COISA JULGADA E AÇÃO RESCISÓRIA

17/07/2020 às 21:52
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O ARTIGO DISCUTE SOBRE AS HIPÓTESES DE AÇÃO RESCISÓRIA E DISCUTE SOBRE A COISA JULGADA.

 COISA JULGADA E A AÇÃO RESCISÓRIA

Rogério Tadeu Romano

I – A DICOTOMIA COISA JULGADA FORMAL E COISA JULGADA MATERIAL: A AÇÃO RESCISÓRIA

Proferida a sentença e preclusos os prazos para recursos, a sentença se torna imutável (coisa julgada formal) e, em consequência, tornam-se imutáveis os seus efeitos (coisa julgada material).

A coisa julgada formal consiste no fenômeno da imutabilidade da sentença pela preclusão dos prazos para o recurso.

Por sua vez, a coisa julgada material é a autoridade da coisa julgada na medida em que o comando emergente da sentença se reflete fora do processo em que foi proferido pela imutabilidade de seus efeitos (art. 468 do CPC). É a chamada eficácia pan-processual. O artigo 502. do novo CPC denomina coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso. É o conteúdo deôntico, normativo, dando significado ás ideias de Enrico Tulio Liebman(Coisa julgada).

O disposto no caput do artigo 502 aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:

I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;

II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;

Não fazem coisa julgada os motivos da decisão e a verdade dos fatos, mantendo o novo Código o entendimento do Código de 1973.

Para desconstruir a coisa julgada formal e material formada há a ação rescisória, ação de natureza constitutiva negativa.

II – AÇÃO RESCISÓRIA E O PRAZO DECADENCIAL

O novo CPC de 2015 traz alguns aspectos quanto a ação rescisória a ser proposta em prazo decadencial a ser contado depois de esgotado o prazo para o último recurso. Ou seja: quando não couber mais recursos. Veja-se:

“(...) O prazo decadencial para propositura de ação rescisória começa a correr da data do trânsito em julgado da sentença rescindenda, incluindo-se-lhe no cômputo o dia do começo, e sua consumação deve pronunciada de ofício a qualquer tempo, ainda quando a tenha afastado, sem recurso, decisão anterior. (...” STF - AR 1412 SC, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJe 26/06/2009

“(...) O termo inicial de prazo de decadência para a propositura da ação rescisória coincide com a data do trânsito em julgado do título rescindendo. Recurso inadmissível não tem o efeito de empecer a preclusão - "Comentários ao Código de Processo Civil", José Carlos Barbosa Moreira, volume 5, Editora Forense. (STF - AR: 1472 DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 07/12/2007

“(...) 1. A decadência do direito de desconstituir, em ação rescisória, a coisa julgada material implementa-se no prazo de dois anos iniciado no dia seguinte ao término do prazo para a interposição do recurso em tese cabível contra o último pronunciamento judicial. 2. Inobservância, quando do ajuizamento da ação rescisória, do prazo bienal de decadência. 3. A certidão emitida por funcionário do Poder Judiciário informa apenas a ocorrência, e não a data exata, do trânsito em julgado. (...)” STJ - AR 4374 MA, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª Seção, DJe 05⁄06⁄2012

I – No texto produzido na Câmara, não se fala em “sentença” de mérito, mas em “decisão” de igual conteúdo. A alteração reflete o que doutrina e jurisprudência já vinham reconhecendo há tempos: também decisões interlocutórias são passíveis de rescisão porque, ainda que excepcionalmente, elas também podem conter julgamento sobre o mérito e, portanto, são aptas a projetar efeitos substanciais para fora do processo.;

II – Também passível de rescisão “a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, não permita a repropositura da demanda ou impeça o reexame do mérito”. Isso é rigorosamente correto e está fundado – conscientemente ou não – na premissa de que a rescisão, conquanto sabidamente excepcional (o que decorre da limitação de suas hipóteses de cabimento), deve abranger toda e qualquer decisão que projete efeitos substanciais para fora do processo”.

III - A RESCISÃO E AS DECISÕES DE MÉRITO

A ação rescisória pode ser utilizada para a impugnação de decisões com conteúdo de mérito e que tenham adquirido a autoridade da coisa julgada material. Em que pese incomum, é possível que tais decisões sejam proferidas incidentalmente no processo, antes da sentença. Isso pode ocorrer em três hipóteses: (i) em diplomas anteriores ao CPC/73; (ii) nos processos regulados pelo CPC em que, por algum motivo, um dos capítulos da sentença a respeito do mérito é antecipadamente decidido, de maneira definitiva; e, finalmente (iii) sempre que surja uma pretensão e um direito independentes do direito em causa, para serem decididos no curso do processo.

Exemplo desta última hipótese é a definição dos honorários dos peritos judiciais e do síndico na falência: o direito à remuneração desses profissionais nasce de forma autônoma no curso do feito, e no próprio processo é decidido, em caráter definitivo. Não há por que negar a via da ação rescisória para impugnar tal decisão.(…)” STJ – REsp 711794 SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJ 23/10/2006. Aqui o que se há de falar é em preclusão.

O Código de Processo Civil especifica os casos em que pode ser manejada a ação rescisória cuja condição de procedibilidade, salvo nos casos em que é legitimada a Fazenda Pública e suas autarquias, e o Ministério Público, é o depósito de caução(condição de procedibilidade) de 5% do valor da causa, a teor do artigo 968, II, do Código de Processo Civil de 2015.

A rescisão, pois que cinde(rescinde) a sentença válida, estabelece situação jurídica que seria a existente se não tivesse ocorrido a sentença ou decisão, que se rescindiu.

Disse Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, 1976, pág. 460), que “é da mais alta importância saber-se que a rescindibilidade nada tem com a não-existência), nem com a não-eficácia(portanto, com a declaratibilidade de não-eficácia), nem com as decretações de invalidade(decretações de nulidade ou de anulação). A parecença maior é com a revogação ou com a retratação, mas revocatio é retirada de voz pelo que emitiu a voz(vox), e retratação, é voltar atrás, o que também supõe que retrate quem tratou. No conceito de rescisão não há, de modo algum, essa identidade do agente positivo e do agente negativo. A técnica legislativa tanto pode adotar que a sentença seja rescindida por juiz ou por tribunal de grau superior ao que proferiu a sentença rescindível quanto pelo próprio juiz ou tribunal que a proferiu.

Assim rescindir não é anular.

IV - AS HIPÓTESES TAXATIVAS DE RESCISÃO

A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida nos seguintes casos, expostos de forma taxativa:

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

1. - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

Obtenção de alguma vantagem ilícita pelo magistrado em detrimento do exercício de sua função jurisdicional. Segundo Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, pág. 219) a terminologia que vinha já do CPC de 1973 liga-se ao Código Penal do seu tempo. No fundo, tudo isso envolvia a peita, que se lia no CPC de 1939, no artigo 185, III, causa de rescindibilidade.

2. for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;

Impedimento refere-se a ocorrência de alguma das hipóteses do artigo 144 que devem conduzir ao afastamento do magistrado, por iniciativa própria ou das partes do processo. Trata-se de violação de norma de ordem pública, que contamina de invalidade o processo.

Incompetente: significa violação a pressuposto processual de validade do processo. Trata-se de incompetência absoluta e não relativa, algo que diz respeito ao juízo e impedimento que diz respeito ao juiz, na linha do transcrito em lei. Ensinou Pontes de Miranda que impedimento é conceito de lei de organização judiciária, de direito judiciário material, não de processo. As regras jurídicas a propósito de impedimento escapam às regras jurídicas sobre suspeição, posto que se possas alegar o impedimento com o procedimento de exceção de suspeição. Anote-se que as incompatibilidades tratam de impedimentos. Ainda Pontes de Miranda disse que a expressão “incompetência do juízo”, também tem dois conceitos: o positivo, “juízo”, e outro negativo, “incompetência”. Para que haja incompetência do juízo é necessário que haja “juízo”, por obvio, e não haja “competência”. Trata-se aqui de uma competência absoluta que pode ser ratione materiae e à competência pela hierarquia. Mas, repita-se, a incompetência de que trata a lei para efeito de ação rescisória é a absoluta.

3. resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei.

A hipótese foi ampliada em relação ao antigo Código. Descreve situações em que uma das partes em detrimento da outra ou ambas, em atuação consertada, visa a obtenção de objetivo ilegal no processo. Nesse caso, tem legitimidade, além do terceiro prejudicado, o MP.

O que é dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida? Explicou, para tanto, Pontes de Miranda que dolo estava, naquele artigo 485 do CPC de 1973, no sentido de ato ou omissão em que não há apenas culpa; é direção da vontade para contrariar a direito. No suporte fático, estão o ato, positivo ou negativo, a contrariedade a direito, e a direção da vontade que liga aquele a essa. O dolo da parte vencedora faz rescindível a sentença porque a parte vencedora infringiu, com a prática ou com a falta do seu ato, o seu dever de lealdade e de boa-fé e, além disso, teve por fito prejudicar a parte vencida. Se, por exemplo, a parte vencedora obstou a prática de ato processual, ou mesmo extraprocessual, para que não produzisse prova a parte vencida, o que lhe deu causa à desfavorabilidade da sentença, houve dolo. Se não houve relação causal entre o ato ou a omissão dolosa e a desfavorabilidade da sentença não está formado o pressuposto. Se o vencedor sabia que a prova era falsa, a causa de rescindibilidade não poderia ser a que existia no artigo 485, III, mas ainda a do artigo 485, VI, do CPC de 1973 e agora do CPC de 2015. Mas o dolo pode ser da parte vencedora, ou de seu procurador, ou advogado, e – em se tratando de pessoa jurídica -de órgão ou de representante, ou de advogado, pois o que importa, como Pontes de Miranda, à luz de Nicola Giudiceandrea, Le Impugnazioni civile, II, 408) é que tenha poderes de presentação ou de representação, outorgados pela parte vencedora.

4. colusão das partes

Fala-se ainda na colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei. Essa colusão entre as partes em fraude à lei é o acordo, ou concordância, entre as partes, para que, com o processo, se siga o que a lei não lhe permitiria, ou não permitia, o que tem por base a simulação(causa de anulação do negócio jurídico)ou outro ato em fraude à lei.

Mas se houve conluio, ajuste entre as partes, inclusive o Ministério Público, quando presenta(pois é órgão) ou quando representa, ou entendimento entre elas para fraudar a lei, há rescindibilidade da sentença. A colusão deve ser entre as partes.

5. ofender a coisa julgada:

 É possível a rescisória para desfazer a coisa julgada que tenha se formado em segundo lugar, ainda que proveniente de processo iniciado anteriormente, prestigiando, com isso, a proteção constitucional do inciso XXXVI do artigo 5º CF, uma verdadeira garantia constitucional.

Para Pontes de Miranda a ação rescisória ataca a coisa julgada formal(Tratado da ação rescisória, pág. 242). Um dos pressupostos é ter a sentença que se quer rescindir, violado a coisa julgada material de outra sentença, ou apenas a coisa julgada formal.

Há uma questão a levar em conta: Se duas sentenças forem absolutamente iguais, proferidas pelo mesmo juiz, no mesmo processo, só a primeira vale. Se proferidas em dois processos diferentes, na mesma espécie(identidade de ação), vale a primeira, ou, passados os dois anos, a segunda, se não foi executada, ou não começou a ser executada a primeira. Não sendo iguais, ainda que in minimis, dá-se a ofensa à coisa julgada. A rescindibilidade pende, durante o biênio decadencial, e após ele rege a segunda e não a primeira, salvo se a primeira já se executou o começou de executar-se. Se o momento posterior ao prazo bienal da segunda encontra a outra em execução, ainda não precluso o prazo para embargos de devedor, pode o executado, segundo Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, pág. 254), a que a segunda sentença interessa, opor-se à execução, sustentando a irrescindibilidade da segunda sentença. A execução posterior da primeira não pode ofender a irrescindibilidade da segunda.

A decisão inconciliável com o julgado anterior, porém que, não obstante, já se tornou irrescindível, prevalece. O fundamento disso não é a renúncia à sentença anterior ou a aquiescência à posterior. Não é, por si, ato jurídico ou de consequências jurídicas interindividuais.

6. violar manifestamente norma jurídica:

Trata-se aqui daquela decisão que destoa do padrão interpretativo da norma jurídica (de qualquer escalão) em que a decisão baseia-se. Eventual divergência jurisprudencial não deve ser compreendida como elemento a descartar a rescisória por esse fundamento.

Não é certo que a ação rescisória tenha por fito, como o recurso especial ou o recurso extraordinário, manter a unidade do sistema federal. O remédio rescisório não possui tal função.

Na lição de Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, 5ª edição,1976, pág. 283), “se existe regra jurídica interpretativa, que foi infringida ao se interpretar negócio jurídico, ou ato jurídico stricto sensu, cabe ação rescisória: a regra jurídica interpretativa, ius interpretativum, é regra de direito, como qualquer outra. Se o erro é na sua interpretação, sem se infringir ius cogens, ius dispositivum ou ius interpretativum, então sim.

Assim se o juiz viola regra de direito pré-processual, processual, material, constitucional, administrativo, judiciário interno, sobredireito no tempo ou no espaço, ou no espaço-tempo, a ação rescisória cabe.

Alguns julgados exigiram que tenha havido discussão sobre a violação da lei, uma espécie de pré-questionamento.. De modo algum, não.

Pontes de Miranda, aliás(obra citada, pág. 290) lembrou que: “A Corte de Apelação do Distrito Federal, a 16 de dezembro de 1936, julgou caso de violação de direito processual expresso, mandando que se julgasse o recurso cabível, do qual o acórdão não conhecera, desprezando o recurso cabível, do qual o acórdão não conhecera, desprezando o texto da lei então vigente. A 25 de maio de 1938, o Tribunal de Apelação do Distrito Federal assentou: “... em conhecer da ação rescisória, se bem que se não houvesse invocado, no processo da sentença rescindenda, a lei que se diz violada, desde que é aplicável de ofício(Pontes de Miranda, A ação rescisória contra as sentenças, 197, s)”.

O autor deve indicar o dispositivo jurídico cuja regra foi violada.

Para o cabimento da ação rescisória, o que importa é que tenha havido infração da regra jurídica, ofensa ao direito em tese. Quais os degraus que subiu o juiz para a conclusão, qual o caminho tortuoso que tomou, como ensinou Pontes de Miranda, mesmo se reproduz a regra jurídica, se lhe acentua os conceitos, se põe em relevo os seus dizeres, há rescindibilidade da sentença se não atendeu ao preciso sentido da regra jurídica, tal como ela se insere no sistema jurídico. Infringe regra jurídica quem a interpreta erradamente. Ao juízo rescindente cabe a missão de apura-lo.

Mas o juiz é obrigado a conhecer o direito.

As sentenças de eficácia impossível e as outras em que alguma impossibilidade absoluta as fere não são rescindíveis, são decisões ineficazes. Assim: se personalíssima a prestação, passiva ou ativamente, e falece o obrigado, ou o credor; b) se perece o objeto, em casos raríssimos em que não subiste a obrigação; c) se a relação jurídica se extingue sem ser por execução, novação, ou outro modo convencional.

Por sua vez, o julgamento ultra petita ou citra petita constitui violação às regras processuais.

