A PROVA TRASLADA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO: DA PROVA EMPRESTADA ENTRE AS MESMAS PARTES: DO JUÍZO CRIMINAL PARA O PROCESSO CIVIL

14/09/2020 às 22:48
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O presente estudo objetiva analisar a eficácia justamente da prova emprestada produzida entre as mesmas partes litigantes em um juízo criminal para o processo civil de modo a cooperar com o processo para o qual fora trasladada.

1DEFINIÇÃO DE PROVA

 

Segundo o grande dicionário unificado da língua portuguesa, “prova” significa aquilo que mostra a veracidade ou a realidade, testemunho, sinal, indício, um documento justificativo. [1]

 

A palavra prova vem do latim probatio, oriunda do verbo probare, cujo sentido está relacionado com examinar, persuadir, demonstrar.[2]

 

Considerando o conceito de prova no ambiente jurídico, observa-se que a análise de tal instituto paira sobre o seu aspecto objetivo.

 

Costuma-se, assim, conceituar prova, no sentido objetivo, como os meios destinados a fornecer ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos deduzidos em juízo.

 

Mas é importante destacar que prova, no sentido subjetivo, é aquela que se forma no espírito do juiz, seu principal destinatário, quanto à verdade desses fatos. A prova então, consiste na convicção que estas, as provas, produzidas no processo geram no espírito do juiz quanto à existência ou inexistência dos fatos.

 

Assim a prova no sentido subjetivo, se forma do conhecimento e ponderação das provas no sentido objetivo, que transplantam os fatos para o processo, de modo que defini-seesta como a soma dos fatos produtores da convicção, apurados no processo[3].

 

2 OBJETO DE PROVA

 

A prova tem por fim último convencer o juiz no que diz respeito à existência ou inexistência dos fatos sobre o qual versa a lide, constituindo-se assim, o seu objeto. [4]

 

Qualquer fato ou circunstancia, onde a demonstração evidencia-se relevante para o convencimento do magistrado sobre a veracidade das argumentações das partes, constituí objeto de prova. [5]

 

Desse modo, conforme expõe o Código de Processo Civil, art. 337, como regra provam-se os fatos, por exceção prova-se o direito, quando estadual, municipal, costumeiro, singular ou estrangeiro.

 

O artigo 334 do CPC é taxativo ao enunciar que não dependem de prova os fatos: I- notórios; II – afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária; III – admitidos, no processo, como incontroversos; IV – em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.

 

Dessa forma, é possível apreender que dependem de prova os fatos controvertidos e relevantes,de forma que para serem suscetíveis de prova, os fatos devem ser determinados, ou seja, apresentados com características suficientes para se distinguirem de quaisquer outros. São, pois, objeto de prova os fatos controvertidos, relevantes e determinados, isto é, os fatos que embasam as pretensões.

 

3 NATUREZA JURÍDICA DA PROVA

 

É importante destacar que a prova se reveste de caráter de utilidade social que produz efeitos além do sistema processual.

 

Isto porque esta natureza da prova, uma vez projetada fora do campo processual, pode por si só evitar litígios, na medida em que, por exemplo, por meio de verificação da existência de um ato jurídico no liminar da vida social, cesse a necessidade de acionar-se o sistema jurisdicional.

 

Com base nessas premissas, embora parte da doutrina aponte como sendo essa natureza somente processual, não se pode olvidar que há outra corrente doutrinária que entenda estar essa natureza processual da prova contida na ampla natureza deste instituto.

 

Entre esta balizada doutrina estáCarnelutti, que entende ser a natureza da prova pertencente a uma realidade mais ampla, na medida em que possui pertinência para além do âmbito processual, sendo que neste adquiriu apenas mais visibilidade.[6]

 

Nesse contexto, não há dúvidas de que a prova é instituto aplicável além dos parâmetros do campo jurisdicional, muito embora seja na seara processual que obteve mais visibilidade.

 

4 A PROVA EMPRESTADA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO: DA PROVA TRASLADA ENTRE AS MESMAS PARTES: DO JUÍZO CRIMINAL PARA O PROCESSO CIVIL

 

Primeiramente, acerca do questionamento se a prova produzida no juízo criminal pode ser trasladada para o processo civil, a resposta é afirmativa, eis que é indiferente a natureza do juízo onde a prova foi colhida e para onde vai transportar-se, até porque, num ou noutro, busca-se a verdade que é a mesma tanto no civil quanto no penal. [7]

 

A prova de um fato, produzida em determinado processo, seja por documentos, testemunhas, confissão, depoimento ou exame pericial, pode ser trasladada para outro, por meio de certidão extraída daquele. A esse procedimento de transferência de um processo para outro dá-se o nome de prova emprestada. [8]

