Das Formas Alternativas de Solução de Conflitos no Processo Trabalhista

Conciliação, Mediação e Arbitragem

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O seguinte artigo trata das modalidades alternativas de solução dos conflitos individuais e coletivos na seara trabalhista, sendo elas: a autotutela, a autocomposição e a heterocomposição, esclarecendo respectivamente cada uma delas e seus aspectos.

   

  1. INTRODUÇÃO

A globalização trouxe à sociedade contemporânea uma imensa integração internacional, fazendo com que os países do mundo estejam cada vez mais alinhados social, política e economicamente. Essa conexão global é impulsionada pela internet, pelo surgimento de plataformas e aplicativos digitais como o Uber, a Netflix, o ifood, dentre outros. Dessa maneira, as relações sociais, econômicas, políticas e trabalhistas foram alteradas e dinamizadas de forma que acompanhar as evoluções e mudanças proporcionadas.

Nesse sentido, o direito trabalhista deve acompanhar essas transformações, o poder judiciário e o legislativo devem garantir que os direitos trabalhistas continuem a serem assegurados. Assim, cabe ao legislativo criar normas legais que regulamentem as novas relações trabalhistas surgidas, prevendo a presença ou não de uma relação de emprego e ao poder judiciário aplicar tais normas legais de forma a resguardar os direitos trabalhistas reivindicados.

Os conflitos ou dissídios podem ser classificados como individuais ou coletivos, os conflitos individuais são aqueles que versam sobre interesses próprios e podem ser classificados como simples, quando o reclamante é o próprio titular ou plúrimos, quando possuir litisconsórcio e identidade de matérias. Além disso, os dissídios podem ser coletivos também quando houver interesses em comum por um grupo.

A grande quantidade de litígios, gerados pelas relações trabalhistas, causa uma sobrecarga do judiciário, trazendo retardamento dos processos e uma análise menos individualizada e mais generalizada ou em série, visando atender a grande demanda de processos gerados o que aumenta cada vez mais ao longo dos tempos.

Com o objetivo de desafogar o poder judiciário surgem   as formas alternativas de solução de conflito que são: a autotutela, a autocomposição e a heterocomposição. Logo, a jurisdição não é colocada como o único meio de solução dos conflitos, mas sim deve ser a ultima ratio ou última alternativa. 

  1. DISSÍDIOS INDIVIDUAIS VERSUS DISSÍDIOS COLETIVOS

Os dissídios são os conflitos de interesses relativos a área trabalhista e podem ser de natureza individual, quando versar sobre interesses pessoais de um trabalhador ou de vários em litisconsórcio ou podem ser de natureza coletiva, quando versar sobre interesses de um grupo em comum.

Ademais, os dissídios podem ser propostos por Sindicatos, por Empresas ou pelo Ministério Público do Trabalho, cabendo a justiça do trabalho processar e julgar os dissídios trabalhistas de acordo com o artigo 114 da Constituição federal.

Os dissídios individuais podem ser classificados como simples quando o reclamante é o próprio titular da ação ou plúrimos quando houver litisconsórcio, ou seja, uma identidade de matéria, nos termos do artigo 842 da CLT.

Já os dissídios coletivos devem ser instaurados quando não houver um acordo na negociação direta entre trabalhadores ou sindicatos e empregados e devem ser propostos necessariamente nos tribunais de competência originária. Nesse sentido, Raimundo Simão Melo pondera que os dissídios coletivos são: “O processo através do qual se discutem interesses abstratos e gerais, de pessoas indeterminadas (categoria profissional ou econômica), com o fim de se criar ou modificar condições gerais de trabalho".  (MELO, 2011)

  1. DA AUTOTUTELA

Na autotutela, as partes executam o exercício arbitrário e defendem pessoalmente seus interesses, ou seja, solucionam o conflito por conta própria, sendo utilizada por diversas áreas do direito, no direito internacional é utilizada rotineiramente, citando-se como por exemplo a invasão do Iraque pelos EUA, sendo excepcionalmente usado na área cível, justificando a para a defesa da posse. No direito penal é exercida nas excludentes de ilicitude.

No direito trabalhista, a autotutela, é exercida através da greve, que consiste em uma paralisação total ou parcial da atividade laboral por parte de categoria específica, visando reivindicar direitos e melhorias das condições de trabalho. A greve deve partir de um sindicato representando uma classe, caso a classe não possua um sindicato, deverá formar-se uma comissão representativa.

A greve é um direito fundamental, assegurado pelo artigo 9º da Constituição Federal de 1988 e prevista no artigo 7.783/1989, porém deverá obedecer um prazo mínimo de comunicação prévia.

