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Os crimes contra os idosos previstos na Lei nº 10.741/2003 do ponto de vista dos direitos humanos

05/08/2020 às 12:24
Leia nesta página:

A violência contra idosos fere gravemente seus direitos humanos e dignidade, sendo necessária maior efetivação de políticas públicas e responsabilização de agressores.

1. INTRODUÇÃO

Esse estudo tem como enfoque temático voltar o olhar para os crimes que são praticados tendo como vítimas os idosos, assim definidos em lei, a partir da legislação própria de proteção a esse grupo, que consiste na Lei 10.741/2003 ou, como é popularmente conhecida, Estatuto do Idoso. Ao apontar os delitos específicos que podem ser praticados e a relação que se estabelece com a perspectiva dos Direitos Humanos.

A escolha desse tema se deu em razão da infinidade de abusos que são praticadas em desfavor dessas pessoas, inclusive no contexto íntimo dos lares. Assim, a relevância de se estabelecer um estudo sobre o assunto é importante para fomentar o debate e a devida atenção que deve ser desempenhada a esses indivíduos que representam um grupo marcado pela vulnerabilidade.

Considerando essa perspectiva, o objetivo geral desse trabalho consistiu em compreender quais são os crimes específicos cometidos contra os idosos, a partir do Estatuto do Idoso. Quanto aos objetivos específicos, destaca-se em conceituar e caracterizar o idoso, bem como identificar os tipos de crimes cometidos contra a pessoa idoso e, por fim, relacionar os crimes cometidos contra idosos à luz dos Direitos Humanos.

Quanto a metodologia de pesquisa, essa caracteriza-se por ser bibliográfica, a partir da revisão da literatura disponível de livros, artigos científicos, teses e dissertações, bem como tem caráter exploratório, pois buscou a análise junto a legislação vigente.

Por último, a organização do trabalho se dará em três tópicos, em que em um primeiro momento realizou-se uma abordagem sobre a conceituação e caracterização da pessoa idoso, enquanto no segundo tópico sobre os crimes previstos no Estatuto do Idoso e no derradeiro tópico sobre esses crimes e a abordagem dos Direitos Humanos.


2. A PESSOA IDOSA

Ao se remeter à pessoa idosa, a principal definição, por meio de uma interpretação gramatical, que se pode utilizar é a trazida pela Lei n. 10.741/2003, popularmente conhecida como o Estatuto do Idoso, que traz em seu artigo 1º, que este diploma legal busca resguardar e assegurar os direitos de todas as pessoas que tenham idade igual ou superior a sessenta anos.

Acerca do conceito de pessoa idosa, é importante salientar que seu conceito se diferencia em decorrência do perfil do país, ou seja, leva-se em consideração o fato de que essa terminologia é variável a depender de um Estado em desenvolvimento, daqueles que são desenvolvidos. Sobre isso, conforme preleciona Santos (2010) é possível destacar que:

Nos primeiros, são consideradas idosas aquelas pessoas com 60 anos e mais; nos segundos são idosas as pessoas com 65 anos e mais. Essa definição foi estabelecida pela Organização das Nações Unidas, por meio da Resolução 39/125, durante a Primeira Assembleia Mundial das Nações Unidas sobre o Envelhecimento da População, relacionando e com a expectativa de vida ao nascer e com a qualidade de vida que as nações propiciam aos seus cidadãos.

Conforme se observa, essa diferenciação pode se dar em razão de vários aspectos atrelados à qualidade de vida e garantia do mínimo existencial para a população, bem como diante dos fatores relacionais à faixa etária e níveis de envelhecimento da população em um país.

No Brasil, as taxas de velhice estão mais altas do que as de natalidade, refletindo em uma população que cada vez mais envelhece e depende da proteção do Estado para ter seus direitos concretizados. Segundos dados do IBGE (PNAD 2016):

Em 2016, a população residente foi estimada em 205,5 milhões de pessoas e 42% dela estavam no Sudeste. Os homens eram 48,5% da população e as mulheres, 51,5%. Entre 2012 e 2016, a população idosa (com 60 anos ou mais de idade) cresceu 16,0%, chegando a 29,6 milhões de pessoas. Já a parcela de crianças com até 9 anos de idade na população caiu de 14,1% para 12,9% no período.

