DO CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE

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Trata-se de estudo visando analisar o Controle Preventivo de Constitucionalidade expressamente previsto na Constituição Portuguesa e também existente no Brasil conforme construção doutrinária e jurisprudencial.

DO CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE

 

 

Por Ricardo Russell Brandão Cavalcanti[1]

1.Introdução

O presente trabalho visa fazer um estudo sobre o controle preventivo de constitucionalidade em Portugal, onde o mesmo está expressamente previsto, fazendo um paralelo com o ordenamento jurídico brasileiro, onde o instituo em testilha não possui previsão legal. De antemão, frise-se que podemos mencionar quatro classificações do controle de constitucionalidade em Portugal.

A primeira que divide o controle de constitucionalidade em preventivo e sucessivo; a segunda que divide o controle em abstrato e em concreto; a terceira que divide o controle em difuso e concentrado e ainda existe a quarta que divide o controle em por ação ou por omissão. A primeira divisão se dá em relação ao aspecto temporal, ou seja: se a norma entrou ou não em vigor. A segunda divisão se dá em relação a possibilidade da análise estar ou não vinculada a um caso concreto. A terceira divisão se dá a partir do fato do controle ser feito por qualquer órgão jurisdicional ou apenas por uma Corte Constitucional específica. Por fim, a última divisão analisa se há vício em uma lei existente ou se a inconstitucionalidade é justamente em face a inexistência da omissão na existência da lei. Existindo, ainda, a possibilidade excepcional de controle misto.

No Brasil as classificações se dão de forma similar ao que acontece em Portugal, uma vez que o ordenamento jurídico brasileiro afirma que o controle de constitucionalidade pode ser feito por duas vias, quais sejam: por via de ação ou por via de exceção.

O controle por via exceção, ou controle difuso, é o feito diante de um caso concreto, o mesmo se dá, segundo as palavras de Paulo Bonavides: quando, no curso de um pleito judiciário, uma das partes levanta, em defesa de sua causa, a objeção de inconstitucionalidade da lei que se quer aplicar. (BONAVIDES, 2001, p.272).

Assim, todos os juízes e tribunais têm a possibilidade de avaliar, de forma incidental, a inconstitucionalidade de uma lei. Não podem os mesmos afirmarem no dispositivo da sentença que a norma é inconstitucional, sob pena de invadir a competência do Supremo Tribunal Federal- STF, mas podem fundamentar as suas decisões com base na inconstitucionalidade levanta pelas partes. De modo que os efeitos dessa declaração, apesar de serem ex tunc, (ou seja: retroage) só terão validade no caso concreto, tendo efeito entre as partes e não erga omnes (para todos), salvo, se depois de ratificada pelo STF, a referida decisão for encaminhada para o Senado, e este último, através de Resolução, estender esses efeitos para todos.

Na atualidade, o STF tem progredido de modo a considerar a existência da chamada objetivação do controle de constitucionalidade, onde, em tese, uma decisão proferida no controle difuso pode ter efeito não apenas entre as partes, porém é um tema que merece uma reflexão mais aprofunda e que foge do objetivo do presente artigo.

Já o controle por via de ação, é o que discute a inconstitucionalidade em tese da norma legal, ou seja, são ações que não discutem um direito subjetivo, não havendo o que se falar em partes, uma vez que tem caráter objetivo, sendo um controle concentrado, pois é realizado apenas pela Suprema Corte Brasileira.  

Assim, podemos dizer que a análise da constitucionalidade/inconstitucionalidade das normas no Brasil é complexa ou mista tal como acontece em Portugal.  

Ante o exposto, verificaremos que o controle preventivo, inserido na primeira classificação e que será objeto de maior aprofundamento no presente estudo, é ainda concentrado e abstrato (CANOTILHO, 2003, p. 1026).

 

2.Da importância do controle de constitucionalidade

A existência de órgãos e de critérios para a análise da constitucionalidade de uma lei é questão extremamente relevante, pois, tal como afirma Kelsen, uma norma que contraria a Constituição deve ter sua invalidade decretada, porém enquanto não tiver sua inválida decretada, ela será considerada válida. (KELSEN, 1999, p.188/189).

