A labelling approach ou teoria do entiquetamento é uma teoria que surgiu nos Estados Unidos na década de 60 e correlaciona a conduta criminosa como atrelada a realidade social do agente.
Segundo Osera é a partir do labelling approach que a pergunta dos criminólogos muda, isto é, não mais se questiona o porquê do criminoso cometer os crimes. A pergunta passa a ser: por que algumas pessoas são tratadas como criminosas, quais as consequências desse tratamento e qual a fonte de sua legitimidade?
Nessa esteira há algumas informações que precisam serem postas para analisarmos melhor a referida teoria.
A primeira é que há muito mais condutas delituosas do que as que o sistema penal possui condições de investigar e processar.
A segunda é o fato de que existem muito mais pobres encarcerados do que pessoas de outras classes sociais.
Diante dessas duas constatações começa-se a analise de quem é um criminoso? A resposta é que o criminoso é simplesmente alguém que pratica uma conduta ilícita, típica e dolosa, porém no dia a dia da prática forense soma-se esse fato com a marginalização do agente. Quanto mais marginalizado for maiores são as chances de ser condenado pelo Ius puniend estatal e de receber essa rotulação nefasta pela sociedade.
Portanto a labelling approach nos traz a ideia de que a classificação do agente enquanto criminoso depende mais de quem é a pessoa do que do ato criminoso propriamente dito.
Essa teoria influenciou o sistema jurídico brasileiro de forma que, a título de exemplo, o artigo 176 do código penal brasileiro assim determina:
“Art. 176 - Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.” Grifo nosso
Note que o núcleo essencial do tipo penal não é a conduta lesiva ao patrimônio do restaurante ou do hotel ou mesmo do meio de transporte, o núcleo essencial é o fato do agente estar sem recursos para adimplir a obrigação contraída.
Em outras palavras, o tipo penal em comento é o fato do agente ser pobre.
O legislador ao prever tal absurdo na norma mais extremada a ser aplicada, que é a norma penal, é no mínimo um ato de discriminação in pejus legalizado pelo estado.
Mas e o princípio da dignidade da pessoa humana, onde fica? Certamente que os legisladores o desconhecem ou taparam os olhos para ele. O fato é que o princípio mor do nosso ordenamento jurídico foi duramente ofendido por esse tipo penal, razão pelo qual o reputo como inconstitucional.
Mas o mais grave de tudo isso é saber que a norma nasceu de um estigma cultural e contaminou o ambiente forense.
A isso chamamos de criminalização primária, ou seja, o fato de o estado escolher uma conduta para incriminá-la baseado não nos possíveis danos que provoquem ao patrimônio mas sim na origem do agente que pratica a conduta.
Tal qual a criminalização primária existe também a criminalização secundária que consiste no fato de o aparato estatal competente para investigar as condutas criminosas dar preferência para investigar aqueles infortunados que já são marginalizados pela sociedade e deixar para um segundo ou terceiro plano a investigação e processamento dos “criminosos do colarinho branco”.
A consequência lógica é que o agente que comete delito primário facilmente se tornará um delituoso secundário pelo fato da tipificação criminosa ser baseada na origem do agente e por não haver uma política de reinserção do indivíduo na sociedade.
Referências:
BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 25 de setembro.
Osera, Karen Mylena de Gouvêa. breves considerações acerca da influência da teoria do labelling approach na formação do pensamento jurídico e social brasileiro. Disponível em: http://revistas.ung.br/index.php/cienciasjuridicasesociais/article/view/2305/1677. Acesso em 25 de setembro de 2020.