SUMÁRIO
1 - Introdução
2 – A construção de valores do direito da mulher
3 - A Violência contra a mulher – A convenção de Belém do Pará x Maria da Penha
4 - Feminicídio
5 - Estudo de CASO - Situação dos direitos da mulher na cidade de Juárez, México: Direito de não ser um assunto de violência e discriminação
5.1 - Caso – Feminicídios em Ciudad Juárez – México
5.2 - O Contexto de Ciudad Juárez
5.3 – Decisão
5.4 – Efeitos pós-decisão
6 – Considerações finais
7 – Referências
1 - INTRODUÇÃO
Devido às constantes violações a dignidade da mulher, a Comissão Interamericana de direitos humanos, órgão principal da OEA, cuja função principal é proteger e promover os direitos humanos e atuar como órgão consultivo da Organização nessa área, resolveu promover algumas convenções para assegurar a integridade da mulher e conscientizar a modificação do papel tradicional tanto dos homens como das mulheres na família e na sociedade, para de fato alcançar uma igualdade real entre os gêneros. A CIDH investiga e decide, através de visita in loco, sobre denuncias de violações aos direitos humanos e formula recomendações oportunas para que os Estados garantam o pleno exercício da liberdade de todo o seu povo, sem exceção. Destarte, monitora a evolução dos direitos humanos em cada estado membro da OEA.
A opressão a mulher e a sua subserviência perfazem uma matriz ontológica, pois de fato, desde a sociedade primitiva, constitui uma das mais antigas relações de poder. O menosprezo e a discriminação quanto à vulnerabilidade da mulher e as suas condições físicas e psicológicas serem mais frágeis era o fator determinante para o despotismo da sociedade patriarcal. O termo feminicídio fora empregado pela primeira vez em 1976, no Tribunal Internacional de Crimes Contra as Mulheres, em Bruxelas, para se referir aos assassinatos de mulheres motivados em razão do gênero feminino. No Brasil esta prática criminosa incide como qualificadora de homicídio, sendo incorporado na relação de crimes hediondos, cujos regimes iniciais de cumprimento da pena e o de progressão são mais severos.
Ao analisarmos a construção de valores do direito da mulher e percorrermos sobre fatos e acontecimentos históricos que contribuíram para o declínio da concepção machista, podemos evidenciar um passado inglório acerca dos valores universais proclamados, os quais preveem que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e qualquer dele possa invocar todos os direitos aclamados, sem distinção alguma, inclusive de sexo.
2 - A construção de valores do direito da mulher
Há séculos a humanidade falocêntrica impera com os seus descasos quanto ao gênero. As degradações das mulheres foram perpassadas como forma de sub-cultura a qual pormenoriza os seus direitos e garantias como se fosse uma espécie de submissão predestinada, substancialmente cultivada e incutida na sociedade pelos dogmas religiosos, que as condenavam ao santo inquérito pela insurgente audácia de aspirarem à igualdade entre os sexos e consequentemente transgredissem os valores morais de uma determinada cultura ou civilização. Esta concepção déspota fadou à mulher a eterna subserviência. Ainda que após um silêncio secular tais paradigmas tenham desvelados gradualmente as bravatas de uma sociedade patriarcal, a verdade é que as conquistas feministas por direitos iguais ainda não atingiram o seu apogeu, devido a carência de políticas públicas que efetivem a equiparação dos gêneros.
Enaltecer a evolução da relevância da mulher na sociedade a partir do seculo XIX, é desconsiderar quão obscura fora a nossa historia ao não reconhecê-las, sobretudo, como matrizes da vida e precursora dos nossos valores. Por isso, a violência contra a mulher perfaz um passado inglório desde a colonização, quando estas eram apreciadas como propriedades, objetos de recompensa e até moedas de troca. Mas a quem compete a proteção da mulher e as medidas em que consistem?
“É dever do Estado garantir a preservação da dignidade e do valor da pessoa humana, e da igualdade de direitos dos homens e das mulheres”¹. Esta resolução da ONU (34/180) constitui o tratado acerca da “Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher”, ocorrido em dezembro de 1979, e tivera como incidência em seu preâmbulo, que:
“a discriminação contra a mulher viola os princípios da igualdade de direitos e do respeito à dignidade humana, dificultando a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constituindo um obstáculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da família e impedindo a mulher de servir o seu país e a Humanidade em toda a extensão das suas possibilidades”; Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher; Resolução 34/180, da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 18 d Edezembro de 1979.
