Breves considerações a respeito das tutelas provisórias

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Nesse artigo abordamos de forma breve o instituto das tutelas provisórias (de urgência e de evidência) à luz do Novo Código de Processo Civil, suas peculiaridades e cabimento, além dos poderes do juiz na implementação dessas medidas.

Breves considerações a respeito das tutelas provisórias

Autores: Nehemias Domingos de Melo

Márcia Cardoso Simões

 

 

Sumário: 1. Notas introdutórias. 2. Dos tipos de tutelas provisórias: urgência e evidência. 3. Da eficácia e da mutabilidade das tutelas provisórias. 4. Dos poderes do juiz na efetivação das medidas. 5. Da motivação da decisão. 6. Da competência. 7. Conclusão. 8. Bibliografia.

 

1. Notas introdutórias

               Por primeiro cabe destacara que as tutelas provisórias existem para atenuar os malefícios da longa duração do tramite processual. O ideal seria obter desde logo a tutela definitiva que contivesse um juízo de certeza, porém, “é inconcebível um processo que não se alongue no tempo”[1] principalmente respeitando todas as garantias do devido processo legal.

            O decurso do tempo processual traz prejuízos econômicos e morais às partes; afronta os princípios da efetividade e da celeridade processuais; contribui para a insegurança jurídica e pode ocasionar, inclusive, o perecimento do direito pleiteado, com o consequente fracasso do acesso à justiça.

            Diante de efeitos tão danosos, é imprescindível uma solução, mesmo que paliativa, a qual consiste numa tutela provisória, que não resolve definitivamente a lide, mas atende, em parte, à efetividade da justiça, porque pode desde logo ser executada, ou seja, realizada no mundo dos fatos.[2]

             Podemos conceituar tutela provisória como uma decisão jurisdicional com as seguintes características: a) inaptidão para tornar-se imutável e indiscutível; b) representativa de cognição não exauriente; c) com eficácia imediata; d) revogável e modificável; e) tem sempre como referência a correspondente tutela definitiva; f) atende aos princípios processuais constitucionais da efetividade e da celeridade em prejuízo do princípio da segurança jurídica.            

            Por outro lado, as tutelas provisórias têm pronta eficácia. A grande vantagem das tutelas provisórias consiste na sua executoriedade imediata. Uma vez concedida, a decisão pode ser realizada no mundo dos fatos desde logo, mesmo na pendência de recurso. De forma geral, as tutelas provisórias são executadas provisoriamente (ver Novo CPC, art.297, parágrafo único).

            As tutelas provisórias podem ser revogadas ou modificadas, de ofício ou a requerimento da parte, em qualquer momento processual, enquanto houver a busca para encontrar a solução definitiva para o direito em litígio.

               As tutelas provisórias sempre estão relacionadas à tutela definitiva, que chamamos de principal. Afinal elas só existem porque a tutela principal exige o cumprimento minucioso de todo o procedimento traçado pela lei, com obediência ao contraditório e à ampla defesa, tarefa que demanda tempo, fator inimigo da efetividade e que pode trazer prejuízos às partes.

               Em regra, as tutelas provisórias têm como objetivo direto preservar a utilidade da futura tutela definitiva ou evitar que o próprio direito objeto da ação pereça completamente antes da decisão final. Em ambos os casos, para obter a tutela provisória é imprescindível demonstrar a probabilidade de obter a solução definitiva para a lide. Logo, só é possível pensar em tutela provisória se tivermos em mente qual seria a tutela definitiva correspondente.

             Por último, para que se compreenda em profundidade a natureza das tutelas provisórias é preciso identificar o conflito entre princípios constitucionais que o juízo no caso concreto tem sempre que enfrentar antes de conceder ou negar a tutela provisória.

            A concessão da tutela provisória sempre significa atender ao princípio da efetividade e da celeridade processuais, em prejuízo do princípio da segurança jurídica, conforme passamos a explicar.

