QUESTÕES CONTROVERTIDAS
Partimos da questão da possibilidade, ou não, de ex officio ser declarada a nulidade da Certidão de Dívida Ativa que embasa a execução, em razão da ausência de indicação precisa do endereço do imóvel gerador do débito e do endereço de seu contribuinte. A primeira questão controvertida é a respeito de em princípio, ser correto julgar extinta a Execução Fiscal, sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, IV do Código de Processo Civil, condenando o exequente ao pagamento das custas processuais, com isenção da taxa judiciária, por força do art. 3º, alínea “i” do Decreto Estadual nº 962/1932? Ademais, quais os requisitos a respeito que a Certidão de Dívida Ativa, que lastreia a Execução Fiscal, deve preencher e previstos no art. 2º da Lei nº 6.830/80 e no art. 202 do Código Tributário Nacional, estando, portanto, revestida de certeza e liquidez? Prosseguindo, segundo o enunciado nº 9 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, a notificação do contribuinte acerca do lançamento do IPTU pode se dar por quaisquer atos administrativos eficazes de comunicação, e que a presunção de notificação do sujeito passivo é assegurada ao fisco, podendo ser elidida por prova em contrário a cargo do sujeito passivo, o que há que ser feito para restar comprovado no procedimento? Há violação ao art. 321 do Código de Processo Civil, na medida em que o juízo a quo indeferir a inicial sem antes oportunizar a sua emenda ou o complemento no prazo de quinze dias?
PREMISSAS INAUGURAIS
É sabido que todo recurso, para ser conhecido, necessita atender aos princípios do duplo grau de jurisdição, da taxatividade, da fungibilidade, da dialeticidade, da unirrecorribilidade, do exaurimento das vias recursais, da consumação, da complementariedade, da voluntariedade e da devolutividade, bem como da aplicação da lei vigente ao tempo da publicação da decisão.
Oportuno dizer que “o recurso deverá ser dialético, isto é, discursivo. O recorrente deverá declinar o porquê do pedido de reexame da decisão, assim como os fundamentos de fato e de direito que embasariam o inconformismo do recorrente e, finalmente, o pedido de nova decisão”.[1]
Portanto ab ovo de se ressaltar se o juízo de origem extinguir o executivo fiscal por entender que não houve notificação do contribuinte e constituição válida do crédito tributário o Município deve deduzir adequados fundamentos, sob pena de serem entendidos fundamentos completamente dissociadas da sentença objurgada, em manifesta ofensa ao princípio da dialeticidade.
Salientamos que, nos termos do enunciado sumular 189 do Superior Tribunal de Justiça, é desnecessária a intervenção do Ministério Público nas execuções fiscais.
QUESTÕES FUNDAMENTAIS
Supondo que o juízo de direito em primeira instância extinguiu pelos fundamentos já ensamblados, o Município, por sua vez, em recurso de apelação alegando, em suma, que o imóvel, fruto do tributo em execução, está devidamente individualizado com a inscrição imobiliária do bem, a rua em que se localiza, a quadra e seu respectivo lote e que a notificação do contribuinte acerca do lançamento do IPTU pode se dar por quaisquer atos administrativos eficazes de comunicação, de forma que a presunção de notificação do sujeito passivo é assegurada ao fisco, somente elidida por prova em contrário a cargo do sujeito passivo, fato que não restou comprovado, em nenhum momento no procedimento.
De se reconhecer com razão o apelante.
Primeiramente imperioso destacar que a arrecadação tributária tem por natureza uma função eminentemente social, pois é através do recolhimento de tributos que o Estado realiza seus fins sociais, presta serviços à população e realiza obras e investimentos para o bem comum.
Nesse viés o tributo é o meio estatal de concretização da participação individual na realização do bem comum, ensejando o ideal da vida em sociedade, com a devida comunhão de esforços, cabendo ao Estado o dever de empregar o que arrecada em benefícios coletivos.