Por outro lado, o autor austríaco ainda frisa que só quando existe um tribunal para declarar a inconstitucionalidade é que essa decisão pode valer para todos. (KELSEN, 1999, p.188/189) e Alexy lembra que não há o que se falar em invasão da função legislativa pelo Tribunal Constitucional quando ele declara a invalidade de uma lei para proteger um direito fundamental, não havendo um exercício indevido de competência, mas apenas um cumprimento de uma ordem dada pela própria Constituição. (ALEXY, 2008, p.484)

Sendo por esse motivo uma decisão acerca da inconstitucionalidade só tem efeito “erga omnes” (para todos) quando decidida por um tribunal constitucional.

No mais, podemos afirmar que o controle de constitucionalidade só existe em face de um motivo primordial: a supremacia da constituição, ou seja, um ordenamento jurídico permite o referido controle quando possui uma Constituição rígida.

A rigidez se caracteriza em face do processo para modificação das normas constitucionais ser mais dificultoso do que o processo para alterar os demais dispositivos legais, levando em consideração que as normas constitucionais também são leis, leis de hierarquia superior as demais, de modo que, como afirma José Afonso da Silva, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se conformarem com as normas da Constituição Federal. (SILVA, 2005, p. 46).

Podemos nos utilizar das palavras do mestre pernambucano Pinto Ferreira: A constituição é uma superlei, com uma força valorativa acima das leis ordinárias (FERREIRA, 1996, p.421). Acrescentamos as palavras do referido autor que ela é superior a todos os demais tipos legais, como a Lei Complementar no Brasil e a Lei Orgânica em Portugal.

Frise-se, no entanto, que a quem critique que um tribunal possa invalidar uma norma que foi feita por meio de um processo democrático (NINO, 1994, p.68.69), haja vista que os parlamentares, diferentemente dos juízes na maioria dos Estados, são eleitos pelo povo.

Não concordamos com a crítica acima porque, em verdade, os magistrados, ao realizarem o controle de Constitucionalidade, apenas confrontam a lei com o Texto Constitucional, que, como regra, também é criada por meio de um processo democrático.

Desta feita, quando uma norma infraconstitucional desobedecer aos preceitos de uma Carta Magna, ela, na maioria dos países, será inconstitucional. Essa desobediência pode se dar em três aspectos: aspecto formal, o material e orgânico.

Uma lei será formalmente inconstitucional quando não obedecer ao processo de elaboração determinado pelo Texto Constitucional, como, por exemplo, a necessidade das leis complementares brasileiras serem aprovadas pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, assim como acontece com as leis orgânicas portuguesas, que também exigem um quórum de aprovação qualificado. 

Por outro lado, uma norma será materialmente inconstitucional quando existir uma colisão entre o conteúdo do novel dispositivo legal com a o Texto Constitucional, como a estipulação da pena de morte sem que esteja dentro de alguma exceção prevista na própria Constituição.

Frisamos o termo “novel” por um simples motivo: entendemos não existir controle de constitucionalidade de normas anteriores à Constituição, uma vez que a avaliação da permanência das leis que antecede uma Constituição é realizada por outro instituto, qual seja, a possibilidade ou não de recepção, ou novação como escreve a doutrina portuguesa (MIRANDA, 2002, p.665), dos seus textos, a depender de estarem materialmente de acordo, ou não, com o atual texto do Pergaminho Máximo.

Por fim, o vício ainda pode ser orgânico, quando a norma é produzida por quem não tenha competência para tal mister, como aconteceria, por exemplo, se um juiz de chão decidisse pela inconstitucionalidade de uma norma no dispositivo de uma sentença e não apenas incidentalmente no processo ou ainda a inconstitucionalidade fosse declarada de forma abstrata por um tribunal que não tivesse essa atribuição.

 

3.Do objeto da análise de constitucionalidade

Em seu artigo 277 (duzentos e setenta e sete) a Constituição Portuguesa prevê que serão analisadas as constitucionalidades das normas e dos seus princípios.