          Já vimos que as medidas provisórias advêm de uma cognição superficial, não obstante, poderem ser executadas imediatamente, mesmo na pendência de recurso. De forma que se torna possível executar sem que se tenha certeza jurídica sobre o direito litigado.

              Executar sem certeza vai de encontro ao princípio da segurança jurídica, expressado no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição, segundo o qual “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

             Apenas outro princípio do mesmo quilate pode justificar essa invasão da esfera jurídica de alguém sem o completo devido processo legal. Trata-se do princípio da efetividade da jurisdição, garantia decorrente da inafastabilidade da jurisdição, pois o direito de acesso à justiça compreende não apenas obter a solução jurídica ao caso concreto levado à juízo, mas igualmente o direito de ter realizado no mundo dos fatos a solução jurídica obtida.

          Ensina Teori Albino Zavascki que “a forma para viabilizar a convivência entre a segurança jurídica e efetividade da jurisdição é a outorga de medidas de caráter provisório, que sejam aptas a superar as situações de risco de perecimento de qualquer um desses direitos”.

               Não obstante, nem todas as tutelas provisórias envolvem situações de perigo, de risco ao direito em litígio. É o caso das tutelas de evidência previstas no artigo 311 do Novo CPC a ser estudado mais adiante.

             O pressuposto das tutelas provisórias consiste em “circunstâncias de fato” que configurem um risco ou, pelo menos, um embaraço ao princípio da efetividade da jurisdição, que garante a entrega da tutela jurisdicional em tempo e em condições adequadas à preservação do bem da vida.

          Nas tutelas provisórias de urgência a circunstância de fato deve significar um perigo, uma ameaça de perecimento do objeto do processo ou uma ameaça à utilidade/efetividade da decisão definitiva final do processo.

              Já o embaraço ao princípio da efetividade e da celeridade prescinde da situação de perigo, mas configura um entrave à prestação da tutela jurisdicional em prazo razoável e com a celeridade e presteza exigidas pelo inciso LXXVII do art. 5º da Constituição Federal.

               De qualquer modo, quando o julgador é chamado a decidir provisoriamente, ele deve enfrentar o dilema de decidir qual das garantias constitucionais fundamentais sairá vencedora em prejuízo da outra: segurança jurídica ou efetividade (e celeridade) da tutela jurisdicional? Trata-se, portanto, de um conflito de normas de segundo grau, para o qual não há solução preconcebida, cabendo ao juiz elaborar no caso concreto a regra conformadora entre os princípios que se afrontam. [3]

 

2. Dos tipos de tutelas provisórias: urgência e evidência

           Nos termos do art. 294 do Novo CPC, as tutelas provisórias podem ser de urgência ou de evidência, utilizando dois critérios para a classificação das medidas, senão vejamos.

             Por primeiro, o Código classifica as tutelas provisórias pelo critério de existência de situação de perigo, quais sejam, em tutelas provisórias de urgência ou de evidência. Atentem para o fato de que a tutela provisória é gênero do qual são espécies a tutela de urgência e a tutela de evidência.

               Já o segundo critério classificatório diz respeito ao momento processual escolhido pelo autor para requerer a medida. A tutela provisória terá caráter antecedente quando for requerida antes do requerimento da tutela definitiva. Neste caso, é a tutela provisória que primeiro estabelece a relação processual na qual serão veiculados os dois pedidos, de tutela provisória e de tutela definitiva. Já na tutela provisória de caráter incidente o pedido para concessão da decisão provisória é requerido depois ou na mesma petição do pedido de tutela definitiva, de modo que o autor inicia a relação processual com o pedido de tutela definitiva. Aliás, desde o início do processo ele já estruturou a petição inicial com todos os fatos e fundamentos necessários para a propositura da ação principal. O pedido de tutela provisória pode compor a petição inicial ou ser requerido durante o andamento do processo.

           Atenção para não confundir os termos “antecedente,” que se refere a classificação de acordo com o momento processual de requerimento da medida, com “antecipada” ou “antecipatória,” cujos termos se referem à espécie de tutela de urgência que será estudada mais adiante.