Para que se chegasse a um acordo acerca das medidas que seriam utilizadas, o tratado conscientizava os ratificantes da necessidade de “modificar o papel tradicional tanto dos homens como das mulheres na família e na sociedade”², para de fato alcançar uma igualdade real entre homens e mulheres; É evidente os preceitos do naturalismo jurídico, que se instauravam apenas a partir daquela época com a devida amplitude legal, proclamando que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e que qualquer dele possa invocar todos os direitos proclamados, sem distinção alguma, inclusive de sexo. Embora tal princípio iluminista tivesse um penhor ordinário, pois não previa que a mulher fosse capaz de compreender o funcionamento da política como um todo, incitou movimentos feministas, dentre estes, as sufragistas, que conquistaram o direito ao voto em 1918, sendo aderido no Brasil após uma década, como o voto da potiguar Celina Guimarães Viana. Seria o inicio do declínio do sistema patriarcal, mas não a conscientização absoluta do direito da mulher. A convenção de 1979 sobre a eliminação da descriminação da mulher fora o primeiro acordo entre os Estados signatários para colocar em prática os “princípios enunciados na Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres e, para tanto, a adotar as medidas necessárias a fim de suprimir essa discriminação em todas as suas formas e manifestações”, inclusive, como dispõem o artigo segundo da referida convenção, as providências de “caráter legislativo, para modificar ou revogar leis, regulamentos, costumes e práticas que constituam discriminação contra as mulheres”; Certamente que às nações as quais os dogmas religiosos se constituem arraigados em suas identidades ao menos foram signatárias deste acordo. No Brasil este tratado fora ratificado em fevereiro de 1984 (com reservas) e todos os direitos sociais foram transcritos na constituição de 1988 com equidade, acrescidos àqueles específicos em razão do gênero e condição da mulher. Mas o que de fato ainda consistia os anseios sobre os direitos e garantias da mulher?
Quão morosa quanto à efetivação os direitos conquistado pela mulher é a desconstrução do sistema patriarcal. Em nada adianta solver-lhes a burca se os costumes são perpetrados. A cultura do gênero dominante ainda persiste no berço e nas escolas, quando deveria ser translúcida que a flexibilização das funções sociais não representa uma ameaça, mas sim uma condição a seres dotados da racionalidade. Se uma determinada sociedade ainda contemplar o gênero como objeto semovente ou lhe atribuir, em razão deste fato, a subserviência, decerto é uma sociedade em estado primitivo.
3 - A Violência contra a mulher – A convenção de Belém do Pará x Maria da Penha
Em 1983, um ano antes do Brasil ratificar o tratado de Eliminação das formas de descriminação da mulher, ocorreu um caso alarmante da letargia da justiça e das autoridades competentes. A biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernades, cearense, além das diversas ameças proferidas pelo seu marido, o economista Marcos Antonio Heredia,colombiano naturalizado brasileiro, sofreu dupla tentativa de homicidio motivadas pelo mesmo agente; sendo a primeira quando recebeu dois tiros pelas costas enquanto dormia, deixando-a paraplégica, a segunda, eletrocutada enquanto banhava-se. Passados 15 anos e duas condenações pelo tribunal do juri, o autor ainda permanecia em liberdade através de recursos protelatórios a espera de um trânsito em julgado. O caso repercutiu com grande comoção popular, no que incentivou a vítima a posicionar-se de modo alternativo frente ao caso.
Em 1994, o Brasil foi anfitrião da convenção interamericana de Belém do Pará, para previnir, punir e erradicar a violência contra a mulher, ratificando os termos propostas e se comprometendo a aplicá-los, assumindo um compromisso de envergadura. Entretanto, a inercia parasitária do Estado em prover medidas resolutivas quanto ao caso de Maria da Penha, que auxiliada pelo CEJIL (centro de justiça e direito internacional) e o CLADEM (comitê latino-americano e do caribe para a defesa dos direitos da mulher) enviaram o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), que responsabilizou o estado brasileiro por omissão, negligência e tolerância, com base na própria convenção de 1994, classificando o caso como violência doméstica. De acordo com o artigo segundo do referido tratado, tal fato pode ocorrer:
“no ambito da família ou na unidade doméstica, ou em qualquer relação interpessoal, quer o agressor compartilhe, ou não da mesma residência com a mulher, incluindo, entre outras formas, o estupro, os maus-tratos e abuso sexual”. ESCANFELLA; p. 29, 2007
Esta Convenção é a primeira internacionalmente a enfatizar a volência doméstica e reconhecer a amplitude desse fenômeno como uma moléstia agravante que viola e ofende os direitos e a dignidade da pessoa humana. Destarte, nesta convenção ainda admite, quando há omissão do Estado, o peticionamento a corte Interamericana e a responsabilização civil do estado em caso de decumprimento do tratado, ainda que por omissão na criação de normas. Em agosto de 2006 foi sancionada no Brasil a lei nº 11.340, que reproduz substancialmente os dispositivos do tratado acordado entre as nações em 1994, e recebera o título com o nome da sua destemida ativista Maria da Penha, que também fora idenizada pela morosidade da Estado.