Conforme leciona o Professor Eduardo Sabbag[2]: “(...) o Estado necessita, em sua atividade financeira, captar recursos materiais para manter sua estrutura, disponibilizando ao cidadão-contribuinte os serviços que lhe compete, como autêntico provedor das necessidades coletivas”.
Ocorre que a crescente situação de desigualdade social fomentada pelas crises econômicas, políticas e de saúde pública, exigiu uma maior participação do Estado, que passa a ter como suas as necessidades de grande parcela de seus cidadãos, os quais, carentes de recursos, vivem desprovidos de qualquer critério de pertencimento a uma sociedade, à qual estão incluídos formalmente, mas excluídos substancialmente, à mercê do mínimo necessário à dignidade da pessoa humana.
As desigualdades sociais produzem a exclusão social e a marginalização de grupos sociais com baixo poder aquisitivo, fato que os distancia cada vez mais de uma moradia digna e do direito ao mínimo existencial.
O ilustre Professor Valter Foleto Santim, em artigo publicado em coautoria com a mestranda Carolina Bombonatto Borchart[3] de forma didática pontua que:
“Constata-se que além de fundamento e fim da ordem jurídica, a dignidade é, sobretudo, pressuposto de igualdade real dos homens e da própria democracia. Assim, a noção de dignidade da pessoa humana está de maneira estrita relacionada à noção de justiça. Neste diapasão, não se pode falar em justiça sem atender a dignidade da pessoa humana”.
Ao abordar brilhantemente o tema justiça e dignidade, o mestre Gilberto Giacóia, excelentíssimo Procurador Geral de Justiça do Estado do Paraná, em artigo publicado na Revista Em Tempo[4] destaca que:
“No dizer de Bobbio - ao tratar dessa concepção kantiana -, é necessário, para que brilhe a justiça com toda a sua luz, que os membros da associação usufruam da mais ampla liberdade compatível com a existência da própria associação, ou ainda segundo suas próprias palavras, é este o direito único originário que cabe a cada homem segundo a sua própria humanidade”.
Como em todo conceito aberto da ciência jurídica, analisar o termo justiça é tarefa que se faz de maneira não tão simples e direta. Contudo, é unânime que justiça, em sentido amplo, deve refletir isonomia, equidade, direitos igualitários e dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido o ilustre Professor Eduardo Cambi[5], Promotor de Justiça do Estado do Paraná esclarece que:
“Nesta questão, é atual a questão da tutela dos direitos fundamentais sociais (art. 6º, CF: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, bem como a assistência aos desamparados). Tais direitos não são verdadeiros direitos subjetivos, dotados de conteúdo líquido e certo, mas também não são meros instrumentos jurídicos para a luta política, dando ensejo à atuação positiva do Estado – e, portanto, conferindo legitimidade individual ou coletiva para demandar judicialmente – quando tais direitos, ainda que gerem custos à sua implementação, forem indispensáveis à concretização do valor constitucional da dignidade humana”.
Com efeito, para que o Estado tenha sucesso em atingir o bem comum, sua principal fonte de recursos é a tributação, com o grande desafio de fazer com que os tributos não alcancem apenas a função arrecadatória, mas também atendam as garantias constitucionais e, de certa forma, promovam, na medida do possível, a justiça social.
Constantemente o Poder Judiciário é apontado como responsável pela crise da justiça em razão de uma percepção comum de inefetividade do sistema judicial de resolução dos conflitos, em especial na seara das execuções fiscais, com a existência de processos que se arrastam por décadas sem resolução.
Nessa perspectiva, a necessidade de atribuir efetividade ao processo judicial confere ao Poder Judiciário o compromisso de dar efetividade ao processo, com o mínimo sacrifício econômico, com a rápida resposta e melhor composição do litígio.