            Ainda no que se refere à primeira classificação, existe uma subdivisão das tutelas provisórias de urgência em tutelas cautelares e antecipadas. Essa distinção é muito importante porque cada uma delas protege diretamente um bem jurídico diferente e também porque o código regulamenta essas espécies de forma diferente. As tutelas provisórias de urgência cautelares obedecem às disposições específicas dos artigos 305/310. Já as tutelas de urgência antecipadas têm seu regramento específico dispostos nos artigos 303/304.

             Não obstante a importância da diferenciação entre cautelares e antecipadas, o código não traz seus conceitos, de modo que cabe a doutrina definir e diferenciar essas tutelas. Sobre o assunto remetemos o leitor aos comentários do art. 300, a seguir.

            Por último, é importante ressaltar que, pela própria redação do parágrafo único do art. 294, não é possível requerer a tutela provisória de evidência de forma antecedente. A razão dessa afirmação está no próprio conceito que o Código empresta à tutela de evidência (ver art. 311).

                

3. Da eficácia e da mutabilidade das tutelas provisórias

            Eficácia é a qualidade de produzir o efeito desejado, significa ter força executiva, haja vista que a “eficácia” das tutelas provisórias decorre de sua aptidão para ser realizada no mundo dos fatos imediatamente.

            As tutelas provisórias, uma vez executadas, têm preservados no mundo real os efeitos que produziram até que uma decisão definitiva sobrevenha. Portanto, depois da concessão da tutela provisória, o processo deve continuar em busca da decisão definitiva até ser extinto.

            A extinção do processo pode-se dar com ou sem resolução de mérito, conforme os artigos 487 e 485 do Novo CPC, respectivamente. Quando a decisão final resolve o mérito, ela pode confirmar ou revogar a tutela provisória que fora concedida. De qualquer forma, o que prevalecerá são os efeitos do provimento jurisdicional definitivo.

          Se a extinção do processo foi sem resolução de mérito, também haverá cessação dos efeitos da tutela provisória. Esse é o comando da primeira parte do caput do artigo comentado. Sendo assim, a tutela provisória conserva sua eficácia enquanto durar o processo no qual foi concedida.

          Todavia, o artigo 303 do Novo CPC excepciona essa regra. O dispositivo em referência possibilita a estabilização da tutela provisória antecipada. Neste caso, assim que a medida é efetivada, o processo extingue-se sem que haja a cessação dos efeitos da medida provisória concedida. Além de continuar ativa, a tutela antecipatória estabilizada não pode ser revogada ou modificada no processo em que foi concedida, uma vez ele não estará mais em curso.

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           Qualquer alteração deverá ser requerida em novo processo que tenha como objetivo a tutela definitiva correspondente (sobre a estabilização da tutela antecipada provisória remetemos o autor à leitura dos comentários relativos aos artigos 303 e 304).

            A segunda parte do caput do artigo estudado afirma que a qualquer tempo, na pendência do processo, a medida provisória pode ser revogada ou modificada. Trata-se de disposição harmônica com a natureza das tutelas provisórias, pois todas advêm de cognição não exauriente, insuficiente, portanto, para formar coisa julgada.

            Em outras palavras, o que é provisório se baseia em cognição não exauriente, não atende à garantia da segurança jurídica, por isso deve durar apenas o tempo necessário e indispensável à obtenção da certeza jurídica exarada pela decisão definitiva final (aquela da qual não cabe mais recurso e pode ser definitivamente executada). Portanto, pelo menos em princípio, após a concessão da tutela provisória o processo deve continuar até chegar a um juízo de certeza. Quanto mais o processo avança o conhecimento a respeito do litígio, vai se ampliando e se aprofundando, de forma que o juízo vai adquirindo mais conhecimento sobre o litígio. Fatos supervenientes podem também acontecer e influenciar o processo. Durante esse caminho a medida provisória concedida vai aos poucos sendo corroborada ou confrontada, sendo adequado que o magistrado possa revogar ou modificar a tutela provisória requerida em conformidade com o andamento do processo, em nome da boa prestação jurisdicional.