De acordo com Maurício Godinho Delgado: "a greve funciona como um mecanismo de pressão, tendo como objetivo o atingimento de mais favoráveis resultantes na dinâmica negocial coletiva em andamento ou a se iniciar". (DELGADO, 2002).

  1. DA AUTOCOMPOSIÇÃO

A autocomposição consiste na forma de solução de conflito entre as partes, sem a interferência de terceiros, podendo ser judicial ou extrajudicial. Na judicial é obrigatório a tentativa de conciliação. Após realizado o acordo deverá ser reduzido a termo, que é a transcrição do que foi acordado oralmente. A quitação pode ser quanto ao objeto ou quanto o geral, quando versar apenas sobre o objeto poderá ocorrer novamente, enquanto a quitação geral poderá ser discutida novamente.

Na modalidade extrajudicial, a solução de conflitos ocorre por um acordo extrajudicial, caso o juiz verifique que uma das partes está sendo prejudicada ele não estará obrigado a homologar o acordo, por não ser paritário entre as partes.

De acordo com o jurista Carlos Henrique Bezerra Leite a técnica de solução dos conflitos coletivos pelos próprios interlocutores, chamado de autocomposicão, assim se consiste quando não há o emprego da violência, mediante ajustes de vontades.

As negociações coletivas de trabalho são exemplos de autocomposição, tendo em vista, que ocorre uma negociação coletiva entre empregados e empregadores, podendo ser através de uma Convenção Coletiva de trabalho (CCT), nos termos do artigo 611 da CLT ou um Acordo Coletivo de trabalho (ACT), nos termos do artigo 611, § 1º da CLT. Na convenção coletiva ocorre um acordo entre empregados, representados por um sindicato e a empresa, enquanto no acordo coletivo ocorre um acordo entre sindicatos, sendo eles um representando os trabalhadores e outro representando a classe patronal.

A conciliação é um dos métodos de autocomposição. Nessa modalidade, o terceiro denominado conciliador participa ativamente da discussão, propondo soluções que podem ou não serem aceitas pelas partes, sendo uma forma barata de solução de conflito em que as próprias partes chegam em um acordo, sem a necessidade de invocar o judiciário e os gastos gerados para tal.

  1. DA HETEROCOMPOSIÇÃO

Já a heterocomposição consiste em uma forma de solução de conflitos com a interferência de terceiros. As espécies são: mediação, jurisdição ou tutela jurisdicional e arbitragem. Na mediação há a possibilidade de escolha pelas partes ou pelo ministério da economia. O mediador, entretanto, não tem poder de coação sobre as partes, que, portanto, não estão obrigadas a aceitarem o acordo.

A jurisdição ou tutela estatal consiste na invocação da dicção do direito no caso concreto. Pelo principio da inércia, em regra, a jurisdição precisa ser invocada. Sua provocação traz a incumbência do estado, através do juiz, de dar cada um o que é seu, segundo o direito objetivo e seus princípios informativos. A jurisdição, como modalidade de hetecomposição, obriga a intervenção de um terceiro, o Estado juiz, para a composição do litígio.

A mediação e a arbitragem são formas efetivas na solução dos dissídios coletivos, sendo economicamente mais viáveis e mais céleres, tendo grande eficácia na solução de conflitos coletivos na seara trabalhista. Na mediação, o terceiro (mediador) simplesmente tem a função de intermedir o diálogo entre as partes, fazendo com que se estabeleça um diálogo, enquanto na arbitragem, o terceiro escolhido (árbitro) apresenta uma solução que posteriormente se transforma em uma cláusula compromissória.

  1. DA ARTBITRAGEM

A arbitragem está prevista inicialmente na lei 9.307/1996, que posteriormente foi alterada pela lei nº 13.129/2015 e consiste em uma forma alternativa de solução de conflitos, sendo bastante utilizada pelo direito internacional para a solução de controvérsias internacionais. No direito trabalhista, a solução de conflitos coletivos pela arbitragem está prevista no artigo 114, § 2º da Constituição Federal de 1988 e na lei 7.783/1989, a denominada Lei de Greve.

Trata-se de uma espécie de heterocomposição, na qual as partes escolhem um terceiro denominado árbitro, apresenta soluções para o conflito. De acordo com Carlos Alberto Carmona: "a arbitragem é uma técnica de soluções de conflitos através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes através de uma convecção privada". (CARMONA, 2009).

Na arbitragem, o terceiro, que deve conduzir a solução do conflito, sendo denominado árbitro e substitui a figura do juiz na heterocomposição. Diferentemente do juiz, todavia, o árbitro não tem o poder coercitivo. O árbitro é escolhido pelas partes e tem a função de proferir uma sentença denominada "sentença arbitral".

