Responsabilidade Civil do Construtor

09/09/2020 às 19:36
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Aspectos gerais sobre a Responsabilidade Civil do Construtor

 

RESUMO:

Este artigo tem como objetivo, diante dos avanços do segmento da construção civil, o qual muito tem contribuído para o desenvolvimento social e econômico do nosso país, abordar, a responsabilidade do construtor, do ponto de vista jurídico, que, neste contexto, se apresenta como um dos responsáveis pela dinâmica desse importante setor da nossa economia.

Palavras-chave: Responsabilidade, Construtor, Consumidor e Imóvel.

INTRODUÇÃO

A responsabilização do construtor, pelos danos causados ao contratante ou a terceiros, em virtude da sua atuação no mercado imobiliário, é de fundamental importância no contexto da construção e venda de imóveis no Brasil.Não temos a pretensão de esgotar o assunto, porém, apresentar alguns aspectos jurídicos fundamentais, em virtude do incremento das ações judiciais que responsabilizam o construtor, pelo inadimplemento das obrigações contratuais por ele assumidas, notadamente, no que diz respeito à perfeição, solidez e segurança da obra.

 

1. OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil, no ordenamento jurídico brasileiro, impõe àquele que causou um dano a outrem, o dever de repará-lo, segundo aduz o Art. 927 do Código Civil, in verbis:

“Aquele que, por ato ilícito (artes. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. 

O ato ilícito cometido é definido pelo Art.186, como: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Portanto, a responsabilidade civil exsurge do cometimento de um ato ilícito, trazendo dano a alguém, e isto, gera a obrigação de que o direito violado seja reparado.

Para Maria Helena Diniz, a responsabilidade civil é “a  aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.[1] 

Nesse mesmo sentido, o professor Carlos Roberto Gonçalves, ensina que:

“Quem pratica um ato, ou incorre numa omissão de que resulte dano, deve suportar as consequências do seu procedimento”. Trata-se de uma regra elementar de equilíbrio social, na qual se resume, em verdade, o problema da responsabilidade. Vê-se, portanto, que a responsabilidade é um fenômeno social. [2] 

Sendo um fenômeno social, caracterizado pela obrigação de uma pessoa reparar um dano  cometido na esfera moral ou patrimonial de outrem, para o direito brasileiro, a  responsabilidade civil se dá tanto de  forma subjetiva, como de forma objetiva.

Haverá a responsabilidade subjetiva, quando, a pessoa causadora do dano agir com  culpa, no  seu sentido amplo.

De acordo com a professora Maria Helena Diniz:

A culpa em sentido amplo, como violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever. [3] 

 Ao tratar do mesmo tema, assim aduz o professor Carlos Roberto Gonçalves:

Diz-se, pois, ser “subjetiva a responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa”. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro desta concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa. [2]

 

Portanto, uma vez provada à culpa do agente causador do dano, nasce, de imediato, a obrigação de repará-lo; é assim que se configura a responsabilidade subjetiva, em regra, no nosso ordenamento jurídico.

Já a responsabilidade objetiva, não depende da comprovação da culpa do causador do dano, conforme preceitua  o Art. 927 do Código Civil, em seu parágrafo único, in verbis:

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

 Como vemos, a obrigação de indenizar é imposta desde que o fato danoso esteja tipificado na lei, ou, a atividade desenvolvida pelo causador do dano ocasionar  riscos para terceiros. .

 

2. DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONSTRUTOR

A atividade da construção civil tem sido pujante em nosso país. Este segmento é, sem dúvida, um dos segmentos basilares da nossa economia, servindo, até mesmo, como um dos termômetros do desenvolvimento econômico e social da nação.

Um dos atores de significativa importância no cenário da construção civil é, inequivocamente o construtor. É ele que, pelo seu trabalho, executa os projetos de construção, dos quais resultam as mais diferentes edificações.

Tal atividade é regulada pelo ordenamento jurídico pátrio, o qual prevê responsabilidade civil ao construtor, por danos produzidos contra outrem, no exercício das relações contratuais por ele estabelecidas com os clientes.

Esse tipo de reponsabilidade a que a legislação submete o construtor é a responsabilidade objetiva, à qual, obriga ao causador do dano a repará-lo, independentemente da demonstração da culpa, conforme dito, bastando para isso, que o fato esteja caracterizado na lei, ou que exista  nexo de causalidade, entre o fato e o evento danoso.

Eis o que diz o Código Civil, no Art. 931, como fundamento da responsabilidade objetiva dos construtores.

Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação. 