           São muitas as situações processuais que justificam a revogação ou modificação da tutela provisória. Caso a tutela provisória tenha sido concedida liminarmente, inaudita altera parte, a contestação do réu pode ser motivo suficiente para a cassação da medida.

          Haveria limites para o poder do juiz de revogar ou modificar a medida provisória anteriormente concedida, sem que houvesse ao menos requerimento da parte prejudicada?

        Existem posições doutrinárias que defendem a necessidade de requerimento da parte prejudicada, mas a posição majoritária defende a revogabilidade e modificabilidade de ofício.[4] Acreditamos que o limite a esse poder do juízo está na fundamentação da decisão. Não seria, por acaso, que logo a seguir, no artigo. 298 que vem a seguir, o legislador enfatiza o princípio da motivação das decisões judiciais dispondo: “na decisão que conceder, negar, modificar ou revogar a tutela provisória, o juiz motivará seu convencimento de modo claro e preciso”. Na motivação da decisão o Juízo deve indicar quais acontecimentos processuais fundamentam a revogação ou modificação da medida provisória.

          Ressaltamos que o dispositivo em comento tem aplicação para as tutelas cautelares, as tutelas antecipadas incidentais sem requerimento de estabilização e também, as tutelas de evidência (aquelas não fundamentadas na urgência).

          Quanto às tutelas antecipadas que visam a estabilização, entendemos que extinto o processo no qual a medida foi    concedida e alcançada a estabilização, a tutela somente poderá ser revogada ou modificada no bojo do processo posterior que busca a tutela definitiva, a ser eventualmente instaurado antes do prazo de dois anos, regulado pelo parágrafo 5º do artigo 304 do Novo CPC.

            Ainda não se pode esquecer de comentar a hipótese na qual tenha havido recurso contra a medida provisória e ela tenha sido mantida pelo Tribunal. Neste caso, como ao juiz de primeiro grau é vedado revogar acórdão, a revogação ou modificação da medida estaria vedada ao juízo por decisão interlocutória. Apenas por ocasião da sentença estaria o magistrado autorizado a revogar ou confirmar a medida provisória[5].

 

4. Dos poderes do juiz na efetivação das medidas

          O Código de Processo Civil é peremptório ao afirmar que o juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória (CPC, art. 297).

        Cumpre esclarecer que efetivar a tutela provisória significa executá-la. Nesse sentido, o parágrafo único do citado art. 297 determina que sejam seguidas na execução as normas referentes ao cumprimento provisório de sentença, de maneira que somos remetidos às disposições constantes nos artigos 513 e seguintes do Novo CPC. Ainda segundo o artigo 519 do novel codex, as técnicas de liquidação também se aplicam às tutelas provisórias.

            Podemos concluir da leitura do presente dispositivo que a execução das tutelas antecipadas se faz, em regra, na mesma forma do cumprimento de sentença ainda não transitada em julgado, visto que o parágrafo único manda observar as regras da execução provisória e não definitiva. Sobre a distinção entre essas espécies de execução remetemos o leitor à leitura dos comentários referentes aos artigos 513 e seguintes do CPC, especialmente do artigo 520, que regulamenta o cumprimento provisório da sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo.

            Ressaltamos que as tutelas provisórias podem determinar execuções por quantia certa, para entrega de coisa certa, de obrigações de fazer ou não fazer, ou seja, “todas as medidas adequadas para a efetivação da tutela provisória”.

            Em harmonia com o dispositivo ora estudado está o artigo 301 do Novo CPC que confirma serem as tutelas provisórias cautelares efetiváveis por quaisquer medidas idôneas que assegurem o direito. O artigo, inclusive, traz os seguintes exemplos de medidas cautelares: arresto, sequestro, arrolamento de bens e registro de protesto contra alienação de bem.

