Limites da alteração qualitativa nos contratos administrativos oriundos de procedimentos licitatórios.

Quais são os limites???

08/10/2020 às 15:18

Resumo:


  • A Lei nº 8.666/93, conhecida como Lei Geral de Licitações, estabelece cinco modalidades de licitações.

  • O artigo 65 da referida lei permite alterações unilaterais nos contratos pela administração para melhor adequação técnica.

  • Essas alterações devem respeitar o interesse público, os limites estabelecidos e manter o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Há uma grande divergência doutrinária a respeito dos limites da alteração contratual no que tange os paramentos qualitativo e quantitativo. Por isso, o presente artigo busca explicar a melhor solução. Leia e entenderás!!

 

A Lei nº 8.666/93, conhecida como a Lei Geral de Licitação, que regulamentou o dispositivo 37, inciso XXI da Carta Magna de 1988, dispõe sobre os procedimentos licitatórios estabelecendo cinco modalidades de licitações, quais sejam: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão. A legislação em comento disciplina, ainda a mutabilidade unilateral dos contratos, como sendo uma das prerrogativas da administração sobre os contratantes, como se observa do artigo 65 do preceptivo diploma normativo, no qual traz regras referentes aos acréscimos e supressões qualitativas das quais os atores que integram a relação contratual não podem se afastar.

Em sendo assim, vejamos o que dispõe o artigo 65 no que tange a mutabilidade unilateral dos contratos, precisamente a qualitativa, verbis:

“Art. 65 Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: I – unilateralmente pela administração: a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos”.

O artigo em comento traz a possibilidade de alteração qualitativa e, por parte da administração, usando de seu “poder de império”.  Reparem que aduz claramente o dispositivo em comento, de forma unilateral. Alias, é de bom alvitre que esta possível modificação deverá está prevista no contrato, uma vez que, se trata de cláusula exorbitante, bem como essencial em todas as avenças administrativas, como veremos mais a frente.

Também, podemos perceber que se trata mesmo de uma mudança na qualidade, já que menciona para melhor adequação técnica aos seus objetivos.

A referida alteração contratual, é na verdade de observância ao principio do interesse público mencionado no artigo 58 do supramencionado diploma legal, vejamos o que dispõe:

“Art. 58 O regime jurídico dos contratos administrativos instituídos por esta lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I modificá-los unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado”.

De fato, o interesse público deverá permeia todos os atos da administração pública, visto que a finalidade das ações administrativas terá como norte a supremacia dos interesses da coletividade, ou seja, dos cidadãos que pagam seus tributos e, esperam em contrapartida serviços públicos de qualidade.

Pois bem, contudo a administração mesmo que gozando de seu “poder de império” não poderá jamais deixar de observar os padrões legais estabelecidos para as alterações.

Sendo assim, para aclarar vejamos a doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2010, pag. 269):

“São requisitos para alteração unilateral: a) que haja adequada motivação sobre qual interesse público que justifica a medida; b) que seja respeitada a natureza do contrato, no que diz respeito ao seu objeto; não se pode alterar um contrato de venda para um de permuta, ou um contrato de vigilância para um de limpeza; c) que seja respeitado o direito do contratado à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicialmente pactuado”.

No que se refere ao patamar de 25% e 50% previstos para as alterações quantitativas encartados no escopo do art. 65, $1º, ainda segundo a autora:

“Temos entendido que somente as alterações quantitativas estão sujeitas aos limites de 25% ou 50%, referidos no art. 65, $1º, de lei 8.666, até porque o inciso I, “b” (que trata especificamente dessa hipótese de alteração), faz expressa referência à modificação do valor contratual “em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta lei” não se encontrando a mesma referência no inciso I, “a”, que trata das alterações qualitativas.” (grifos do autor)

A doutrina de Celso Antonio Bandeira de Melo (2016, pag. 648) traz o seguinte:

“Note-se que a vedação contida no § 2º do art. 65 da Lei 8.666 – a de exceder os 25% ou 50% - está reportada tão somente à alteração unilateral a que se remete a letra “b” do inciso I (“ quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta lei” os quais estão fixados no § 1º) não diz respeito, pois ao que está mencionado na letra “a” (“modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos”.          

Extraímos do texto que os limites são referentes ao acréscimo ou diminuição destacados, no que toca ao valor do contrato e consequentemente ao seu objeto.

