MP 971 e a Banalização da “Relevância e Urgência”

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Durante a crise do Covid-19 é importante a análise quanto as medidas provisórias relacionadas a outros temas, e se esses demais são urgentes relevantes tal como essa crise sanitária ou se o uso da MP tem sido banalizado pelo Poder Executivo.

 

No dia 26 de maio, o Presidente da República Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória de número 971/2020, publicada no Diário Oficial, produzindo alterações nas Leis 9.264/1996 e 11.134/2005. Que levou ao
aumento da remuneração da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros Militar e da Polícia Civil do Distrito Federal e da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar dos Extintos Territórios Federais.

Longe de tentar debater o mérito da referida medida, se é ou não válido o aumento da remuneração, no entanto é importante a análise quanto ao uso desse instituto na realidade jurídica do Brasil, sobretudo diante da sua banalização.

Assevera a Constituição Federal, em seu artigo 62, que “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”. A simples análise do dispositivo mostra que essa modalidade de processo legislativo apresenta a sua especificidade, de modo que a sua edição deveria estar restrita a casos especiais onde houvesse a dita relevância e urgência.

De modo que se torna necessária a análise quanto a esses pressupostos formais, devido a sua excepcionalidade e diferenciação quanto ao processo legislativo. Visto que junto às vedações, visam a não banalização desse instituto. Sendo assim cabe ao Congresso Nacional, a análise quanto a existência de relevância e urgência, seguindo os ditames do parágrafo 5º do artigo 62 da Constituição [1]. Não havendo a atuação do Judiciário sobre a regulamentação das MP’s que cumpram ou não esse requisito, pois prevalece o entendimento de que esse ato usurparia a atuação de controle do Legislativo. E assim uma violação ao princípio da separação dos poderes e os reflexos sobre o sistema de checks and balences, havendo atuação do Judiciário somente em casos excepcionais conforme entendimento do STF na ADC 11 MC e ADI 4.029 [2].

Diante desse cenário um tanto quanto inseguro já que existe MP sobre variados assuntos em momentos distintos, houve a edição da Emenda Constitucional n.32/2001, fixando vedações visando uma regulamentação mais rígida da Medida Provisória. Criando a vedação à edição dessas medidas  quanto à nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral;  direito penal, processual penal e processual civil organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; dentre outras limitações.

De todo modo, embora não exista uma especificação quanto ao conteúdo, é certo que o Presidente da República deve atentar-se quanto a esses requisitos formais e quanto a existência de urgência no caso. E é obrigação do Congresso em análise prévia, e não somente posterior ao período de vigência da MP, e sim quanto relevância do assunto que está sendo debatido de forma prévia ou logo após a sua publicação.

Ora, o país vive em uma crise sanitária alarmante diante da Pandemia do Coronavírus, esse é o momento ideal para utilização da agilidade e rápida tramitação para vigência que a Medida Provisória apresenta. Esse instituto fora produzido de modo a trazer mais segurança em situações que o país não possa aguardar todo um processo legislativo, daí surge a necessidade e a urgência apresentada pela CF.

O legislador Constituinte não criou esses requisitos à toa, eles demonstram o momento em que a MP deve e pode ser utilizada. A função precípua de legislar é do Poder Legislativo, ao Poder Executivo não cabe a criação de normas, mesmos com vigência temporária como a MP, com exceção de casos excepcionais já apresentados pela Constituição Federal, sob pena intervenção a separação dos poderes.

Logo o Congresso deve se ater e agir de forma prévia ao conteúdo apresentado pela Medidas Provisórias, e auferir se a matéria exposta é relevante e urgente diante da realidade do país. Essa é a sua atuação exigida pela CF, onde “a deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais”O mandato constitucional deve ser exercido, essa medida não pode ser exercida a bel prazer do Chefe do Executivo. Em um Estado Democrático de Direto devem haver critérios, sob pena de banalização desse instituto a ponto de estarmos tratando como relevante e urgente medidas que versam sobre aumento salarial, ao mesmo tempo estamos diante de um cenário alarmante de pandemia onde o número de mortos já ultrapassa a casa dos 24 mil.

 

Referências Bibliográficas

[1] Curso de Direito Constitucional, Gilmar Ferreira Mendes, página 1488, 13ª edição, ano 2018, editora Saraiva Jur.

[2] ADC 11 MC e ADI 4.029, Supremo Tribunal Federal.

 

Sobre os autores
Pedro Vitor Serodio de Abreu

LL.M. em Direito Econômico Europeu, Comércio Exterior e Investimento pela Universität des Saarlandes. Legal Assistant na MarketVector Indexes.

Matheus Rodrigues dos Santos

Advogado, graduado em Direito pela Universidade Estácio de Sá (UNESA), pós-graduando em Direito Civil Constitucional (UERJ). contato:[email protected]

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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