Certamente, muitos contratos firmados antes da chegada da crise pandêmica, que, por sinal, tem assolado o setor privado, serão descumpridos em virtude do impacto sobremaneira nas relações comerciais, seja devido às paralisações na cadeia produtiva, seja na interrupção dos tráfegos aéreo e portuário em diversos locais do globo terrestre.
Importante lembrar que não há um dispositivo isolado para tratar exclusivamente das atividades de comércio exterior entre os países.
Assim, necessário analisar alguns mecanismos para estar por dentro de eventuais acontecimentos causados pelo Covid-19 nas relações de compra e venda oriundas de pacto contratual.
O Brasil, como consignatário da Convenção de Viena, possui alguns dispositivos jurisdicionais atinentes à relação de compra e venda de mercadorias, sobretudo aplicáveis ao difícil momento.
Com a pandemia, vários contratos internacionais deixarão de ser cumpridos. Importante, portanto, analisar a questão do descumprimento de obrigações por meio de cláusulas de desoneração.
O artigo 79 da Convenção de Viena trata da compra e venda e estabelece cláusula geral de isenção por parte do inadimplente, daquele que descumpre o contrato em virtude da ocorrência de caso fortuito ou força maior, o que se aplica também aos contratos internacionais.
O art. 79 do diploma legal citado dispõe que:
ARTIGO 79. Nenhuma das partes será responsável pelo inadimplemento de qualquer de suas obrigações se provar que tal inadimplemento foi devido à motivo alheio à sua vontade, que não era razoável esperar fosse levado em consideração no momento da conclusão do contrato, ou que fosse evitado ou superado, ou ainda, que fossem evitadas ou superadas suas consequências.
A título de exemplo, empresas brasileiras e chinesas também podem se valer da Lei Modelo da UNCITRAL[1] – Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional – fazendo o uso de cláusulas como forma de se eximir de obrigações contratuais devido às circunstâncias que fujam do controle.
A China reconhece a incidência do instituto force majeure para isentar responsabilidades derivadas dos descumprimentos contratuais, assim como no Brasil, inclusive, que, por força do art. 393 do Código Civil, exime o devedor de responsabilidades na situação abordada.
No entanto, tal previsão não se pode afirmar quanto ao restante das jurisdições mundo afora, sendo, na maioria dos casos, o contrato que determina as consequências de um descumprimento contratual, sujeitando-se a uma gama de legislações aplicáveis.
O cenário é preocupante, uma vez que a China é o principal parceiro comercial do Brasil, de modo que as trocas entre estes países, somente em 2018, atingiram um montante de US$ 100 bilhões.
Já em 2019, o Brasil teve superávit de mais de US$ 45 bilhões, isto é, o país mais exportou do que importou, o que deixa a balança comercial favorável, ao passo que a China foi a grande protagonista responsável por tais números.
Em suma, muitas situações intervenientes inviabilizarão o prosseguimento de alguns pactos contratuais firmados antes da pandemia, o que, certamente, será motivo de muitas discussões jurídicas à frente.
[1] Seu texto legislativo rege sobre a arbitragem, meio preferido para tratar de relações internacionais. Aborda a venda internacional de bem; a resolução de disputas comerciais internacionais, incluído a arbitragem e a conciliação; o comércio eletrônico; a insolvência; o transporte internacional de bens; os pagamentos internacionais.
Por Gian Lucca Jorri, Advogado, Formado em Direito em 2016 pela Universidade Católica de Santos. Área de Atuação: Direito Aduaneiro e Direito Tributário, OAB: 404.759.