4 - Feminicídio
Para enrigecer as medidas adotadas e tentar conter o crescente número de assassinatos contra a mulher, essencialmente no âmbito doméstico, em março de 2015, fora sancionada a lei 13.104, que trata sobre o feminicídio, que tem seu fundamento politico, por violar normas de direitos internacionais, as quais o Estado se comprometeu em reproduzir e assegurar as suas aplicabilidades. Nesta lei prevê o homicidio motivado em razão do gênero feminino como qualificadora do crime, sendo ainda incluso no rol de crimes hediondos, os quais o regime inicial de cumprimento da pena será fechado em estabelecimento de segurança máxima, com progressão prevista após o cumprimento de dois quinto da pena, e são insuscetíveis de anistia, graça, indulto e pagamento de fiança para obtenção de liberdade provisória. O referido crime ainda poderá ter um aumento de pena caso ocorra nas seguintes circunstâncias: Durante a gestação ou nos três meses posteriors ao parto; contra menor de 14 anos, maior de 60 ou pessoa com deficiência e na presença de descendente ou ascendente da vítima.
Segundo Bitencourt (2017), para que haja o crime de feminicídio é necessário que “o homicídio discriminatório seja praticado em situação caracterizadora de violência doméstica e familiar, ou motivado por menosprezo ou discriminação à condição de mulher”. O professor ainda faz uma ressalva sobre um erro de conjunção acerca da situação fática na primeira parte do dispositivo, alegando que o âmbito não necessariamente deveria ser acumulativo, como infere a conjunção aditiva empregada, quando deveria, por razões conceituais, ser empregado um termo alternativo, visto que são circunstâncias distintas, que podem gerar, de acordo com o “princípio da tipicidade estrita”, prerrogativas de discussões que podem excluir a tipicidade da conduta para este crime específico.
As implicações dos termos utilizados na referida lei descaracteriza o crime se este não atende algum dos seguintes aspectos: Ambiente, que é a situação caracterizadora da violência doméstica ou familiar, ou seja, as circunstâncias; Motivo, que é o menosprezo ou a discriminação pelo fator da vulnerabilidade da mulher quanto as suas condições físicas e psicológicas ser mais frágeis e oferecer menor resistência à investida, encorajando de tal maneira, a ação covarde do agente;
Bitencourt ainda pondera sobre o fato da lei Maria da penha ser mais abrangente do que a Lei do Feminicídio, pois está condicionada exclusivamente em razão do gênero, devendo para tanto, ser identificada oficialmente como feminino, enquanto aquela é passível de um entendimento expansivo da percepção do indivíduo como mulher e a identidade que assume perante a sociedade.
5 - Estudo de CASO - Situação dos direitos da mulher na cidade de Juárez, México: Direito de não ser um assunto de violência e discriminação.
O caso a ser apresentado fora extraído do sitio eletrônico da Corte Interamericana de Direitos Humanos, publicada a resolução em 07 de março de 2003. A partir destes fatos, ocorridos no inicio da década de noventa, o termo Feminicídio fora amplamente difundido e as práticas de violência contra a mulher enfim alcançaram a devida relevância em todo o mundo. Decerto que se admite a intervenção humanitária em um determinado estado ratificante de tratados e convenções por razões de fortes violações dos direitos humanos, sendo assim, flexibilizada da sua soberania.