Ainda conforme dados do IBGE (2016), a população brasileira com 80 ou mais anos pode passar de 19 milhões em 2060. Isso representa um crescimento de mais de 27 vezes em relação a 1980, quando o Brasil tinha menos de 1 milhão de pessoas nesta faixa etária (684.789). O País contabilizou 3.458.279 idosos com mais de 80 anos. O resultado de esperança de melhoria de vida, ao nascer do brasileiro era 62,2 em 1980. Os idosos estão sendo vistos com as métricas: 1) 1980 com 62,6; 2) 1991 com 66,9; 3)2000 com 69,8; 4) 2010 com 73,9; 5)2014 com 74,9; 6)2050 com 81,2.

Desta forma, se extrai que existem diversos detalhes ao entorno desse grupo social, em que no próximo tópico será dado enfoque aos crimes específicos praticados contra essas pessoas, previstos no Estatuto do Idoso.


3. OS CRIMES PRATICADOS CONTRA A PESSOA IDOSA À LUZ DO ESTATUTO DO IDOSO

Surgem diariamente diversos crimes e infrações penais cometidas contra pessoas idosas, dos quais é possível observar que o Estatuto do Idoso traz um rol de crimes os quais consistem nos artigos 95 a 108, do referido diploma legal.

Inicialmente, acerca da tutela jurisdicional do campo penal desempenhada na proteção da pessoa idosa, é importante salientar que o Estatuto do Idoso não deve ser aplicado apenas isoladamente como a única forma de proteção do idoso, tendo em vista que o mesmo autoriza que haja a aplicação de fontes subsidiárias para suprir eventuais lacunas na lei, por meio da adoção do Código Penal e do Código de Processo Penal, bem como de modo excepcional a incidência da Lei 9.099/95 (Juizados Especiais), nos delitos em que a pena máxima privativa da liberdade não seja superior a quatro anos.

Feito esse esclarecimento, ressalta-se que o Capítulo II, da Lei 10.741/2003 traz em seu bojo diversos dispositivos penais tipificando vários delitos que são praticados tendo como vítimas as pessoas idosos, sendo que todos esses crimes serão processados por meio de uma ação penal pública incondicionada, ou seja, o Ministério Público será o titular da ação, o qual poderá propor a ação em juízo independente da vontade da vítima, pois o bem jurídico tutelado é maior do que os próprios interesses do ofendido.

O primeiro desses crimes vem esculpido no artigo 96, do Estatuto do Idoso e traz a conduta típica de discriminação ao idoso, de forma a impedir ou dificultar seu acesso às operações bancárias, meios de transportes, bem como ao direito de firmar contratos ou qualquer recurso que lhe dificulte o exercício da sua livre cidadania, em razão da sua idade, sob pena de reclusão mínima de seis meses e o máximo de um ano, além da multa cominada (BRASIL, 2013).

Em seus parágrafos subsequentes, o texto legal aponta que incorrerá na mesma pena aqueles que realizarem condutas de desdenho, humilhação, menosprezo ou discriminar o idoso por qualquer que for a motivação. Além de prever uma causa de aumento de pena de 1/3 (um terço), se essa vítima estiver sob os cuidados ou responsabilidade do autor do fato.

Analisando o crime em tela, é possível observar que o bem jurídico tutelado é a dignidade do idoso, tendo como finalidade garantir a liberdade para que possa exercer os atos da vida civil e o regular exercício da cidadania. Trata-se de um delito classificado como comum, pois qualquer pessoa pode ser o sujeito ativo (praticar a conduta delitiva), não necessitando que seja um agente específico. Sobre o conceito de cidadania, destaca-se a visão de Lima, Menezes Junior e Brzezinski (2017, p.2482):

O conceito contemporâneo de cidadania se estendeu em direção a uma perspectiva na qual cidadão não é apenas aquele que vota, mas aquela pessoa que tem meios para exercer o voto de forma consciente e participativa. Portanto, cidadania é a condição de acesso aos direitos sociais (educação, saúde, segurança, previdência) e econômicos (salário justo, emprego) que permitem ao cidadão desenvolver todas as suas potencialidades, incluindo a de participar de forma ativa, organizada e consciente da vida coletiva no Estado.

