ao direito penal do inimigo.

Já a supressão corresponde a retirada por completo de direitos ou garantias fundamentais, ou seja, sua extinção para determinados casos, tratando-se de uma medida mais extrema.

Portanto, diante de aspectos rígidos como os supracitados, percebe-se que sua aplicação não poderia ser concedida em qualquer caso e, por isso, a teoria do direito penal do inimigo defende sua execução apenas em crimes mais gravosos e específicos.

 

VELOCIDADES DO DIREITO PENAL

As Velocidades do Direito Penal foram desenvolvidas pelo professor Jesús-Maria Silva Sánches, as quais podem ser divididas em três grupos e consistem, basicamente, no tempo que o Estado leva para punir o autor de algum delito, em que a pena é aplicada de acordo com a gravidade do crime praticado.

Na chamada Primeira Velocidade se enquadram os crimes em que são aplicadas a pena restritiva de liberdade, compreendendo os delitos possuidores de penas mais graves, de forma que necessitam de um julgamento mais extenso e aplicação de uma pena rigorosa, como o homicídio. Porém, aos agentes de tais delitos aqui enquadrados possuem direitos constitucionais, como o direito à ampla defesa e contraditório, devido processo legal e demais garantias.

Já na Segunda Velocidade não há a necessidade de aplicação da pena restritiva de liberdade, bastando a atribuição de medidas alternativas. Esse caso é aplicado em delitos mais simples, podendo ser atribuídos aos Juizados Especiais Criminais, os quais adotam um processo mais simplório, se utilizando da oralidade e celeridade do processo. Assim, há o que se falar de uma flexibilização do sistema penal, marcado por penas menos rígidas, mas que desempenham o papel de agente sancionador de forma satisfatória.

Por fim, a Terceira Velocidade do Direito Penal também defende a pena restritiva de liberdade aos crimes mais gravosos, da mesma forma que a Primeira Velocidade. Porém, difere desta por, além de possuir um processo mais célere, não permitir que os criminosos tenham direitos e garantias fundamentais, adotando a flexibilização ou supressão dos dispositivos garantidos pela Primeira Velocidade.

Dessa forma, o Direito Penal do Inimigo está inserido nesta última Velocidade, pois, conforme Silva Sánchez (2002, p.55) trata-se da “privação da liberdade e suavização ou eliminação de direitos e garantias penais e processuais”.

 

DIREITO COMPARADO

Estados Unidos da América

O atentado às Torres Gêmeas do complexo empresarial World Trade Center, em 11 de setembro de 2001, na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos da América (EUA) interferiu em todo o globo terrestre, tanto na população quanto em autoridades e políticos que voltaram suas ações para evitar que o mesmo acontecesse em seus territórios.

Mesmo sendo um caso de âmbito mundial, nenhuma nação sofreu mais com seus impactos quanto aquela em que o atentado ocorreu, chegando a refletir em outros países devido a integração entre os Estados soberanos e a nova ordem de Direito Internacional. Assim, após o famoso 11 de setembro, nova políticas foram adotadas pelo governo estadunidense a fim combater o terrorismo e dar uma maior segurança para seus cidadãos, visto que em um contexto pós-Guerra Fria, a potência era vista como desprovida de vulnerabilidade.

Dessa forma, depois do impacto proporcionado pelo atentado, os Estados Unidos reagiram com uma demasiada autodefesa, interna e externa, e uma legislação de caráter autoritário-repressivo, influenciando nas leis de outros países, principalmente europeus, e por vezes restringindo os direitos dos indivíduos, conforme saliente Natália Berti:

[...] No sopesamento entre defesa/segurança nacional e liberdades e garantias individuais, restou claro que o Senado americano optou pelo primeiro valor em jogo, a segurança nacional, com uma drástica redução de liberdades, garantias e, sobretudo, dos procedimentos de habeas corpus. (BERTI, 2011).

Portanto, com tais medidas, o Estado Americano violou direitos e liberdades individuais de seus cidadãos, em prol da segurança nacional.

Neste cenário a Teoria do Direito Penal do Inimigo ganhou ainda mais força, pois Jakobs (2003, p. 47) já defendia que a teoria estava voltada para os terroristas, afirmando que a aplicação teria “mais a tarefa de garantir segurança do que a de preservar a eficácia jurídica, e isso se revela na finalidade da pena e nos tipos penais correspondentes”.

