Os Quitutes do Judiciário

"Que eles comam brioche" – Maria Antonieta, ao saber que os camponeses não tinham pão para comer.

11/06/2020 às 23:16
Leia nesta página:

Notícias do tjSP.

O Estado sou Eu” - Luis XIV (falsamente atribuída aos Ministros do STF)

 

Recentemente chegou a conhecimento público a notícia de que o tribunal de justiça (com minúsculo mesmo) de São Paulo utilizou-se de verbas discriminadas como “emergenciais” para compra de petiscos e outras regalias aos seus 360 desembargadores. E a cereja do bolo, a opção pelo uso de tais verbas era o fato de que dessa forma o tribunal consegue evitar que esses gastos sejam divulgados de forma pública e depois questionados pela população. Isso acontece porque os dados são fechados, ao contrário de aquisições feitas por meio de processos públicos de aquisição.

Tudo isso teria dado certo se não fosse o intrometido de Tribunal de Contas do Estado que teve a audácia de questionar os nobres desembargadores, que gastaram em 2019 R$83.000,00 (oitenta e três mil reais) com frutaria e R$221.000,00 (duzentos e vinte e um mil reais) com mercado, entre outras despesas essenciais. Para melhor visualização, isso dá a módica quantia de R$25.333,33 por mês ou R$832,87 por dia com frutas e mercado.

Francamente Tribunal de Contas, vocês não têm nada melhor para fazer do que questionar nossos ilustres desembargadores? Vocês sabem o quão sofrida é a vida deles, o quão pouco eles ganham, e o tanto que eles trabalham? Aposto que não fazem ideia que até o próprio presidente do tribunal de justiça de São Paulo há pouco tempo não teve sequer condições para pagar as custas do processo, necessitando dos benefícios da justiça gratuita para ter seus direitos resguardados pelo judiciário (https://m.folha.uol.com.br/poder/2015/08/1675401-presidente-do-tj-sp-recebe-r-96-mil-em-junho-mas-nao-paga-custas-de-acao.shtml - Presidente do tj-SP recebe R$ 96 mil em junho de 2015, mas não paga custas de ação). Isso eles não veem.

Por acaso o Tribunal de Contas sabe que o salário médio dos desembargadores do tjSP é de R$70.000,00 (setenta mil reais), entre salário e benefícios justos? Isso dá pouco mais de R$2.333,33 por dia, como eles pagariam do próprio bolso os quitutes essenciais ao desempenho de suas funções? Não sabem que magistrados com fome condenam mais, afetando a imparcialidade de seus julgamentos? (https://www.conjur.com.br/2014-jun-05/juiz-fome-ou-almocou-mal-julgar-nossas-causas)

E o pior, até parece que são os enxeridos do Tribunal de Contas que pagam o salário dos ilustríssimos desembargadores. Não pagam, somo nós, pagadores de impostos, que pagamos, e fazemos questão de que os mesmos possam usar o nosso dinheiro para compra de produtos essenciais como queijo maasdam holandês (R$67,90/quilo), salame hamburguês Di Callani (R$60,25/quilo) e kiwi gold (R$59,99/quilo). Assim, mesmo que não tenhamos dinheiro para experimentar tais iguarias essenciais, ficamos felizes em saber que estamos contribuindo com o próximo e ajudando os necessitados.

Só para informar esses perniciosos membros do Tribunal de Contas, a situação dos magistrados e desembargadores é tão precária e desesperadora, que a Loman (Lei da magistratura Nacional) necessitou garantir alguns direitos mínimos para resguardar os pobres desfavorecidos, tais como:

Art. 65 - Além dos vencimentos, poderão ser outorgadas aos magistrados, nos termos da lei, as seguintes vantagens:

 I - ajuda de custo, para despesas de transporte e mudança;

 II - ajuda de custo, para moradia, nas localidades em que não houver residência oficial à disposição do Magistrado.

 III - salário-família;

 IV - diárias;

 V - representação;

 VI - gratificação pela prestação de serviço à Justiça Eleitoral;

 VII - gratificação pela prestação de serviço à Justiça do Trabalho, nas Comarcas onde não forem instituídas Juntas de Conciliação e Julgamento;

 VIII - gratificação adicional de cinco por cento por qüinqüênio de serviço, até o máximo de sete;

 IX - gratificação de magistério, por aula proferida em curso oficial de preparação para a Magistratura ou em Escola Oficial de Aperfeiçoamento de Magistrados (arts. 78, § 1º, e 87, § 1º), exceto quando receba remuneração específica para esta atividade;

 X - gratificação pelo efetivo exercício em Comarca de difícil provimento, assim definida e indicada em lei.

 § 1º - A verba de representação, salvo quando concedida em razão do exercício de cargo em função temporária, integra os vencimentos para todos os efeitos legais.

 § 2º - É vedada a concessão de adicionais ou vantagens pecuniárias não previstas na presente Lei, bem como em bases e limites superiores aos nela fixados.

 Art. 66 - Os magistrados terão direito a férias anuais, por sessenta dias, coletivas ou individuais.

Art. 73 - Conceder-se-á afastamento ao magistrado, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens:

 I - para freqüência a cursos ou seminários de aperfeiçoamento e estudos, a critério do Tribunal ou de seu órgão especial, pelo prazo máximo de dois anos; (Redação dada pela Lei Complementar nº 37, de 13.11.1979)

 II - para a prestação de serviços, exclusivamente à Justiça Eleitoral.

 III - para exercer a presidência de associação de classe.

Percebe-se que, até para se aperfeiçoarem e terem acesso a uma melhor qualificação, necessitam de afastamento remunerado bancado por nós, pagadores de impostos, que, magnânimos que somos, abrimos mão de nossa própria educação para que os coitados tenham acesso a uma qualificação melhor e garantam a excelência dos serviços tão maravilhosamente prestados.

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Agora, onde está o Tribunal de Contas que não fiscaliza o trabalhador comum, que chega a ganhar até a astronômica quantia de um salário mínimo, salário este que, ao contrário da remuneração dos pobres desembargadores, é o suficiente para atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo” (CF., art. 7, inciso IV), além de ainda sobrar uma gorda fatia para pagar os impostos e ajudar a combater a desigualdade que sofrem os magnânimos julgadores.

Para ajudar a visualizar, só no ano de 2020, esta afrontosa quantia corresponde ao montante R$1.045,00 por mês, que dá aproximadamente R$34,83 (trinta e quatro reais e oitenta e três centavos) por dia. Isso sem contar os diversos penduricalhos que os mesmos recebem e não declaram ao fisco, como dinheiro emprestado de parentes, dinheiro achado na rua, empréstimos a taxas irrisórias que conseguem dos bancos, para focar só no básico. E o Tribunal de Contas do Estado tem a pachorra de implicar com os quitutes do tjSP. Francamente...

E se você, Excelso pagador de impostos, ficou um pouco chateado de não ter sequer dinheiro para comer um pãozinho que seja, que dirá queijo maasdam holandês, não fique. Que coma brioche!

Fraternais abraços.

Sobre o autor
Renan Drudi Gomide

* Pós-Graduação Lato Sensu em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhaguera-Uniderp.* Ex assessor jurídico de Vereadora e de Deputado Estadual. * Fluente em inglês, japonês e mandarim.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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