Alexy divide as normas em regras e princípios, trazendo critérios diferentes quando da existência da colisão entre eles. (ALEXY, 2008, p.70-71).

Entretanto, no que tange a questão da inconstitucionalidade, os princípios não podem, em face de sua abstração, ser o objeto de controle de constitucionalidade. Sendo por isso que a Constituição portuguesa deixa claro que os princípios só serão objeto de controle se positivados.

Já o Brasil vai mais além e permite expressamente também na alínea a, inciso I, artigo 102 (cento e dois), da Constituição da República[2], a inconstitucionalidade dos atos normativos federais.

 Acontece que essa última hipótese de controle não existe expressamente em Portugal, porém o Tribunal Constitucional de Portugal por meio de sua jurisprudência alargou esse conceito, permitindo que atos administrativos sejam objetos de controle. (USTÁRROZ, 2007, p.1.)

Desse modo, hoje se entende em Portugal que pode ser declarada a inconstitucionalidade de qualquer norma que esteja em confronto com a Constituição e não apenas as normas parlamentares e governamentais, de modo que pode ser declarada a inconstitucionalidade da lei feita pelo parlamento, dos decretos-leis feitos pelo executivo e dos regulamentos administrativos feitos pelos municípios e demais antes administrativos.

No mais, existem mais de um critério para definir a validade de uma norma, no caso do controle de constitucionalidade, o usado é o da hierarquia, uma vez que as normas inferiores são confrontadas com a norma de elevação objetiva maior, que no âmbito estadual é a Constituição. (KELSEN, 1999, p.155)

 

4.Do controle preventivo

4.1 Introito

De antemão, se faz importante frisar que o controle preventivo das normas em Portugal é concentrado e abstrato (CANOTILHO, 2003, p. 1026), haja vista o fato de só ser realizado por um tribunal e analisando uma lei em tese, desvinculada de qualquer caso concreto, até mesmo porque a norma ainda não está em vigor.

Assim, o controle preventivo é o realizado antes da norma entrar em vigor e que, diferentemente de outras espécies de controle, só poder feita pelo Tribunal Constitucional, em requerimento, em regra, realizado pelo presidente da República, que pode ser feito dentro do prazo de 8(oito) dias da data da recepção da norma.

Desse modo, mais do que uma análise jurídica da conformidade com o Texto Maior, Canotilho afirma que o controle preventivo teria um viés também político justamente porque não analisa exatamente uma lei e sim a continuidade ou não de um projeto de lei ainda não completamente aprovado (CANOTILHO, 2003, p. 901).

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Segundo o artigo 278 (duzentos e setenta e oito) da Constituição Portuguesa, podem ser objeto de controle preventivo: norma constante de tratado internacional, decreto enviado ao presidente para promulgação como lei ou decreto-lei ou acordo internacional cujo decreto de aprovação tenha sido remetido para o presidente para assinatura.

Apesar de, como regra, ser atribuição do presidente enviar a análise para o Tribunal Constitucional, também podem requerer o controle preventivo os representantes da república, porém esses nada mais são do que um “longa manus” do presidente e só o podem fazer em normas regionais.

Além deles, também de forma excepcional, podem requerer o controle preventivo o primeiro-Ministro e um quinto dos Deputados da Assembleia da República no caso de lei orgânica, que são leis que possuem um quórum qualificado de aprovação.

Assim, podemos dizer que, como regra, o controle preventivo em Portugal é realizado a pedido do Presidente da República pelo Tribunal Constitucional.

 

4.2 Funções do Controle Preventivo 

O professor Jorge Miranda afirma que são 3(três) as funções do controle preventivo, quais sejam: 1- afastar as inconstitucionalidades grosseiras 2 – no caso dos tratados, evitar problemas de relações internacionais. 3 – resolver dúvidas sobre a constitucionalidade das leis. (MIRANDA, 2008, p.257).

Em relação à primeira função, em verdade, a função do controle preventivo é afastar toda e qualquer inconstitucionalidade, evitando que uma norma viciada entre em vigor. De qualquer forma, a possibilidade de afastar de plano inconstitucionalidades grosseiras é algo que aumenta a importância do controle prévio.