Como escreveu ainda Pontes de Miranda(Comentários ao CPC, volume 6, n. 9, pág. 216), pode haver ação rescisória ainda quando a infração do direito concerne àquelas regras sujeitas à interpretação. Para a caracterização da hipótese prevista na regra que ocupava o artigo 485, V, do CPC de 1973, não e necessário que a ofensa dirija-se ao teor literal do dispositivo normativo. Ainda há violação quando a sentença veicular orientação incompatível com a interpretação correta da norma.

É caso em que a violação deriva da pura e simples aplicação incorreta das normas jurídicas(aplicação de regra inaplicável o desconsideração de regra que deveria incidir). É a esse segundo grupo de hipóteses que se aplica a fórmula “violar literal disposição de lei”. A expressão tem o sentido da ofensa ao ordenamento que se constata independentemente do reexame dos fatos da causa.

É caso, pois, de violação de direito em tese.

Observe-se a Súmula 343 do STF:

Súmula 343

Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

Teses de Repercussão Geral

● A decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das decisões anteriores que tenham adotado entendimento diferente. Para que tal ocorra, será indispensável a interposição de recurso próprio ou, se for o caso, a propositura de ação rescisória própria, nos termos do art. 485 do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495).

[Tese definida no RE 730.462, rel. min. Teori Zavascki, P, j. 28-5-2015, DJE 177 de 9-9-2015,Tema 733.]

● Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente.

[Tese definida no RE 590.809, rel. min. Marco Aurélio, P, j. 22-10-2014, DJE 230 de 24-11-2014,Tema 136.]

Jurisprudência selecionada

● Afastamento da Súmula 343 e interpretação constitucional

No tocante à preliminar de incidência da Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal, ressalto que, em se tratando de ofensa à norma constitucional, ao comentar o art. 966, V, do Código de Processo Civil, Humberto Theodoro Junior pondera que "a súmula 343 não deixa de se aplicar, invariavelmente, às ações rescisórias, cujo objeto envolva tema constitucional. Mas, o que não se justifica é o seu afastamento em caráter absoluto na aplicação do art. 966, V, do NCPC, quando se cogitar de ofensa à norma constitucional" (Curso de Direito Processual Civil, Volume III, 50ª edição, Editora Forense, p. 864). Conforme já afirmou o Pleno do Supremo Tribunal Federal, "Preliminar de descabimento da ação por incidência da Súmula STF 343. Argumento rejeitado ante a jurisprudência desta Corte que elide a incidência da súmula quando envolvida discussão de matéria constitucional." (Ação Rescisória 1409/SC, Rel. Min. Ellen Gracie).

[AR 1.981 AgR, rel. min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. min. Dias Toffoli, P, j. 20-2-2018, DJE 39 de 1-3-2018.]

● Súmula 343 e ofensa à Constituição

Reitero que o entendimento aplicado por esta Suprema Corte quando da prolação do decisum rescindendo estava de acordo com seu entendimento e prevalece até a presente data. E, ainda que houvesse algum indicativo de alteração do entendimento quanto à questão posta nos autos (o que não é o caso, pois esta Corte se mantém firme em sua compreensão), não restaria configurada a alegada causa de rescindibilidade da decisão, prevista no art. 966, inciso V, do Código de Processo Civil atual, pois, conforme tese fixada no julgamento do Tema 136 da Repercussão Geral (RE 590.809/RS): "não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente"

[AR 2.572 AgR, rel. min. Dias Toffoli, P, j. 24-2-2017, DJE 54 de 21-3-2017.]

Acompanho o relator quanto ao tema de fundo, porém peço vênia para manter o meu entendimento (...). Entendo que é cabível ação rescisória fundada em violação a literal dispositivo de lei (art. 485, V, do antigo CPC), quando a decisão rescindenda tiver se baseado em interpretação constitucional frontalmente contrária à própria Constituição Federal ou em interpretação tida como incompatível pelo Supremo Tribunal Federal, ainda que seja pela posterior declaração de inconstitucionalidade superveniente da legislação que amparou o título executivo transitado em julgado, não se aplicando a ratio essendi da Súmula 343 do STF. (...) É sabido que o Plenário desta Corte, recentemente, passou a entender aplicável a súmula 343 do STF, inadmitindo ação rescisória fundada em ofensa à literal dispositivo de lei (art. 485, V, do CPC), aos casos de interpretação de norma constitucional controvertida à época da decisão rescindenda, consubstanciada no RE 590.809, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 24.11.2014 (discussão envolvendo creditamento de IPI). Ocorre que tal julgado teve como pano de fundo a existência de divergência de entendimento interna no próprio STF, de modo a manter o aresto transitado em julgado quando a jurisprudência do Pretório Excelso era vacilante. Por outro lado, não há como aplicar a súmula 343 do STF (...) aos casos em que o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sempre decidiu no mesmo sentido (...).”

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[AR 2.572 AgR, voto do min. Gilmar Mendes, red p/ o ac. min Dias Toffoli, P, j. 24-2-2017, DJE 54 de 21-3-2017.]

Bem se percebe, portanto, que o Tribunal, nesse julgamento (RE 590.809/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 24/11/2014), não operou substancial modificação da sua tradicional e cristalizada jurisprudência no sentido de que a Súmula 343 não se aplica em ação rescisória fundada em ofensa à Constituição. O que o Tribunal decidiu foi outra questão: ante a controvérsia, enunciada no acórdão que reconheceu a repercussão geral da matéria, a respeito da possibilidade ou não da 'rescisão de julgado fundamentado em corrente jurisprudencial majoritária existente à época da formalização do acórdão rescindendo, em razão de entendimento posteriormente firmado pelo Supremo', a Corte, por maioria, respondeu negativamente. Em outras palavras: o que o Tribunal afirmou, naquela oportunidade, foi que a superveniente modificação da jurisprudência do STF não autoriza, sob esse fundamento, o ajuizamento de ação rescisória para desfazer acórdão que aplicara jurisprudência firme até então vigente no próprio STF.

[AR 2.370 AgR, rel. min.Teori Zavascki, P, j. 22-10-2015, DJE 225 de 12-11-2015.]

2. In casu, incide a Súmula 343 deste Tribunal, cuja aplicabilidade foi recentemente ratificada pelo Plenário deste Tribunal, inclusive quando a controvérsia de entendimentos se basear na aplicação de norma constitucional (RE 590.809, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 24/11/2014).

[AR 1.415 AgR-segundo, rel. min. Luiz Fux, P, j. 9-4-2015, DJE 79 de 29-4-2015.]

4. Ação Rescisória. Matéria constitucional. Inaplicabilidade da Súmula 343/STF. 5. A manutenção de decisões das instâncias ordinárias divergentes da interpretação adotada pelo STF revela-se afrontosa à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional. 6. Cabe ação rescisória por ofensa à literal disposição constitucional, ainda que a decisão rescindenda tenha se baseado em interpretação controvertida ou seja anterior à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal. 7. Embargos de Declaração rejeitados, mantida a conclusão da Segunda Turma para que o Tribunal a quo aprecie a ação rescisória.

[RE 328.812 ED, rel. min Gilmar Mendes, P, j. 6-3-2008, DJE 78 de 2-5-2008.]

● Súmula 343 e ofensa à literal disposição de lei

Ação rescisória - Violação a literal dispositivo de lei - interpretação - divergência - negativa de seguimento. Envolvida norma de interpretação controvertida, incabível é a rescisória - Verbete 343 da súmula do Supremo.

[AR 2.435 AgR, rel. min. Marco Aurélio, 1ª T, j. 25-8-2015, DJE 186 de 10-9-2015.

Sabe-se que a orientação tomada pelo ministro Gonçalves de Oliveira nos EAR 602 deu motivo a essa súmula: “Entendo que não é possível, em rescisória, alterar o julgamento proferido em grau de embargos ao recurso extraordinário, com amplo debate, sem que se possa dizer que o julgamento é nulo por violação da lei. O Tribunal tomou, após ampla discussão, uma interpretação razoável da lei, firmada, de resto, de acordo com precedentes. Destarte, não caberia ação rescisória para anular a sentença anterior do Supremo Tribunal, porque, em favor do mesmo, da tranquilidade pública, da tranquilidade jurídica, em razão mesmo da eficácia da coisa julgada, terminou o julgamento, ainda que tomado por maioria ocasional”.