A modalidade de solução de conflitos pela arbitragem pode ser previamente estipulada por uma cláusula compromissória ou pelo compromisso arbitral. A diferença entre as duas está no fato de que a cláusula compromissória é anterior ao conflito e estabelece que futuros conflitos serão resolvidos por meio da arbitragem, enquanto o compromisso arbitral é posterior a existência do conflito, dessa forma, após surgido o conflito as partes conjuntamente decidem optar pela arbitragem.

  1. DAS MUDANÇAS TRAZIDAS PELA REFORMA TRABALHISTA NA ARBITRAGEM

O recente artigo 507-A da CLT, que surgiu com a reforma trabalhista, possibilita a ocorrência da arbitragem individual no direito do trabalho, desde que sejam cumpridos dois requisitos: a remuneração do empregado seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social e que seja pactuada a cláusula compromissória decorrente da arbitragem seja pactuada por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância  expressa, nos termos previstos na lei nº 9.307/96.

Assim, o legislador buscou proteger o empregado hipossuficiente e garante um acordo mais igualitário, de forma que não seja prejudicial ao trabalhador por ser mais frágil economicamente e juridicamente. Desse modo, o trabalhador é resguardado e protegido por esses requisitos, para evitar que ocorra uma cláusula abusiva ou desproporcional que prejudique o empregado.

Nesse sentido, verificamos o Recurso Ordinário 0001482-62.2013.5.05.0551, da 5ª Turma, sob relatoria do Desembargador Paulino Couto que decidiu sobre a possibilidade de Arbitragem envolvendo direitos trabalhista individuais.

O STJ, tendo consciência da desproporção existente nas relações de consumo, autorizou a arbitragem individual, porém, de acordo com o entendimento da corte, a cláusula compromissória não pode impedir o consumidor de invocar o judiciário caso seja necessário. Tal entendimento protege o consumidor de uma cláusula abusiva e supressora de direitos.

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  1. CONCLUSÃO

As formas alternativas de resoluções de conflitos surgem como uma forma mais célere e barata de solucionar os conflitos, sem que seja necessário invocar o poder judiciário. Portanto, tendem a ser cada vez mais utilizados, possibilitando uma solução mais rápida, economicamente viável e eficaz dos conflitos.

Para que essa solução ocorra de forma mais justa e equiparada, cabe enfatizar, deve o legislador proteger os elos mais frágeis jurídico e economicamente, ou seja, no direito trabalhista o empregado deve ser protegido com maior rigor, evitando que ocorra um acordo prejudicial para o trabalhador.

Nesse sentido, a reforma trabalhista, ao possibilitar a arbitragem individual, estipulou requisitos, visando resguardar os direitos dos trabalhadores e evitar um acordo abusivo e maléfico, que desrespeite direitos trabalhistas.

Deste modo, as partes poderão, antes de invocar o judiciário, tentar solucionar os conflitos pelas formas alternativas, evitando uma sobrecarga do poder judiciário, que está a cada ano com um maior número de processos. Essas modalidades inovadoras de solução de conflito são mais baratas e céleres. Lembrando que caso as modalidades alternativas não solucionem o conflito ainda sim as partes poderão invocar o judiciário.

  1. REFERÊNCIAS

MELO, Raimundo Simão de. Dissídio coletivo de trabalho. 2.Ed. São Paulo: LTR, 2011.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9ª edição, São Paulo: LTr, 2010.

DELGADO, Mauricio Godinho. Arbitragem, mediação e comissão de conciliação prévia no direito do trabalho brasileiro. Revista LTr, v. 66, n. 6, jun. 2002, São Paulo.

                                                                                                                      Disponível:<https://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Adriana_Sena.pdf> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:< https://www.conjur.com.br/2018-jan-23/guilherme-amaral-arbitragem-conflitos-trabalhistas-individuais> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:< https://jus.com.br/artigos/70596/a-arbitragem-no-ambito-do-direito-do-trabalho> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:< https://www.migalhas.com.br/depeso/258392/arbitragem-na-reforma-trabalhista> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:<http://www.granadeiro.adv.br/clipping/doutrina/2018/02/08/arbitragem-no-processo-do-trabalho-apos-reforma-trabalhista> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:< https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-151/mediacao-e-arbitragem-no-dissidio-coletivo/> Acesso em 17 maio 2020.

Disponível:< https://sinprogoias.org.br/sobre-a-alteracao-da-lei-da-arbitragem-2/> Acesso em 17 maio 2020.

        

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O seguinte artigo foi elaborado por mim durante a pandemia para compreender e estudar melhor as formas alternativas de solução de conflitos.

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