         Nos casos de estabilização da tutela antecipada encampamos o entendimento de Heitor Vitor Mendonça Sica[6], para quem a tutela estabilizada enseja execução definitiva, assim que seja extinto o processo nos termos do § 1º do artigo 304 do presente Código. Afinal, não faria sentido criar a estabilização e impor-lhe as restrições do provimento provisório de sentença como a exigência de caução para levantar quantia depositada em dinheiro, ou para alienação de propriedade e transferência de posse. Não podemos esquecer que, nesses casos, quando o executado deixou de recorrer tinha ciência da consequente estabilização de tutela, o que equivale a uma concordância tácita, não com o mérito da tutela, mas com todos os seus efeitos.

                       

 

5. Da motivação da decisão

            Determina o nosso Código de Processo Civil que o juiz deverá motivar seu convencimento de modo claro e preciso toda vez que conceder, negar, modificar ou revogar a tutela provisória (art. 298).

        Tal dispositivo corrobora o princípio processual constitucional da motivação das decisões jurisdicionais, expresso no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, que dispõe: “Todos os julgamento dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões, (...)”.

        O princípio da motivação das decisões judiciais é tradição em nosso ordenamento jurídico e também é reafirmado pelo art. 489 no estatuto processual vigente, tendo em vista que não basta o juiz dizer o direito, sendo de fundamental importância que ele diga quais os fundamentos fáticos e jurídicos que motivaram seu convencimento..

            O princípio da motivação das decisões judiciais está intimamente relacionado ao nosso sistema de valoração das provas produzidas no processo e à liberdade de julgar dos magistrados. Sabemos que impera o princípio do livre convencimento motivado do juiz, segundo o qual o juiz tem liberdade de avaliar e valorar as provas produzidas durante o processo, além de poder formar uma convicção “pessoal” sobre a resolução da lide.

            Trata-se de uma convicção pessoal, mas submetida aos ditames de nosso ordenamento jurídico. Tudo deve se passar como se o magistrado tivesse alcançado conhecer a vontade da lei para o caso concreto. Ao elaborar sua fundamentação ele deve demonstrar que chegou à solução de maneira imparcial, com o raciocínio submetido à lógica, aos princípios e ao conhecimento jurídico-científico. 

      A motivação expressa das decisões jurisdicionais é instrumento imprescindível para saber se houve imparcialidade, se o julgador realmente conheceu a lide, se ele apreciou e considerou os argumentos das partes, enfim se as garantias constitucionais foram respeitadas.{C}[7]

            Entendemos que ao corroborar o princípio da motivação das decisões judiciais neste ponto do código, o legislador quis senão limitar pelo menos alertar para a adstrição o poder do juiz de conceder revogar, modificar, ou conceder as tutelas provisórias aos princípios constitucionais, cujo cumprimento pode ser controlado mediante a análise da motivação das decisões a respeito das tutelas provisórias.

            Mais especificamente em relação à modificação ou revogação de decisão já proferida o Juízo deve indicar com elementos que constam dos autos que os motivos da mudança de seu entendimento.

 

6. Da competência

            Segundo dispõe o art. 299 do Novo CPC, as tutelas provisórias de caráter antecedente devem ser requeridas ao Juízo competente para apreciar o pedido principal. Coerentemente, as tutelas provisórias incidentais também devem ser julgadas pelo juiz natural do pedido principal. As normas relativas à competência estão dispostas nos artigos 44 a 53 do Novo CPC, aos quais remetemos o leitor.

            O parágrafo único do art. 299 diz respeito à competência para julgar o pedido de tutela provisória em nível de tribunal. Isso pode acontecer quando a causa é de competência originária do tribunal, de forma que o juiz de primeiro grau não participa do julgamento da lide ou quando, estando a causa em nível recursal, surge a necessidade ou a conveniência de uma das partes requerer o pedido de tutela provisória. Neste caso, o presente dispositivo determina que a parte faça o pedido diretamente ao órgão do tribunal competente para julgar o mérito do recurso.