Na AR 323, também o STF adotou a mesma orientação(DJU 18.12.1970). Na matéria é costume ler as lições de Luiz Eulálio de Bueno Vidigal, Comentários ao Código de Processo Civil, v. VI,/116 e 165, ed. RT. Aliás, segundo Vidigal, a regra daquele artigo 485, V, apenas se aplicaria às violações de literal disposição da lei vinculadas na própria sentença rescindenda, no conteúdo do julgamento. A violação assim não poderia consistir em error in procedendo cometido por ocasião da sentença. Haveria de ser error in iudicando contido na sentença, ainda que versando sobre norma de caráter processual. Segundo Eulálio Vidigal, os outros casos de rescisória previstos nos demais incisos e que concernem a errores in procedendo também envolveriam implícita ou explicitamente violação de literal disposição da lei. Sendo assim aquele inciso V deveria ser examinado de forma restrita. Mas, para Eduardo Talamini esses argumentos não procedem.

Já se entendeu que esse texto não se aplica quando a controvérsia for em relação a texto constitucional(RE 101.114, DJU de 10 de fevereiro de 1984, relator ministro Rafael Mayer). Não se aplica quando a interpretação controvertida se circunscreve a um mesmo tribunal(RE 96.952, DJU de 5 de novembro de 1982). Descabe a rescisória quando a decisão rescindenda foi proferida segundo a jurisprudência dominante na época(AR 957, RTJ 104/944, 114/361 e 125/267). Se a jurisprudência alterou-se quando do julgamento do recurso extraordinário, viável a divergência. Entretanto, se a decisão recorrida foi prolatada em ação rescisória, não será possível o provimento para prevalecer a jurisprudência atual(Ag.88.486, Rel. ministro Aldir Passarinho, RTJ 110/1072). Ainda tenha-se quanto a aplicação da súmula 343, o julgamento na AR 1.124, relator ministro Francisco Rezek, RTJ 110/487.

Por seu turno, tem-se a sumula 400 do STF:

Súmula 400

Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra "a" do art. 101, III, da Constituição Federal.

Jurisprudência selecionada

● Afastamento da Súmula 400 em matéria de índole constitucional

(...) esta Corte já assentou que "temas de índole constitucional não se expõem, em função da própria natureza de que se revestem, à incidência do enunciado 400 da Súmula do Supremo Tribunal Federal" (...).

[RE 434.059, rel. min. Gilmar Mendes, P, j. 7-5-2008, DJE 172 de 12-9-2008.]

Temas de índole constitucional não se expõem, em função da própria natureza de que se revestem, à incidência do enunciado 400 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. Essa formulação sumular não tem qualquer pertinência e aplicabilidade às causas que veiculem, perante o Supremo Tribunal Federal, em sede recursal extraordinária, questões de direito constitucional positivo. Em uma palavra: em matéria constitucional não há que cogitar de interpretação razoável. A exegese de preceito inscrito na Constituição da República, muito mais do que simplesmente razoável, há de ser juridicamente correta.

[AI 145.680 AgR, rel. min. Celso de Mello, 1ª T, j. 13-4-1993, DJ de 30-4-1993.]

Bem lembrou Eduardo Talamini(Coisa julgada e sua revisão, pág. 163) que “em certo sentido, a ideia de que as várias interpretações cogitadas pelas diferentes correntes jurisprudenciais seriam todas “razoáveis” pressupõe a noção de que haveria alguma “discricionariedade” na atividade de interpretação e aplicação da lei pelo juiz. O processo interpretativo conduziria a uma multiplicidade de alternativas, todas equivalentes entre si. A escolha de uma delas, em lugar da outra, não seria censurável”.

Mas, o próprio Eduardo Talamini(obra citada) não reputa correta essa noção. Disse ele: “A atividade de concreta determinação do “conceito vago” envolve certa “liberdade” do julgador que será exercida levando-se em conta as “máximas da experiência”, os valores reinantes na comunidade, e assim por diante. Mas, nela, não há propriamente discricionariedade. Estando o “conceito vago” na hipótese da incidência da norma, terá de ser identificados, concreta e precisamente, que fatos a ela se subsumem”.

O ministro Eros Grau(Crítica da discricionariedade e restauração da legalidade. Perspectivas do direto púbico, Estudos em homenagem a Miguel Seabra Fagundes, 1995) embora afirme que a aplicação dos chamados “conceitos indeterminados” constitui “juízo de legalidade” e, não, discricionariedade, discorda da noção de que nessas situações haveria apenas uma solução justa. Segundo, aliás, o ministro Eros Grau, “inexistem, no âmbito do direito, soluções exatas”, mas “sempre, para cada caso, um elenco de soluções corretas”, porque “direito não é ciência, mas prudência’.

Leve-se em conta, aliás, que para que o sistema jurídico possa operar, inclusive no que concerne à efetivação da isonomia, do controle dos atos estatais, da inafastabilidade da tutela, da segurança e certeza jurídica, há de se pressupor que, idealmente, há uma única solução correta. O sistema jurídico, como lembrou Talamini(obra citada, pág. 165) contempla diversos outros mecanismos inspirados nesse ideal(uniformização da jurisprudência, recurso especial, recurso extraordinário).

O que se tem da súmula 343 do STF? Se a interpretação de determinada norma é “controvertida nos tribunais, isso no mais das vezes significa que há uma grande quantidade de casos similares submetidos ao exame do Judiciário. Nesses casos, certamente, a adoção de diferentes soluções(ainda que razoáveis) para casos identificáveis tende a multiplicar as situações anti-isonômicas.

Lembre-se que, de há muito, se sedimentou no STF, o entendimento de que a súmula 343 é inaplicável em matéria constitucional.

Tenha-se em resumo:

a) A hipótese de violação da lei não se limita à ofensa de norma de direito material. A violação pode recair sobre norma processual, desde que geradora de “nulidade absoluta” e não mera invalidade sanável pela falta de arguição tempestiva no curso do próprio processo;

b) A violação de dispositivo processual nem mesmo precisa consistir em jui´zo incorreto sobre tal norma formulada no conteúdo da sentença rescindenda(error in iudicando). Pode-se tratar de vício derivado da inobservância de requisitos de tempo, lugar ou forma;

c) É sequer necessário, como afirmou Eduardo Talamini(obra citada, pág. 171), que a violação se dê na própria sentença rescindenda ou por ocasião do seu proferimento. A ofensa pode ter ocorrido no curso do processo.

d) Por outro lado, é ainda possível que a rescisória fundamente-se em ofensa a norma de direito material havida ainda no curso do processo. Tal seria o caso de decisão interlocutória que, na fase saneadora, descarta prescrição, ofendendo a literal disposição sobre o tema.

7. for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;

Nesse caso, a prova falsa deve ter sido o fundamento bastante da decisão rescindenda, sendo indiferente que sua falsidade seja apurada em processo criminal ou no próprio processo em que se pretende a rescisão.

Para Pontes de Miranda(Tratado de direito privado, pág. 311), enquanto corre(ou não se iniciou) o processo criminal, não pode correr o prazo para se propor a ação rescisória da sentença com a invocação que era dada no artigo 485, VI, primeira parte, do CPC de 1973. O sistema jurídico, para Pontes de Miranda, teve que acolher tal fundamento exatamente para evitar a contradição entre a sentença rescindenda e o julgado criminal, que lhe infirma o principal fundamento.

8. falsa prova

A sentença civil que declare a falsidade da prova, essa não tem a consequência de abertura do prazo preclusivo, porque a ela não se referia a lei processual. Trata-se de decisão civil como elemento de prova para a ação rescisória dentro do biênio decadencial.

Pergunta-se: A absolvição no juízo criminal obsta à propositura da ação rescisória com o fundamento aqui estudado? Para Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, pág. 313), é a questão da coisa julgada material da sentença penal em relação a ação civil. Se a sentença penal afirma que não foi usado o documento, ou produzida outra prova, ou não foi prestado o testemunho(inexistência material do fato) e o documento ou o testemunho de outra prova foi o fundamento da sentença civil, não se pode negar a ação rescisória.

Mas, observe-se: se a ação penal está prescrita, ou se está prescrita a condenação, a ação rescisória, desde que no curso do prazo decadencial de dois anos, pode ser proposta.

Pode a parte que produziu o documento pedir a rescisão? Se no documento que foi apresentado pela parte se firmou o juiz para dar ganho de causa à parte contrária, claro que sim. Igualmente, se se trata de procedimento inquisitivo ou de processo em juízo dúplice.

A prova há de ser o fundamento em que se apoiou o juiz para decidir como decidiu. O juiz da rescisão pode verificar qual foi ele, como ensinou Pontes de Miranda, examinando o encadeamento lógico da sentença. Se há dois fundamentos somente não cabe a rescisória se o outro bastaria para se decidir como se decidiu, isto é, se admitindo-se a falsidade, a decisão rescindenda teria sido a mesma que se deu.

Mas pode ocorrer que a falsidade da prova só atinja o fundamento para um dos pedidos. Então, a rescisão é rescisão parcial. O que foi julgado, sem se apoiar na prova falsa, fica incólume à eficácia da sentença rescindente.

Nesse ponto, Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, pág. 322), assim se pronuncia: “Fala-se, no artigo 485, VI, de sentença que se fundou em prova, cuja falsidade foi apurada em processo criminal, ou se prova na própria ação rescisória. Pergunta-se: se o fundamento foi numa ou duas ou mais provas, porém, alguma ou algumas não são falsas. É rescindíveis a sentença? Tudo se há de resolver segundo princípio da suficiência probatória: se há prova ou provas que não se arguem de falsas a elas não bastariam ao julgamento que ocorreu, há a rescindibilidade; se a prova ou as provas em que houve falsidade são suficientes para julgar tal como se julgou, não cabe pensar-se em ação rescisória. Se há duas conclusões separadas(independentes entre si) e a falsidade somente concerne a uma delas, de modo que pode persistir a parte inatingida, a rescindibilidade só atinge a parte que se fundou em falsa prova”.

9. obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;

A prova documental trazida em de ser capaz de, por si só, assegurar pronunciamento favorável.

Exige-se que a existência da prova tenha sido ignorada pelo autor (e cuja descoberta altera o prazo para a rescisória - art. 927 § 2), ou que dela não faça uso no processo originário, em que foi proferida a decisão. Além disso, a prova nova deve ter o condão de por si só, assegurar pronunciamento favorável ou benéfico.

Observe-se que o documento que se obteve, sem que dele tivesse noticia ou não tivesse podido usar o autor da ação rescisória, que foi vencido na ação em que se proferiu a sentença rescindenda, tem de ser bastante para que se julgasse procedente o pedido na demanda. Se bastante aí, é ser necessário, mas não é de exigir-se que só ele bastasse, excluído ouro ou excluídos outros que foram apresentados. Como disse Pontes de Miranda, o que se exige é que sozinho ou ao lado de outros, que constaram dos autos, seja suficiente.

Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

O artigo altera o termo inicial do prazo de 2 anos para a rescisória fundada em prova nova. Não mais o transito em julgado da decisão, mas sim a “data de descoberta da prova nova Nas hipóteses de simulação ou de colusão das partes, o prazo começa a contar, para o terceiro prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou da colusão.

 Contudo, o mais relevante é a previsão que vem a seguir: o prazo máximo para a ação rescisória fundada em prova nova será de 5 anos do transito em julgado da última decisão.

Fala-se que o exame de DNA é uma prova nova. A data da descoberta pode ser o momento em que o DNA se popularizou. Mitiga-se assim a coisa julgada pelo uso da ação rescisória naquilo que se tinha como relativização da coisa julgada na doutrina de Paulo Otero.

Na matéria, trago o entendimento de Eduardo Talamini(Coisa julgada e sua revisão, pág. 621). Ali se diz que se a sentença sobre a relação de filiação amparou-se em presunções e veiculou conclusão diversa daquela a que chegaria com o exame de DNA, não se poder dizer, só por isso, que a “prova” seja “falsa”. É certo que Theodoro Junior sugeriu ser essa hipótese de ação rescisória. A presunção, sabe-se, não é, em si mesma, meio de prova. É atividade intelectiva desenvolvida pelo juiz para formar convencimento sobre a ocorrência de um fato(principal) a partir de outro(secundário) que ele já reputa comprovado.

Para Eduardo Talamini só haverá falsidade quando as próprias provas empregadas para a constatação do fato secundário não correspondem à realidade. Assim disse ele: “O exame hematológico não excluiu a paternidade, e as testemunhas ouvidas relataram que o réu na ação de investigação mantinha relação íntima e coabitava com a mãe do autor na época e correspondente à concepção; o réu recusou-se a se submeter ao exame do DNA; o juiz, com base em tais indícios julgou procedente o pedido. Posteriormente, verifica-se mediante exame de DNA que o autor não é filho do réu. É perfeitamente possível que isso ocorra sem que as provas produzidas sejam falsas: as testemunhas falaram a verdade, o exame hematológico estava correto, o réu de fato não aceitou passar pelo exame do DNA no curso do processo. Apenas o processo dedutivo conduzido pelo juiz, muito embora parecesse razoável, conduziu a resultado errado. Em caso como esse, não há de se falar em rescisória por falsidade da prova”. Na matéria, já decidiu o STF: “A circunstância de na ação rescisória ter sido feita prova melhor do que a produzida na causa originária não importa na falsidade desta”(RE 90.816-SP, rel. Ministro Soares Muñoz, DJU de 23 de novembro de 1979).

Mas há quem sugira o enquadramento na hipótese de erro de fato. Essa situação não parece ser a mais adequada.

A terceira solução de que se pode cogitar consiste em enquadrar o caso em exame na hipótese de rescisória com base em provas novas, interpretação extensiva, que se dá ao caso de documentos novos.

Sérgio Rizzi(A ação rescisória, n. 95, pág. 172) apontou a impossibilidade de se aplicar a analogia para se aplicar aquele artigo 485, VII, do CPC de 1973.

O STJ já enfrentou a matéria ao aduzir: “O exame de DNA obtido após a improcedência da investigatória de paternidade é documento novo para o fim de ensejar a ação rescisória”(STJ, REsp 189.306/MG, relator para o acórdão o ministro Cesar Rocha). No passado, o STJ chegou a admitir a realização do exame no próprio processo rescisório(Not. STJ, 07.05.2004, 2º S, s/indic. Do n. do processo, relator ministro Humberto Gomes de Barros).

Já se entendeu que o magistrado tem o dever de determinar a produção dessa prova, mesmo que as partes não a tenham pleiteado(STJ, REsp 4.987 – RJ, relator minisro Sálvio de Figueiredo Teixeira, RSTJ 129/359.

Nos casos em que o exame do DNA foi deferido ou determinado ex officio, mas não pode ser realizado porque houve recusa da parte em se submeter à coleta do material, a questão assume outra configuração. Há precedente de julgamento no STF, onde, por apertada margem, decidiu-se que tal recusa é legítima, cabendo ao juiz, nessa hipótese, considerar tal conduta da parte como indício desfavorável aos fatos por ela defendidos(HC 71.373 – RS, relator ministro Marco Aurélio, RTJ 165/902).

10. for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.