O professor Marcelo Veiga Franco[6][7] traz informação relevante quando constata que:
“(...) somente nos órgãos das Justiças Estadual e Federal de primeiro e segundo graus, havia no Brasil, no ano de 2017, um universo de 73.787.683 (setenta e três milhões setecentos e oitenta e sete mil seiscentos e oitenta e três) ações judiciais com solução pendente. Para agravar esse cenário, percebe-se que essa quantidade está recrudescendo de forma gradual e constante. O estoque de processos judiciais pendentes de julgamento se encontra em tendência de aumento contínuo ano após ano, demonstrando que o Poder Judiciário não absorve de forma satisfatória o alto volume de demandas que lhe são apresentadas”.
Estatisticamente, as execuções fiscais consistem em um dos tipos de ação com maior presença nos órgãos judiciários brasileiros. Nesta colenda Terceira Câmara Cível, cerca de 70% dos processos distribuídos se tratam de execuções fiscais.
Não se desconhece, por evidente, que a alta quantidade de processos em andamento não tem origem somente em falhas do mecanismo judiciário, mas também em deficiências técnicas e estruturais da Fazenda Pública no acompanhamento e promoção do devido andamento processual.
Da mesma forma é relevante ponderar que o emprego de outras práticas de cobrança, que não somente a execução fiscal, podem gerar o aumento da capacidade de recuperação de créditos tributários e desafogar o judiciário, contudo, ao ser provocado, cabe ao Poder Judiciário, na função que lhe compete, atuar de forma célere e eficiente, assegurando as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, dar o efetivo andamento às execuções fiscais, evitando que a crise econômica que decorre em grande parte da inadimplência tributária, continue assolando a sociedade brasileira e causando mais desigualdade social.
Com fundamento nas ponderações supra abordadas, passa-se à análise da nulidade da Certidão de Dívida tal qual reconhecida pelo juízo singular.
O Código Tributário Nacional e a Lei de Execuções Fiscais preveem os requisitos necessários à validade da certidão de dívida ativa.
Vejamos:
Art. 202, CTN: O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I - o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros; II - a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos; III - a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado; IV - a data em que foi inscrita; V - sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito. Parágrafo único. A certidão conterá, além dos requisitos deste artigo, a indicação do livro e da folha da inscrição.
Art. 2º, § 5º da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal):
O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter: I - o nome do devedor, dos corresponsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros; II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato; III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida; IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo; V - a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.
Consoante entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, tais requisitos são essenciais e têm a finalidade de proporcionar o direito à ampla defesa do devedor, identificando, de forma acurada, o objeto da execução. Neste sentido, o seguinte julgado:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. REQUISITOS ESSENCIAIS. DESOBEDIÊNCIA AOS DITAMES DO ART. 2º, § 5º, DA LEI 6.830/80. PRECARIEDADE PATENTE. RESPEITO AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. NULIDADE DO TÍTULO. (...)
2. A CDA, enquanto título que instrumentaliza a execução fiscal, deve estar revestida de tamanha força executiva que legitime a afetação do patrimônio do devedor, mas à luz do Princípio do Devido Processo Legal, proporcionando o enaltecimento do exercício da ampla defesa quando apoiado na estrita legalidade.
3. Os requisitos legais para a validade da CDA não possuem cunho formal, mas essencial, visando permitir a correta identificação, por parte do devedor, do exato objeto da execução, com todas as suas partes constitutivas (principal e acessórias), com os respectivos fundamentos legais, de modo que possa garantir, amplamente, a via de defesa.
4. É inadmissível o excesso de tolerância por parte do juízo com relação à ilegalidade do título executivo, eis que o exeqüente já goza de tantos privilégios para a execução de seus créditos, que não pode descumprir os requisitos legais para a sua cobrança.
5. Recurso não-provido.
(REsp 807.030/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/02/2006, DJ 13/03/2006) destaquei
Na CDA há que constra o nome da parte devedora, a origem e a natureza do crédito tributário, a data de vencimento do tributo cobrado, os valores de multa, dos juros e da correção monetária incidentes, o número do processo administrativo, bem como o fundamento legal destas cobranças.
Ademais, há indicação da inscrição imobiliária do imóvel sobre o qual pende a dívida tributária, com o nome da rua, o número do logradouro e o número do CEP.