5.1 - Caso – Feminicídios em Ciudad Juárez – México
O caso refere-se a um número considerável de assassinatos de meninas e mulheres ocorridos na cidade de Juarez, localizado no México, fronteira com o Texas, EUA. Entre 1993, até o relatório apresentado pela CIDH em 2003, foram 268 casos confirmados de assassinato e mais de 250 de desaparecimento, até então não solucionados. As vítimas eram jovens entre 15 a 25 anos, apresentavam marcas de estupro, estrangulação, perfuração por arma branca e traços brutais de tortura, havendo similaridade do modus operandi. Em resposta a ineficiência dos serviços de segurança pública, após clamor público e de diversas instituições, um relator especial da CIDH fora realizar uma visita à cidade, solicitando apoio internacional do governo Americano para solucionar os crimes.
O descaso do Estado para com o compromisso de proteger a dignidade da pessoa humana, especialmente com as mulheres, fazia-se mais do que ineficiente, era demasiadamente letárgico, ofensivo e degradante. Segundo depoimentos registrados pelo relator especial, a intervenção da comissão era mais do que uma necessidade daquela população, era um apelo humanitário irrenunciável e desesperado:
“a resposta das autoridades a esses crimes tem sido notavelmente deficiente. Dois aspectos dessa reação são de especial importância. Por um lado, a grande maioria dos assassinatos continua impune; Aproximadamente 20% resultaram em processos e condenações. Por outro lado, quase ao mesmo tempo que a taxa de homicídios começou a aumentar, Alguns dos funcionários encarregados da investigação desses eventos e o julgamento dos perpetradores começaram a usar um discurso que, em resumo, culpou a vítima pelo crime. De acordo com declarações públicas de certas autoridades de alto escalão, as vítimas usavam minissaias, saíam dançando, eram "fáceis" ou eram prostitutas. Há relatos de que a resposta das autoridades competentes aos familiares das vítimas oscilou entre indiferença e hostilidade”. OEA/Ser.L/V/II.117.
Inconformados com as vagas respostas, muitas vezes discriminatórias e desrespeitosas com os familiares das vítimas, proferidas pelas autoridades, chegando até renegar a situação calamitosa acerca das incontestáveis violações ao direito da mulher e a inação da policia e do governo para impedir novos assassinatos e responsabilizar os culpados, a corte Interamericana de Direitos Humanos sentenciou o Estado do México por ser responsável pela falta de uma investigação adequada. A corte recomendou ao Estado a imposição de sanções aos funcionários que não cumprirem as suas obrigações nos termos da lei. Entretanto, devido à falta de acompanhamento institucional e genuína vontade política de determinar uma resposta efetiva ao caso, a impunidade continuava, tanto para os criminosos quanto para os funcionários omissos, no que demandou novos julgamentos e sentenças nos quais acusava à polícia e demais funcionários do governo de responder com indiferença para os feminicídios, bem como indicar altos graus de tolerância perante os crimes, realizar investigações inadequadas e negligentes, fornecer respostas ineficazes, e não prevenir ou proteger as mulheres da violência.
Na convenção de Belém do Pará ficou elucidado entre os signatários, dentre estes o México, que a violência contra a mulher é uma forma de manifestação de poder historicamente desigual entre homens e mulheres, que as colocam em posição de subordinação. Segundo o relator:
“A impunidade desses crimes envia a mensagem de que essa violência é tolerada, o que favorece sua perpetuação. A falta de diligência para esclarecer e punir esses crimes e impedir sua repetição reflete o fato de que eles não são considerados um problema sério”. OEA/Ser.L/V/II.117.
Em 1998, após cinco anos de discriminação e menosprezo a vulnerabilidade da mulher e incontáveis violações aos tratados acordados, a comissão e a sua relatora conseguem estabelecer um canal aberto com o governo mexicano, percebendo algum progresso, na elucidação quanto à verossimilhança dos fatos. Com a nomeação de um novo promotor especial para resolver os crimes que se configuravam especificamente em razão do gênero feminino, os perpetradores começaram enfim a ser responsabilizados. Em uma iniciativa dos governos nacional e local, foi promovida, juntamente com a contribuição da sociedade civil, uma abordagem abrangente sobre a situação existente para conter e resolver os assassinatos.
5.2 - O Contexto de Ciudad Juárez
Juárez é uma das maiores cidades do México e fica no estado de Chihuahua. Atualmente possui mais de 2.6 milhões de habitantes, sendo o maior centro populacional do estado e destaca-se no cenário nacional pelo seu extenso pólo industrial. Não obstante, é um portal de acesso à emigração ilegal para o território americano.
