1 – PRÉVIA ANÁLISE QUANTO A DIFICULDADE EM COMPARAÇÃO DAS LEIS ANTICORRUPÇÃO BRASILEIRA E FRANCESA.
Com a sociedade cada vez mais informada, principalmente após grandes personalidades públicas passarem a cumprir pena de restrição de liberdade pelos chamados “crimes do colarinho branco” foi o Estado notadamente preenchido por diversos corruptos e corruptores criar uma legislação que passasse a promover programas anteriormente desconhecidos no Brasil, tais como o Compliance dentre outros programas de ética empresarial.
A corrupção em sua generalidade é um mal sistêmico, presente em todos os sistemas econômicos, independente da forma de governo, tendo sido percebido em todos os meios econômicos adotados. Nota-se que de nada adianta criar-se uma boa gestão se as engrenagens do sistema encontram-se inoperantes, burocráticas e dotadas e esquemas em que há comodidades para ser combatidos por envolver grandes grupos políticos e empresariais.
A Lei 12.846/2013 trouxe inovações no tocante a seara empresarial, passando a normatizar regras punitivas contra empresas que geralmente são as corruptoras do sistema político, injetando verba em favor pessoal de políticos para obterem retorno de grandes escalas, tudo isso financiado pelo dinheiro públicos. Ato contínuo, normatizou programas de integridade empresarial, objetivando a regulamentação em âmbito nacional, beneficiando as instituições que efetivamente tenha adotado os referidos sistemas anticorrupção no caso de haver condenação por prática delituosas de seus gestores, funcionários e servidores.
Nesta perspectiva, tem-se os modernos programas de integridade que passam a ser adotados na administração pública, seara esta que não será colocado em tela neste artigo. Contudo, há suma necessidade em observamos a eficácia destes programas, uma vez que afim de haverem para si a benesse da lei e rotineiramente a moralidade da adoção de programas de ética e integridade, onde inúmeras vezes são apenas nomes técnicos que são usados para cobrirem esquemas minuciosamente antiéticos.
Sobre a perspectiva da Loi Sapin II vigente na França, possuindo semelhanças juntamente com a Lei Anticorrupção Empresarial (12.846/2013), tem-se a eficácia do Poder Judiciário e métodos investigativos de cada nação. Há dificuldades continuadas em colocar em prática diversas leis nacionais, seja pelo sobrecarregamento dos órgãos de investigação, seja pela ineficiência dos órgãos julgadores, diante um sistema pátrio com as engrenagens comprometidas, como dito anteriormente.
Há dificuldade em comparação das referidas legislações. Enquanto tem-se um sistema nacional em que a prática condiz com o positivado, a realidade de outra banda é divergente. Por mais moderna e justa que seja a legislação, não havendo eficácia lógica e real para sua aplicação, perde-se o sentido literal da universalidade da norma.
Logo de início, portanto, tem-se a necessidade em abrir debates de como colocar em prática com o intuito de obter plena eficácia das normas vigentes que prezam pelo combate a corrupção no Brasil. A simples criação de uma legislação operando em território nacional não é suficiente para que sua natureza seja real. Contrassenso disso, tem-se a criação de legislações demasiadamente para pôr fim ao debate insatisfatório popular, passando os legisladores a óptica “dever cumprido” diante a sociedade.
Nada obsta evidenciarmos que atualmente no Brasil a maioria dos crimes contra a vida sequer são solucionados pelos órgão investigativos [1]. Diante essa realidade, compreende a dificuldade incontestável em diligenciar os mecanismos positivados. O sistema brasileiro apresenta graves desvantagens em comparação ao sistema europeu, em especial ao francês.
De outro modo, a tese elencada acima serve para mencionar tão somente quanto a peripécia que o caso requer. Entende-se não ser objeção para o efetivo cumprimento e aperfeiçoamento das legislações brasileiras, aqui incluída notoriamente a Lei 12.846/2013, conforme passaremos a analisar a poteriori .
