Decreto não é lei!... Ou seria?

Resumo:


  • Decretos municipais durante a pandemia têm valor legal até que sejam julgados inconstitucionais, mas há questionamentos sobre sua constitucionalidade, especialmente em relação à obrigatoriedade do uso de máscaras.

  • A Lei nº 14.019 de 2020 alterou a Lei nº 13.979 de 2020 para tornar obrigatório o uso de máscaras em espaços públicos e privados acessíveis ao público, dando suporte legal aos decretos que impõem tal obrigatoriedade.

  • Multas aplicadas por decretos antes da Lei nº 14.019 de 2020 podem ser consideradas inconstitucionais, mas as aplicadas após essa data estão amparadas legalmente, e a não utilização de máscaras pode acarretar sanções previstas no artigo 268 do Código Penal.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Artigo pretende esclarecer a diferença entre lei e decreto, bem como a constitucionalidade dos decretos municipais sobre uso de máscaras

Em tempos de pandemia, o que mais ouvimos falar é sobre decretos municipais editados pelos prefeitos. E não são poucos os questionamentos sobre a constitucionalidade de algumas medidas adotadas. Mas até que sejam julgados inconstitucionais ou não, tais decretos possuem sim valor legal de norma.

Mas e aí? Decreto é lei ou não?

Bom. Para melhor esclarecermos, é necessário entendermos um pouco do Processo Legislativo definido em nossa Constituição.

A Constituição é a norma máxima de um país, todas as demais normas devem ter seus limites adstritos a Constituição. É na constituição também que observamos os limites e deveres de cada poder bem como a forma que o Estado se organiza e suas diretrizes de desenvolvimento.

As normas constitucionais são classificas como: plena, contida/restringível, limitada.

São plenas as normas que não necessitam de qualquer regulamentação, bastando sua existência no texto constitucional pra que ela produza efeitos.

Norma contida ou restringível, são aquelas normas que produzem efeitos imediatos assim como a plena no entanto pode ser restringida por alguma lei que venha a entrar em vigor.

Já as normas limitadas podem ser classificadas como limitada pura, limitada programática e limitada institutivas.

 A limitada pura é aquela norma que necessita de uma lei complementar que ira regulamentar o instituto jurídico fazendo com que a norma constitucional produza seus efeitos.

As limitadas programáticas são aquelas que estabelecem princípios ou programas de Estado, traçando os objetivos gerais da nação, sem no entanto instituir programa especifico.

E por fim as normas institutivas, que estabelecem estruturação geral de determinado órgão ou instituição.

Compreendidas as normas constitucionais passemos a verificação das normas infraconstitucionais

DAS NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS

As normas infraconstitucionais são todas as contidas no artigo 59, da Constituição Federal, exceto a do inciso I, vejamos:

Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:

I - emendas à Constituição;

II - leis complementares;

III - leis ordinárias;

IV - leis delegadas;

V - medidas provisórias;

VI - decretos legislativos;

VII - resoluções.

Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.

O inciso I não configura norma infraconstitucional, pois uma vez aprovada a emenda constitucional, fará parte do texto constitucional se tornando assim norma constitucional, todas as demais normas são infraconstitucionais.

Quanto ao decreto ser ou não lei da simples leitura do artigo 59, é possível concluir que de fato decreto não é lei, todavia é sim norma prevista no ordenamento jurídico pátrio e como tal deve ser cumprida.

Ocorre que quanto aos decretos que visam obrigar o uso de máscaras, por mais que tenham boas intenções (combate a propagação do vírus) a sua constitucionalidade é questionável, pois o artigo 5º inciso II da Constituição Federal diz que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” hora se somente a lei pode obrigar o cidadão a fazer ou deixar de fazer algo, o meio utilizado (decreto) para obrigar o uso de mascara é flagrantemente inconstitucional, salvo a existência de lei municipal ou estadual que obrigue o uso das referidas máscaras.

Atendo a isso o Governo Federal sancionou a lei nº 14.019 de 02 de julho de 2020, que alterou a lei 13.979 de 06 de fevereiro de 2020, tornando obrigatório o uso de mascaras onde as autoridades locais assim determinarem.

Art. 3º  Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas:

...

III-A – uso obrigatório de máscaras de proteção individual;

Art. 3º-A. É obrigatório manter boca e nariz cobertos por máscara de proteção individual, conforme a legislação sanitária e na forma de regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo federal, para circulação em espaços públicos e privados acessíveis ao público, em vias públicas e em transportes públicos coletivos, bem como em:

I – veículos de transporte remunerado privado individual de passageiros por aplicativo ou por meio de táxis;

II – ônibus, aeronaves ou embarcações de uso coletivo fretados;

Assim aqueles prefeitos que editarem decreto estabelecendo a obrigatoriedade de mascaras sob pena de multa, estão amparados pela lei nº13.979/2020, todavia tais multas são constitucionalmente válida após a publicação da lei 14.019 de 02 de julho de 2020, salvo a existência de lei municipal ou estadual determinando a obrigatoriedade das mascaras.

Assim as multas aplicadas por meio de decretos anteriores a 03 de julho de 2020, podem todas serem derrubadas por meio de ação judicial haja vista a ausência de previsão legal para imposição de multa ou obrigação por meio de decretos, salvo existência de lei municipal ou estadual prévia que crie a obrigatoriedade de máscara.

Não se pretende por meio desse artigo estimular o não uso de máscara, haja vista que essa é de importância enorme para o auxilio do controle pandêmico, mas apenas trazer uma reflexão sobre a técnica normativa adotada.

Além das multas com a edição da lei 14.019 de 2020 a não utilização de máscaras em ambientes públicos nas localidades onde as autoridades sanitárias determinarem o individuo poderá responder criminalmente conforme artigo 268 do Código Penal.

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Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:

Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.

CONCLUSÃO

Do exposto pode-se concluir que caso não haja lei municipal ou estadual determinando a utilização de máscaras em locais públicos ou exposto ao públicos as multas aplicadas em data anterior a lei 14.019 de 02 de julho de 2020, são flagrantemente inconstitucionais, todavia as multas aplicadas em data posterior a promulgação da lei são válidas de acordo com os decretos municipais vigentes.

Além do que aquele que insistir em desrespeitar as determinações estabelecidas podem sofrer as sanções previstas no artigo 268 do Código penal.

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