Aplicação da Lei nº 8.928/2020 na atividade da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Ocorrências de lesão corporal ou morte por intervenção por agente do estado

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03/10/2020 às 14:56

Resumo:


  • Atualização de procedimentos operacionais e administrativos considerando a Lei nº 13.491/17.

  • Criação de tópico para procedimentos em casos de crimes militares praticados por policiais militares de folga e em serviço.

  • Inclusão dos crimes deliberadamente omitidos no Vade Mecum, em especial o Homicídio e Lesão Corporal Decorrente de Intervenção Policial Militar.

  • Inclusão dos procedimentos referentes à Lei Estadual nº 8.928/20.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5. ATUALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS E ADMINSITRATIVOS

A PMERJ adota um protocolo peculiar de padronização de procedimentos em ocorrências policiais, é o VADE MECUM DE OCORRÊNCIAS POLICIAIS MILITARES, com uma última versão republicada no Aditamento ao Boletim da PMERJ n.º 034, de 22 de fevereiro de 2013 e uma atualização de códigos no Bol da PM n.º 076 - 10 JUL 18. Entretanto, o que salta aos olhos é que o VADE MECUM tratou de maneira inepta os crimes militares, trazendo à baila acepções equivocadas e escassos protocolos adotados em ocorrências envolvendo crimes militares praticados contra civis, além de não abordar nenhum protocolo quanto aos crimes militares praticados por civil contra as instituições militares estaduais.

Cabe ressaltar, a omissão no Vade Mecum de dois dos crimes militares mais registrados e que são hoje objeto de atenção da Lei nº Estadual nº 8.928/20: o Homicídio e a Lesão Corporal praticados contra civil. Não é tratado também, o desenvolvimento das atividades operacionais e administrativas quando há concurso entre crimes comuns e crimes militares na mesma ocorrência, bastante comum em operações policiais, na qual tem como desfecho um dos dois delitos supracitados.

Com o objetivo de alinhar os procedimentos operacionais e diligências de polícia judiciaria militar com ordenamento jurídico vigente, bem como aprimorar a construção e a atualização de um Procedimento Operacional Padrão (POP) ideal, os pontos abaixo devem ser considerados:

1) Atualização dos procedimentos operacionais e administrativos considerando a Lei nº 13.491/17

O Vade Mecum não contempla o novo rol dos crimes militares, são exemplos que devem passar a existir protocolo: Aborto, porte ilegal de armas, disparo de arma de fogo, tortura, racismo etc. São crimes que estão previstos apenas na legislação penal comum. Aqui também cabe uma observação relevante quanto a procedimento administrativo interno para eliminação de munições. Sempre se foi exigido registro em delegacia para isso, no entanto, depois de 2017, o disparo de arma de fogo em serviço não é considerado mais um crime comum, portanto dispensa a confecção RO da DP, mas a gestão da PMERJ, ainda não observou tal fato, mantendo esse procedimento desnecessariamente.

2) Criação de tópico para procedimentos em casos de crimes militares praticados por policiais militares de folga e em serviço

Na parte do Vade Mecum que trata dos crimes militares, os procedimentos estão todos misturados quando o agente é militar federal ou estadual, mas não elenca a hipótese dos crimes praticados por militares da PMERJ, ficando subentendido que estariam ali incluídos. Entretanto, carece de detalhes quanto à: Lavratura de APFD em Unidade do agente ou em DPJM, ocorrências que envolvam integrantes do Corpo de Bombeiros, militares de outros estados, crimes militares praticados em concurso com crimes comuns, e outras questões relevantes. Na PMESP, existe um manual específico apenas para esses casos, é o Manual I-40-PM-INSTRUÇÕES PARA O ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIA EM QUE HAJA O COMETIMENTO DE INFRAÇÃO PENAL PRATICADA POR POLICIAL MILITAR.

3) Inclusão dos crimes deliberadamente omitidos no Vade Mecum, em especial o Homicídio e Lesão Corporal Decorrente de Intervenção Policial Militar

O Vade Mecum omitiu diversos procedimentos em ocorrências. Os Crimes Contra a Pessoa – Título IV do CPM, foram muito prejudicados, os quais diversos tipos penais ocorrem com grande recorrência. Parece uma seletividade direcionada com exclusão do alguns crimes principais, em especial os crimes previstos nos artigos 205 e 209 do CPM, e dando atenção a crimes extremamente distantes da realidade policial militar e muito difíceis e improváveis de serem executados, com pouquíssimos ou nenhum registro nos últimos anos, como GENOCÍDIO, código 38.208 e a HOSTILIDADE CONTRA PAÍS ESTRANGEIRO, código 38.136.