Dá-se quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou considerar inexistente fato efetivamente ocorrido. Além disso, o fato não pode dizer respeito a ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado, nem tenha tido pronunciamento judicial.

§ 1o Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.

Para Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, pág. 341), a generalidade do conceito, que é o conteúdo do erro de fato em boa terminologia, seria nociva, razão por que aquele artigo 485, IX, do CPC de 1973, além de se referir à cauas do erro de fato, limitando, portanto, a dimensão conceitual, teve após si os parágrafos primeiro e segundo que mais longe levam a uma limitação.

O erro de fato não é error iuris, mas só error facti. Todavia, se o juiz teve de fundar a sentença no que a parte produziu como prova do teor e da vigência de direito municipal, estadual, estrangeiro, ou consuetudinário, e se verifica que houve erro do juiz por ser falsa a prova, aí o erro do juiz foi error iuris, a despeito de se ter produzido prova falsa.

Pontes de Miranda(Tratado de ação rescisória, pág. 342), se a sentença se fundou em erro de fato, ligado a ato da causa ou a documento que nela se apresentou, há rescindibilidade. O juiz pode ter sido levado a erro devido à apreciação de algum documento, ou de qualquer ato praticado no processo, e não só ato de produção de prova. Aquele parágrafo primeiro, frisava que havia erro quando a sentença admitia com existente fato que não ocorreu(não existiu), ou como inexistente o que ocorreu.

Cogita-se, pois, em erro de fato. O erro foi do juiz, posto que a sua culpa possa ter sido mínima, devido a atos, que constavam do processo, ou de documentos apresentados. Pode ser que se tenha admitido fato que não ocorreu, e para isso haja contribuído a atitude a atitude de alguma das partes, de assistentes, de peritos, de técnicos ou de testemunhas, ou algum documento; ou que se haja repelido a inexistência – ou a continuidade – de fato que não se dera, ou que cessara. Se o juiz, diante da prova que se fez, decidiu conforme o que se apresentou como prova, e errou, a parte ou interessado que foi ofendido com o julgado pode propor a ação rescisória. Da mesma forma se o juiz crendo conhecer a legislação estrangeira, dispensou a prova. Surge o problema como disse Pontes de Miranda(Tratado de ação rescisória, pág. 344), de se saber se pode ser proposta a ação rescisória pela parte que apresentou a prova errada, ou já impertinente.

O erro pode consistir em se ter afirmado que o fato acontecera, ou que não acontecera, ou que acontecera no momento b, que interessa a causa, ou que não acontecera em tal momento, e a afirmação se referiu, erroneamente, ao momento b, em vez de só admitir ter existido ou não ter existido no momento a ou c ou a e c.

Mas, além disso, pode ser que ao fato existente fosse estranho o elemento subjetivo(ato praticado pelo autor, ou pelo réu). O que importa é tratar-se do ato ou fato que seja ponto de exame para o juiz. Quem o levou ao processo, como ensinou Pontes de Miranda, mesmo se não o devia fazer, ou não o podia, não se precisa indagar, porque o juiz se baseou no que consta nos autos, e errou.

V - A LEGITIMIDADE

 Serão legitimados para ela quem for parte no processo ou o seu sucessor a título universal e singular, o terceiro juridicamente prejudicado e o Ministério Público.

Irá se cumular na petição inicial a rescisão da decisão transitada em julgado com novo julgamento do mérito, na dicotomia(iudicium rescindens, de cunho declaratório ou constitutivo negativo, se procedente) e rescissorium, um novo julgamento de mérito(pedido, lide).

VI - A COMPETÊNCIA

Barbosa Moreira escreveu que: “do texto de vários dispositivos do capítulo Do processo nos tribunais, do vigente Código de Processo Civil, dessume-se que o legislador concebeu como competente para ação rescisória, sempre, um tribunal, entendida aqui esta palavra no sentido de órgão colegiado, a que normalmente cabe o exercício da função jurisdicional em grau superior” (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 5, 14ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2012, pág. 201).

Como lembrou José Rogério Tucci(Novo Código de Processo Civil traz mudanças na ação rescisória, Conjur), "quando o acórdão de mérito foi proferido pelo tribunal de origem e o litigante derrotado interpõe recurso especial dirigido ao Superior Tribunal de Justiça. Inadmitido este, maneja agravo regimental contra a respectiva decisão monocrática, que é julgado por órgão colegiado, produzindo um acórdão naquela instância superior. Desavisada, a parte interessada, cometendo flagrante atecnia, afora a ação rescisória perante o Superior Tribunal de Justiça, o qual não julgou mérito algum.

O mesmo se observa, em sentido contrário, ou seja, a rescisória é ajuizada no tribunal de origem, quando, na verdade, deveria atacar o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que examinou o mérito da causa e, portanto, competente para julgar a rescisória."

Assim se manifestou o STJ, pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Ação Rescisória n. 2.821-SP, de relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira: 

"Manifestado pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Ação Rescisória n. 2.821-SP, de relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira, textual: “A ação rescisória não merece prosperar. O pedido formulado pelo autor diz respeito a julgado do (extinto) 2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo. No entanto, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial 162.209-SP, a egrégia 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em acórdão de relatoria do eminente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, não obstante ter mantido o entendimento do acórdão estadual, apreciou o mérito da controvérsia, reconhecendo a incidência da prescrição. Assim, a questão de mérito a ser impugnada por meio de ação rescisória encontra-se na decisão proferida por esta Corte e não no acórdão estadual. Na verdade, a presente ação não deveria ter sido ajuizada na Corte de origem, mas sim perante o Superior Tribunal de Justiça, por ter sido o último Tribunal a emitir pronunciamento de mérito a respeito da controvérsia...”.

Ainda expôs José Rogério Tucci(obra citada):

"Secundando esse mesmo raciocínio, a contrario sensu, acórdão da 3ª Seção, relatado pela ministra Maria Thereza de Assis Moura, no julgamento da Ação Rescisória 3.851-MG, deixou assentado na respectiva ementa que: “... Se a matéria tratada na ação rescisória não foi objeto de exame pela decisão rescindenda, da lavra de ministro desta Corte, mas apenas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, incide no caso o disposto na Súmula 515 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual ‘a competência para a ação rescisória não é do Supremo Tribunal Federal, quando a questão federal, apreciada no recurso extraordinário ou no agravo de instrumento, seja diversa da que foi suscitada no pedido rescisório’...”.

Definitivamente, dúvida não pode haver de que se o Superior Tribunal de Justiça, de um modo ou de outro, enfrenta o mérito da controvérsia no julgamento de agravo ou, em particular, de recurso especial, é de sua exclusiva competência o conhecimento e o julgamento de ação rescisória visando à desconstituição do aresto que proferiu em tais situações."

De importância o artigo 968, parágrafo quinto do CPC de 2015 ainda consoante José Rogério Tucci:

"Caracterizado por ser um diploma que deu significativa ênfase à prevalência do julgamento do mérito, o novo Código de Processo Civil interveio expressamente para conferir a esta importante questão tratamento mais técnico, racional e justo.

Realmente, dispõe o parágrafo 5º do artigo 968, que: “Reconhecida a incompetência do tribunal para julgar a ação rescisória, o autor será intimado para emendar a petição inicial, a fim de adequar o objeto da ação rescisória, quando a decisão apontada como rescindenda: I – não tiver apreciado o mérito e não se enquadrar no § 2º do art. 966; II - tiver sido substituída por decisão posterior”.

Neste caso, depois de adaptada a petição inicial, em especial, com a alteração do pedido de rescisão do ato decisório correto, abre-se vista ao réu para que este possa exercer o contraditório, aditando, se for o caso, a sua defesa (conforme artigo 968, parágrafo 6º).

Em seguida, os autos serão remetidos ao tribunal que proferiu o julgado rescindendo, então competente para processar e julgar a ação rescisória (conforme, ainda, artigo 968, parágrafo 6º).