Desta forma, o crime em voga versa sobre a discriminação a esses direitos, em razão da característica pessoal da vítima, pelo fato dela ser idosa, inclusive contrariando o texto constitucional, em seu artigo 5, que veda qualquer forma de discriminação e tratamento desumano ou cruel, garantindo o acesso a todos aos seus direitos, sem qualquer distinção.

O segundo crime previsto no Estatuto do Idoso, vem disposto no artigo 97, que tipifica a omissão de socorro que prevê a conduta de deixar de prestar a devida assistência à pessoa idosa, desde que seja possível essa prestação e a pessoa deixa de faze-la e seja sem risco pessoal, nos casos em que houver iminente perigo ou atos como recursar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem uma justa causa, ou de qualquer modo não pedir o socorro da autoridade pública incumbida de presta-lo. Com pena de seis meses a um ano e multa. Além da majorante da metade se dessa omissão resultar uma lesão corporal de natureza grave e triplicada se tiver como resultado morte (BRASIL, 2013).

Nesse caso, o bem jurídico tutelado é a vida do idoso. Trata-se de um crime classificado como próprio, pois somente podem ser sujeitos ativos (autor do fato) aqueles que são obrigados a prover a necessidade básica do idoso, como filhos, cônjuge, curador, entre outros. Diferencia-se por ser um crime omissivo, que se consuma pelo ato de deixar de fazer, ao abandonar e/ou não prover, não admitida a tentativa.

Como se pode verificar, esse delito se diferencia da omissão de socorro geral prevista no artigo 135, do Código Penal (BRASIL, 1940), o qual é genérico e prevê uma pena detenção de um a seis meses, alternativamente a pena de multa. Nesse enfoque, sendo a vítima idosa e se enquadrando na tipificação do artigo 97, do Estatuto do Idoso, este é que deverá ser aplicado, em face do princípio da especialidade, haja vista que trata especificamente dessa situação e prevê uma pena mais severa para o autor.

Em seguida, no artigo 98, do Estatuto do Idoso, o abandono em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência ou similares ou não prover a subsistência quando for obrigado por lei ou mandado, com pena de detenção de seis meses a três anos, além da multa (BRASIL, 2013).

O bem jurídico tutelado é a saúde e a vida do idoso, também se enquadrando como crime próprio, pois somente podem ser autores aqueles que estariam obrigados a prover as necessidades básicos da pessoa idosa, se consumindo com a omissão.

O artigo 99, por sua vez, trata das condutas que configuram maus tratos, correspondendo à conduta de “expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado” (BRASIL, 2013, online).

Por sua vez, prevê a pena de detenção de dois meses a um ano e multa. Tal delito possui duas qualificadoras, a primeira estabelece que se dessa conduta delituosa ficar apurada a ocorrência de lesão corporal de natureza grave o crime terá pena mais severa, consistente em reclusão de um a quatro anos. A outra qualificadora prevê o resultado morte, com pena de quatro a doze anos.

Adiante, o artigo 100, da Lei 10.741/2003, elenca condutas que podem ter pena de seis meses a um ano e multa, entre elas verifica-se obstruir o acesso de qualquer pessoa a cargo público, bem como negar trabalho ou emprego se fundamentando única e exclusivamente na faixa etária. Destaca-se, ainda, o fato de recursar, retardar ou dificultar atendimento ou não prestar assistência à saúde para idoso, sem que se apresente um justo motivo. Ainda, quando se depara com a execução de ordem judicial em ação civil compreendido pelo Estatuto do Idoso, deixando de cumprir, retardando ou frustrando o ato. E, por fim, a conduta de oferecer recusa, retardar ou omitir dados técnicos que seriam fundamentais para a propositura da respectiva ação civil, prevista no respectivo ordenamento, quando requisitados pelo órgão ministerial.

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Por consequente, um outro delito que é comum, é o previsto no artigo 102, que consiste na conduta de “apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade” (BRASIL, 2013, online). Com pena de reclusão de um a quatro anos, além da multa. Tal crime se difere da apropriação indébita, prevista no Código Penal, tendo em vista que é específico na tutela e proteção do patrimônio das pessoas idosas.

O delito do artigo 103, do Estatuto do Idoso se difere dos demais, diante do fato que é um crime próprio, pois a conduta consiste em negar o acolhimento ou a permanência da pessoa idosa como abrigada, em razão deste ter recusado outorgar procuração a essa respectiva entidade de atendimento. Consiste na recusa da entidade de acolhimento, motivada pela escolha pessoal da pessoa em não assegurar uma procuração designando poderes à mesma.