2 – LEI 12.843/2013 (LEI ANTICORRUPÇÃO EMPRESARIAL BRASILEIRA)
Moderna e com um único propósito, a Lei 12.843/2013 objetiva normatizar e estabelecer regras para as pessoas jurídicas envolvidas em esquemas de corrupção, promovendo programas de integridade que devem ser adotados por estas personalidades privadas com o intuito de evitar o infortúnio combatido pela legislação e, em havendo os delitos ali mencionados a bonificação por parte do Estado para aqueles que adotaram e efetivamente cumpriram os programas de compliance.
Compliance, é um agrupamento de regras para fazer cumprirem as normas legais e regulamentares, entre essas políticas e diretrizes estabelecidas para os negócios jurídicos nas personalidades privadas. Pode ser adotado em instituições públicas. É um sistema que visa detectar e tratar qualquer desvio de finalidade gerando práticas de corrupção. [2]
A Lei n. 12. 846, de 1° de agosto de 2013, bem como o Decreto n. 8.420, de 18 de março de 2015, vieram complementar esse conjunto de leis e fortalecer o combate nacional à corrupção. A lei também conhecida como Anticorrupção, nasceu da pressão social e manifestações durante o ano de 2013, anos este, em que houve uma “chuva” de notícias e processos de escândalo de corrupção envolvendo tanto agentes públicos como privados ligados àquele, bem como foi uma forma do Brasil se adaptar as medidas estipuladas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
De uma forma ampla, se pode afirmar que a Lei Anticorrupção, institui a possibilidade de responsabilizar objetivamente no âmbito administrativo e civil a pessoa jurídica por prática de atos corruptos contra a Administração Pública nacional ou estrangeira (artigo 1°), não excluindo a possibilidade individual dos dirigentes e administradores da pessoa jurídica (artigo 3°). Conforme descrito na lei, a responsabilização na esfera administrativa não intervém na responsabilização na esfera cível.
Também foi inovadora a maior concentração de poderes à Controladoria Geral da União (artigo 8°, § 2°), que terá no âmbito do poder executivo federal competênciaconcorrente “para instaurar procedimentos administrativos de responsabilização de pessoas jurídicas” ou para verificar “a regularidade ou para corrigir o andamento” de processos que tenham a Lei Anticorrupção como fundamento. Ainda são de competência da CGU (Controladoria Geral da União) a apuração e o julgamento em casos envolvendo a Administração Pública estrangeira (artigo 9°).
O Capítulo V da Lei n. 12.846/2013 trouxe a possibilidade de se realizar Acordo de Leniência, beneficio este já previsto em outras legislações nacionais, com nomenclatura diferente, como por exemplo, “termo de compromisso”, “termo de ajuste de conduta”, onde aquele que praticou o ato ilegal se compromete em oferecer informações a respeito do ilícito em troca de determinado benefício.
No entanto, merece devida atenção, que na Lei Anticorrupção diferentemente de outras leis que prevê o tal acordo, seus benefícios não se estendem a seara criminal, caso haja processo contra a pessoa física. (HEINEN, 2015, p.235)
Outra novidade foi a previsão de um Cadastro Nacional de Empresas Punidas (artigo 22), dando publicidade as sanções aplicadas as empresas por meio da Lei Anticorrupção. Tal cadastro devera ser sempre atualizado pelo órgão responsável, de modo que no cadastro conste a sanção aplicada a pessoa jurídica bem como depois de realizado o acordo, se este foi cumprido (artigo 23).
Retornando ao artigo 7°, merece devido destaque o inciso VIII, onde há a previsão de Programas de Integridade, também chamado no meio empresarial de programas de Compliance (DEMATTÉ, 2015, p.128).
Ligado à Responsabilidade empresarial, foi estipulado no décimo princípio do Pacto Global das Nações Unidas que estipula que as empresas devem combater a corrupção. Tal atitude acarretará atenuante à dosimetria da sanção a ser aplicada a pessoa jurídica. (DEMATTÉ, 2015, p. 128).
Além da Lei Anticorrupção, existem outras normas pertinentes relacionadas ao combate interno da corrupção, a exemplo das resoluções e das cartas circulares do Banco Central do Brasil (BACEN).