Pois bem, após o atentado às Torres Gêmeas, o governo estadunidense deu início à chamada “Guerra ao Terror”, campanha desenvolvida por George Bush que objetivava eliminar o terrorismo e, consequentemente, punir o fundador da organização islâmica que desencadeou o ataque, Osama bin Laden, bem como seus aliados e seguidores.

Até que no dia 2 de maio de 2011 foi descoberto, por um serviço de inteligência dos Estados Unidos, o local em que bin Laden estava vivendo e, diante da informação, o então presidente estadunidense, Barack Obama, optou pela invasão do local, a qual foi efetuada por membros da Marinha que formavam um grupo operacional de elite. Segundo informações, Obama preferiu tal alternativa em detrimento do bombardeio do local a fim de que fosse comprovada a morte do terrorista mais famoso dos últimos anos.

Assim, verifica-se que Osama bin Laden foi localizado, identificado e morto, não havendo qualquer consideração sobre a hipótese de realizar sua detenção e apresenta-lo às autoridades competentes no Paquistão e, posteriormente, entregá-lo ao Tribunal Penal Internacional ou extraditá-lo aos EUA a fim de que lhe fosse atribuído o devido processo legal.

Portanto, conclui-se que o tratamento atribuído a bin Laden pelo governo estadunidense é exemplo irrefutável de aplicação do Direito Penal do Inimigo, e que, apesar de ser uma teoria relativamente nova, possui aplicações e implicações jurídicas práticas para a resolução de conflitos e segurança interna.

Alemanha

Juntamente com o Direito estadunidense, o direito alemão é um dos mais importantes atualmente, e suas implicações e teorias acabam por causar grandes repercussões mundo afora. Embora tenha sido criada apenas na década de 1980, o doutrinador Luis Régis Prado afirma que o melhor exemplo do Direito Penal do Inimigo em terras germânicas é o das leis nazistas[1].

De acordo com o doutrinador, mesmo que não existisse uma discussão sobre a teoria do Direito Penal do Inimigo, que só viria a ser desenvolvida posteriormente, as leis nazistas apresentavam um grande caráter segregacionista e autoritário, e feriam os princípios do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana.

Com a criação das Leis de Nuremberg[2] em 1935 alguns grupos que viviam na Alemanha tiveram seus direitos cerceados, a exemplo dos ciganos e negros, mas tal lei dirigia-se em especial aos judeus, pois rejeitavam a visão de que eles faziam parte de uma comunidade religiosa ou cultural.

Dentre as Leis de Nuremberg, aprovada estava a Lei de Proteção do Sangue e da Honra Alemã, que proibia o casamento e a relação sexual entre judeus e não-judeus, sendo também sancionada pelo governo nazista a chamada Lei de Cidadania do Reich que passou a definir a política de quem seria, ou não, considerado cidadão alemão. A referida lei determinava que somente seria cidadão as pessoas de sangue e ascendência alemã e, da mesma forma, definia quem seria ou não considerado como judeu.

É importante ressaltar que a partir da criação destas leis a população judaica passou a perder grande parte dos seus direitos, passando a ser marginalizados e discriminados pelo resto da sociedade alemã, sofrendo também com a miséria e o desemprego, e além de tudo, serem considerados como os verdadeiros inimigos do estado alemão. 

 

APLICAÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO BRASIL

A legislação brasileira atual, em um contexto de Estado Democrático de Direito, tende a não utilizar da teoria do Direito Penal do Inimigo visto que cada vez mais se busca garantir os direitos dos cidadãos, pautados nos princípios de dignidade da pessoa humana, isonomia e outros. Esta é a ideia que se adota, em teoria. Porém, na prática, mesmo que de forma sutil, é possível perceber a aplicação do Direito Penal do Inimigo em diversos dispositivos do ordenamento jurídico brasileiro.

Constituição Federal de 1988 e a Lei de Crimes Hediondos

O artigo 5º de nossa Carta Maior é conhecido por assegurar os direitos individuais e coletivos da sociedade, considerados essenciais a todo cidadão e que caracterizam o Estado Democrático vivido atualmente. Entretanto, o referido artigo apresenta contradições ao princípio da igualdade em alguns incisos, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (BRASIL, 1988)

Diante de tal dispositivo, fica evidente a aplicação do Direito Penal do Inimigo, de forma que o legislador definiu alguns crimes como inafiançáveis, imprescritível, insuscetível de graça ou anistia, os quais foram atribuídas penas mais gravosas e realizando a supressão de garantias penais e processuais penais aos acusados que ainda não foram condenados, ferindo, inclusive, o princípio do in dubio pro reo. Assim, os incisos buscaram limitar alguns direitos diante da reprovabilidade dos delitos de racismo, tortura, tráfico, terrorismo e afins e da periculosidade atribuída aos agentes desses delitos, tal qual exposto na teoria alemã.