Por considerar que não teria havido a correta identificação do imóvel e sua localização, se a sentença declarou a nulidade da inscrição dos tributos em Dívida Ativa, vez que, no entender do juízo a quo, o crédito não foi adequadamente constituído, pois não se precisou a localização do contribuinte, presumindo-se que a constituição dos tributos pelo Município se deu à revelia do sujeito passivo.
A propósito, cumpre transcrever o excerto explicativa sentença que fundamenta a decisão de nulidade:
“No caso de dívida constituída sobre imóvel, não resta dúvida de que o seu endereço é o que o individualiza, permitindo ao contribuinte efetuar a sua defesa.
No caso dos autos, ao que se depreende das intercorrências processuais, o Município efetuou o lançamento do débito sem, sequer, possuir a correta localização do imóvel.
Não se olvida que o endereço do executado seja prescindível para a propositura da execução fiscal, haja vista que não consta como requisito da petição inicial (artigo 6° da Lei de Execução Fiscal) e pode ser declinado no decorrer da execução. Porém, antes disso, é necessário se constituir adequadamente o crédito tributário, que, em se tratando de IPTU, ISS, contribuições de melhoria e demais taxas municipais, não se vislumbra possa ser constituído sem que a Fazenda precise a concreta localização e individualização do imóvel.
No caso em mesa, entretanto, o que se evidencia é que o crédito não foi adequadamente constituído, pois não se precisa a localização do imóvel gerador do débito ou do contribuinte, presumindo-se que a sua constituição pelo Município ocorreu à revelia do sujeito passivo.
Ao não indicar o correto endereço do executado na Certidão de Dívida Ativa, na inicial da execução e não ter apresentado até o presente momento, indica o Município que sequer sabe onde está individualizado o imóvel gerador do tributo lançado ou onde encontrar o sujeito passivo, o que fulmina a constituição do crédito ora executado, diante da ausência da necessária notificação prévia do devedor para que possa impugnar o lançamento. Isso porque, não se pode presumir que o carnê para pagamento foi devidamente encaminhado ao contribuinte, haja vista que o Município não possui sequer o endereço correto do imóvel gerador do débito ou do contribuinte.
Outrossim, na esteira das disposições do artigo 202, I, do CTN e art. 2° da Lei de Execução Fiscal, o domicílio ou residência do executado é, sempre que for conhecido, requisito indispensável do Termo de Dívida Ativa e respectiva certidão. Ora, ao se tratar de tributo de natureza real, cujo fato gerador é relacionado à propriedade, à posse ou ao domínio útil de bem imóvel, não há se afastar a indicação do endereço. Afinal, é obrigação do Município individualizar adequadamente os imóveis geradores do IPTU, assim como da contribuição de melhoria, o que se faz com o seu correto endereço. Causa estranheza o lançamento do tributo sobre imóvel sem a sua localização precisa. E não se diga que a matrícula do imóvel ou o seu cadastro imobiliário supre tal exigência”.
Como disposto alhures, se consta na CDA, que lastreia a Execução Fiscal, expressa indicação da inscrição imobiliária e o nome da rua onde o imóvel está localizado e o número do logradouro, de modo que a Fazenda Pública atendeu ao propósito de identificação do fato gerador do débito.
Cumpre mencionar, ainda, que não há qualquer previsão legal que exija, para a validade da CDA, a indicação do integral endereço do contribuinte.
Anota-se, a expressa menção da inscrição fiscal, por ser única para cada imóvel, já é suficiente para atender ao disposto no art. 2º, § 5º, inciso III da Lei nº 6.830/1980.