 

Nesse passo, a prova emprestada ingressa no outro processo sob a forma documental. A prova emprestada consiste no transporte de produção probatória de um processo para outro processo, sendo o aproveitamento da atividade probatória anteriormente desenvolvida, através do traslado dos elementos que a documentam.[9]

 

E ainda, denomina-se prova emprestada aquela que foi colhida em determinado processo anteriormente, sendo apresentada em outro, subsequente, sendo que a produção deve ter acontecido, impreterivelmente, em processo envolvendo as mesmas partes.[10]

 

Em que pese, se admita por parte da doutrina, a utilização num processo, prova emprestada de outro, em que foi produzida, necessário se faz tecer algumas considerações e seguir alguns parâmetros.

 

Nesse diapasão, as regras referentes a eficácia da prova emprestada devem observar as situações em que se encontrarem as partes envolvidas, isto é, os entes litigantes para o qual é transportada, destacando se a prova emprestada foi produzida: i) entre as mesmas partes; ii) entre uma das partes daquele e terceiro e iii) entre terceiros.

 

Dentre as diversas incursões que podem ser suscitadas nesta seara, tratando-se de prova emprestada é necessário considerar esta: i) quando produzida em juízo incompetente; ii) quando produzida em processo anulado e iii) quando produzida em juízo criminal.

 

O presente estudo objetiva analisar a eficácia justamente da prova produzida entre as mesmas partes litigantes em um juízo criminal para o processo civil de modo a cooperar com o processo para o qual fora trasladada a referida prova, considerada a partir de então prova emprestada, propiciando maior celeridade e eficiência aquela nova lide, o que consequentemente corroboraria com o conceito de justiça.

 

A título exemplificativo é possível destacar um acidente de transito ocorrido entre “A” e “B”. Assim, uma vez lavrado o boletim de ocorrência pela autoridade policial competente, os entes envolvidos prestam os esclarecimentos iniciais as referidas autoridades, cientificados de que seriam convocados para audiência em determinado juízo criminal para a apuração do referido crime de transito. Comparecem em dia e hora determinados para a audiência. Nesta audiência, em depoimento, “A” confessa que foi o causador do crime de transito, portanto, constata-se que “A” foi quemcausou o acidente de transito e “B” a vítima do evento danoso.

 

Alegando que uma vez resolvida a questão do crime de transito na esfera criminal , “B” ao questionar que o acidente de transito lhe causara danos morais e patrimoniais, foi informado que deveria pleitear essas questões na seara civil.

Ao ingressar com processo na esfera civil, depara-se com o fato de que o causador dodano no juízo criminal, “A”, não admitiu que foi o autor do crime de transito que ensejou a propositura da demanda na seara civil por “B”, a vítima.

 

Assim, “B” acreditando na possibilidade de trasladar aquela prova produzida por “A” para o processo civil em que pleiteia reparação pelos danos citados, confeccionou a prova emprestada, que continha a confissão do crime praticado por “A”, com vistas a proporcionar ao magistrado ampla visão dos fatos, cooperando com o processo no sentido de incutir maior celeridade, efetividade e consequentemente o deferimento de seu pedido.

 

Acerca do Instituto da Prova Emprestada, faz-se mister discorrer sobre o art. 332 bem como do art. 339 ambos do Código De Processo Civil desta honrada Pátria:

 

“Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa”.

“Art. 339. Ninguém se exime do dever de colaborar como o poder judiciário para o descobrimento da verdade”.

 

Então, meio de prova é o instrumento pessoal ou material que é trazido para o processo com o intuito de revelar ao juiz a veracidade de um fato, visto que por meios legais entende-se os disciplinados especificamente pelo CPC (depoimento pessoal, prova documental, testemunhal, pericial, etc.). moralmente legítimos são a prova emprestada, pericial, etc.[11]

 

É de suma importância o presente instrumento probatório, pois assim é possível chegar a verdade dos fatos e a justiça.