A segunda função mencionada pelo professor Jorge Miranda é algo que vai poder acontecer a depender do caso concreto. De fato, evitar que um tratado viciado entre em vigor é algo salutar, pois evita uma declaração de inconstitucionalidade feita apenas de forma sucessiva, o que pode gerar situações mais traumáticas. De qualquer forma, não necessariamente uma declaração de inconstitucionalidade pode evitar problemas no âmbito das relações internacionais, pelo contrário, normalmente quando um acordo internacional acaba não sendo incorporado internamente, ainda que em virtude de sua inconstitucionalidade, acaba existindo uma tensão no âmbito internacional.

O que realmente evita problemas de relações internacionais é o cuidado em não celebrar tratados que estejam em desarmonia com o ordenamento jurídico interno do Estado pactuante.

Quanto à terceira função mencionada pelo professor Jorge Miranda, de fato uma lei acaba ganhando uma maior legitimidade quando só entra em vigor após passar pelo crivo do Tribunal Constitucional, gerando uma maior segurança para a população.

Entretanto, urge frisar que, diferentemente do que acontece com a Ação Declaratória de Constitucionalidade no Brasil, cujo provimento gera efetivamente uma presunção de constitucionalidade, o controle preventivo em Portugal não impede que a norma, após entrar em vigor, seja novamente objeto de um controle sucessivo, uma vez que a decisão pela constitucionalidade da norma não faz coisa julgada, podendo a Suprema Corte Portuguesa, diante de novos argumentos, convence-se pela inconstitucionalidade em eventual controle sucessivo.  

 

4.3 Efeitos da inconstitucionalidade no controle preventivo

No caso de uma norma ser declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional Português, o presidente deverá, como regra, a vetar, porém, caso ela seja declarada constitucional, o presidente não é obrigado a promulgar, pois pode optar pelo veto político.

Entretanto, ainda que a lei seja declara inconstitucional, ela poderá ser aprovada pelo presidente quando a Assembleia a confirme por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados efetivamente em atividade.

Ou seja: em um exemplo típico da teoria dos freios e contra pesos (checks and balances), a decisão do parlamento pode prevalecer em relação ao decidido pelo Judiciário, o que, no entanto é algo preocupante, pois nesse caso a norma não deixará de ser inconstitucional. De qualquer forma, em face do quórum elevado, é algo difícil de acontecer.

Em se tratando de um tratado, caso ele venha a ser declarado constitucional, o presidente também poderá por decidir ratificar o mesmo ou não, pois a ratificação dos tratados é um ato discricionário/soberano do presidente da república, pois o mesmo é titular do “jus raepresentationis omnimodoe”, como afirma o professor Jorge Miranda. (MIRANDA, 1983, p.360)

É possível, no entanto, que órgão responsável por fazer a norma opte pela reformulação da norma declara inconstitucional, o que gera nova possibilidade de se fazer um novo controle preventivo da constitucionalidade. (CANOTILHO, 2003, p. 1031)

 

4.4 Obrigatoriedade ou faculdade

Existe uma discussão doutrinaria sobre se seria uma obrigatoriedade ou uma faculdade do Presidente da República consultar o Tribunal Constitucional por meio do controle preventivo antes da promulgação de uma lei.  Entretanto, na linha do defendido pela maioria da doutrina, entendemos que claramente se trata de uma faculdade. E assim entendemos por dois motivos.

O primeiro deles é que na prática diversas normas são sancionadas sem que haja o controle prévio, até mesmo porque possivelmente a Suprema Corte de Portugal não teria condições humanas e estruturais de fazer o controle preventivo de toda e qualquer norma que chegasse ao presidente.  O segundo motivo é que a ausência do controle preventivo não perpetuará necessariamente uma norma viciada, pois o controle sucessivo poderá ser feito a qualquer momento por um leque maior de legitimados.