VII – O TEMA NO ENTENDIMENTO DE PONTES DE MIRANDA

 É fundamental a ilação de Pontes de Miranda, exposta no seu Tratado de Ação Rescisória, 1976, pág. 375): “A ação rescisória é proponivel desde que transitou em julgado a decisão que se quer rescindir. A relação jurídica processual pode ainda estar pendente de sentença que a faça cessar. A afirmativa de que, pendente a lide, ainda nã há coisa julgada formal, é falsa. Se transitou em julgado decisão que não foi a final, coisa julgada formal estabeleceu-se para o pontos ou os pontos dessa decisão.

Em pensamento de Pontes de Miranda, adota-se a coisa julgada como a eficácia da declaração, que tem como partidários Hellwig, que fundamenta a autoridade da coisa julgada na eficácia da declaração de certeza contida na sentença.

Nâo seguiu Pontes de Miranda a orientação de Liebman, para quem a coisa julgada é qualidade especial da sentença a reforçar a sua eficácia, consistente na imutabilidade da sentença, como ato processual (coisa julgada formal) e na imutabilidade de seus efeitos (coisa julgada material). Diversa é a eficácia.

Ensinou para tal Pontes de Miranda(Tratado das ações, tomo I, ed. Bookseller, pág. 308):

“Durante o processo, questões surgem que o juiz tem de resolver, processuais ou materiais, de fato ou de direito, que não dizem respeito à entrega da prestação jurisdicional. As resoluções do juiz, as decisões, que então pronuncie, são dotadas, ou não, de força formal da coisa julgada, a despeito da interlocutoriedade, isto é, de serem palavras(locutio) ditas entre a promessa estatal de julgar e a sentença final. São ainda quando obtenham força formal de coisa julgada, simples preparações para aquela sentença de acolhida do pedido ou de rejeição dele. Não tem força material de coisa julgada. A sua eficácia é restrita, limitada às exigências de ordem e de desenvolvimento ritmo ou seguro do processo, com a preclusão da faculdade de serem renovadas no mesmo processo as questões dirimidas, se não forem de ordem pública.

Porque lhes falta a força material de coisa julgada, noutro processo, posto que entre as mesmas partes e até a propósito do mesmo objeto, é possível renovarem-se as mesmas questões a serem resolvidas diferentemente. As questões acidentais, quando não insertas em pedido e conteúdo autônomo de decisão, são questões que lhe tratam como em resoluções interlocutórias.”

Alertou Pontes de Miranda(obra citada, pág. 310) que “as resoluções, sentenças ou decisões proferidas em jurisdição voluntária ou graciosa, não têm força material de coisa julgada, porque a coisa julgada material se liga à sentença extrínseca, ao evitamento de litígios futuros. Aliás, uma das consequências é a de que a justiça proferindo-as, não fica tolhida de conhecer do mesmo objeto, achando-se, posteriormente, noutro processo, injusta. Disse Pontes de Miranda: “Está mesmo autorizada a isso”. São as lições de Franz Schlegelberger, dentre outras.

Não há de se admitir, então, ação rescisória de sentenças em processo de jurisdição tida como administrativa, em que há coisa julgada formal.

A nota básica sobre o entendimento de Pontes de Miranda sobre a natureza jurídica da coisa julgada é vista nas páginas 194 e seguintes daquela obra(Tratado de Ações):

“A eficácia enunciativa depende do sistema de regras jurídicas em que a proposição declarativa se encontra. Por isso mesmo, diante de elemento declarativo das sentenças trânsitas em julgado e das resoluções que não têm força de coisa julgada formal, duas atitudes surgiram entre os juristas: a) a dos que viram nisso a prova de haver eficácia declarativa fora e essencialmente distinta da eficácia de coisa julgada material, pois aquelas resoluções que formalmente não passam em julgado e não têm consequência, força ou efeito material de coisa julgada, produzem eficácia declarativa; b) a daquelas que revidam, com energia que o falar-se de eficácia de declaração sem a coisa julgada material seria absurdo: a eficácia de declaração seria apenas “lógica”(Enrico Allorio, La Cosa giudicata rispetto ai terzi, 39). A tese e a à antítese respondamos, como em síntese: c) o sistema de regras(falamos no sentido da lógica contemporânea) em que se coloca a declaração contida nas resoluções judiciais que não passam formalmente em julgado não é como supõe a atitude b, o sistema somente logico; portanto, a antítese b é falsa. No sistema lógico em que há resoluções judiciais que transitam, formalmente, em julgado, e resoluções judiciais que não transitam, formalmente, em julgado, há regras jurídicas que se aplicam àquelas e a estas, de modo que o sistema é jurídico em toda a sua abrangência. O valor da resolução judicial que não passa, formalmente, em julgado, é mais do que lógico: é jurídico, apenas, dentro do mesmo sistema de regras jurídicas, essa resolução e esse valor não são regidos por um grupo de regras que somente regem as resoluções judiciais que transitam em julgado. Quando somamos eficácia declarativa e força formal de coisa julgada(preclusão) é que podemos falar em coisa julgada material. O elemento declarativo, como o constitutivo, o condenatório, o mandamental e até o executivo, que se encontra nas resoluções judiciais que não passam formalmente em julgado, é o mesmo que aparece nas resoluções judiciais que formalmente transitam em julgado. O plus está na força formal da coisa julgada, que há aqui e ali não há. A distinção entre resoluções judiciais que não têm força de coisa julgada formal nada há com a classificação das resoluções judiciais em declarativas, constitutivas, condenatórias, mandamentais e executivas. Quando dizemos que a sentença declarativa a tem força de coisa julgada material, referindo-nos a resolução judicial que entra na classe das resoluções judiciais declarativas e na subclasse das resoluções judiciais declarativas que passam formalmente, em julgado; assim, a eficácia de coisa julgada material depende daquela conjunção de dois elementos da classificação em duas classificações diferentes: o trânsito formal em julgado e o elemento declarativo. “

.......

E concluiu Pontes de Miranda por dizer que “o problema é, portanto, o mesmo, quer se pense na eficácia declarativa, quer na eficácia constitutiva, ou condenatória, ou mandamental, ou executiva, das resoluções judiciais que passam formalmente em julgado e das que não passam formalmente em julgado.

O que se pretendeu ver de “diferente” entre a eficácia declarativa daquelas e a destas na presença e na ausência da preclusão, e nunca em diferença da declaratividade.”

Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, 1976, pág. 243) frisou que “se há ofensa à coisa julgada, cabe a ação rescisória. Naturalmente, tem-se de precisar sobre quais pontos se operou a preclusão; e aí, tratando-se de sentenças declarativas ou de sentenças com efeito declarativo(de coisa julgada material), intervém a questão do motivo que é, em verdade, argumento, e do motivo que é decisão(‘considerando que constituir fundamento indispensável”)”. E concluía, naquela obra, Pontes de Miranda, à luz do CPC de 1973, que “é a coisa julgada formal.”

Se houve desrespeito, segundo Pontes de Miranda, à coisa julgada formal, tem-se de exercer a pretensão à rescisão(ação rescisória). Já a coisa julgada, no art. 485, IV, é a coisa julgada material, isto é, a ofensa a sentença anterior, trânsito em julgado, ou a sentenças anteriores, trânsitas formalmente em julgado(porque esse é o elemento essencial e geral para qualquer rescindibilidade), por ter decidido o que já fora objeto de sentença anterior ou de sentenças anteriores.

Voltando-se ao CPC de 1973, Pontes de Miranda(Tratado da ação rescisória, 1976, pág. 246) aduziu que “para se entender o art. 485, quando se refere a sentença “transitada em julgado”, tem-se de dizer que o trânsito formal em julgado é elemento necessário essencial, para qualquer ação rescisória”. E disse então: “Não se acolha, ao cogitar-se do artigo 485, IV, o artigo 467, que denomina “coisa julgada material a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. O erro foi palmar, porque aí se define a coisa julgada formal”.