3. O COMBATE INTERNACIONAL A CORRUPÇÃO:
Centro de debate a nível internacional o combate à corrupção tem sido difundida em diversos países, e estes por sua vez, tem buscado ao máximo elaborar leis tanto preventivas como repressivas, de forma a criar uma barreira contra tal mal. Para que seja bem-sucedido é necessário a utilização da transparência e da responsabilidade, assim asseverado:
[...] são dois os requisitos chaves no combate à corrupção. O fortalecimento destes requisitos através da assistência internacional trará vantagens competitivas, aumentará a credibilidade não apenas de uma perspectiva ética, mas também econômica e promoverá o desenvolvimento (RAMINA, 2008, p. 39).
Com o intuito de promover ambos os fatores, a ONU (Organização das Nações Unidas) tem demonstrado interesse em promover o combate à corrupção. Para isso, tem incentivado os seus países-membros a se submeterem a regras com foco na probidade.
De início pode-se citar as Resoluções n° 50.106 e n° 53.176, datadas de 1996 e 1999 respectivamente, que trazem o compromisso de combater a corrupção. No ano de 2003 a Assembleia Geral da ONU aprovou a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, que busca possíveis soluções para problemas de corrupção aos países-membros, documento esse, que veio a ser o principal alicerce para a elaboração da Lei Anticorrupção no Brasil (HEINEN, 2015, p. 27).
O Banco Mundial (BM), por sua vez, criou a Iniciativa para a Recuperação de Ativos Roubados, com a intenção de detectar paraísos fiscais para onde é desviado dinheiro público bem como com o intuito de ajudar os países prejudicados a reaver as somas desviadas. O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), outrossim, tem buscado melhores estratégias para prestação de contas bem como para que haja transparência em seus atos (RAMINA, 2008, p. 77).
A Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE), igualmente, tem buscado mecanismos para prevenção e combate a atos corruptos no ramo empresarial, em especial em relação às relações de transnacionais, de forma que em 1997 seus países-membros assinaram a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais.
É valido ressaltar que participaram deste instrumento países não membros da OCDE, inclusive o Brasil, que ratificou a Convenção em 12 de junho do ano de 2000 (HEINEN, 2015, p. 27).
Também merece destaque a Organização dos Estados Americanos (OEA) que aprovou em 1996, na Venezuela, a Convenção Interamericana Contra a Corrupção buscando uma interação e o fortalecimento ao efetivo combate à corrupção por meio de medidas de prevenção (RAMINA, 2008, p. 73).
O Comitê de Ministros do Conselho Europeu, em busca de meios de combate a corrupção, criou em 1999 o Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO), com o intuito de obter melhores resultados. Ainda em relação à União Europeia há o Convênio voltado a proteção de interesses financeiros dos países-membros, de 1995 estipulando meios de prevenção bem como a punição dos agentes envolvidos em fraudes fiscais. Mais tarde outro Convênio foi firmado com o mesmo intuito só que dessa vez visando punir os funcionários públicos e os agentes que são da própria Comunidade, envolvidos em atos de corrupção. (HEINEN, 2015, p. 28).
4. COMPLIANCE E SUA EFETIVA APLICABILIDADE.
Dentre as diversas inovações oferecidas pela lei anticorrupção merece o devido destaque ao compliance, mecanismo altamente conhecido e difundido no exterior. Apesar de sua menção na novel legislação, diversas pessoas jurídicas, tanto públicas como privadas já desenvolviam tal mecanismo.
A palavra compliance advém do termo comply, que por sua vez significa estar em conformidade, realizar regras impostas, ou seja, relaciona-se ao dever de vigilância da pessoa jurídica frente a seus subordinados. (CASTRO, 2015, p.109).
O compliance é mecanismo de prevenção, de forma que as pessoas jurídicas que deste se valem objetivam o desenvolvimento e o incentivo da aderência de seus membros a leis internas de boas práticas. (HEINEN, 2015, p.175).