Contudo, o festejado autor segue com suas ponderações da seguinte forma:

“Isso não significa, entretanto, total e ilimitada liberdade para a Administração modificar o projeto ou suas especificações, sob pena de burla o instituto da licitação. Estas modificações só se justificam perante circunstâncias especificas verificáveis em casos concretos, quando eventos supervenientes, fatores invulgares, anômalos, desconcertantes de sua previsão inicial, vêm a tornar inalcançável o bom cumprimento do escopo que o animara, sua razão de ser, seu “sentido”, a menos que, para satisfatório atendimento do interesse público, se lhe promovam alterações”.

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Portanto, segundo o autor a alteração qualitativa, não significa uma carta branca, na qual à Administração possa alterar como melhor lhe aprouver, haja vista que o agente público deverá ser acima de tudo probo e realizar as alterações dentro dos limites da razoabilidade, em vista do caso concreto.

Comenta, Ronny Charles Lopes de Torres (2018, pag. 721):

“Tais alterações derivam ou devem derivar de situações em que modificações no projeto original serão eficientes na melhor busca de seus objetivos, trata-se de alteração que não deve ser prejudicial ao contratado nem à Administração, devendo ter o equilíbrio contratual mantido através do devido aditamento contratual, conforme já prevê o § 6º deste artigo”. 

Percebemos que o princípio da eficiência permeará qualquer avença que à Administração vier a celebrar e, sempre com repeito ao equilíbrio econômico, para que não haja locupletamento, isto é, enriquecimento ilícito do Poder Público.

Apesar de parte dos doutrinadores entenderem que os limites estabelecidos no art. 65, §1º da lei 8.666 se referem apenas as alterações quantitativas, encontramos posição contraria do TCU, citada pelo professor Ronny Charles, o qual também se afilia a corrente que entende que o dispositivo em comento se aplica as duas hipóteses (qualitativa ou quantitativa).

Desse modo, o TCU em seu livro de orientação básica (2010) adota a seguinte orientação:

“Em respeito aos direitos do contratado, tanto as alterações contratuais quantitativas quanto as unilaterais qualitativas, necessárias nos contratos celebrados com a administração Pública, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8.666/1993”.

Segundo, Victor Aguiar Jardim de Amorim (2020, pag. 248):

“Muito se discute na doutrina e na jurisprudência se se aplicam os limites previs­tos no § 1o do art. 65 nos casos de alterações qualitativas (art. 65, I, “a”). O entendimento que prevalece, inclusive do próprio TCU, é que, em regra, nas alterações qualitativas devem ser observados os limites do § 1o, admitindo-se, em hipóteses excepcionalíssimas, e desde que haja anuência do contratado, a extra­polação dos limites, tendo em vista que, quando as consequências da outra al­ternativa (a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação) forem gravíssimas ao interesse público primário”.

Por fim, sem a pretensão de esgotar o excelente assunto, tampouco adentrarmos em questões especificas de alterações de contratos celebrados sob a égide de legislação especial, editada para atender a calamidade publica de enfrentamento da pandemia internacional do coronavírus - covid-19.

Concluímos que, as alterações contratuais unilaterais qualitativas, oriundas da Lei Geral das Licitações, que mantém intangível o objeto em natureza e, em sua dimensão, esta sujeita aos limites encartados no art. 65,§ 1º da Lei nº 8.666/93, apesar de haver divergências por parte da doutrina o TCU assim entende. Sobretudo, deverão ser por fatos supervenientes, o interesse público esteja sempre presente com a finalidade de que os órgãos públicos possam prestar serviços com eficiência.

 

 

Referencia bibliográficas:

BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Planalto.gov.  Brasília, DF, 21 Jun. 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 14 dez. 2018.

DI PIETRO, M. S. Z. Direito administrativo. 23. Ed. São Paulo: Atlas, 2010.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de - Curso de Direito Administrativo – 33ª ed. Saão Paulo. Ed. Malheiros, 2018.

MARÇAL, Justen Filho. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010.

 

Torres, Ronny Charles Lopes de, Lei de Licitações Públicas comentadas / Ronny Charles Lopes de Torres, - 9. Ed. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018.

Amorim, Victor Aguiar Jardim de, Licitações e contratos administrativos : teoria e jurisprudência / Victor Aguiar Jardim de Amorim. – 3. ed. – Brasília, DF : Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2020.

 

 

Sobre a autora
Fabio Vilas Gonçalves Filho

Graduado em Direito (2010); Pós – Graduado em Direito Público e Tributário - com habilitação para Docência no Ensino Superior - (2012); MBA em Licitações e Contratos Administrativos (2018); Mestre em Saúde e Tecnologia no Espaço Hospitalar pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO (2017).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

A fim de informar a celeuma existente na doutrina a respeito do assunto.

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