Nesse sentido, já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:
TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL (IPTU). EMBARGOS À EXECUÇÃO JULGADOS IMPROCEDENTES. VALOR SUPERIOR A 50 ORTNs (ART. 34 DA LEF). RECURSO ADEQUADO. PRELIMINAR AFASTADA. PROVA DA NOTIFICAÇÃO DO LANÇAMENTO. ÔNUS DO CONTRIBUINTE. JUNTADA DE PROCEDIMENTO ADMINSTRATIVO. DESNECESSIDADE. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. "AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DA ORIGEM DO DÉBITO". REQUISITO FORMAL QUE SOMENTE GERA A NULIDADE DA CDA QUANDO IMPORTA EM CERCEAMENTO A DIREITO DE DEFESA. INDICAÇÃO DA "INSCRIÇÃO FISCAL" DO IMÓVEL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. (...) 4. "INEXISTÊNCIA DE INDICAÇÃO" DO IMÓVEL QUE DEU ORIGEM AO TRIBUTO: A ausência de requisito formal somente acarreta a nulidade da CDA quando importa em cerceamento ao direito de defesa do contribuinte. Isso, no caso, não ocorreu. Além disso, a CDA faz menção à "INSCRIÇÃO FISCAL" do imóvel, o que basta para identificá-lo. (...) RECURSO NÃO PROVIDO.
(TJPR - 2ª C.Cível - AC - 415552-0 - Paranaguá - Rel.: Valter Ressel - Unânime - J. 02.10.2007)
Por outro lado, mesmo que se adotasse entendimento diverso – no sentido de que a indicação do endereço do contribuinte é condição de validade da CDA – não se permitiria extinguir, de plano, a Execução Fiscal, pois a Fazenda Pública pode substituir a CDA lavrada com omissão de qualquer dos requisitos previstos no art. 202 do CTN, ou erro a eles relativo, até a prolação da sentença de embargos, afastando, dessa forma, o vício do título e, consequentemente, a nulidade da execução, conforme dispõe o art. 203 do CTN:
Art. 203, CTN: A omissão de quaisquer dos requisitos previstos no artigo anterior, ou o erro a eles relativo, são causas de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente, mas a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada.
Inclusive, a questão restou reduzida a verbete pelo Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 392, STJ: A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução.
No caso, se houve sentença em Embargos à Execução Fiscal, a Certidão de Dívida Ativa poderia ser substituída por outra que constasse o integral endereço do devedor, de modo a sanar a omissão e permitir o prosseguimento da demanda, com atos tendentes à satisfação do crédito tributário.
Ademais, não se pode falar na presunção de que a constituição do crédito tributário pelo Município ocorreu à revelia do sujeito passivo (não há como presumir que o contribuinte desconheça a obrigação anual de pagar o IPTU).Como bem apontou a eminente Des.ª Lidia Maejima em caso análogo: “considerando, ainda, que se trata de um imposto periódico e rotineiro, a remessa do carnê de pagamento ao endereço cadastrado junto à municipalidade é presumida, compelindo ao contribuinte a prova de que não recebeu o documento, para fins de questionamento da constituição definitiva”. (TJPR - 3ª C.Cível - 0016292-21.2015.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Desembargadora Lidia Maejima J. 10.03.2020).