Os programas de compliance também conhecidos como programa de integridade possuem como objetivo fundamental a redução de atos corruptos no interior da pessoa jurídica que o utiliza e a redução das penas em caso de condenação por condutas ilícitas (HEINEN, 2015, p.177), ou seja, visa uma “capacidade comunicativa da pena nas relações econômicas”, já que une a técnica positiva da concorrência justa com a prevenção (SILVEIRA; DINIZ, 2015, p. 255), e ainda se pode acrescentar que essas medidas preventivas podem evitar,
[...] possível persecução criminal de seus agentes e dela própria, enquanto pessoa jurídica. O envolvimento da corporação com um processo penal pode representar grande risco para suas operações, como prisões de seus agentes, mandado de busca e apreensão, custos com o processo, abalo de sua reputação, enfim, um considerável impacto negativo que, inegavelmente, acaba por implicar em prejuízos financeiros ou mesmo o termino das atividades.(BUONICORE; LEONHARDT, 2013, p. 111).
Ainda é valido acrescentar que tais programas de compliance não devem ser utilizados de qualquer forma, ou seja, não basta apenas a instalação do programa, sendo necessária sua constante atualização, para que se amolde ao momento presente da pessoa jurídica. (DEMATTÉ, 2015, p. 130).
Sob um aspecto histórico, os mecanismos de compliance aparecem pela primeira vez nos Estados Unidos relacionados às instituições financeiras, com a criação do Banco Central Americano em 1913, diante da necessidade da criação de um sistema financeiro mais estável, para isso desenvolveu-se a Política Intervencionista New Deal. (GÓIS; SANTOS; ROCHA, 2016, p. 233).
O Pacto Global das Nações Unidas, em seu princípio décimo, dispõe que é tarefa das empresas combater a corrupção, ou seja devem estas tomarem as medidas adequadas, dentre elas mecanismos de combate, como o compliance.
Ainda é válido a menção da Lei Sarbanes-Oxley, SOX, também denominada como Public Company Accounting Reform and Investor Protection Act de 2002, lei federal americana criada após diversos escândalos corporativos e contábeis, objetivando a restauração da credibilidade no sistema capitalista (GÓIS; SANTOS; ROCHA, 2016, p. 233).
Outra lei internacional que prevê mecanismos de integridade é a lei antissuborno do Reino Unido (U.K. Bribery Act, UKBA), que prevê a exigência de treinamento dos subordinados e a constante revisão dos programas internos das pessoas jurídicas de alto escalão (GÓIS; SANTOS; ROCHA, 2016, p. 233).
Em uma breve análise, é possível observar que a Lei n. 12.846/2013 em seu art. 5° enumerou as práticas lesivas que podem ser praticadas pela pessoa jurídica ante a Administração Pública nacional ou estrangeira. No art. 6° da referida lei há as possíveis sanções a serem aplicadas à pessoa jurídica que cometem os atos descritos no art. 5°.
Em complementação o art. 7° trás um rol de questões que devem ser avaliadas ao serem aplicadas as sanções, dentre elas é válido destacar o inciso VIII que dispõe, “a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.
A lei Anticorrupção foi regulamentada pelo Decreto n. 8.420/2015, este por sua vez, dispôs sobre os programas de integridade em seu capítulo IV, destacando que não basta a mera implantação do mecanismo é necessária a sua atualização para que hajam os resultados necessários (art. 41, parágrafo único do Decreto n. 8.420/2015).
Para que se tenha a efetiva aplicação dos programas de compliance é necessário a observância de requisitos que dispõe a lei. Conforme se analisa o rol descrito no art. 42, § 1° do Decreto n. 8.420/2015 existem parâmetros para que a pessoa jurídica usufrua do beneficio de atenuação da pena prevista em lei.
Já o artigo 42, § 4° do referido decreto transmite ao chefe da Controladoria Geral da União a responsabilidade de expedir as necessárias orientações e normas sobre os programas de integridades.
A Portaria n. 909 da CGU, de 7 de abril de 2015, cumpriu o disposto no artigo acima dispondo minuciosamente os devidos dados a respeito dos mecanismos de compliance e de sua implantação no interior das pessoas jurídicas.
A pessoa jurídica que deseja implantar o mecanismo deverá apresentar o relatório de perfil, informando sua área de atuação, seu número de empregados, e sua estrutura organizacional, sua participação societária e informar sua qualificação.
Também deve ser apresentado o relatório de conformidade com o programa, informando como se dá a estrutura do programa, demonstrar o pleno funcionamento do mesmo, por meio dos dados obtidos e de relatórios, e demonstrar como funciona o programa na aplicação.
