RESUMO
Esse artigo apresenta uma discussão teórica entre leis e doutrina acerca do Direito Desportivo e suas especificidades, mais precisamente, sua competência. O objeto de estudo desse artigo, tratará de uma disciplina considerada “autônoma”, com procedimentos, legislação, tribunais e advogados próprios, tornando o desporto, e ainda mais seu processo no ponto de visto jurídico, peculiar. O objetivo é esclarecer o procedimento e com isso elucidar questões acerca das competências e limites do Direito Desportivo em paralelo com o acesso à Justiça Comum.
Palavras-chaves: Desporto, Competência, Desportivo.
INTRODUÇÃO
O universo desportivo cobra uma absoluta expertise dos seus profissionais, acerca do assunto, assim como celeridade e eficiência superior à da Justiça Comum para a resolução de conflitos e processos advindos dessa prática. De acordo com o art 50 da Lei 9.615/98 (Lei Pelé) determina que os procedimentos, ritos e organização das atribuições do Direito Desportivo devem está previstos em Código. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, surgiu a lei 8.672/93, intitulada Lei Zico, com o intuito de referendar esta autonomia, dada pela Carta Magna, as entidades praticantes do desporto.
Para aprimorar o entendimento sobre essa matéria, é de suma importância compreender que Desporto não é sinônimo de “esporte”. Segundo o professor e especialista Roberto Armelin, o desporto é composto por três características fundamentais: competição, imprevisibilidade, e observância à determinadas regras. O desrespeito ou descumprimento a qualquer uma delas, é que leva a um conflito, no direito desportivo.
O texto legal mais importante para a defesa da área, está presente no Art 217 da CF/1988 que determina como papel do Estado o fomento às atividades desportivas, concedendo autonomia e independência às entidades desportivas. No § 1º e § 2º, no entanto, tratam realmente do objeto deste texto: a Justiça Desportiva. O primeiro parágrafo cita que o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à infração a um daqueles três elementos do desporto supracitados, quando as instâncias jurídico-desportivas estiverem esgotadas, enquanto o § 2º estabelece o prazo máximo de sessenta dias para se proferir uma decisão final, uma vez que as competições têm datas impreteríveis que não podem esperar por muito tempo as decisões dos Tribunais Desportivos. É nesse momento, portanto, que se torna clara a existência de uma Justiça específica ao desporto, amparada justamente pelo fato de que, mesmo os tribunais desportivos não fazendo parte do sistema judiciário estatal, a sua competência está garantida na Constituição Federal.
DESENVOLVIMENTO
Antes de questionar-se qual a competência de jurisdição das lides desportivas, é importante entender quais exatamente são as ações cabíveis para esse caso. Segundo o mestre e professor Roque Júnior, as lides tipicamente desportivas são “controvérsias que, por sua natureza e pelas circunstâncias em que soem acontecer, não extrapolam os limites e o terreno da competição desportiva tout court, sendo, por isso, desejável que venham a ser dirimidas interna corporis.”
As controvérsias desportivas em sentido direto e estrito são as relacionadas às próprias regras da pugna, entre elas: suspensão após expulsão do campo de jogo, suspensão por dopagem, multa por infração a regra disciplinar (como retirada do uniforme, por exemplo), etc.
É importante frisar que as lides desportivas stricto sensu vigoram em todas as confederações desportivas e, consequentemente, para todas as entidades de prática futebolista do mundo. Não estão exclusivamente à mercê do legislador de cada país, pois derivam de um arcabouço legal comum a todas as nações. Valem urbi et orbi, motivo pelo que não devem ser analisadas pelo jurista comum, conhecedor ou aplicador apenas de sua legislação pátria.
Ratifica esse pensamento, em Les Sports et Le Droit, o emérito professor Jean Loup, advogado na Corte de Toulouse: “Há também nas instituições de esportes autoridades judiciais encarregadas de fazer valer e respeitar as leis e julgar os litígios.”
Não figuram no rol de lides tipicamente desportivas as relações trabalhistas entre atletas e entidades de prática de desportiva; contratos de licença de uso de imagem de atletas profissionais; controvérsias oriundas da relação de consumo entre torcedor e organizador de evento esportivo, etc.
Assim como não estão sob o amparo desportista condutas praticadas em atividades desportivas não oficiais (jogos de campeonato amistosos) e jogos não promovidos pela respectiva federação.
É conveniente transcrever o artigo 217 CF/1988 onde cita, quando as ações desportivas poderão ser de responsabilidade do Judiciário:
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
§ 1º O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.