No mesmo sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. SENTENÇA DE EXTINÇÃO POR AUSÊNCIA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E NULIDADE DA CDA. IRRESIGNAÇÃO DO MUNICÍPIO. VALIDADE DA CDA. CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE SE PRESUMIR A AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO/POSSUIDOR. INSUFICIÊNCIA DE ENDEREÇO QUE NÃO É CAUSA DE NULIDADE, PODENDO SER SANADA NO CURSO DO PROCESSO. COM TANTO MAIS RAZÃO, A EXECUTADA COMPARECEU AO CARTÓRIO PARA PAGAR AS CUSTAS, OCASIÃO EM QUE INFORMOU SEU NOVO ENDEREÇO. SENTENÇA CASSADA, COM RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJPR - 3ª C.Cível - 0013970-28.2015.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Juiz Osvaldo Nallim Duarte - J. 17.08.2020)
APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. SENTENÇA DE EXTINÇÃO POR AUSÊNCIA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E NULIDADE DA CDA. IRRESIGNAÇÃO DO MUNICÍPIO. VALIDADE DA CDA. CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE SE PRESUMIR A AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO/POSSUIDOR. INSUFICIÊNCIA DE ENDEREÇO QUE NÃO É CAUSA DE NULIDADE, PODENDO SER SANADA NO CURSO DO PROCESSO. COM TANTO MAIS RAZÃO, A EXECUTADA COMPARECEU AO CARTÓRIO PARA PAGAR AS CUSTAS, OCASIÃO EM QUE INFORMOU SEU NOVO ENDEREÇO. SENTENÇA CASSADA, COM RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJPR - 3ª C.Cível - 0013970-28.2015.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Juiz Osvaldo Nallim Duarte - J. 17.08.2020)
APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. SENTENÇA DE EXTINÇÃO POR AUSÊNCIA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E NULIDADE DA CDA. IRRESIGNAÇÃO DO MUNICÍPIO. VALIDADE DA CDA. CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE SE PRESUMIR A AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO/POSSUIDOR. INSUFICIÊNCIA DE ENDEREÇO QUE NÃO É CAUSA DE NULIDADE, PODENDO SER SANADA NO CURSO DO PROCESSO. COM TANTO MAIS RAZÃO, A EXECUTADA COMPARECEU AO CARTÓRIO PARA PAGAR AS CUSTAS, OCASIÃO EM QUE INFORMOU SEU NOVO ENDEREÇO. SENTENÇA CASSADA, COM RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJPR - 3ª C.Cível - 0013970-28.2015.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Juiz Osvaldo Nallim Duarte - J. 17.08.2020)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. SENTENÇA QUE DECLAROU EXTINTA A EXECUÇÃO FISCAL, EM FACE DA NULIDADE DA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. INSURGÊNCIA RECURSAL DA MUNICIPALIDADE. 1. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE NOS TÓPICOS “ATUALIZAÇÃO CADASTRAL DO CONTRIBUINTE” E “SUCESSÃO TRIBUTÁRIA”. PLEITOS NÃO CONHECIDOS. 2. ALEGADA VALIDADE DA CDA. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE ENDEREÇO DO EXECUTADO. IMÓVEL GERADOR DO TRIBUTO QUE NÃO FOI DEVIDAMENTE INDIVIDUALIZADO. SENTENÇA QUE DECLAROU A NULIDADE DA CDA MANTIDA. 3. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. INAPLICABILIDADE DO ART. 26 E 39 DA LEF. VEDAÇÃO À ISENÇÃO HETERÔNOMA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 151, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSIÇÃO AO PAGAMENTO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS MANTIDA. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
(TJPR - 3ª C.Cível - 0011436-14.2015.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: Desembargadora Lidia Maejima - J. 04.08.2020)
CONCLUSÃO
À vista de tais fundamentos, o entendimento sedimentado na Colenda 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, bem como da necessidade de se dar efetividade à execução fiscal para promoção da equidade social, se decidido de tal sorte em primeira instância, a sentença deve ser reformada para afastar a declaração de nulidade de Certidão da Dívida Ativa com a determinação de prosseguimento do feito.
[1] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos. 5ª Ed., São Paulo: RT, 2000, p. 149.
[2] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[3] SANTIN, Valter Foleto; BORCHAT, Carolina Bombonatto. Dignidade da pessoa humana no contexto urbano: o direito a cidade. Revista de Direito e Sustentabilidade, Salvador, v. 4, n. 1, 2018.
[4] GIACÓIA, Gilberto. Justiça e Dignidade. Revista Em Tempo, Marilia, v. 6, n. 1, 2004.
[5] CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal da Bahia: Homenagem ao Professor Luiz de Pinho Pedreira, Salvador, n. 17, ano 2008.2.
[6] FRANCO, Marcelo Veiga. A cobrança extrajudicial de dívida ativa como meio de enfrentamento do “gargalo” das execuções fiscais. Revista CNJ. Brasília, v. 3, n. 1, 2019.
[7] ENCHER LINGUIÇA CITANDO PROFESSORES DO MESTRADO E DO DOUTORADO