            É importante distinguir duas situações: a primeira refere-se à situação interposição de recurso contra a decisão que julgou o pedido de tutela provisória. Concedida ou denegada a medida pelo juiz de primeiro grau, cabe agravo de instrumento que devolve o mérito da tutela provisória ao órgão recursal competente para manter, cassar ou modificar a medida. Nessa hipótese o pedido de tutela provisória foi feito em primeiro grau e a decisão do juiz está sendo combatida pelo recurso.

            Mas é perfeitamente possível que a parte não tenha feito ainda qualquer pedido de tutela provisória ao juízo de primeiro grau. É possível que apenas quando a causa estiver em nível recursal surja a necessidade de uma tutela provisória. Neste caso o pedido de tutela provisória deve ser requerido diretamente ao órgão de segundo grau. Isso independe da espécie de tutela provisória requerida, seja de urgência (cautelares e antecipatórias), seja de evidência, o pedido deve ser feito diretamente no órgão ad quem.

            A concessão de tutelas provisórias em nível recursal é feita principalmente pelo manejo do efeito suspensivo dos recursos. O efeito suspensivo é aquele que retira da decisão recorrida a aptidão para ser executada. Quando um recurso contra qualquer decisão é recebido com efeito suspensivo isso significa a decisão que está sendo combatida pelo recurso não terá eficácia enquanto o recurso não for julgado. O inciso II do artigo 932 do presente Código concede ao relator do recurso poderes para “apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal”. De forma que o relator está autorizado a atribuir efeito suspensivo a recurso que por regra não o tenha (efeito suspensivo ope judicis) e também a cassar o efeito suspensivo dos recursos que como regra o tenham. São exemplos de dispositivos legais que concedem esse poder ao relator: § 3º do art. 1.012; § 1º do art. 1.026; § 5º do art. 1.029, aos quais remetemos o leitor.

 

 

7. Conclusão 

          As tutelas provisórias nunca fazem coisa julgada, ou seja, são inaptas para se tornar imutáveis e indiscutíveis. Já as tutelas definitivas, diferentemente, ao transitar em julgado, adquirem imunidade contra decisões posteriores.

      A coisa julgada é imutável porque não pode ser modificada por decisão posterior. Consequentemente, a propositura de mesma lide em outro processo fica vedada. Além de imutável, ela é indiscutível porque impede que se aprecie a mesma questão em outro processo futuro entre as mesmas partes.          

       Já a tutela provisória não transita em julgado, de modo que pode ser modificada ou revogada por decisão posterior (ver Novo CPC, art. 296), além de também ser rediscutida no mesmo processo ou em outro processo futuro entre as mesmas partes. Uma vez extinto o processo na qual ela foi concedida, a tutela provisória não impede a reapreciação da mesma lide em outro processo entre as mesmas partes.

          Como já dissemos, o objetivo maior das tutelas provisórias consiste em atender à efetividade e à celeridade processuais, de forma que se abre mão de um juízo de certeza em prol da efetividade e celeridade. Um juízo de certeza jurídica somente pode ser obtido após a produção integral de provas, obedecido o contraditório, a ampla defesa, efetivado todo o procedimento legal, enfim, respeitadas todas as garantias do devido processo legal.

            Uma decisão definitiva está fundamentada em uma cognição plena e exauriente. Plena porque significa que o juiz examinou toda a extensão do debate das partes, e exauriente porque foi observado o maior grau de profundidade possível. A decisão proferida com base em cognição plena e exauriente propicia um juízo com o mais elevado índice de segurança em relação à certeza do direito controvertido. Por isso, o Estado confere a essa decisão a autoridade da coisa julgada.