§ 2º A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final.
Contudo para compreender esse limite legal é necessário que seja esclarecido acerca das instancias do JD. Na estrutura da Justiça Desportiva, temos como tribunais o Superior Tribunal de Justiça Desportiva como órgão máximo, podendo-se, inclusive, recorrer a instâncias internacionais, que atua em âmbito nacional e estadual. Em seguida, temos os Tribunais de Justiça Desportiva, atuando em âmbito regional e municipal. Convém esclarecer que existe um STJD para cada modalidade de esporte, estando ligado à entidade máxima de cada uma das modalidades, embora independentes delas. O art. 55 da Lei Pelé afirma que os TJDs serão compostos por, no mínimo, sete e, no máximo, onze auditores, assim indicados: três pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); um pela entidade de administração do desporto, federação/confederação; um pelos clubes da divisão principal; um pelos árbitros; um pelos atletas. Indispensável a paridade entre todos os representantes acima, exceto os da OAB.
O disposto na redação constitucional é claro, não restando margem para nenhuma dúvida: É preciso necessariamente que as entidades e os atletas extinguem todas as instâncias da Justiça Desportiva, antes de tomarem qualquer medida no âmbito da Justiça comum, sob pena de verem a ação ser fulminada por impossibilidade jurídica do pedido. Sem esgotar a todas as instâncias desportivas, dificilmente uma ação desportiva será recebida no Poder Judiciário, correndo o risco, de a ação ser extinta sem resolução de mérito, respeitados os trâmites processuais dispostos no Código Civil Brasileiro.
A Constituição, diferentemente do que pode-se concluir alguns juristas, em momento algum veda o acesso ao Judiciário, pelo contrário, ele é considerado cláusula importante, cujo o respeito se equivale a uma cláusula pétrea.
Convém ressaltar que o mesmo está redigido e previsto no art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Levando se em conta, o livre acesso ao judiciário, através de qualquer lesão e/ou ameaça de direito, sofrido por qualquer clube desportivo, o mesmo teria acesso livre a Justiça Comum, para intentar as ações que entendesse, fossem cabíveis, contudo devemos observar que há uma Justiça completamente especializada, específica e direta, e que dentro desta Justiça, há todo um rito processual a ser respeitado e seguido, com isso qualquer ação iniciada fora do âmbito desportivo, é como citado anteriormente, de pleno julgado extinto o mérito.
A extinção do processo dá-se, não por falta de conhecimento dos magistrados ou advogados que atua na Justiça Comum, pelo contrário, se dá mesmo porque a matéria que ali será discutida, não pertence a este tribunal. Para se chegar ao ajuizamento de uma ação na Justiça Comum, é preciso exaurir todas as instâncias da Desportiva, conforme expressamente determinado em lei.
E com isso, uma ferramenta vem ganhando cada vez mais espaço na jurisdição geral, especialmente no desporto: a mediação. Dentre as vantagens de aderir a um processo mais amigável é a manutenção dos relacionamentos, a possibilidade da confidencialidade, e as economias com custos e tempo.
CONCLUSÃO
É sabido que é direito de todo cidadão, seja ele pessoa física ou jurídica o acesso ao poder judiciário, explicitamente previsto no art. 5º, XXV da CF 88. Não suficiente temos também o texto previsto no artigo 217, §1º da Constituição Federal, elucidando que após transcorridos o prazo de 60 dias, pode se ingressar na Justiça comum, para obter uma revisão de alguma causa desportiva, depois que comprovadamente, tenham sido esgotadas todas as instâncias.
Igualmente vale ressaltar, que se entendem como todas as instâncias da Justiça Desportiva: As Comissões Disciplinares, Os Tribunais de Justiça Desportiva, O Superior Tribunal de Justiça Desportiva e seu Tribunal Pleno, O Tribunal de Disciplina e a Câmara de Apelações da Conmebol, O Tribunal Arbitral do Esporte e Corte Arbitral do Esporte da FIFA.
Sem exaurir a todos os níveis citados acima, se recebida, uma ação desportiva no Poder Judiciário, será julgada extinta sem resolução de mérito, respeitando os trâmites processuais dispostos no Código Civil Brasileiro. Somente após esgotada a via administrativa, tem-se aberto, por razões constitucionais, o acesso ao Judiciário.
Com isso concluo que o entendimento da Constituição segue a principio da jurisdição, que se baseia na premissa que cada matéria so será julgada pela sua determinada competência, justificando o exaurimento dos recursos na JD para o acesso a Justiça Comum.