Os códigos de ocorrência pulam do crime previsto no art. 204. (Exercício de Comércio por Oficial) para o 208 do CPM (Genocídio) e depois pula deste para o art. 235. do CPM (Pederastia). A pergunta que perpassa é: qual será o procedimento então na ocorrência desses crimes militares que foram omitidos?

Artigos do CPM omitidos:
  • [205] e 206 – Homicídio doloso e culposo

  • [207] – Provocação ou auxilio a suicídio

  • [209] e 210 – Lesão corporal dolosa e culposa

  • [211] – Participação em rixa

  • [214] – Calúnia

  • [2150] – Difamação

  • [216] – Injúria

  • [222] – Constrangimento ilegal

  • [223] – Ameaça

Esses são só alguns delitos militares que não tem protocolo descrito, não é à toa que muitos casos de crimes militares foram direcionados para registro em delegacia de polícia, inclusive crimes entre militares da ativa ocorridos no interior de unidades da PMERJ.

Nota-se também a omissão do crime previsto no art. 172. do CPM: Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa, pois pula do art. 171. para o 173 do CPM, evidentemente negando a premissa que o civil pode praticar esse crime.

4) Inclusão dos procedimentos referentes à Lei Estadual nº 8.928/20

Fundamental incluir os protocolos desta lei a fim uniformizar as ações da Autoridade Policial Militar, para que atenda ao dispositivo, respeitando os aspectos penais e processuais penais militares para os casos de Homicídio e Lesão Corporal Decorrente de Intervenção Policial Militar, que serão tratados, inicialmente, como delitos militares, e durante a investigação em IPM, poderá haver a desclassificação da conduta dentro de uma das hipóteses de excludentes de crime previstas no art. 42. do CPM.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Lei Estadual nº 8.928/20 tangencia perigosamente as atribuições da Autoridade Policial Militar, flertando com a inconstitucionalidade, e com pouco tempo inserida no ordenamento jurídico, já é notório na prática que induz os Oficiais da PMERJ para a condução das diligências de polícia judiciária militar de maneira errônea, permitindo que delegados de polícia atuem dentro da esfera de atribuição que é reservada às autoridades policiais da PMERJ no art. 12. do CPPM.

A inclusão dos novos procedimentos da Lei nº 8.928/20 em caso de ocorrência, em tese, dos crimes previstos no art. 205. e 209 do CPM, é fundamental para que as ações adotados por Oficiais e Praças da PMERJ não continuem ocorrendo de forma totalmente errada, muito disso em razão da omissão desses protocolos no Vade Mecum da PMERJ.

O resultado negativo disso é observado por anos: a dupla investigação pela PMERJ e PCERJ de policiais militares pelo mesmo fato, superexposição na mídia, a precariedade na instrução dos IPM’s conduzidos pelos Oficiais, pois não são adotadas as medidas preliminares do art. 12. do CPPM: não há perícia militar no local, não há perícia militar nos armamentos, isso porque essas diligencias são feitas em outra instituição, que ao arrepio da CF, estão investigando os fatos, e ademais, não há inteiração entre os órgãos, o que facilitaria a requisição dessas perícias no caso incapacidade técnica ou pessoal do CCrim.

Ademais, mesmo se debruçando sobre esta lei, interpretando à luz da CF e adequando às normas do CPPM em vigência, a aplicação prática é muito complexa, pois a atribuição de perícia civil às ocorrências da prática de crimes militares, em tese, em operações policiais, apesar de haver previsão legal, atualmente encontra obstáculos administrativos em razão do diálogo precário entre as duas instituições: Polícia Militar e Polícia Civil, e um sistema integrado e prático de informação de ocorrências e solicitação de perícias.

Cumpre salientar, que em razão dos problemas desta lei aqui apresentados, ainda poderão surgir diversas questões controversas e discussões nos tribunais, quanto à implementação no caso prático, pois não é uma possibilidade distante a revogação da Lei 8.928/20, desde que, as autoridades militares não se omitam diante desses problemas.


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Nota

1 Conceito de autoridade: disponível em <https://www.dicio.com.br/autoridade/ > Acesso em 20 ago 2020

Sobre o autor
Leone Pinheiro Borges

Oficial da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (CFO-PMERJ); Ex-Oficial da Reserva do Exército Brasileiro (CFOR-MatBel); Especialista em Operações de Choque – (COPC-PMERJ); Paraquedista Militar (C Bas Pqdt); Bacharel em Direito; Pós-graduado em Direito Penal Militar e Processo Penal Militar; Pós-graduado em Ciências Jurídicas; Pós-graduando em Medicina Legal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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