A falta de infraestrutura e a insuficiência dos serviços públicos contribuem para a desordem e calamidade da região. O relator apontou em sua análise, após a visita in loco, “que as diferenças culturais, econômicas e sociais existentes na população geram problemas especialmente complexos”, enquanto os direitos sociais ao menos coadunam para promover o mínimo necessário para subsistência, sendo escassos recursos básicos como água potável e saneamento. O relator ainda acentua de forma oportuna, que por ser uma cidade fronteiriça, Juárez está propícia a um maior número de tráfico de drogas organizado e a criminalidade como um todo. Porém, concentrar em si todos os índices de crimes por execução ou ser reconhecida internacionalmente como a capital do feminicídio, é um tanto alarmante.
Também se faz apropriada uma análise socioeconômica da região. Com o tratado de livre comércio da America do norte (NAFTA), firmados pelo México, Estados unidos e Canadá em 1994, houve uma considerável expansão de fábricas maquiladoras, que tivera como prerrogativa a importação de materiais sem o pagamento de taxas, sendo seu produto específico e não comercializável no país onde estava sendo produzido. Esta modalidade de empresa fora difundida no México e atraia, devido à demanda de sua produção, a migração de milhares de trabalhadores. Especialmente as mulheres da zona rural, que eram encaminhadas para trabalhos maçantes que exigiam menor instrução e consequentemente pagavam o menor salário. Para justificar o desnível salarial e evadir-se de possíveis auditorias da OIT, os empresários alegavam que o trabalho era temporário, todavia de fato incidia alta rotatividade de trabalhadoras. O êxodo incauto dessas mulheres que migraram para grandes cidades as quais possuíam expressivos pólos industriais, como a cidade Juárez, elevou os casos de prostituição devido à instabilidade econômica proporcionada por empregos miseráveis e descartáveis e o malogro da jornada ao menos lhes renderam à custa do retorno ao lar. Em diferente prisma, a independência econômica da mulher de certa forma também incomodava grande parte dos mexicanos ainda turvados pela cultura machista, pois ocupavam a maior parte dos empregos. Segundo o relator, “essas modificações das estruturas tradicionais em alguns casos geram tensões em uma sociedade caracterizada por desigualdades históricas entre homens e mulheres”.
5.3 - Decisão
Ainda que a nomeação de um novo promotor especial e o esforço conjuntos do governo nacional e local fizessem aparecer os primeiros resultados, pairavam sobre as conclusões diversas cifras negras e incompetência para manter registros da crescente onda de assassinatos de mulheres. Foram casos de desaparecimento que as autoridades não quiseram reconhecer, sob a alegação de que provavelmente a vítima tivera saido com um suposto namorado. Os resultados das perícias para o reconhecimento das vítimas duravam meses, sendo negada a familia o direito de confirmação do óbto do seu ente através de exames de DNA, sendo obrigados a aceitar de maneira incontestável o resultado apresentado pelos legistas, que não raro, identificava os cadáveres de maneira errônea. Também há relatos do emprego de tortura nas diligências policiais para conseguir a confissão dos supostos perpetradores e ameaças constantes a membros dos direitos humanos. Sabe-se que havia uma intensa rede de exploração sexual em Juárez e o fato estranhamente não servira como linha de investigação. Os casos de feminicídios foram classificados como assassinatos em série e 93 pessoas foram detidas com base nesta fundamentação. Devido a falta de transparência, a CIDH determina, em março de 2003, novas recomendações:
Quanto aos aspectos diligenciais de investigação, julgamento e punição dos perpetradores - Fortalecer a capacidade e procedimentos institucionais para responder a crimes de violência contra as mulheres, com supervisão independente e elaboração de relatórios; Intensificar os esforços para treinar todas as autoridades competentes, incluindo polícia, procuradores, médicos forenses e outros especialistas, juízes e judicial, quanto às causas e conseqüências da violência baseada no gênero; Reorientar as relações de trabalho; Ponderando a as condições de trabalho, solicitar o apoio de profissionais de outras localidades (...)