O artigo 104, do mesmo códex, prevê a conduta de retenção do cartão magnético responsável pelas contas bancárias, das quais o idoso faria saques relativos a benefícios, proventos ou pensão, assim como qualquer outro documento, tendo como elemento subjetivo assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida, com pena de detenção de seis meses a dois anos e multa.

O artigo 105, por sua vez, trata de delitos que ofendem a honra do idoso, ao exibir ou veicular, pelos meios de comunicação, informações ou imagens que depreciem ou injuriem a pessoa idosa, com detenção de um a três anos e multa. O artigo 106, trata da conduta de indução do idoso, que não possua discernimento, a outorgar procuração para que lhe administrem os bens ou para que deles possa se dispor livremente. Prevê uma pena ainda mais severa, de reclusão de dois a quatro anos. No mesmo sentido, o artigo 107 trata da coação a essas pessoas doar, contratar, testar ou outorgar procuração, com reclusão de dois a cinco anos. E, por último, o 108, trata de lavrar ato notarial do idoso sem entendimento dos seus atos, sem que exista a devida representação legal, com reclusão de dois a quatro anos.

Dos delitos evidenciados, observa-se que muitas condutas são similares a outras previstas em outros diplomas legais, como o Código Penal, mas o Estatuto do Idoso, em atenção ao princípio da especialidade, trata com maior rigor essas condutas, direcionando-as especificamente à proteção da pessoa idosa.

Além disso, dos crimes em que a pena máxima for igual ou inferior a dois anos, é cabível a aplicação da Lei 9.099/95, conhecida como a Lei dos Juizados Especiais, o que significa na prática a possibilidade de oferecimento da transação penal e composição civil dos danos, além da suspensão condicional do processo, desde que atendidos os requisitos legais.

Ademais, nos delitos que não se enquadrem nesses requisitos, ainda existe a possibilidade de substituição da pena privativa da liberdade por restritiva de direitos, nos casos em que não seja superior a quatro anos e o crime não se tiver consumado com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa ou independente do quantum da pena quando se tratar de crime culposo, bem como o réu não seja reincidente e as circunstâncias judiciais lhe forem favoráveis (BRASIL, 1940).

Desta forma, verifica-se que existem várias circunstâncias e especificidades que devem ser observadas quando se voltar o olhar para os crimes específicos que são cometidos contra os idosos, previstos no Estatuto do Idoso. A seguir, o enfoque do estudo será em relacionar essa perspectiva com os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana.


4. OS DIREITOS HUMANOS E A PROTEÇÃO AOS IDOSOS VÍTIMAS DE CRIME

Com relação à proteção dos Direitos Humanos assegurados a esses idosos, verifica-se que a questão da violência contra os mesmos implica claramente desrespeito à dignidade da pessoa humana e envolve muito mais coisas do que simplesmente o abandono domiciliar, a falta de remédio, a subtração de aposentadorias. O que mais causa indignação é saber que essas pessoas na sua grande maioria perderam as forças para reagir contra as injustiças que sofrem.

Segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramos (2007) em parceria com o SESC nacional, a maioria da população idosa (73%) sabe da existência do Estatuto do Idoso, porém quase sempre apenas por ouvir falar (61%). O desconhecimento total é maior entre os idosos (27%) que entre os não idosos (18%). Três em cada quatro idosos (77%) citam espontaneamente algum direito social, com destaque para o direito à saúde (45%), seguido pelo direito à aposentadoria ou pensão (30%). A violência, desrespeito ou maus-tratos é algo presente na vida dos idosos, muito embora, espontaneamente, só́ 15% dos pesquisados relatem alguma ocorrência. Entre os homens, há maior percepção de violência (18%, contra 13% entre as mulheres).

Outrossim, de acordo com a Casa da Cidadania (2012) a os idosos afirmam que ironia, gozação, humilhação ou menosprezo devido à idade (17%) e ficar sem remédios ou tratamento adequado quando necessário (14%); a recusa de algum trabalho ou emprego, por causa da idade ou ser ameaçado/aterro- rizado (7% cada), e serem submetidos a violência física ou lesão corporal (5%) são as ocorrências mais comuns. A mesma fonte afirma que passar fome ou ficar sem ter o que comer, não ter cuidados ou convivência com a família e ter crédito recusado devido à idade já ocorreram com 4% dos idosos e 3% dizem ter sido submetidos a trabalho excessivo ou inadequado, ou forçados a fazer coisas que não gostariam.

