A construção do direito à voz nos 16 anos de Lei Maria da Penha

09/07/2020 às 21:43

Resumo:


  • A violência contra a mulher no Brasil tem raízes históricas e estruturais que persistem até hoje, sendo por muito tempo considerada algo normal e familiar.

  • A aprovação da Lei Maria da Penha em 2006 representou um marco importante no reconhecimento da violência doméstica pelo Estado e incentivou vítimas a denunciarem seus agressores.

  • Apesar dos números alarmantes de violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha proporcionou às vítimas meios mais seguros e variados para denunciar, resultando em um aumento de casos denunciados e evidenciando a necessidade de políticas públicas para combater esse tipo de violência.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A Lei Maria da Penha sempre buscou a defesa de direitos básicos da mulher, no entanto, foi preciso um longo caminho para a aquisição do principal deles: o direito à voz.

 

A violência contra a mulher é um fenômeno histórico na sociedade brasileira, ele possuí raízes estruturais que persistem em não deixar as famílias brasileiras. Ignorada pelo Estado por considerar um problema familiar e íntimo demais para que fosse possível uma intervenção, tal violência foi balizada como algo normal por séculos dentro desse país.

No entanto, essa realidade começou a mudar devido a um marco extremamente importante na legislação nacional: a aprovação da Lei Maria da Penha, ocorrida em 2006. Foi aí que o Estado brasileiro passou a reconhecer a importância de sua ação no combate desse tipo de violência silenciosa, que resultou e, ainda resulta, em incontáveis vítimas.

Atualmente, há 16 anos depois desse marco histórico, embora ainda exista violência contra a mulher em números gritantes, chegando a ter muitos que duvidem de sua eficácia, há um ponto positivo que pode ser elencado: Muitas vítimas ganharam voz e passaram a denunciar seus agressores. Uma voz que foi construída com base em uma lei contemporânea e reciclável, justamente pelo fato de possuir um grande núcleo construído por princípios fortes e modernos.

Por conta da facilidade dos meios de denúncias e comunicação com os governos e instituições públicas, nota-se uma clara exposição do problema dentro das famílias brasileiras que antes era silencioso. A tecnologia é usada pelo Poder Executivo para captar denúncias e ameaças a direitos. O Poder Judiciário, por sua vez, busca de forma ativa a resolução das demandas levadas a ele no contexto de violência doméstica e misoginia. Tudo isso provido por um Poder Legislativo que busca a todo o momento inovar em prol dos direitos da mulher nos mais variados contextos da sociedade.

Seja por smartphones, pelo canal de denúncias 180, pessoalmente ou por iniciativa das instituições públicas, a quantidade de possibilidades que a mulher agredida tem para fazer valer o seu direito é muito vasta e totalmente segura. No decorrer desses 14 anos, o Estado treinou e profissionalizou o seus agentes para um tratamento mais humanizado e acolhedor. Consequentemente, houve um aumento nos casos de violência contra a mulher, no entanto, isso é uma resposta lógica pela abrangência e a possibilidade de se realizar denúncias na atualidade.

Sem dúvida, a possibilidade de dar voz a estas mulheres reflete nos seguintes números, retirados do ano de 2018, do Portal do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos [1]:

[...], o Sistema Integrado de Atendimento à Mulher registrou denúncias de ameaças (12.878), cárcere privado (3.065), feminicídio (63), tentativa de feminicídio (2.075), homicídio (44), tentativa de homicídio (308), trabalho escravo (6), tráfico de mulheres (105), violência no esporte (7), violência contra diversidade religiosa (3), violência doméstica e familiar (62.485), violência física (3.263), moral (2.320), obstétrica (75), policial (99), patrimonial (199), psicológica (3.209), sexual (2.317) e virtual (64).

De fato, os números ainda são estarrecedores, no entanto, mostra que estamos no caminho certo. Quando mais denúncias sobre esse tipo de violência, mais será o ênfase e o esforço do Estado no provimento de políticas públicas no combate à violência doméstica e por razões de misoginia.

Sim. São 16 anos da Lei Maria da Penha e muito ainda deve ser construído para que haja igualdade material entre homens e mulheres. Mas os números demonstram que um grande passo foi dado para a existência dessa verdadeira igualdade, o reconhecimento dos direitos da mulher conforme resta elencada na Lei Maria da Penha de que toda mulher goza de direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhes assegurado o exercício efetivo do direito à vida, à segurança, à saúde, à dignidade e, sobretudo, à voz.

E quando se adquire voz em uma sociedade, adquire o instrumento necessário para lutar ainda mais pelos direitos. A voz de milhões de mulheres em um país, antes patriarcal, mostra que em breve, esse presente texto apenas será uma velha recordação de como conseguimos trazer igualdade, justiça e paz para a nação brasileira como um todo, simplesmente pelo fato de respeitar um direito básico de qualquer ser humano.

 

 

Fontes e Referêncas:

[1] Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; Balanço anual: Ligue 180 recebe mais de 92 mil denúncias de violações contra mulheres. disponível em < https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2019/agosto/balanco-anual-ligue-180-recebe-mais-de-92-mil-denuncias-de-violacoes-contra-mulheres>

 

Sobre o autor
Leandro Ferreira da Mata

Cientista Jurídico; bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio Brasília; Especialista em Direito da Criança, Juventude e dos Idosos e em Segurança Pública e Organismo Policial.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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