 

Contudo, como se não bastasse, o presente instituto da Prova Emprestada foi abordado com maestria pela Doutrina Pátria:

 

“Terá a potencialidade de assumir exatamente a eficácia probatória que obteria no processo em que foi originariamente produzida. Ficou superada a concepção de que a prova emprestada receberia quando muito valor de documento, “prova inferior” ou “ato extrajudicial”. O juiz ao apreciar as provas, poderá conferir à prova emprestada precisamente o mesmo peso que esta teria se houvesse sido originariamente produzida no segundo processo. Eis o aspecto essencial da prova traslada: apresentar-se sob a forma documental, mas poder manter seu valor originário. É tal diversidade que confere à prova emprestada regime jurídico específico - o qual não se identifica com o da prova documental nem com o da prova que se emprestou, em sua essência de origem”.[12]

 

De forma complementar, em sua estrutura e na sua função, a prova criminal é idêntica à do processo civil. A verdade que ali a prova produz, relativamente a um fato, é a mesma que produziria no processo civil. Rege-se, então, a produção da prova pelos mesmos princípios, de tal modo que, tudo que se disse quanto à eficácia da prova emprestada de um processo criminal tem inteira aplicação à emprestada de um processo civil. [13]

 

De fato, a prova emprestada é aquela que, embora produzida em outro processo, se pretende que produza os efeitos necessários no processo em questão. [14]

 

5 CONCLUSÃO

 

A prova é o instrumento que proporciona aferir a verdade no campo processual, e consequentemente evidencia-se a aproximação ao conceito de justiça.

 

Logo, a prova é um dos elementos mais importantes do processo em geral e portanto do processo civil.

 

Em se tratando da prova traslada ou emprestada, não há dúvidas de sua importância e eficácia para o processo no sentido de cooperação, celeridade e efetividade das decisões judiciais, objetivando-se a promoção da justiça.

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Nesse prisma, o juiz capacitado pela visão holística proporcionada pela prova emprestada, com ampla visão dos fatos que suplantam as searas individuais dos processos, não poderá deixar de considerar a potencialidade desta prova – Emprestada - ainda mais se for entre os mesmos entes processuais, preservado o contraditório.

 

Por derradeiro, a luz de alguns princípios processuais, como os da imediatidade, oralidade e livre convencimento do juiz, não deve haver óbice à realização/produção da prova traslada, observando-se, também, as formalizadas preconizadas pela doutrina e jurisprudência quanto a sua admissão e produção, reiterando que a prova se reveste de caráter de utilidade social, com total eficácia probatória no processo civil.

 

 

6 REFERENCIAS

 

CARNELUTTI, Francesco. La prueba civil. Buenos Aires: DePalma, 1984.

 

DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva. 2006.

 

DIDIER JR. Fredie. Curso de direito processual civil. Bahia: Juspodivm, 2007.

 

RIOS. Dermival Ribeiro.Grande dicionário unificado da língua portuguesa.São Paulo: DCL, 2010.

 

MACHADO.Antonio Claudio da Costa. Codigo de processo civil interpretado. São Paulo: Monole, 2010.

 

NERY JR. Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 1999.

 

RODRIGUES. Marcelo Abelha. Manual de direito processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

 

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, 1977.

 

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, vol. 2, 2008.

 

TALAMINI, Eduardo. Prova emprestada no processo civil e penal, Revista deInformação Legislativa: Brasília, nº 140.

 


[1]RIOS.Dermival Ribeiro. Grande dicionário unificado da língua portuguesa. São Paulo: DCL, 2010, p. 557.

[2]RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de direito processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 223.

[3]SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, 1977, p. 288.

[4]SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, 1977, p. 293

[5]DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 4.

[6]CARNELUTTI, Francesco. La prueba civil. Buenos Aires: DePalma, 1984, p. 213.

[7]DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva. 2006, 119.

[8]SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, vol. 2, 2008, p. 377-380.

[9]DIDIER JR. Fredie. Curso de direito processual civil. Bahia: Juspodivm, 2007, p. 65.

[10]DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 116.

[11]MACHADO, Antonio Claudio da Costa. Codigo de processo civil interpretado. São Paulo: Monole, 2010, p. 382-383.

[12]TALAMINI, Eduardo. Prova emprestada no processo civil e penal, Revista deInformação Legislativa, Brasília, nº 140, páginas 145-162.

[13]SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, vol. 2, 2008, p. 381.

[14]NERY JR. Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 1999, p. 146.

Sobre o autor
Raphael José Gireli Peres

Advogado Militante. Inscrito na Ordem dos Advogados do Espirito Santo, Subsecretário de Controle Interno e Auditoria - Prefeitura Municipal de Vitória/ES, Diretor Jurídico do Conselho Popular de Vitoria/ES, Graduado em DIREITO - FAESA (2008). Pós Graduado em Direito Processual Civil - UFES (2010), Pós Graduando em Direito Público, Pós Graduando em Direito Eleitoral, Pós Graduando em Direito Penal e Processual Penal, Escritor e Parecerista, Conhecimento Suplementar em Filosofia - COF: Curso Online de Filosofia

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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