Assim, não há o que se falar em uma sujeição automática dos projetos para a apreciação do Tribunal Constitucional. (MIRANDA;MEDEIROS, 2007, p.725), tratando-se de uma faculdade do Presidente da República e dos demais legitimados sem situações excepcionais.

 

5. Controle preventivo no Brasil

No Brasil, além de controle difuso realizado em concreto, as ações que averiguam a constitucionalidade em tese das normas legais são as seguintes: a Ação Declaratória de Constitucionalidade, a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental, Ação Declaratória de Inconstitucionalidade e a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão e também o Mandado de Injunção. (MIRANDA, 2002, p.770).

Essas ações têm efeitos erga omnes e, em regra, ex tunc, podendo haver a modulação de seus efeitos pelo STF, de modo que, por uma questão de segurança jurídica, os ministros podem, por decisão de 2/3 de seus membros, dar efeitos ex nunc a referida decisão, ou determinar que seus efeitos não irão retroagir ab ovo, e sim, somente, até determinado período.

Entretanto, diferentemente de Portugal, no Brasil não existe a previsão expressa na Constituição de um controle preventivo.

Acontece que, inobstante a inexistência de expressa previsão no Brasil, a doutrina defende a existência do controle preventivo a ser realizado pelo próprio Poder Legislativo, pelo Poder Executivo e também pelo Poder Judiciário.

No caso do controle feito pelo Poder Legislativo, os projetos de leis brasileiros passam durante a sua feitura por algumas comissões temáticas no Congresso Nacional e, em especial, pela Comissão de Constituição e Justiça – CCJ, que analisa a conformidade do projeto com a Constituição, podendo gerar ao arquivamento do mesmo.

Já o controle feito pelo Poder Executivo se daria por meio do veto jurídico dado pelo Presidente da República. No Brasil, assim como em Portugal, existe a possibilidade do veto político e do veto jurídico. Porém esse último, diferentemente do que acontece Portugal, não passa pelo STF, cabendo ao próprio presidente juntamente com sua assessoria analisar a conformidade do projeto com o ordenamento jurídico brasileiro. Naturalmente, muitas vezes o Presidente da República se utiliza de um argumento jurídico para justificar um veto e não assumir o ônus de um veto político, porém isso é uma questão que foge ao objeto do presente estudo.

Já o controle preventivo realizado pelo Poder Judiciário é uma construção doutrinária e jurisprudencial e se dá por meio do ajuizamento de Mandado de Segurança impetrado pelos próprios parlamentares diretamente no STF com base na existência de vício (formal, material ou orgânico) no projeto de lei e com base no entendimento de que os parlamentarem teriam o direito líquido e certo de se submeterem a um procedimento em conformidade com a Constituição.

 

6. Críticas e Considerações Finais.

Diante do estudo e da pesquisa feita, lançamos as seguintes possíveis críticas ao controle preventivo de constitucionalidade das normas:

O controle preventivo pode gerar uma politização do controle, de modo que o Presidente da República tenha a possibilidade de só enviar o projeto para o Tribunal Constitucional para não assumir o ônus político do veto ou da sanção?

O Tribunal Constitucional estaria apto para o julgamento já que seus membros, em sua maioria (dez dentre treze), são escolhidos pelo parlamento?

Teria sentido o controle de um instituto (no caso, um projeto de lei) que nem norma ainda o é?

Poderia o controle preventivo atrapalhar um eventual controle sucessivo em face de um pré-conceito do Tribunal Constitucional?

As críticas acima parecem ter algum sentido, tomemos como exemplo a Espanha, onde havia o controle preventivo das normas, porém o mesmo foi suprimido em 1985 (mil novecentos e oitenta e cinco), pois, como afirma a professora Maria Callejon, o referido controle na práctica servió para que la oposicion dilatara la tramitación de proyectos de ley (CALLEJON, 2010, p.304), de modo que atualmente na Espanha existe apenas o controle preventivo dos tratados internacionais.

Por outro lado, frise-se que, assim, como já foi dito, no Brasil não existe expressa previsão do controle preventivo, porém, na prática, ele acaba acontecendo.

Entendemos que o controle preventivo tem a sua importância.