Por fim, o art. 5° da mencionada Portaria dispõe que para a aplicação do beneficio oferecido pela Lei Anticorrupção será necessário levar em conta todos os mencionados dados contidos em ambos os relatórios
4.1 - COMPLIANCE SOB A DIAPASÃO DE FATO.
Para que haja um bom funcionamento dos mecanismos de compliance há uma extrema necessidade de que as pessoas jurídicas que desejem implantar tais regulamentos em seu interior possuam uma relação harmoniosa com o poder público.
As medidas deverão além de corresponder aos requisitos legais serem aplicadas nas delimitações do âmbito empresarial de forma a não gerar um conflito entre o poder exercido pela pessoa jurídica e seu subordinado com o poder publico.
Assim, sugere a doutrina que haja a formação de “redes”, para pleno funcionamento do sistema implantado. (SILVEIRA; DINIZ, 2015 p. 258).
[...] as idéias de boa governança derivam de combinações “relacionais” entre o setor público e o privado para a “delimitação e padronização dos papeis de cada ator”, organizados em “redes”, “formas de interação em que a coordenação não é garantida nem por instrumentos de mercado nem pela atribuição hierárquica de comando”. (SILVEIRA; DINIZ, 2015, p.258).
Para tanto, deverá a pessoa jurídica privada exercer seu papel de regulamentação e de investigação das condutas de seus subordinados, sendo que suas formas de intervenção não poderão exceder seus limites, pois caso os ultrapasse estaria a pessoa jurídica a realizar funções estritamente estatais.
Motivo de grande divergência doutrinaria é a figura do compliance penal, onde por meio deste a pessoa jurídica privada realiza por conta própria a “autocomposição do conflito interno”, visando solucionar as precariedades do sistema jurídico no âmbito penal. (SILVEIRA; DINIZ, 2015 p. 259).
Vale ressaltar, no entanto que apesar do déficit do sistema judiciário em relação à tal matéria haveria uma fuga dos deveres privativos estatais que de acordo com a doutrina acarretam futuros problemas quanto a delimitação da competência para a resolução do conflito.
[...] veja-se negligenciado o modelo básico de Estado de Direito. No entanto, tal medida foge às vias convencionais de judicialização do conflito penal. É na verdade, medida de desjudicialização da racionalização burocrática da Administração, reforçando a confiança na expectativa gerada entre o lucro do procedimento gerencial e a moralidade administrativa. (SILVEIRA; DINIZ, 2015, p. 259).
Dessa forma, o sugerido doutrinariamente é que o compliance no âmbito interno das pessoas jurídicas se atenha apenas como um mecanismo de prevenção de práticas ímprobas e de regulação interna da própria pessoa jurídica.
A função de punir as práticas corruptas pertence ao Estado. O papel da pessoa jurídica é apenas colaborar nas investigações para a apuração dos fatos, desencadeando assim uma boa governança interna e de acordo com as normas estatais.
Outra característica extremamente criticada pela doutrina é o fato de que com o desenvolvimento do compliance as pessoas jurídicas acabem por se autoincriminar, revelando praticas próprias passiveis de punibilidade estatal (SILVEIRA; DINIZ; 2015, p. 264).
Nestes casos, a própria Lei Anticorrupção trouxe o benefício da atenuante, visando incentivar que as práticas corruptas sejam combatidas, mesmo que em caso de autoincriminação.
5. MECANISMOS QUE GARANTEM A EFICIÊNCIA DA LEGISLAÇÃO ANTICORRUPÇÃO BRASILEIRA
Dentre os mecanismos presentes na novel legislação, ainda há que se destacar a previsão dos acordos de leniência, que foi polemizado no Brasil (chegando ao ponto de determinados grupos políticos investigados aduzirem ser prática de tortura psicológica) em razão da sua eficiência em atingir os pontos nodais concernente as organizações criminosas, principalmente na seara política brasileira.
O acordo de leniência, já conhecido em outras legislações como delação premiada a exemplo da lei de crimes contra o sistema financeiro nacional e de lavagem de dinheiro, é a possibilidade de celebração de acordo entre a Administração Pública e a pessoa jurídica que praticou o ilícito.