Nesse mesmo sentido, também aduz o Art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Como vemos, tanto o Código Civil, como a legislação consumerista, são unânimes em afirmar, que a responsabilidade  do construtor é objetiva, pois,  responde ele, independentemente de culpa, pelos danos causados  á terceiros consumidores.

 

2.1 DA RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

Até aqui, ficou demonstrado, que, aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo, ou seja, uma vez efetivado o dano, surge para o agente, a responsabilidade civil  pela reparação do referido dano. Tal responsabilidade, no entanto, é imposta pela lei, ou pelo contrato. Quando proveniente da lei, ela  é dita extracontratual ou aquiliana, ao ser oriunda do contrato ela é dita contratual

Ao tratar da responsabilidade contratual, assim aduz a professora Maria Helena Diniz:

 Resulta, portanto, de ilícito contratual, ou seja, de falta de adimplemento ou da mora no cumprimento de qualquer obrigação. É uma infração a um dever especial estabelecido pela vontade dos contraentes, por isso decorre de relação obrigacional preexistente e pressupõe capacidade para contratar. [3] 

Portanto, para o construtor, a responsabilidade contratual se impõe, ou pelo inadimplemento, ou pela mora de qualquer obrigação estabelecida no contrato, pois, trata-se de uma violação ao que ficou estabelecido pelas partes contratualmente. Por exemplo: quando o construtor deixa de executar a obra, ou ao executá-la, a executa com algum tipo de defeito, isso configura inadimplemento contratual e, consequentemente, o responsabilizará civilmente.

No que diz respeito à responsabilidade extracontratual ou aquiliana, que é de ordem pública, esta se verifica, quando de uma ilicitude cometida extracontratualmente, ou seja, o agente deixa de cumprir um dever imposto pela lei, especialmente no que tange à perfeição da obra, à solidez e segurança da mesma, ou  por danos cometidos contra  terceiros.

Ao tratar do tema,  o professor Carlos Roberto Gonçalves, assim se expressa:

Quando a responsabilidade não deriva do contrato, diz-se que ela é extracontratual. Neste caso, aplica-se o disposto no art.186 do Código Civil. Todo aquele que causa dano a outrem, por culpa em sentido estrito ou dolo, fica obrigado a repará-lo. É a responsabilidade derivada de ilícito extracontratual, também chamada de aquiliana.

Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. [2]

Pelo exposto, concluímos que, a responsabilidade extracontratual surge, quando uma obrigação legal é descumprida, enquanto, a contratual surge da violação daquilo que é avençado contratualmente pelas partes. Como responsabilidades extracontratuais, poderíamos citar: a responsabilidade pela perfeição,  a responsabilidade pela  solidez e pela  segurança  da obra.

 

3. DA RESPONSABILIDADE PELA PERFEIÇÃO DA OBRA

Ao contratar a construção de uma obra, o que o contratante deseja, é que a obra atenda às suas exigências de qualidade e perfeição. Cabe ao construtor, portanto, atender a tais exigências, empregando materiais de qualidade e boas técnicas de construção, além de fiscalizar a execução da obra, no sentido de evitar eventuais erros cometidos ao longo do processo de construção, uma vez que, trata-se de uma obrigação de resultado, que além de garantir que a obra seja entregue da forma como foi contratada, também ofereça a segurança que dela se espera.

Eis o que nos ensina, ao tratar desse tema, o professor Carlos Roberto Gonçalves:

 

A responsabilidade pela perfeição da obra, embora não consignada no contrato, é de presumir-se em todo ajuste de construção como encargo ético-profissional do construtor. Isto porque a construção civil é, modernamente, mais do que um empreendimento leigo, um processo técnico-artístico de composição e coordenação de materiais e de ordenação de espaços para atender às múltiplas necessidades do homem. [2]

Portanto, o compromisso com a perfeição da obra, mesmo que não ajustado contratualmente, é algo que se presume na prestação de serviço do construtor, em virtude da boa fé, que deve prevalecer na efetivação de todo negócio jurídico, devendo ele ser responsabilizado civilmente, pela quebra desse compromisso.

 

4. DA RESPONSABILIDADE PELA SOLIDEZ E SEGURANÇA DA OBRA

Ao concluir a obra, o construtor responde objetivamente, pela solidez e segurança da construção, por um prazo de cinco anos, de acordo com o que estabelece o Art. 618 do Código Civil, in verbis:

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“ Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser  a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias  seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.”

Vemos, pelo dispositivo acima, que o prazo de garantia é de cinco anos, enquanto o prazo decadencial é de cento e oitenta dias, ou seja, o proprietário tem um prazo de até 180 dias a partir da constatação do vício ou defeito, além do qual, ele perde o direito de ajuizar uma ação contra o construtor.