Em relação ao primeiro questionamento, o fato é que: caso a norma seja declarada constitucional, o presidente, ainda que em um segundo momento, deverá assumir o ônus de vetá-la ou sancioná-la.

Quanto à formação política do tribunal, também entendemos que não é motivo para tirar o crédito do controle preventivo, primeiro porque o controle sucessivo concentrado é realizado pelo mesmo tribunal, de modo que o referido argumento iria inviabilizar também esse tipo de controle (MUNGUBA, 2014, p.111), segundo porque os magistrados, após tomarem posse, possuem prerrogativas que os permitem se desvincular de qualquer viés político (MUNGUBA, 2014, p.111) e terceiro porque essa é uma crítica que diz respeito, em verdade, ao critério de seleção dos magistrados e não ao controle preventivo em si.

Quanto ao fato de ainda não se tratar de uma norma, entendemos, em verdade, isso como algo benéfico, pois o controle preventivo acaba podendo vir a impedir o nascedouro de uma norma inconstitucional, sendo algo muito mais benéfico do que deixa-la entrar em vigor ainda que defeituosa.

Por fim, ainda que exista um conceito pré-estabelecido pelo tribunal constitucional ao fazer um controle sucessivo de uma norma que já tinha passado pelo controle preventivo, o referido conceito pode mudar com a própria mudanças dos membros da Corte Suprema no decorrer do tempo e com os próprios fatos e circunstâncias que podem ser outros quando do momento de um eventual controle sucessivo.

Ante o exposto, entendemos que o controle preventivo em Portugal é uma medida salutar e que deve continuar a existir de forma a poder evitar a existência de normas em desconformidade com a Constituição, garantindo uma maior segurança ao cidadão.

 

REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 2ª ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2008.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2001.

CALLEJÓN, Maria Luisa Balaguer. El Tribunal Constitucional. In: Manuel de Derecho Constitucional. 5 ed. Madrid: Tecnos, 2010.

CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003.

FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1996.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito[tradução João Batista Machado) 6ª.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional: introdução à teoria da constituição2ª edição. Tomo II. Coimbra: Coimbra Editora, 1983.

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional2ª edição. Tomo VI. Coimbra: Coimbra Editora, 2008

MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui. Constituição Portuguesa Anotada. Tomo III. Coimbra: Coimbra Editora, 2007.

MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 2002.

MUNGUBA, Filipe Ferreira. Controle Preventivo de Constitucionalidade: uma análise comparativa entre os ordenamentos jurídicos brasileiro e português. Dissertação apresentada durante o 2º ciclo de estudos da Universidade de Coimbra. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2014.

NINO, Carlos Santiago. Derecho, Moral y PolíticaBarcelona: Ariel Derecho, 1994.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25ªed São Paulo: Malheiros, 2005.

USTÁRROZ, Elisa. A fiscalização de constitucionalidade em Portugal. InÂmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 46, out 2007.

 

 

 

 


[1] Doutorando em Ciência-Jurídicas Públicas pela Universidade do Minho, Braga/Portugal, mestre em Direito, Processo e Cidadania pela Universidade Católica de Pernambuco, professor efetivo do Instituto de Ciência e Tecnologia de Pernambuco –IFPE, Defensor Público Federal em Pernambuco/Brasil.

[2] Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal. 

 

Sobre o autor
Ricardo Russell Brandão Cavalcanti

Doutor em Ciências Jurídicas-Públicas pela Universidade do Minho, Braga, Portugal (subárea: Direito Administrativo) com título reconhecido no Brasil pela Universidade de Marília. Mestre em Direito, Processo e Cidadania pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Ciência Política pela Faculdade Prominas. Especialista em Direito Administrativo, Constitucional e Tributário pela ESMAPE/FMN. Especialista em Filosofia e Sociologia pela FAVENI. Especialista em Educação Profissional e Tecnologia pela Faculdade Dom Alberto. Capacitado em Gestão Pública pela FAVENI. Defensor Público Federal. Professor efetivo de Ciências Jurídicas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco - IFPE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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