Por meio de tal acordo, a pessoa jurídica irá se comprometer a colaborar de forma efetiva com as investigações do processo, concedendo elemento suficientes para auxiliar na apuração do ilícito. (OLIVEIRA; NEVES, 2015, p. 3).
Trata-se então de um “direito premial” onde o autor do crime se compromete em fornecer as informações devidas, identificando os demais envolvidos na prática do ilícito, colaborando na recuperação dos prejuízos, resultando assim, em uma redução da pena que lhe seria aplicada. (HEINEN, 2015, p. 233).
Apesar de já haver tal previsão do acordo de leniência em outras legislações, mesmo que com outra definição como já acima explicitado, merece destaque o fato de que, a Lei n. 12.846/2013, inovou o sentido de que o acordo não gerará a extinção da punição.
Ao contrário do que ocorre, por exemplo, em situações onde a aplicação da sanção poderia acarretar a frustração da obtenção de resultados, como ocorre no Termo de Ajuste de Gestão (TAG), onde a multa ambiental é substituída pela imposição de investimento na restauração do meio ambiente em valor correspondente ao que seria estipulado em multa. (OLIVEIRA; NEVES; 2015 p. 3).
As diversas legislações que trazem tal benesse em seu texto dispõem que o infrator que colabora com a investigação cedendo suas informações, e caso esta surte em efeitos positivos terá a ação punitiva afastada. (HEINEN, 2015, p. 233).
Em uma breve análise do artigo 16 da Lei Anticorrupção, é possível perceber que a Lei Anticorrupção estabeleceu que da colaboração realizada pela pessoa jurídica deve resultar, na identificação dos envolvidos na infração; a obtenção de informações e documentos que permitam a identificação do ato ilícito. (conforme artigo 16 da Lei 12. 846/2013).
Outro fator que merece devida atenção é que o acordo de leniência não é um direito subjetivo, e sim, um ato administrativo discricionário e bilateral, quer dizer, diante de proposta realizada pelo infrator de firmar acordo, o poder público poderá recusar a oferta. (HEINEN, 2015, p. 233).
Conforme análise do parágrafo primeiro do artigo 16 da Lei Anticorrupção observa-se que a proposta do acordo de leniência deve partir da própria pessoa jurídica que cometeu o ilícito, e ainda, deve esta cessar todas as causas em que esteja envolvida no ilícito.
Outro destaque, é que a pessoa jurídica que firmar o acordo deverá admitir que participou do ilícito.
Deve-se aqui acrescentar que tais requisitos são cumulativos, e que as negociações referentes ao acordo de leniência são totalmente sigilosas, terminando o sigilo a partir do momento em que o acerto for firmado.
No entanto, houve diversos debates acerca da inconstitucionalidade do requisito previsto no inciso III, do art. 16 da Lei anticorrupção, entendendo a doutrina majoritária, que,
[...]Poder-se-ia alegar que o último requisito deva ser reputado inconstitucional, uma vez que se estaria, em tese e por via indireta, obrigando o acusado a confessar os atos ilícitos praticados. Não se concorda com esse entendimento, especialmente porque se trata de um acordo, enfim, de um ato bilateral em que é livre a manifestação da vontade de ambos os pólos da relação jurídica. Sendo assim, não se pode concordar que exista, ainda que de modo amplo qualquer inconstitucionalidade a ser alegada. (HEINEN, 2015, p. 239)
Logo, não havendo a inconstitucionalidade, é possível auferir que, basta que sejam preenchidos os requisitos de ordem objetiva, sendo eles a celebração ser realizada por autoridade competente e que a autoridade manifeste sua vontade (artigo 16, caput). (HEINEN, 2015, p. 240).
Ainda devem ser preenchidos os requisitos de ordem subjetiva, dispostos no § 1°, incisos I, II, III, sendo eles que a pessoa jurídica se disponha a cooperar na apuração do ilícito, que seja posto fim na prática da infração, e que a pessoa jurídica admita a sua participação, cooperando com o que for necessário para o bom andamento do processo (HEINEN, 2015, p. 240).