Como se pode depreender, há uma série de fatores, da mais variada tipologia, resultando em distintas formas de violência contra a pessoa idosa e consequentemente ferindo os universais direitos da pessoa humana. Não resta dúvida que as políticas desse particular carece ainda de muita efetivação, notadamente porque há o substrato da problemática uma questão cultural, advinda de longa data e de por conseguinte impregnada no seio da sociedade.

A mesma pesquisa da Casa da Cidadania (2012) ainda indica que excluídas as duplicidades pela vivência de mais de uma destas formas de violência, chega-se ao índice de 35% de idosos que já sofreram algum tipo de violência. Este índice é maior entre os homens (40%, contra 30% entre mulheres) e, sobretudo entre os mais velhos (52% entre os homens com 80 anos). Pode-se incluir, ainda, a garantia do Poder Público em conceder ao cidadão todos os seus direitos, preconizados na própria Constituição Federal de 1988, como, por exemplo, o direito à vida, à saúde, à educação, à segurança, às condições mínimas de higiene, a uma moradia saudável, à alimentação, ao trabalho, ao transporte público adequado etc.

Por outro lado, o artigo 3º do Estatuto do Idoso estipula ser obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

Na continuidade o Art. 4º estabelece que “Nenhum idoso será́ objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação e violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será́ punido na forma da lei. Segundo Minayo (2003, p. 785):

Dentre as principais causas de morte em idosos no Brasil, nos anos de 1980 a 1998, as causas externas representaram 3,5% da mortalidade geral, ocupando, nesse conjunto, o sexto lugar. Os dados indicam tendência de queda desse tipo de óbitos que, já em 1998, significou 3,2% da mortalidade geral nessa faixa etária (ou seja, na população de 60 anos ou mais), tendo sido superado pelas doenças infecciosas e parasitárias (DIP), que estavam logo abaixo no ranking das causas de mortalidade. Em 1998, morreram 13.184 idosos por acidentes e violências no país, significando, por dia, cerca de 37 óbitos. No período de 1980 a 1998, as taxas de óbitos da população de 60 anos e mais, por todas as causas, no país, apresentaram comportamento decrescente em ambos os sexos, com picos entre 1984, 1988 e 1993. Em 1980, essas taxas para o sexo masculino foram de 4.425,4 por 100 mil habitantes e em 1998, de 4.191. No sexo feminino foram, respectivamente, 3.531,8 e 3.180,6.

Segundo os Princípios das Nações Unidas para o Idoso (Resolução 46/91) ressaltam a importância dos idosos na sociedade, participando ativamente na formulação e implementação de políticas que afetam seu bem-estar, prestando serviços voluntários à comunidade, de acordo com seus interesses e capacidades e atuando em movimentos e associações da sociedade civil. Para confirmar a correção desses princípios, muitos idosos, comprovando sua vitalidade, têm se organizado em associações, grupos da terceira idade, a fim de conquistar esse espaço que lhes têm sido negado. A partir desses exemplos de luta pela dignidade, cabe agora à sociedade reconhecer a importância dos idosos em nosso meio e - cumprindo seu dever de solidariedade - apoiar essas iniciativas, multiplicando as conquistas dos idosos.

Na Constituição Federal estabelecem-se, ainda, nos Princípios e Objetivos Fundamentais do Estado Brasileiro o "Direito a ter Direitos", como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Dentre eles figura a proibição de quaisquer formas de discriminação, inclusive por idade (art. 3º, IV). No tocante aos princípios reconhecidos internacionalmente o Estado Brasileiro referência alguns Tratados Internacionais, dentre eles a prevalência dos Direitos Humanos (BRASIL, 1988, art. 4º, II).

