A Recomendação nº 62 do CNJ, de 17 de março de 2020, cria padrões para as medidas a serem tomadas pelos entes do Poder Judiciário, na adoção de meios preventivos face à propagação da infecção pelo novo coronavírus, no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo.
O Superior Tribunal de Justiça proferiu julgado no último dia 27 de março, no qual garantiu a todos os presos por dívida de alimentos, o direito de cumprir a medida prisional em regime domiciliar, em razão da pandemia de coronavírus.
O impacto econômico sofrido pelo isolamento social não desobriga o pagamento dos alimentos, não podendo, sob nenhuma hipótese, que as referidas despesas de sustento das necessidades do alimentado recaiam, tão somente, sobre quem detém a guarda imediata, deste, em seu lar de referência. As obrigações familiares devem ser honradas, ou quando assim não for possível, que tal fato seja objeto de renegociação, por período determinado, sempre no interesse do beneficiário da prestação alimentícia.
Contudo, vale lembrar que a execução da obrigação da prestação de alimentos é ajuizada, para o fim, único, de proteger-se o sustento do alimentado. Não há hipótese, sob a Lei, que permita o descumprimento da prestação, enquanto perdurar a necessidade do alimentado.
Neste contexto, devemos alertar para a existência de uma brecha para o risco do aumento da inadimplência das prestações alimentícias! No caso, a morosidade do modo coercitivo de imposição ao cumprimento da obrigação de alimentar, através da prisão civil, causada pela pandemia, ou a substituição, desta, pela prisão domiciliar, pode esvaziar o caráter coercitivo do instituto.
Na hipótese do devedor da obrigação alimentícia, não realizar o seu cumprimento através do desconto em sua folha de pagamentos ou não tiver patrimônio suficiente que garanta a execução, destes, a decretação de sua prisão civil domiciliar, afastará o impacto coercitivo da medida, fazendo-o com que o dispositivo legal que lhe dá existência, mera letra morta.
São conhecidos casos, advindos de julgados das Instâncias Superiores ou dos Tribunais Recursais, nos quais foram aplicados entendimentos que excusam o devedor da obrigação alimentícia, de seu cumprimento, como por exemplo, a restrição de decretação de prisão por dívida alimentar, enquanto perdurar a pandemia de Covid-19, ou a suspensão de sua execução ou convolação em prisão domiciliar.
De fato, causa-nos espanto, que tais medidas tenham sido adotadas, haja vista o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça sobre a necessidade do cumprimento da obrigação alimentar, mesmo em casos de desemprego do alimentante. No máximo, a Corte admite o cumprimento da prisão, em regime domiciliar.
Assim, vemos a delicada e perigosa situação à qual os beneficiários de pensão alimentícia se veem defrontados, no tocante à perda do peso das medidas coercitivas havidas na legislação, por entendimento de Magistrados, ante a impossibilidade da prisão civil, em tempos de pandemia.
Este convite aberto ao inadimplemento do pagamento de alimentos, dará força àqueles que, já restritos em seu direito de ir e vir, por conta das medidas de afastamento e isolamento social, pouco impacto sentirão em decorrência de uma eventual prisão domiciliar.
Faz-se necessário, assim, que o Poder Judiciário adote medidas e entendimentos que tornem efetivas as medidas coercitivas aplicáveis aos inadimplentes com suas obrigações alimentares, havidas na Lei, sem tirar-lhes o peso que o legislador lhes atribuiu, de modo a não ficarem desamparados, aqueles que tanto necessitam dos alimentos que lhes são devidos.