Ademais, o referido artigo 5º faz menção ao crimes hediondos, os quais encontram fundamentação na Lei Especial 8.072/90, que em seu artigo 1º elenca os considerados crimes mais gravosos, quais sejam: homicídio, latrocínio, extorsão qualificada pela morte e mediante sequestro na forma qualificada, estupro, epidemia com resultado morte, falsificação ou adulteração de produtos com fins terapêuticos, favorecimento de prostituição ou outra forma de exploração sexual de menores ou vulneráveis.

Além da supressão de direitos elencados no artigo 5º da Constituição Federal, outro desrespeito evidenciado pela Lei de Crimes Hediondos é em relação ao prazo de prisão temporária. A Lei Especial nº 7.960/1989 regulamenta a prisão temporária determinando o prazo de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual período, conforme seu artigo 2º. Entretanto, não ocorre o mesmo com os crimes considerados mais gravosos, visto que o artigo 2º, § 4º prevê o prazo de prisão temporária de 30 (trinta) dias, prorrogáveis por igual período, ou seja, seis vezes maior que o prazo atribuído aos acusados de crimes comuns.

Também, cabe ressaltar que o condenado por crime hediondo iniciará seu cumprimento de pena já em regime fechado, conforme § 1º do artigo 2º que legitima: “A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado”, independentemente do tempo determinado pela sentença, confrontando o disposto no Código Penal, em seu artigo 33 e parágrafos.

Dessa forma, também em legislação especial, a qual é citada pela Constituição, encontra-se a presença da teoria alemã, evidenciando contradições entre diversos princípios legislativos, principalmente o da isonomia.

Prisão Preventiva

Outro exemplo polêmico da aplicação da teoria formulada por Jakobs está preceituada no Código de Processo Penal:

Art. 312 – A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (BRASIL, 1941)

É pacífico que a prisão preventiva é uma forma de medida cautelar e possui o objetivo de evitar algum dano imediato a importantes bens jurídicos, conforme saliente Polastri (2014, p. 73): “tutela cautelar deve se referir a uma situação de perigo a que se destina suplantar”. De outro giro, a sanção penal tem como escopo punir o cidadão devido ao cometimento de um ato ilícito. Assim, no caso de demonstrada autoria, ao condenado continuará sendo atribuída a pena, ao contrário da medida cautelar que cessará diante da comprovação da inexistência de dano, incomprovada autoria, e outros fundamentos.

Porém, apesar da distinção teórica entre esses dois mecanismos, não há diferenciação na prática da medida imposta cautelarmente e a pena restritiva de liberdade, conforme explicita Gomes Filho:

Apesar da clareza dessa distinção teórica, na prática, as diferenças entre a prisão como pena e a prisão como medida de cautela processual não são visíveis, tanto assim que o próprio legislador prevê a detração do tempo de prisão provisória (art. 42 do CP) e determina, além disso, a aplicação das normas de execução ao preso provisório (art. 2º, parágrafo único, da LEP). (2011, p.19)

Ainda, conforme Gomes Filho, a prisão preventiva é determinada, entre outros, sob o fundamento da periculosidade do agente e repercussão do crime. Dessa forma, os acusados desde logo são considerados inimigos da sociedade, pois seus direitos e garantias são restringidos de forma acentuada devido a análise de que um fato atribuído ao sujeito poder indicar que ele possui predisposição ao cometimento de delitos, assim como a reprovação social conferida, que vê o indivíduo como um criminoso em potencial.

Portanto, a legislação considera para efeitos da prisão preventiva o indivíduo representado no meio social e não o crime em si, sobressaindo o Direito Penal do Autor em detrimento do Direito Penal do Fato, característica esta atribuída ao Direito Penal do Inimigo.

Regime Disciplinador Diferenciado

Além dos casos já expostos, o chamado Regime Disciplinador Diferenciado (RDD), incluído pela Lei nº 10.792/2003 propôs um tratamento carcerário diverso a um grupo específico de presos, provisórios ou condenados, conforme artigo 52 da Lei 7.210/1984.