           Diferentemente acontece com as decisões provisórias que estão fundamentadas em cognição sumária, não exauriente. Elas advêm de um juízo superficial e não aprofundado que se baseia na probabilidade do direito alegado pelo requerente. Para o autor, “entre a perfeição e a celeridade, o legislador procurou privilegiar este último, mas em contrapartida deixou de conferir a autoridade de coisa julgada material ao conteúdo declaratório assentado em cognição sumária”.[8]

 

8. Bibliografia

ALVIM, Arruda Manual de Direito Processual Civil, 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

ALVIM, Arruda; ALVIM, Eduardo Arruda; ASSIS, Araken. Comentários ao Código de Processo Civil.  Rio de Janeiro: GZ editora, 2012.

CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela – exposição didática.  7ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010.

MELO, Nehemias Domingos de. Novo CPC Anotado, Comentado e Comparado, 2ª. ed. São Paulo: Rumo Legal, 2016.

NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal.  8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

SICA, Heitor Vitor Mendonça. Primeiras impressões sobre a “estabilização da tutela antecipada” IN: Revista do Advogado, n.126, maio 2015.

WATANABE, Kazuo. Da cognição do processo civil.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

 

 

 

 

 

 

 

 


[1] CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela – exposição didática.  7ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010, p. 1.

[2] MELO, Nehemias Domingos de. Novo CPC Anotado, comentado e Comparado, 2ª. ed. São Paulo: Rumo Legal, 2016.

[3] Sobre o confronto entre princípios processuais constitucionais, vide: Teori Albino Zavascki. Antecipação da tutela, 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 60/70.

[4] Eduardo Alvim, Comentários, art. 807, p. 1260; Câmara, v.  3, p.31; contra apud Lacerda.

[5] ALVIM, Arruda; ALVIM, Eduardo Arruda; ASSIS, Araken. Comentários ao código de processo civil.  Rio de Janeiro: GZ ed. 2012, p. 1260.

[6] SICA, Heitor Vitor Mendonça. Primeiras impressões sobre a “estabilização da tutela antecipada” IN: Revista do Advogado, n.126, maio 2015, p. 120.

[7] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal.  8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 216; c.c. ALVIM, Arruda Manual de Direito Processual Civil, 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 57, v.1.

[8] WATANABE, Kazuo. Da cognição do processo civil.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 108.

Sobre os autores
Nehemias Domingos de Melo

Advogado em São Paulo, palestrante e conferencista. Professor de Direito Civil, Processual Civil e Direitos Difusos nos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito na Universidade Paulista (UNIP). Professor convidado nos cursos de Pós-Graduação em Direito na Universidade Metropolitanas Unidas (FMU), Escola Superior da Advocacia (ESA), Escola Paulista de Direito (EPD), Complexo Jurídico Damásio de Jesus, Faculdade de Direito de SBCampo, Instituo Jamil Sales (Belém) e de diversos outros cursos de Pós-Graduação. Cursou Doutorado em Direito Civil e Mestrado em Direitos Difusos e Coletivos, É Pós-Graduado em Direito Civil, Direito Processual Civil e Direitos do Consumidor. Tem atuação destacada na Ordem dos Advogados Seccional de São Paulo (OAB/SP) onde, além de palestrante, já ocupou os cargos membro da Comissão de Defesa do Consumidor; Assessor da Comissão de Seleção e Inscrição; Comissão da Criança e do Adolescente; e, Examinador da Comissão de Exame da Ordem. É membro do Conselho Editorial da Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil (Ed.IOB – São Paulo) e também foi do Conselho Editorial da extinta Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor (ed. Magister – Porto Alegre). Autor de 18 livros jurídicos publicados pelas Editoras Saraiva, Atlas, Juarez de Oliveira e Rumo Legal e, dentre os quais, cabe destacar que o seu livro “Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum”, foi adotada pela The University of Texas School of Law (Austin,Texas/USA) e encontra-se disponível na Tarlton Law Library, como referência bibliográfica indicada para o estudo do “dano moral” no Brasil.

Márcia Cardoso Simões

Advogada, Professora de Direito Civil e Processual Civil na Universidade Paulista (UNIP), Graduada em Direito e Pedagogia (USP), Mestre em Direito (FADISP), Especialista em Direito Civil (FADISP) e Direito Processual Civil (EPD).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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