Quando começa a coisa julgada formal da sentença? Disse Pontes de Miranda: Só a lei processual pode responder: desde que da sentença não cabe, ou, já não cabe qualquer recurso.

VIII – AÇÃO RESCISÓRIA E DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS QUE ENFRENTAM O MÉRITO E AS DECISÕES FINAIS

No presente sistema processual, fruto do CPC de 2015 há decisões interlocutórias e finais que passam em julgado: há decisões interlocutórias de cunho satisfativo, antecipatório, que merecem, ao transitar em julgado, precluir, o ajuizamento de coisa julgada. A tutela monitória concedida pode passar em julgado, sendo objeto de ação rescisória. O prazo para tal, não é de prescrição, como queria Ruy Barbosa(quando fez a revisão no Código Civil de 1916, em comissão no Senado), mas de preclusão.

Há discussão com relação às chamadas questões prejudiciais:

Dessas chamadas questões prejudiciais afasta-se a regra, mantida no artigo 504, I, do novo Código de Processo Civil, de que os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença, não fazem coisa julgada. Da mesma sorte, não faz coisa julgada a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença. Essa verdade dos fatos será aplicada com relação ao assistente simples nas lides em que participe.

No novo Código de Processo Civil, artigo 487, se diz que haverá resolução de mérito quando o juiz: acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção; decidir, de oficio ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou de prescrição; homologar o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção, a transação, a renúncia da pretensão formulada na ação ou na reconvenção.

O novo Código de Processo Civil não deixa margem à dúvida, no artigo 701, § 3º, no sentido de que é cabível a ação rescisória na decisão prevista no caput quando ocorrer a hipótese do parágrafo segundo(constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, independente de qualquer formalidade, se não realizado o pagamento e não apresentados os embargos previstos no artigo 702).

Ora, como falar em preclusão pro iudicato ou ainda coisa julgada do mandado monitório não embargado, diante de decisão puramente de cognição sumária?

Autores do nível de Nelson Néry Jr., Cândido Rangel Dinamarco sustentam haver coisa julgada com a decisão concessiva da tutela monitória, não embargada.

É a linha adotada por Edoardo Garbagnati, que segue Chiovenda, Salvatore Satta, diante do art. 656 do CPC Italiano, onde se lia que o “decreto d’ingiuzione” tornado ‘título executivo’, por falta de embargos seria impugnável pelos mesmos instrumentos destinados a combater provimentos revestidos pela coisa julgada, tais quais a revocazioni e a opposizione di terzo.

Não há, no direito brasileiro dispositivo semelhante.

Dir-se-á que a coisa julgada, se aplica às decisões que envolvem cognição plena, exauriente, o que não acontece quanto a cognição puramente sumária do mandado monitório.

Na Itália, corrente abalizada disse que tal preclusão pro iudicato ocorreria, por exemplo, nos casos de decreto d’ingiuzione, licenza per finita e locazione.

Doutrina Theodoro Jr. com relação ao pensamento de Redenti, que o réu não poderia mais se opor à execução nem pleitear repetição de indébito, se não embarga. Seria a preclusão pro iudicato que protegeria o bem conseguido ou a conseguir-se na execução, diverso, pois, da coisa julgada, algo que se expandia para além do processo. Como preclusão para algo que fora do processo? A preclusão é fenômeno endoprocessual, já dizia Chiovenda, não algo que produza resultado prático igual ao da autoridade da coisa julgada.

Como ter-se coisa julgada sob juízo sumário?

Data vênia, correta a conclusão de Eduardo Talamini.

Com o silêncio do réu, forma-se ope legis, título executivo.

Mas, se diria, que o título executivo em tela não é sentença transitada em julgado? Ora, títulos executivos há, como o formal de partilha que não são sentenças condenatórias transitadas em julgado, mas cartas de sentença. A lei pode e deve criar títulos executivos judiciais em hipóteses taxativas.

IX – A COISA JULGADA E AS AÇÕES DE ESTADO

Em regra a coisa julgada apanha as partes(seus sucessores, o substitutivo processual). Excepcionalmente terceiros, que tenham interesse jurídico.

O que dizer das chamadas ações de estado?

Como disse Pontes de Miranda(Tratado de ações, volume I, pág. 315), sob a égide do Código Civil de 1916, e a lei supõe que a eficácia erga omnes das sentenças proferidas nas ações de status, portanto nas ações de separação judicial litigiosa que nelas se incluem, seja força da coisa julgada material(o que é erro), faz parecer ao legislador que seria útil excluir das sentenças proferidas nas ações de status, com eficácia de coisa julgada material, a ação de separação judicial consensual.

Nas ações de separação judicial pode ser visto, com facilidade, a força constitutiva, o efeito anexo ou o lateral e o efeito reflexo, além da eficácia material de coisa julgada das sentenças e da força da coisa julgada formal. Respectivamente, a força ex nunc do estado de separado judicialmente ou de separação sem quebra do vínculo conjugal; o efeito de poder o marido proibir o uso de seu nome pela mulher culpada, o que se põe em lei, ainda se não foi incluído na sentença, pois que se trata de Nebenwirkung, efeito anexo ou próximo, o efeito de poderem ser interpretados por atos jurídicos posteriores entre os separados judicialmente, tomando-se por base o que combinaram a respeito dos bens ou das relações com os filhos, efeito da sentença como ato ou fato jurídico; a eficácia de valer a sentença entre as partes de modo que afasta a rediscussão do pressuposto admitido pelo juiz, a eficácia de não mais se poder impugnar a sentença(Konrad Hellwig e ainda Kutner). A sentença em processo de separação judicial consensual pode ter tido de decidir ponto em que o acordo não poderia assentar a solução; ou que foi suscitado pelo órgão do Ministério Público. A sentença em processo de separação judicial normalmente decide questões de que resulta eficácia declarativa mediata”.

Entenda-se que os efeitos das coisa julgada são inter partes. A eficácia constitutiva ou configurante da sentença constitutiva é, em geral, a favor e contra todos, como ensinou Hellwig. Tudo se passa, como acentuou Pontes de Miranda(Tratado das ações, pág. 317), como a respeito das conhecidas sentenças sobre status(Karl Komman; Hellwig). As sentenças nas ações de separação judicial, por exemplo, não têm a coisa de coisa julgada material, têm a eficácia do elemento constitutivo, como concluiu Pontes de Miranda. A força erga omnes das sentenças constitutivas foi descoberta por Theodor Kipp, refletindo-se em Hellwig.

Advertiu Pontes de Miranda que a força constitutiva da sentença se limita àquilo para que se proferiu a sentença; não para qualquer outra questão de ordem declarativa, como ensinou Emil Seckel.

Concluiu Pontes de Miranda por ensinar que “quando se quer a sentença com força declarativa, ou com eficácia imediata ou mediata declarativa, irradie sua força, ou sua eficácia, em toda a ambiência jurídica, por exemplo, quando o autor quer que se possa opor a quem quer que seja a sentença favorável declarativa na ação de declaração da propriedade, imobiliária ou mobiliária, tem de pedir o procedimento edital desde a citação. E arremata: “O simples registro da sentença declaratória, em ação que somente ocorreu entre A e B, ou entre A, autor, e B e C, réus, não teria tal consequência – apenas publicaria a eficácia entre A e B, ou entre A e B e A e C, figurantes.

No tempos de hoje, diante do chamado processo coletivo, à luz da Lei 4.717/65(Lei da ação popular, artigo 18), da Lei 7.347/85, da ação civil pública, e da Lei 8.078/1990, são observados que os efeitos da coisa julgada são inter partes, ultra partes e erga omnes.

 

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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