ADOÇÃO AVOENGA - Quando os avós adotam os seus netos

30/07/2020 às 19:51
Leia nesta página:

Apesar da vedação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a Adoção avoenga tem sido permitida em casos excepcionais.

A “adoção avoenga”, como é chamada a adoção feita pelos avós, é vedada pelo parágrafo 1º do Artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Mesmo diante da vedação expressa, tal proibição nos parece, salvo melhor juízo, totalmente descolada da realidade praticada em muitas famílias brasileiras, embaladas em conceitos, princípios e institutos muito mais dinâmicos, tal como a “socioafetividade”.

O dinamismo com o qual as relações familiares tomam novas formas, no País, demonstra exatamente o contrário do apregoado pelo ECA. Em muitas das vezes, os avós assumem o papel de pais de fato de crianças e adolescentes sob a sua guarda, mesmo que sejam excluídos da possibilidade legal da adoção.

Todavia, mesmo diante dos limites impostos pela Lei, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça adotou, em recente julgado, a permissão da mitigação, em casos excepcionais, em prol do melhor interesse da criança e do adolescente, reconhecendo, na decisão proferida, a procedência da pretensão da avó paterna e de seu companheiro, quanto à adoção de seu neto, com total concordância dos pais biológicos da criança.

Nesta decisão, o Eminente Ministro Luis Felipe Salomão, proferiu voto, na qualidade de relator do recurso, alinhando 0 seu entendimento à jurisprudência daquela Egrégia Corte: “Constata-se a existência de precedentes da Terceira Turma que mitigam sua incidência em hipóteses excepcionais envolvendo crianças e adolescentes, e desde que verificado, concretamente, que o deferimento da adoção consubstancia a medida que mais atende ao princípio do melhor interesse do menor, sobressaindo reais vantagens para o adotando.”

De fato, justifica-se a adoção da criança, pelos avós, diante do largo respaldo oferecido pelas estruturas familiares em constante mutação e evolução, muitas vezes, como in casu, não acompanhadas pela legislação pátria.

Dessa forma, vê-se a necessidade da aplicação de uma ação multidisciplinar sistêmica, levando-se em conta os aspectos individuais de cada caso concreto, bem como os direitos de terceira geração.

Segundo o entendimento doutrinário majoritário, deve-se manter a vedação legal da “adoção avoenga” pelos mais diversos motivos, dentre eles, para evitar fraudes no sistema previdenciário, e o afastamento de problemas futuros na herança.

Contudo, não devemos nos esquecer que os destinatários da proteção e atenção integral do Estado, são as crianças e os adolescentes, os quais devem, por meio de diversos mecanismos e instituições públicas, verem resguardados o seu melhor interesse, mesmo que para isso sejam afastadas algumas restrições legais, em situações excepcionais, como por exemplo, no caso tratado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Em assim sendo, parece-nos que o intuito principal de tal proteção ao impedimento constante do Estatuto da Criança e do Adolescente, é o de privilegiar a relação patrimonial das famílias, indo de encontro com o entendimento constitucional, bem como do Código Civil, no tratamento das relações familiares. Tal atitude, exclui a aplicação de uma ótica que vise o melhor interesse do menor, através de soluções de cunho heterodoxo, como no caso da adoção realizada pelos seus avós.

O nosso Ordenamento Civil, outorga à família a necessária autonomia no tocante à decisão de sua destinação, donde se conclui que a vedação havida no ECA, não passa de uma gritante interferência ao pleno exercício desta prerrogativa na gestão da vida privada e familiar.

Assim, tomando-se o caso apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, vemos que a “adoção avoenga” mostrou-se como uma solução válida, em prol do interesse da criança ou do adolescente, conferindo-se lhe, assim, a devida e integral proteção aos direitos e interesses das pessoas em desenvolvimento, cuja vulnerabilidade e fragilidade justificam a sua aplicação para o pleno desenvolvimento de sua formação, como futuros cidadãos, e de suas famílias.

Sobre a autora
Claudia Neves

Advogada. Pós-graduada em Direito das Mulheres e em Direito de Família e Sucessões, com atuação na área cível com ênfase na área de família, com seus reflexos patrimoniais e assessoria em contratos civis e comerciais, seja na celebração de negócios seja na defesa de interesses. Coordenadora Adjunta da Comissão da Mulher Advogada e membro da Comissão de Prerrogativas da OAB Santo Amaro (2019-2021). Instagram: @claudianeves.adv

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos