Breves considerações jurídicas sobre a contabilidade em organizações do terceiro setor

05/08/2020 às 12:42
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A abordagem temática do presente estudo, voltou o olhar para a contabilidade no âmbito das organizações do Terceiro Setor.

1 INTRODUÇÃO

As entidades inseridas no terceiro setor, tais como Organizações Não-Governamentais, cooperativas, associações, entre outras, constituem um importante espaço na sociedade, tendo em vista que atuam em áreas que o Estado não consegue suprir.

Nesse sentido, a composição dos recursos, sejam eles materiais ou financeiros dessas organizações merece destaque, pois pode haver receita por meio de doações ou por renda própria por meio da alienação de seus produtos ou prestação de serviços dessas entidades.

Desta forma, verifica-se que as organizações do terceiro setor atuam como prestadoras de serviços em ramos que o Estado se vê impossibilitado de atuar pelos mais variados motivos, diante disso, a criação e manutenção dessas entidades é de interesse para todos, razão pela qual se destaca a relevância deste trabalho. Surgindo a seguinte problemática: Quais são os procedimentos contábeis utilizados em uma organização definida como do terceiro setor?

O objetivo geral buscou compreender os procedimentos contábeis envolvidos em uma entidade do terceiro setor. Os objetivos específicos consistiram em contextualizar as entidades do terceiro setor, bem como estudar os aspectos legais presentes nessas entidades e apontar os procedimentos contábeis para controlar o patrimônio das mesmas.

O tipo de pesquisa realizado neste trabalho foi uma Revisão da Literatura, no qual foi realizada consulta a livros, dissertações e em artigos científicos selecionados através de busca nas seguintes bases de dados (livros, sites de banco de dados, trabalhos de conclusão de curso, tese e dissertações). O período dos artigos pesquisados foram os trabalhos publicados nos últimos trinta anos, As palavras-chaves utilizadas foram: Contabilidade, Isenções, Imunidades, Terceiro Setor.

Desta forma, o trabalho foi estruturado em três capítulos, sendo que o primeiro deles foi destinado a conceituar e caracterizar o terceiro setor, enquanto o segundo capítulo buscou discorrer sobre as imunidades e isenções tributárias nesse cenário e, por fim, o último capítulo buscou evidenciar a importância da contabilidade no âmbito do terceiro setor.

2 O TERCEIRO SETOR

O mercado pode ser dividido em três setores essenciais para a compreensão, são eles o primeiro, segundo e terceiro setor, os quais são responsáveis pelas atividades de cada área da sociedade. Cada setor contará com características próprias que servirão de base para sua diferenciação, levando em conta a utilização dos recursos financeiros.

Nesse enfoque, o primeiro setor é regido pelo Estado, o qual é responsável pela essencialidade dos serviços públicos fins. A característica principal que o distinguirá dos demais setores é a utilização do dinheiro público para a concretização dos fins públicos.

Logo, esse setor “representa o uso de bens públicos para fins públicos. Portanto, a aplicação desses recursos deve ser direcionada integralmente na infraestrutura, no bem-estar da sociedade e outras funções de responsabilidade do Estado” (JUNIOR; ARAÚJO; SOUZA, 2015, p.15)

Corroborando com essa afirmação, é possível destacar que o Estado emerge a partir da junção de um Estado soberano, assim com poder político, um povo e um território.

O Estado surge a partir de três elementos, o “poder político, povo e território”. “É um poder político exercido sobre um território e uma população”, conforme destaca (GRUPPI, 1980. p. 07). “Tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como o pluralismo político” (Art. 1º da CF/88). Sua finalidade básica é administrar os bens públicos para atender as necessidades coletivas, derivadas dos direitos previstos na Constituição Federal de 1988. (BENTO, 2010, p.14)

O segundo setor, por sua vez, atinge o mercado propriamente dito, com as atividades que tem como finalidade a obtenção do lucro. Sua composição é marcada por empresas privadas que tem como fim a venda de bens ou serviços, sejam eles oferecidos ou não pelo poder estatal, visando a obtenção de um montante monetário. “Segundo Setor: refere-se ao mercado e é ocupado pelas empresas privadas com fins lucrativos. Corresponde à livre-iniciativa, e tem como característica principal visar ao lucro. ” (JUNIOR; ARAÚJO; SOUZA, 2015, p.15)

Assim, o segundo setor se diferencia pelos demais, conforme acima explicitado, pela utilização de dinheiro privado para uma finalidade considerada como privada, ou seja, a que visa a obtenção de um ganho material, através dos lucros.

Avançando com essa divisão, a última classificação com relação aos setores, é o terceiro. As entidades de terceiro setor também são conhecidas como paraestatais ou entidades de cooperação, as quais são aquelas que prestam um serviço público que o Estado deixou de prestar em benefício da sociedade. Logo, as atividades que realizam são serviços que não são necessariamente exclusivos da administração pública, recebendo certos recursos do poder público.

Ademais, certifica-se que este termo é considerado como recente no Brasil, pois surgiu há aproximadamente três décadas, para designar um setor que transitasse entre o público e o privado. O qual passou a ser reconhecido na sociedade em geral, em virtude de sua capacidade em mobilizar os indivíduos e materiais com a finalidade de atender relevantes questões sociais que o Estado deixou de promover (PAES, 2006).

Nesse sentido, consoante Araújo (2009, p. 10), conceitua-se este terceiro setor como sendo uma:

[...] instituição de dinamização de uma ordem jurídica; resolução dos conflitos sociais por meio da aplicação das normas instituídas; e, administração e gerenciamento dos bens públicos para atender às necessidades da coletividade. (ARAÚJO, 2009, p.10)

Desta forma, ressalta-se que as entidades consideradas como de Terceiro Setor, compreende aquelas que não há fins econômicos e/ou lucrativos. Em que se pese ser um instituto de natureza jurídica de direito privado, tais locais não têm lucro, sendo que a renda excedente é conhecida como Superávit. (PAES, 2006)

Nesse sentido, conforme Oliveira e Durães (2014, p;14), o terceiro setor pode ser visto como uma reunião de organismos, bem como organizações que não possuem fins lucrativos, sendo consideradas entidades autônomas e com administração própria, tendo como objeto atuar de modo voluntário para atender demandas da comunidade buscando auxilia-la, em atividades em que o poder público não está atuando, tendo como finalidade promover mudanças sociais, ao impulsionar o sujeito foco dessas iniciativas.

De igual forma, dentre as principais características presentes nessas entidades paraestatais, segundo Bento (2010), é possibilidade de promover ações destinadas ao bem-estar da comunidade, com a manutenção de projetos sem fins lucrativos e com a sua personalidade jurídica voltada às finalidades sociais.

Outrossim, as atividades têm como investimento oriundos do primeiro setor, sendo que pode ocorrer casos em que hajam doações do segundo setor e de particulares. Assim, as essas organizações possuem características típicas de “prestadoras de um serviço público com o objetivo de promover o bem-estar social; serem privadas, sem fins lucrativos e dotadas de autonomia e administração própria. ” (BENTO, 2010, p. 28)

Essas entidades paraestatais podem se classificar em: associações, fundações, organizações religiosas, partidos políticos, entidades beneficentes (saúde, educação e assistência social), sindicatos, condomínios, esportivas e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP).  

Nesse sentido, as associações correspondem a uma modalidade de união de pessoas que formam uma organização tendo um objetivo comum, sem buscar uma finalidade lucrativa, tendo o enfoque apenas voltado às causas sociais e interesses da comunidade. Assim:

[...] as associações são constituídas a partir de reuniões de pessoas físicas, que, por sua vez, possuem objetivos em comum. Estas se organizam e decidem desemprenhar atividades sem fins lucrativos, que estão voltadas, principalmente, para o atendimento de interesses sociais ou de seus próprios associados. Diferem-se das fundações também no que diz respeito ao patrimônio, uma vez que as associações não necessitam deste para serem constituídas, visto que seus recursos são adquiridos por meio de doações dos associados e da sociedade. (ARAÚJO, 2016, p.21)

No que concerne às fundações elas dizem respeito à organização sem fins lucrativos em que há a destinação de um certo patrimônio para a sua constituição, a qual busca seguir algum propósito que deve transitar entre os fins morais, religiosos, culturais ou assistenciais, podendo ser públicas ou privadas. Consoante Diniz (1998, p. 11):

A fundação é um complexo de bens livres (universitas bonorum), colocado, por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas, sem intuito de lucro, a serviço de um fim lícito e especial com alcance social, em atenção ao disposto em seu estatuto. É portanto, um patrimônio destinado a uma finalidade socialmente útil, ou seja, filantrópica, que lhe dá unidade.

De igual maneira, outra característica que marca as fundações corresponde ao fato de que ela não depende da reunião de várias pessoas para a sua criação, bastando apenas que haja um instituidor que destina um certo valor, anteriormente, para a sua criação.

Em consonância com essa identificação das entidades que compõe o terceiro setor, também é importante destacar as Organizações Não-Governamentais, representadas pela sigla ONGs, correspondendo a organizações que lutam por um determinado interesse.

De acordo com Tenório (2005, p. 11), as ONGs podem ser entendidas como: “são organizações sem fins lucrativos, autônomas, sem vínculo com o governo, voltadas para o atendimento das necessidades de organizações de base popular, complementando a ação do Estado”.

Outrossim, ainda existem organizações voltadas a fins religiosos, os partidos políticos, as entidades que se caracterizam como beneficentes em diversos ramos sociais, os sindicatos de classes profissionais, esportivos, entre outras.

Sendo que outra classificação que merece ser observada é a correspondente à OSCIP, a qual corresponde a uma sigla para o termo Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, compreendida como sendo:

OSCIP é uma sigla ainda pouco conhecida fora do circuito de entidades que atuam no chamado terceiro setor. O assunto começou a chamar a atenção desde que foi sancionada a Lei nº 9.790/99, que regula as relações entre Estado e sociedade. Primeiro, é preciso esclarecer o que significa a sigla. OSCIP quer dizer Organização da Sociedade Civil de Interesse Público e a Lei em questão prevê uma nova forma de contratação, o contrato de parceria, para ligar o Estado às entidades classificadas como OSCIP. (BARRETO, 2006, p.01)

Além disso, é importante ressaltar que, por suas características, não fazem parte da administração pública direta, assim como também não fazem parte da administração pública indireta, tendo em vista que não corresponde a uma gestão centralizada por meio do Estado, assim como não faz parte de um enfoque descentralizado.

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3 ISENÇÕES E IMUNIDADES APLICADAS AO TERCEIRO SETOR

Ao longo do capítulo anterior, foi realizada uma contextualização acerca das organizações do Terceiro Setor, as quais correspondem a entidades que destinam sua finalidade a desempenhar atividades que podem substituir a atuação do poder público, ou seja, realiza serviços que têm interesse social envolvido.

Quanto a natureza jurídica que essas instituições podem se apresentar, é importante recorrer ao Código de Civil/2002, o qual prevê em seu artigo 44, que as pessoas jurídicas de direito privado são as associações, sociedades, fundações, organizações religiosas e partidos políticos. (BRASIL, 2002)

Além disso, ressalta-se que essas entidades de Terceiro Setor, atuam como uma forma de organismo, sem fins lucrativos e que detém autonomia e administração própria. A seguir, Oliveira e Durãs (2014, p.18) prelecionam que o:

[...] Terceiro Setor preceitua-se por um conjunto de organismos, organizações ou instituições sem fins lucrativos com autonomia e administração própria, cuja função e objetivo principal visam atuar voluntariamente junto à sociedade civil visando ao seu aperfeiçoamento. Porem seu objetivo é provocar mudanças sociais, através da transformação de cada indivíduo envolvido. (OLIVEIRA; DURÃS, 2014, p. 18).

Nesse sentido, é possível apontar que as entidades do Terceiro Setor não se enquadram na administração direta e também não na administração indireta, mas suas atividades são regulamentadas pelo ente estatal e pelos tribunais de contas, a fim de que se verifique que estão cumprindo a função social a qual se destina.

Assim sendo, esse capítulo se destinará a realizar uma abordagem acerca das imunidades e isenções tributárias que são aplicadas às entidades do Terceiro Setor. De acordo com isso, verifica-se que essas entidades, em razão de que não possuem fins lucrativos, recebem um fomento por parte do Estado, ou seja, há um incentivo para que essas organizações continuem suas atividades.

A imunidade pode ser compreendida como:

[...] a imunidade tributária representa a exclusão da competência para instituir tributos relativos a determinados atos, fatos e pessoas, previstos na Constituição Federal. Tal exclusão consiste na limitação constitucional ao poder estatal de tributar, resultando na impossibilidade de se criarem impostos. Por considerar relevantes à sociedade as atividades desenvolvidas por determinadas entidades, o legislador exclui tais entidades do alcance da competência conferida à União, aos Estados, Distrito Federal e Municípios para instituir impostos (INSTITUTO PRO BONO, 2005, p. 34)

Essa imunidade conferida é oriunda de uma disposição constitucional, a qual elenca em seu artigo 150 a vedação à União, Estados, Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre patrimônio, rendas ou serviços de várias entidades, inclusive para as que se destinam a promoção da educação e assistência social, sem fins lucrativos:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI – instituir impostos sobre: (...) c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei (BRASIL, 1988).

Essas instituições de educação que o artigo traz pode, em algumas ocasiões, englobar pessoas jurídicas na modalidade de associação, fundação ou organização religiosa, enquanto as de assistência social devem ser interpretadas em seu sentido amplo, correspondente a entidades que oferecem educação, saúde e a assistência social em si (GRAZZIOLI et al, 2015).

Esse requisito de que não devem possuir fins lucrativos seguem o que dispõe o artigo 14, incisos I, II e III, do Código Tributário Nacional que estabelece que essas entidades não podem distribuir qualquer parte do patrimônio ou rendas, em nenhuma hipótese, bem como o superávit deve ser aplicado integralmente no país, na manutenção dos serviços prestados, assim como manter a escrituração das receitas auferidas e despesas em livros, com um caráter formal, de modo a assegurar a exata prestação das informações prestadas.

Com relação aos principais tributos que são alcançados por essa imunidade, verifica-se que cada ente federado (união, estados, DF e municípios), possuem uma competência específica a depender do tipo de tributo pretendido. No caso do Distrito Federal, tendo em vista que não possui municípios, segue a competência conferida aos estados. Dentre esses tributos, destaca-se aqueles previstos nos artigos 153, 155 e 156 da Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988. O quadro a seguir reúne esquematicamente esses tributos e a competência assegurada pelo texto constituição para a respectiva arrecada dos mesmos:

Quadro 1 – Esquema dos tributos e competências estabelecidos pela Constituição Federal/88.

Federal

(artigo 153, da CF/88)

Estadual

(artigo 155, da CF/88)

Municipal

(artigo 156, da CF/88)

Imposto sobre a Renda e os Proventos de qualquer natureza (IR)

Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)

Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU)

Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)

Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA)

Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS)

Imposto Territorial Rural (ITR)

Imposto sobre Transmissão Causa mortis ou Doação de Bens e Direitos (ITCMD)

Imposto sobre Transmissão Inter vivos de Bens Imóveis (ITBI)

Imposto sobre a Importação (II) e a Exportação (IE)

Fonte: Do autor (2018) baseado em Brasil (1988).

Frente ao exposto, verifica-se que existem vários tributos e a sua competência pode variar, o qual pode se dar a partir da competência federal, estadual ou municipal. Identificar qual ente federado é o responsável por determinado tributo é de grande importância quanto se remete à contabilidade no Terceiro Setor.

Compreendido esse enfoque sobre as imunidades conferidas ao Terceiro Setor, é imprescindível voltar o olhar para as isenções tributárias que podem ser aplicadas a essa esfera. A principal diferença que se estabelece entre as imunidades e as isenções é que as primeiras são estabelecidas na CF/88 e visam impostos sobre patrimônio, renda ou serviços. Enquanto as segundas são estabelecidas por intermédio de lei infraconstitucional e pode abranger qualquer modalidade de tributo, em qualquer esfera.

Sobre as isenções:

As isenções podem ser definidas como uma das espécies de exclusão do crédito tributário, ou, em outras palavras, uma espécie de renúncia fiscal. Isso quer dizer que o Estado pode tributar (diferente da imunidade, em que o Estado não pode, porque assim determinou a Constituição Federal), mas deixa de fazê-lo em função de razões específicas. Na isenção existe a obrigação de pagar, mas a autoridade pode, por algum motivo, isentar o pagamento (Instituto Pro Bono, 2005, p. 38)

Conforme se extrai, as isenções constituem um favor legal conferido, podendo ser revogado pelo legislador infraconstitucional a qualquer momento, ou seja, possui natureza temporária, sua previsão está disposta no Código Tributário Nacional, em seu artigo 175, inciso I, bem como nos artigos 176 a 179.

As entidades do Terceiro Setor que se enquadrarem nas normas concernentes à isenção devem tomar algumas providências, como elenca Grazzioli et al (2015, p. 61):

Desta forma, se as pessoas jurídicas constituídas sob a forma de fundação ou associação não se enquadrarem nas regras da imunidade, devem procurar identificar todas as normas referentes às isenções (federal, estadual e municipal) para verificar se não podem se valer desta modalidade de benefício. Verificando atender aos requisitos específicos, a entidade deve requerer à autoridade tributária o reconhecimento da isenção. Referida autoridade, sendo verificado que a organização atende aos requisitos legais, não pode deixar de reconhecê-lo.

Diante disso, extrai-se que essas isenções são sempre oriundas de uma legislação específica do ente competente pelo tributo, o que dependerá das finalidades que o poder público estiver vislumbrando, sendo que elas podem ser concedidas de maneira, consoante Instituto Pro Bono (2005, p.39), “gratuita ou onerosa, por tempo determinado ou indeterminado, podem abranger todo o território do ente tributante ou beneficiar apenas determinadas áreas”, entre outras formas.

Alguns exemplos no âmbito federal é a isenção sobre o Imposto de Renda sobre as atividades próprias (Lei n. 9.532/97 c/c art. 174 do RIR/99); COFINS sobre atividades próprias (MP n. 2.037-24); INSS sobre a quota patronal das entidades filantrópicas (art. 55 da Lei n. 8.212/91), entre outros (INSTITUTO PRO BONO, 2005, p. 39).

Portanto, é possível verificar que o Terceiro Setor, apesar de constituir uma entidade de natureza jurídica de direito privado, atua com a finalidade de prestar serviços que o Estado, o qual era responsável, não pode atuar, devido a vários fatores. O fato é que o Estado se omite ou deixar de fazer determinado serviço público, sendo que nesses casos podem surgir entidades oriundas do Terceiro Setor para suprir essa necessidade, sendo que podem se constituir sob a égide de uma Associação, Organização sem Fins Lucrativos, entre outras.

4 A CONTABILIDADE NO TERCEIRO SETOR

Conforme visto anteriormente, o Terceiro Setor atua na realização de atividade sociais, em que o poder público deixou de atuar, em razão de seu importante papel e função que exerce, essas entidades não compõe a administração pública direta ou a indireta, motivo pelo qual, em tese, não se sujeitaria ao poder de polícia e fiscalização do ente estatal.

Contudo, em razão da natureza dos serviços prestados corroborado com o fato de que essas instituições recebem favor legal das isenções tributárias, assim como das imunidades previstas na legislação brasileira, é interessante que haja a fiscalização das atividades, de modo que fique comprovada que elas continuam a prestar os fins sociais a que se destinam. É nesse sentido a importância da efetivação da contabilidade no terceiro setor, a fim de comprar todas as entradas e saídas, gastos e rendimentos que essas instituições tiveram.

Nesse sentido, sobre a importância da contabilidade, destaca-se ela atua como uma forma de mensurar dados, sendo imprescindível em diversos contextos, inclusive nas entidades do Terceiro Setor, as quais podem oferecer as demonstrações contábeis, além de outras informações que podem surgir, de forma que haja a efetiva prestação de contas (OLAK; NASCIMENTO, 2000).

Ademais, no caso do Terceiro Setor, considerando que o patrimônio e renda dela pertence à sociedade (em razão das funções que presta), deve haver um cuidado com a exatidão das informações de natureza financeira, econômica e patrimoniais que forem repassados, a fim de que se atenda ao princípio da função social, assim como o da transparência (ALVES, 2004).

De acordo com o exposto, é possível apontar uma série de características básicas que compõe a contabilidade no Terceiro Setor. Dentre elas destaca-se que o lucro não é o seu foco principal, a propriedade das suas funções e utilidades pertence à comunidade, bem como as doações realizadas não dão direito ao doador de participar nos bens ou serviços, a principal fonte de tomada de decisões se dá por intermédio de assembleias e os membros são oriundos de vários setores da comunidade, além disso, tem como missão sua razão de ser, a qual é motivo de sua existência (OLIVEIRA; DURÃS, 2014).

Ao se evidenciar a ausência de normas que regulassem a contabilidade nesse setor, sendo que até então utilizava-se a Lei 6.404/76, a chamada Lei das Sociedades Anônimas, o Conselho Federal de Contabilidade, CVM e IBRACON, reunidos com demais órgãos governamentais, editaram algumas normas para reger a contabilidade do Terceiro Setor no Brasil.

Sobre esse ponto, de acordo com Silva et al (2011), destaca-se que essas regulamentações traçam requisitos e procedimentos de maneira específica para que seja possível avaliar e registrar componentes e questões patrimoniais, bem como reunindo informações mínimas para divulgar. Assim sendo, é imprescindível que essas organizações estabeleçam a manutenção da sua escrituração de receitas e despesas registradas em livros.

Quanto as normas brasileiras de contabilidade que são aplicadas no terceiro setor, merece destaque o fato de que essas instituições são consideradas sem fins lucrativos, ou seja, o superávit é destinado à manutenção do bem, assim não há a existência de um lucro líquido a ser revertido para os sócios e nem prejuízos, o que nesses casos recebe a denominação de déficit.

Dentre as normas, conforme Oliveira e Durãs (2014), são aplicadas a:

NBCT 2.2 – Correspondente à documentação contábil (a organização tem o dever de fazer a escrituração de seus documentos contábeis); NBC T 2.5 – Das contas de compensação: As contas de compensação constituem de sistema próprio e obrigatório quando, nos casos que se obrigue. E deverão ser registrados os atos relevantes que possam modificar o patrimônio da entidade e NBC T 3 – Conceito, conteúdo estrutura e nomenclatura das demonstrações contábeis.

Corrobora, nesse contexto, conforme destaca Ebsen (2003, p. 47), na: “aplicação das normas contábeis, em especial a NBC T 3, a conta Capital deve ser substituída por Patrimônio Social, integrando o grupo Patrimônio Líquido, e a conta Lucros ou Prejuízos Acumulados por Superávit ou Déficit do Exercício. ”

No que concerne às demonstrações de superávit ou déficit do exercício é importante salientar que:

Esta demonstração, denominada de "Demonstração do Resultado do Exercício" ou "Demonstração do Superávit ou Déficit", tem por objetivo principal, nas entidades sem fins lucrativos, evidenciar todas as atividades desenvolvidas pelos gestores relativas a um determinado período de tempo, denominado de "Exercício". Por esse motivo, prefere-se utilizar a expressão "Demonstração do Superávit ou Déficit das Atividades" ao invés de "Demonstração do Resultado". A ênfase aqui é dada à atividade e não ao resultado, como ocorre nas entidades de fins lucrativos. Obviamente, ao final, será evidenciado, também, um resultado (superavitário ou deficitário), mas à entidade sem fins lucrativos, em linhas gerais, a preocupação maior é com as atividades desenvolvidas do que com o resultado (OLAK; NASCIMENTO, 2000, p. 14).

Nesse sentido, o balanço patrimonial consiste em uma maneira de demonstrar, contabilmente, evidências quali-quantitativas, levando em conta um determinado período, posição patrimonial e financeira da organização. No que tange à demonstração do resultado, corresponde ao ato de trazer os resultados obtidos dentro de determinado período. Além disso, essas entidades também devem realizar a demonstração dos lucros ou prejuízos que se acumularam em uma determinada fase, assim como evidenciar o patrimônio líquido existente e, por fim, evidenciar as origens e aplicações dos recursos – variação do capital (OLIVEIRA; DURÃS, 2014).

Sob esse prisma, quanto ao trazido, destaca-se que o patrimônio líquido corresponde os recursos que são propriedade dessas organizações, sendo resultado da diferença entre o ativo e o passivo. Assim, Araújo (2009, p.55) aponta que:

O Patrimônio Líquido, segundo a NBC T “compreende os recursos próprios da entidade e o seu valor é a diferença entre o valor do Ativo e o valor do Passivo, que pode ser positivo, nulo ou negativo”. A NBC T, determina ainda, a substituição da conta Capital Social das organizações com finalidade de lucros pela expressão ‘Patrimônio Social’, não fazendo alusão a mudança na denominação do Grupo do Patrimônio Líquido (ARAÚJO, 2009, p. 55).

Existente, ainda, conforme as autoras, outras normas aplicáveis, quais sejam: NBC T 4, a qual dispõe sobre critérios para realizar a avaliação do patrimônio); NBC T 6 que estabelece mecanismos para divulgar as Demonstrações Contábeis; NBC T 10 trata sobre aspectos inerentes à contabilidade de entidades diversas; NBC T 10.4 discorre sobre as fundações; NBC T 10.18 trata sobre os requisitos das Entidades Sindicais e Associações de Classe; NBC T 10.19 estabelece disposições sobre as Entidades sem Fins Lucrativos; NBC T 19.4 elenca normas sobre os Incentivos fiscais, subvenções, contribuições, auxílios e doações.

Ademais, conforme visto, essas demonstrações contábeis devem reunir um mínimo de requisitos e informações que permitam uma análise da real situação financeira e econômica da organização. Nesse enfoque, de acordo com Olak e Nascimento (2000, p. 17), extrai-se que:

No âmbito "normativo", mesmo que de forma tímida, um importantíssimo passo já foi dado no sentido de se definir padrões relacionados ao conceito, conteúdo, estrutura e nomenclatura das Demonstrações Contábeis e de sua divulgação, aplicados às entidades sem fins lucrativos. Espera-se, ainda, que se consolidem regras mais específicas para entidades desse segmento. Nesse sentido, estudos poderiam ser realizados objetivando fundamentar, científica e tecnicamente, questões ainda não consolidadas como, por exemplo, definição das entidades sem fins lucrativos, suas principais características, classificação, principais fontes de recursos, etc. (OLAK; NASCIMENTO, 2000, p. 17).

Além disso, ressalta-se a importância da contabilidade numa perspectiva gerencial, a qual pode ser compreendida, consoante Padoveze (2012, p.02), como o instituto que “congrega todos os demais instrumentos de contabilidade que complementam a contabilidade financeira para tornar efetiva à informação contábil dentro das empresas em todos os processos de gestão”.

Assim sendo, essa modalidade de contabilidade tem como função servir mecanismos para que os administradores das empresas possam efetivar suas funções gerenciais, dando enfoque ao uso adequado dos recursos econômicos da empresa. Em outros termos, corresponde à busca pelo atendimento das necessidades dos usuários interiores dessas entidades, corroborando com o processo administrativo e controle de questões internas.

No âmbito do terceiro setor, a contabilidade gerencial desempenha um importante papel no que tange à gestão financeira, a fim de se efetivar a proposta de transparência, pois muitas dessas organizações passam por procedimentos de controles sociais, devido ao recebimento doações e dinheiro público, por isso é que se vislumbra como de grande relevância que haja o devido controle sobre os dados presentes no ambiente interno. b

Desta forma, verifica-se que as entidades de terceiro setor apresentam peculiaridades que as distingue das demais, razão pela qual foi importante voltar o olhar contábil para as mesmas, compreendendo que por meio da contabilidade é realidade a conduta de evidenciar e demonstrar informações de relevância para a instituição de terceiro setor, a qual deverá prestar esses dados para o poder público e tribunal de contas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desse estudo, foi possível se obter algumas considerações acerca da importância da contabilidade no âmbito do Terceiro Setor. Em virtude disso, no primeiro tópico, conceituou-se esse instituto como sendo organizações que atuam em setores no qual o ente público deixa de atuar, exercendo atividades consideradas como essenciais para o homem.

Posteriormente, o segundo tópico abordou as principais isenções e imunidades que podem ser garantidas para essas entidades, inclusive apontando alguns tributos e a competência de cada ente federado para a fiscalização do mesmo.

Por fim, no terceiro tópico, a abordagem se concentrou em discorrer sobre a contabilidade e a sua importância nesse Terceiro Setor, a qual consiste em um valioso instrumento para controle e manutenção dessas instituições, inclusive no que concerne à contabilidade gerencial, responsável por registrar a entrada de doações e verbas públicas a fim de que haja transparência nesses espaços, permitindo que no controle externo, realizado pelo Estado, não haja nada incorreto nessas entidades.

Sobre a autora
Bruna Gonçalves Xavier

Mestre em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco. Bacharel em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco. Advogada.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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