Ao tratar do tema, assim se expressa Hely Lopes Meirelles:

Recebida a obra, “permanece ela como que em observação por cinco anos, sem admitir interrupção ou suspensão desse prazo, visto que não se trata de lapso prescricional, como já advertimos de início. Trata-se de prazo extintivo da garantia. Se durante esse tempo a construção não apresentar vício ou defeito que afete a sua estabilidade ou comprometa a sua estrutura, ficará o construtor exonerado de responsabilidade perante o proprietário e seus sucessores” (apud GONÇALVES, 2016, p.398) [2].

Importante ressaltar que, se, ao longo de cinco anos, a estrutura ou estabilidade da obra não for comprometida por nenhum vício ou defeito, o construtor fica livre de qualquer responsabilidade, perante o adquirente do imóvel e seus sucessores, conforme nos ensina o eminente doutrinador.

Nesse mesmo sentido, o entendimento jurisprudencial:

APELAÇÃO PRINCIPAL E ADESIVA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR. SEGURANÇA E PERFEIÇÃO DA OBRA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA MANTIDA. 1. O art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, ao definir a figura jurídica do fornecedor de produtos e serviços, contemplou expressamente a atividade de construção, também contemplada no regime da responsabilização pelo fato do serviço (art. 12 e seguintes, do CDC). O referido art. 12, como se sabe, estabelece a responsabilização objetiva do fornecedor dos serviços, definida, no caso do construtor, como obrigação de resultado, que se materializa pela entrega da obra na forma contratada e com a segurança que se deve esperar. 2. A responsabilização do construtor pela perfeição da obra, além das disposições do Código de Defesa do Consumidor, observa também as disposições gerais do Código Civil (art. 618 do CC/2002), em verdadeiro diálogo das fontes. Assim, poderá o contratante rejeitar a obra imperfeita ou defeituosa (art. 615 do CC/2002), ou, se lhe convier, recebê-la com abatimento do preço (art. 616 do CC/2002). 3. Verificada a imperfeição da obra, ocasionando risco estrutural, configura-se a responsabilidade do construtor. 4. A indenização deve ser fixada com observância da natureza e intensidade do dano, da repercussão no meio social, da conduta do ofensor, bem como da capacidade econômica das partes envolvidas, evitando-se enriquecimento sem causa da parte autora.

(TJ-MG - AC: 10145084367682001 MG, Relator: José Marcos Vieira Data de Julgamento: 09/10/2013, Câmaras Cíveis / 16ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/10/2013).

Vemos que, o compromisso do construtor com a perfeição da obra, é de singular relevância, pois, riscos estruturais provenientes da imperfeição da obra, podem responsabilizá-lo proporcionalmente ao dano e a sua repercussão social.

 

5. DOS VÍCIOS REDIBITÓRIOS

Ocorre o vício redibitório, quando o vício ou defeito, não poder ser constatado no momento da compra ou venda de um objeto ou coisa, pois, se os defeitos forem de fácil constatação, e o adquirente não identifica-los, não há que se falar em vicio redibitório, havendo a presunção de que foram aceitos pelo adquirente, não dando a ele o direito de devolver a coisa, e nem de receber a quantia paga.

De acordo com o Código Civil.

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas. 

Como vemos, o artigo é taxativo quanto a autorizar que a coisa seja enjeitada pelo adquirente, quando vícios ou defeitos ocultos forem constatados no momento da contratação. Cabe, portanto, ao construtor, devolver a quantia paga, além da condenação em perdas e danos, caso ocorram.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 A solidez, a segurança, e a perfeição de uma obra, são exigências dos cidadãos  quando planejam a compra ou a construção de um imóvel. O não atendimento a essas  demandas, que venham ocasionar  danos ao consumidor, responsabilizam  o construtor  civil e/ou  criminalmente.

È mister, portanto, que a boa técnica de construção,  aliada   aos princípios éticos e da boa-fé, os quais devem reger os negócios jurídicos, sejam observados, a fim de que, os interesses  e o direito das  partes envolvidas sejam respeitados, afastando-se assim, a  possibilidade de responsabilização do construtor.

 

REFERÊNCIAS

 

[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2009. V.3

 

[2] GONÇALVES, Carlos Responsabilidade Civil/Carlos Roberto Gonçalves- 17. ed. São Paulo:Saraiva,2016

 

[3] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 19.ed.-São Paulo: Saraiva, 2005. V. 5

 

 

 

Sobre o autor
Eudes Pontes da Silva

Advogado com vasta atuação nas áreas cível e trabalhista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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