Bem verdade é que a Lei das Organizações Criminosas (Lei nº 9.034/95) já suprimia alguns direitos dos indivíduos que participavam de crimes organizados, através do cumprimento inicial da pena em regime fechado e por não fornecer a opção de liberdade provisória ou a possibilidade de apelação em liberdade.

Porém, foi através da Lei nº 10.792/2003 que o Direito Penal do Inimigo ficou mais evidente, pois, a nova redação do artigo 52 legitimou o isolamento do condenado por um período de tempo excessivo e com restrição de contato tanto com outros presos quanto com o mundo exterior.

Além do tratamento ser atribuído a quem cometeu falta grave ou que apresente algum risco a ordem, disciplina ou segurança do presídio, o “castigo” também seria aplicado diante de suspeitas que liguem o condenado a alguma organização criminosa, conforme parágrafo 2º do mesmo artigo:

§ 2º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando. (BRASIL, 1984)

Portanto, o Regime Disciplinar Diferenciado, por si só, já é excessivamente penoso e ataca garantias e direitos fundamentais dispostos na Constituição Federal e, do mesmo modo, permite que meras suspeitas de participação em organizações criminosas submetam os condenados a tal tratamento, mesmo diante da falta de conjunto probatório concreto.

Dessa forma, verifica-se que a sanção disciplinar não pode ser admitida em um Estado Democrático de Direito, visto que se trata de normas que ferem os direitos fundamentais através da afronta aos Princípios Constitucionais da Humanidade das Penas, Dignidade da Pessoa Humana e da Individualização da Pena, por se tratar de um sofrimento em demasiado, além de tornar ineficaz a ressocialização do preso.

Lei do Abate de Aeronaves

O Código Brasileiro de Aeronáutica – Lei nº 5.565/86 – sofreu modificações no ano de 1998 através da Lei nº 9.614, a qual regulamentou a opção de destruição de aeronaves estrangeiras que estejam sobrevoando espaço aéreo brasileiro e vistas como suspeitas de tráfico de entorpecentes ou consideradas hostis.

Para isso, a aeronave deve entrar em território brasileiro sem plano de voo aprovado e emigrar de alguma região que seja reconhecida como fonte de drogas ilícitas ou que não forneça as informações necessárias ou mesmo não cumpra ordens determinadas pelas autoridades brasileiras.

Diante da tal situação, a Aeronáutica estabelece três formas do coerção: a primeira é a averiguação, na qual serão identificadas as características da aeronave; depois será feita a intervenção, consistente em determinar um pouso obrigatório ao aeroplano; e por último a persuasão, em que serão realizados tiros de advertências na lateral da aeronave invasora. Se nenhum desse métodos surtir o efeito desejado, a medida a ser seguida é a de destruição da aeronave.

Diante de tal elucidação, é clara a violação a diversos direitos e princípios dos cidadãos, entre eles o mais importante: o direito à vida. Além disso, o princípio da proporcionalidade se encontra abalado, visto que o suspeito é penalizado com a pena de morte sem qualquer comprovação de ato ilícito e havendo outros meios de evitar a entrada de entorpecentes no país. Ademais, os princípios de inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal e da não culpabilidade são também ignorados pela Lei Especial, que visa punir de modo severo a frágil suspeita de que um ato ilícito está sendo cometido.

 

ANÁLISE E CRÍTICA

Em que pese a maioria dos operadores do Direito sejam contrários ao Direito Penal do Inimigo, a mesma possui simpatizantes, como é o caso de Maristela Cabral de Freitas Guimarães, Pedro Balbi Duque e Igor Fernando Custódio (2018), os quais defendem que “seria viável a utilização do direito penal do inimigo no sistema jurídico brasileiro, por sua atuação que se mostra ser mais eficaz nas punições dos indivíduos do que o atual método adotado”. Ainda, segundo eles, a Lei de Execuções Penais não atinge sua finalidade, pois há uma sensação de impunidade diante da aplicação de uma frágil sanção, a qual incentiva o criminoso à reincidência.

Entretanto, a doutrina majoritária defende que a teoria:

(...) que se fundamente na separação entre pessoas e não-pessoas, a partir de um conceito meramente normativo, descartando flagrantemente o aspecto ontológico da condição de ser responsável e capaz de se portar conforme ou contra o preceito normativo inerente a todo ser humano (...) não possui qualquer reflexo positivo. PRADO, 2009

Nesse sentido, a aplicação da teoria alemã não é a melhor opção, de maneira que sua inserção na legislação brasileira configuraria um Estado de Exceção dentro de um Estado Democrático de Direito, através da adoção de dispositivos que ofendem a Constituição, sem a presença de uma situação urgente.