A Política Nacional do Idoso (PNI) (BRASIL, 1994) regulamentada pela Lei 8.842/94 tem como finalidade assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade. Ela traz responsabilidades partilhadas pelo Estado, família, sociedade civil, ministério público, órgãos públicos e instituições sociais. Retoma o estabelecido na Constituição Federal dizendo que compete à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar ao idoso todos os direitos de cidadania, garantindo sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito à vida; afirmando que não deve sofrer discriminação de qualquer natureza, e que o idoso deve ser o principal agente e o destinatário das transformações a serem efetivadas através desta política. Há 15 anos atrás, reconhecia-se já ao idoso o papel de agente ativo na condução da própria vida.

Portanto, como se pode traçar até o momento, os idosos sofrem diariamente com várias condutas que ferem seus direitos e garantias fundamentais, sendo que muitas dessas violências se perpetuam no próprio seio familiar que deveria dar a proteção, mas que frequentemente os mantém reféns de várias formas de abuso, que se dá, na maioria dos casos, na clandestinidade e às ocultas, sem que haja uma testemunha.

Desta forma, ainda há um árduo caminho para que se elimine a violência contra as pessoas idosas da sociedade, garantindo que seja dada a efetividade de seus direitos e asseguradas as condições básicas, de modo que haja respeito à dignidade da pessoa humana e diversos outros direitos humanos que lhe são conferidos.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme visto ao longo do estudo, as pessoas idosas representam um grande grupo vulnerável, compreendendo como idoso aquele que tem mais de sessenta anos e que de acordo com as pesquisas trazidas, a população nessa faixa etária está crescendo mais do que entre os mais jovens, trazendo a ideia de que está havendo um envelhecimento superior à taxa de natalidade.

Compreendido isso, verificou-se que o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2013) traz uma maior proteção ao idoso, pois prevê condutas específicas que têm como vítima os idosos, atendendo ao princípio da especialidade, ao atribuir penas mais severas em crimes praticados nesse contexto. Dando uma proteção ainda maior e o Estado como protetor desse vulnerável grupo social, aplicando as penas com finalidade de punição e proteção.

Por fim, verifica-se que o respeito a esses direitos, bem como a busca pela erradicação ou ao menos evitar os crimes contra os idosos, por meio de punições mais incisivas, atende aos ideais de direitos humanos, na busca de proteção aos mesmos e da devida noção da dignidade da pessoa humana, que tanto merecem.


REFERÊNCIA

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.

BRASIL. Estatuto do Idoso. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003.

BRASIL. Lei 8.842/94 - Política nacional do idoso, 1994.

FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMOS. Pesquisa: Idosos no Brasil - Vivências, desafios e expectativas na 3ª idade,2007. Disponível em: https://www.sescsp.org.br/online/artigo/7102_PESQUISA+IDOSOS+NO+BRASIL+VIVENCIAS+DESAFIOS+E+EXPECTATIVAS+NA+3+IDADE Acesso em 15.06.18.

IBGE - PNAD 2016. População idosa cresce 16,0% frente a 2012 e chega a 29,6 milhões. (24.11.2017). Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2013-agencia-de-noticias/releases/18263-pnad-2016-populacao-idosa-cresce-16-0-frente-a-2012-e-chega-a-29-6-milhoes.html. Acesso em 15.06.18.

LIMA, Maria Eliene; MENEZES JUNIOR, Antônio da Silva; BRZEZINSKI, Iria. Cidadania: Sentidos e Significados. 2017. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/24065_12317.pdf. Acesso em: 20 jun. 2019.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Violência contra idosos: relevância para um velho problema. Centro Latino-Americano de Estudos sobre Violência e Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz. Av. Brasil 4036, Rio de Janeiro.

ONU - Princípios das Nações Unidas para o Idoso - Resolução 46/91. Disponível em https://www.fbb.pt/sos/wp-content/uploads/sites/10/2014/05/principios_das_nacoes_unidas_para_o_idoso.pdf Acesso em 15.06.18.

SANTOS, Silvana Sidney Costa. Concepções teórico-filosóficas sobre envelhecimento, velhice, idoso e enfermagem gerontogeriátrica. Rev. Bras. Enferm, Brasília, 2010.

SOARES, Jardel de Freitas. Dos crimes contra os idosos. Disponível em: https://semanaacademica.org.br/system/files/artigos/dos_crimes_contra_os_idosos_1_0.pdf. Acesso em: 13.02.2019.

Sobre a autora
Bruna Gonçalves Xavier

Mestre em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco. Bacharel em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco. Advogada.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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