Quanto às diligencias para prevenir a violência contra as mulheres e o aumento da segurança – Renovar a ênfase na formação de funcionários do setor público; promover continuamente espaços para dialogo institucional, com abordagens coerentes e mecanismos que efetivem um bom desempenho na atuação do combate a violência; Coordenar e expandir os esforços nos níveis federal, estadual e municipal, a fim de melhorar os serviços básicos, como a iluminação em espaços e áreas marginais que têm sido associados a riscos de segurança, segurança em relação ao transporte; pavimentação de estradas em áreas marginais; e alocar os fundos necessários para a prestação desses serviços; aperfeiçoar os registros de denuncia de violência contra a mulher; Conscientizar a mulher dos seus direitos de liberdade e promover campanha de educação para que a população compreenda que a violência baseada no gênero é uma violação dos direitos humanos, no âmbito do direito internacional e como uma infração punível sob a lei de Chihuahua e amplamente divulgar na mídia os valores instituídos pelos direitos humanos; garantir resposta aos perpetradores que cometem violência contra a mulher;
Em 2009, a Corte Interamericana de Direitos Humanos decidiu sobre o assassinato de três jovens. Fato ocorrido na cidade de Juárez em 2001, e ficara conhecido como “Caso campo de algodão”. A corte fundamentou em sua sentença que o México era culpado de discriminação e de não proteger as três jovens assassinadas, ou garantir uma investigação efetiva sobre o seu seqüestro e assassinato, sendo assim, ordenou ao estado mexicano que conduzisse uma nova investigação sobre o caso, criasse um monumento nacional em homenagem às vítimas, pagasse indenizações para as famílias das vítimas e novamente pontuou que melhorasse as medidas de prevenção e investigação adequada dos assassinatos de mulheres.
5.4 - Efeitos pós-decisão
Decerto que as recomendações do CIDH não foram efetivadas pelo Estado do México em sua integra, e a morosidade das suas aplicações resultou em nova condenação por violação dos tratados internacionais, como observamos no caso do campo algodoeiro. Até 2010, a ciudad de Juaréz figurava como a cidade mais violentas do mundo, com uma média de 271 assassinatos para cada 100 mil habitante, sendo equiparada a guerrilha da faixa de Gaza. Atualmente, estes índices despencaram para 19 para cada 100 mil habitantes à guisa de muito sangue derramado.
Com projetos que envolviam os governos federal, Estadual e municipal para a urbanização, pavimentação da cidade, cultura e educação, encorporando a sociedade civil desde a elaboração, resgatou o instinto de amor a terra, proporcionando desenvolvimento social e econômico, bem como respeito pela vida humana. As respostas aos casos de violência ficaram mais ágeis. Visto que os carteis de tráfico de drogas determinavam a atuação das autoridades, o governo realizou uma fundamental medida ao exonerar todo àquele policial envolvido com corrupção, no que resultou na expulsão de um terço dos servidores.
Havia sobretudo forças politicas inertes corrompidas pela ganância, que coadunavan pela desconjuntura do sistema o qual deveras ser democrático e resguardar a dignidade da pessoa humana. Apesar do progresso, a ciudad de Juarez ainda está entre as trinta mais violentas do mundo e ativistas dos direitos humanos são constantemente ameaçados e mortos. Milhares de mães insones ainda aguardam o retorno de suas filhas, pois o estigma da incerteza não encrava ao peito a dor certa da perda.
6 - Considerações finais
Considerando que os direitos da mulher ainda não alcançaram a sua integralidade devido a insuficiência ou efetividade de normas que lhes garantam a dignidade da pessoal humana em iguais condições, independente do sexo, realizamos este projeto afim de difundir tais direitos e denunciar quão morosas são as medidas adotadas pelo poder público para exaurir as indiferenças quanto ao gênero. Reconhecer a condição do genero feminino e ponderar sobre ela é exprimir razoabilidade sobre uma problemática que já perpassaram seculos e ainda persiste de forma irracional com dogmas de uma sociedade patriarcal.
7 - Referências
PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional internacional. SP – Ed. Saraiva. 2015.
ESCANFELLA, Célia Maria. Formação de Conselheiros em Direitos Humanos. Brasilia – Ed. SEDH. 2007.
Jurisprudência da corte interamericana de Direitos Humanos - 2014. Direito à Vida, Anistia e Direito à liberdade. Brasilia - CNJ. 2016
Jurisprudência da corte interamericana de Direitos Humanos - 2014. Direito à Integridade Pessoal. Brasilia - CNJ. 2016.
VADE MECUM, 21º edição. SP – Ed. Saraiva. 2016
https://www.conjur.com.br/2017-nov-15/cezar-bitencourt-feminicidio-aplicado-transexual
http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/mulher/lex121.htm
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ConvElimDiscContraMulher.df
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sufr%C3%A1gio_feminino
http://www.cidh.org/annualrep/2002sp/cap.vi.juarez.htm
https://pt.wikipedia.org/wiki/Feminic%C3%ADdios_em_Ciudad_Ju%C3%A1rez