Ademais, é evidente que a adoção da teoria de Jakobs não resolveria os problemas de criminalidade presentes no Brasil, sendo este um problema social e estrutural. A adoção de penas mais severas e a supressão de direitos e garantias fundamentais não alterariam a ocorrência de cada vez mais de crimes, evidenciando tal quadro fático através da análise histórica que pode ser exemplificada pelo período da Ditadura Militar, momento em que vários direitos e garantias eram suprimidos e mesmo assim houve o crescimento de diversos crimes, com destaque aos roubos e homicídios. Também, as rígidas penas não atingiriam o objetivo de ressocialização do criminoso, pautada no princípio da humanidade penal e adotada pela Teoria Mista da Pena, a qual é aceita pelo ordenamento jurídico vigente.

Entretanto, algumas exceções podem, e devem, continuar sendo aplicadas, como é o caso da prisão preventiva. A prisão preventiva é um exemplo de mecanismo eficaz no combate a condutas criminosas, vez que os direitos individuais do infrator são relativizados em prol do in dubio pro societate. Nesse sentido, há técnicas previstas em lei que precisam ser mantidas a fim de conferir uma maior segurança à população, devendo serem limitadas a casos específicos e respeitando o princípio da legalidade, evitando assim, que o Direito Penal do Inimigo seja aplicado em demasiado.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dessa forma, percebe-se que o Direito, tanto brasileiro quanto internacional, sofreu diversas modificações e evoluções no decorrer do tempo e de acordo com seu contexto social. Porém, a aplicação do Direito Penal do Inimigo é uma medida extrema e deve ser evitada pelo ordenamento jurídico brasileiro, pois além de suprimir diversos direitos e garantias fundamentais, as quais são asseguradas pela Constituição Federal de 1988, a adoção da segregação entre os cidadãos e inimigos vai contra o princípio da isonomia e o próprio artigo 5º da Carta Maior (BRASIL, 1988), a qual assegura que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Devido a isso, a punibilidade pautada no autor do fato e não no fato em si demonstra uma pré concepção inserida na sociedade a qual deve ser quebrada afim de garantir o tratamento igualitário entre todos.

 

REFERÊNCIAS

BERTI, Natália. O Regime Disciplinar Diferenciado como expressão do Direito Penal do Inimigo. 2011 Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10108. Acesso em: 18 ago. 2019.

BRASIL. Código de Processo Penal de 1941. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019.

BRASIL. Código Penal de 1940. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019

BRASIL. Lei da Prisão Temporária de 198. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019.

BRASIL. Lei de Execução Penal de 1984. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019.

BRASIL. Lei dos Crimes Hediondos de 1990. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 27ª edição, 2019.

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Editora das américas S.A. – EDAMERIS – SP. 1961, p. 211.

GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Medidas cautelares e princípios constitucionais. In: FERNANDES, Og. (org.). Medidas cautelares no Processo Penal: prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 19

HOBBES. Thomas. Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. Trad. João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. [s.l.]: Ed. Nova Cultural, 1997, p. 237

JAKOBS, Günther. Incriminação do estado prévio à lesão de um bem jurídico. Tradução de André Luis Callegari. In:_______. Fundamentos de direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

POLASTRI, Marcellus. A tutela cautelar no processo penal. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 73.

PRADO, Luis Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 11ª edição. 2011, p. 84.

SANTOS, Juarez Cirino dos. O Direito Penal do Inimigo – ou o discurso do Direito Penal Desigual. Disponível em: < http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/Direito%20penal%20do%20inimigo.pdf >. Acesso: 18 de ago. de 2019.

SILVA SÁNCHEZ, Jesús-Maria. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. Trad. Luiz Otávio de Oliveira Rocha. São Paulo: RT, 2002, p. 55.


[1] Entrevista concedida por Luis Régis Prado ao site “Carta Forense” em maio de 2009

[2] Leis aprovadas em 1935 que tratavam sobre a miscigenação dos judeus, condições para uma pessoa ser considerada como cidadã alemã e definia uma nova bandeira para o país

 


[1] Execução

[2] Lesões

[3] Penas em dinheiro (multa)

 

Sobre os autores
Renan Izidoro de Oliveira

Acadêmico de Direito da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de M.C. Rondon

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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