O Direito à prova e a participação ativa da defesa.

20/09/2020 às 14:23
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O direito à prova abrange a participação ativa da defesa, para que empregue os meios adequados à demonstração dos fatos que sejam pertinentes à comprovação de sua tese.

As provas, nas palavras de Francesco CARNELUTTI (1995, p. 43-44), servem para reconstruir uma história, para voltar ao tempo dos fatos. Fato, dessa forma, é um pedaço de história, sendo assim, no processo penal se faz uma história.  

O conceito de prova, conforme Franklyn Roger Alves SILVA (2019, p. 55): “provas correspondem ao conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz e por terceiros, visando a instrução do processo com os elementos necessários à apuração do fato, capazes de permitir ao julgador formar seu livre convencimento motivado na solução do conflito jurídico”. 

Antonio Scarance FERNANDES (2005 p. 77-80) elenca três requisitos fundamentais do direito à prova, correlacionadas ao contraditório, quais são: necessidade de conceder iguais oportunidades de pleitear a produção de provas; inexistência de disparidade de critérios no deferimento ou indeferimento das provas pelo órgão judicial; e igualdade entre as partes, de possibilidades de participar dos atos probatórios e de pronunciar-se sobre os resultados. 

Além disso, FERNANDES elenca direitos da parte sobre as provas no processo: direito de requerer produção de provas; direito a que o juiz decida sobre o pedido de produção de prova; direito a que, esta seja realizada, tomando-se todas as providências necessárias para sua produção; direito a participar da produção da prova; direito da prova em contraditório; direito da produção da prova com a participação do juiz; direito de se manifestar sobre as provas; e direito que a prova seja objeto de avaliação do julgador. 

Destarte, o juiz não é o único destinatário da prova no processo, mas também as próprias partes. A defesa e acusação podem buscar elementos de convicção, pois ambos possuem interesse na prova produzida. A busca pela prova não pode ser encarada pelo monopólio da jurisdição, visto que a essa possui fator determinante no aspecto persuasivo. Logo, a defesa possui interesse na produção da prova em duas funções distintas, uma endoprocessual (dar suporte à decisão) e exoprocessual (concordância da decisão). No caso da defesa, a investigação criminal defensiva se torna relevante na produção da prova e de sua apreciação (SILVA, 2019, p. 60-61). 

Relacionado ao direito à prova, estão os meios de prova, que nas palavras de Paulo RANGEL (2017, p. 465): “Meios de prova são todos aqueles que o juiz, direta ou indiretamente, utiliza para conhecer da verdade dos fatos, estejam eles previstos em Lei ou não. Em outras palavras, é o caminho utilizado pelo magistrado para formar sua convicção acerca dos fatos ou coisas que as partes alegam”. Exemplo de meio de prova é a confissão, o depoimento do ofendido e a perícia no local. 

A atividade do juiz em relação às provas é sempre recognitiva, afinal, o processo é uma máquina retrospectiva, com o escopo de estabelecer um fato e quem o realizou. Dessa forma, a prova está vinculada a atividade encaminhada a conseguir o convencimento psicológico do juiz, que selecionará e elegerá as hipóteses históricas a partir das provas colhidas (LOPES JR., 2018, p. 342-344). 

A atividade probatória se vincula também à paridade de armas. Para alcançar o convencimento jurisdicional, a efetiva produção probatória deve passar pelo crivo do contraditório, bem como ao da isonomia, a partir de um modelo participativo, garantindo às partes o desempenho de seus papéis de forma equilibrada. 

A participação da defesa na produção probatória garante o devido processo legal. Assim, o acusado deve ter acesso a todos os meios de provas em igualdade de condições com a acusação. O acesso adequado aos meios de prova pela defesa depende da possibilidade de o acusado ter condições de propor a produção de quaisquer meios relevantes e admitidos no ordenamento jurídico.  

A participação da defesa na atividade probatória é um direito, então sua participação não deve ser um mero convite ao processo, mas sim de empregar meios adequados à demonstração dos fatos que sejam pertinentes à comprovação de sua tese. Dessa forma, a investigação criminal defensiva é uma forma de exercer o confronto às teses acusatórias, contra suas provas e declarações. O direito de confrontar, estendidos aos meios de provas, é a arma a ser empregada na investigação defensiva (SILVA, 2019, 79-80). 

A relação da prova e do sistema acusatório se dá pelo livre desenvolvimento do conflito entre as duas partes do processo. Nesse conflito a acusação possui o primeiro movimento, afinal é dela o ônus acusatório da prova. Com a rígida separação dos atores do processo, que é característica do sistema acusatório, o ônus de provar o crime não poderá ser transferido aos outros sujeitos processuais. No mesmo sentido, é vedado que o acusador e juiz possuam funções conflitantes (FERRAJOLI, 2002, p.488). 

A variação do sistema legal de provas possui relação a um sistema acusatório e um inquisitório, visto que o elemento fundante que determinará o sistema é a gestão da prova, que se na mão das partes teremos um sistema acusatório, se na mão do juiz teremos um sistema inquisitório. A figura do juiz-ator, com poderes investigatórios ou instrutórios do sistema inquisitório gera a relativização de garantias, enquanto no modelo acusatório preza-se pelo formalismo protetor. Essa é a grande vantagem do sistema acusatório, seu estrito respeito às regras do jogo (LOPES JR., 2018, p. 351). 

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Diante da limitação da participação do imputado na investigação estatal, que ocorre geralmente pelo inquérito policial, que possui somente a possibilidade do artigo 14 do Código de Processo Penal, que permite requisitar diligências à Autoridade Policial, a investigação criminal defensiva é uma possibilidade de o imputado propor ativamente sua própria investigação (MACHADO, 2009, p. 91-93). 

Dessa forma, a investigação criminal defensiva é um meio de prova dirigido pelo defensor, que define sua linha investigatória, buscando garantir a paridade de armas entre acusação e defesa, com o objetivo de reunir elementos probatórios, de forma lícita, favoráveis à defesa e capazes de influenciar o convencimento do julgador. 

Portanto, o direito à prova abrange a participação ativa da defesa, para que empregue os meios adequados à demonstração dos fatos que sejam pertinentes à comprovação de sua tese. Com isso, a utilização da investigação criminal defensiva como mais um meio de defesa é uma forma de admitir que sua participação seja efetiva, buscando paridade de armas em relação à acusação, que possui todo o aparato estatal à sua disposição. Logo, a investigação defensiva dá maior força ao confronto, com a participação determinante da defesa, de forma ativa e garantindo melhores resultados à sua atuação. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 

 

CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. Campinas: Conan, 1995. 

 

FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 4ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 

 

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2002. 

 

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. 

 

MACHADO, André Augusto Mendes. A investigação criminal defensiva. São Paulo, 2009. 207 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 

 

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 25ª ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017. 

 

SILVA, Franklyn Roger Alves. Investigação criminal direta pela defesa. Salvador: JusPodivm, 2019. 

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