O parágrafo segundo do artigo 16 da Lei Anticorrupção dispõe sobre os benefícios que serão concedidos a pessoa jurídica que se comprometer e firmar o acordo de leniência dispõe tal parágrafo que, ficara a pessoa jurídica isenta da publicação extraordinária da decisão que a condena, ficará isenta também da proibição de receber incentivos, empréstimos e afins por parte do poder público, e ainda, terá reduzida em 2/3 (dois terços) o valor da multa que lhe será aplicada.
O parágrafo terceiro deixa claro que não poderá ser objeto de negociação por meio do acordo de leniência o dano causado, pois caso contrário se estaria diante de afronta ao principio da indisponibilidade do patrimônio público, princípio este que mesmo não constando no artigo 37 da Constituição Federal encontra-se consolidado de forma implícita, e também disposto no artigo 2°, caput da Lei n. 9.784/99. (HEINEN, 2015, p.243).
O parágrafo quarto define que as condições que assegurem o pleno cumprimento do acordo serão definidas no próprio texto do acordo de leniência firmado.
Como regra, o acordo de leniência surtirá efeitos em face apenas da pessoa jurídica que o firmou com o poder público. No entanto o art. 16, em seu § 5° trás a exceção a tal regra, permitindo que as benesses sejam estendidas as demais pessoas jurídicas, desde que estas comprovem pertencer ao mesmo grupo econômico, devendo estas também firmarem de forma conjunta o acordo.
Como já citado aqui o acordo de leniência só se tornara público em momento posterior a sua realização. A fase de propostas e negociações são totalmente sigilosas (conforme parágrafo sexto).
Para que seja firmado o acordo de leniência é requisito necessário a confissão de envolvimento com a prática ilícita por parte da pessoa jurídica que o firmou. No entanto o parágrafo sétimo deixa claro que, em caso de rejeição do acordo proposto, visto que o poder público não se encontra obrigado a aceitá-lo, não haverá a presunção da participação na pratica do ilícito por parte da pessoa jurídica.
O parágrafo oitavo trouxe as consequências que serão acarretadas em caso de descumprimento do acordo firmado. Dispõe o texto legal que, caso descumpra o acordo de leniência a pessoa jurídica não poderá firmar outro acordo no prazo de 03 (três) anos, contados da data do conhecimento do inadimplemento.
Acrescenta-se aqui que, tal efeito não seria por si só efetivo, visto que, o processo administrativo ou judicial possui continuidade, logo, a pessoa jurídica ao descumprir o acordo firmado deve suporta também o ônus advindo do processo em curso. Tendo em vista que o parágrafo oitavo busca uma punição a pessoa inadimplente, também seria ideal que tal inadimplemento fosse incluído do Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP). (HEINEN, 2015, p. 244-245)
Ainda avaliando os parágrafos dispostos no artigo 16 da Lei Anticorrupção, dispõe o parágrafo nono que o acordo de leniência interrompe a prescrição dos atos ilícitos previstos na própria lei.
Por fim, o parágrafo dez efetivou a Controladoria Geral da União (CGU) como o órgão competente para firmar tal acordo no âmbito federal, bem como nos casos de praticas de ilícitos em face da Administração Pública estrangeira.
No entanto, não deve a Controladoria Geral da União (CGU) substituir nesse viés as autoridades máximas dos entes da Administração Pública indireta (HEINEN, 2015, p. 236). Assim como compete a autoridade máxima de cada órgão ou entidade publica celebrar a leniência (caput, artigo 16).
Na sequência, o art. 17 da Lei n. 12.846/2013, permitiu que o acordo de leniência também possa ser aplicados a casos relacionados a Lei de Licitações Públicas e Contratos Administrativos, visando isentar ou atenuar as penas contidas no artigo 86 e 87 e 88 da Lei n 8.666/93.
Diferentemente de quando o acordo é firmado em situações previstas na Lei Anticorrupção, quando aplicado às hipóteses da Lei de Licitações Públicas e Contratos Administrativos poderá ocorrer a isenção da aplicação da sanção, o que não ocorre as sanções previstas na primeira legislação, visto que as sanções podem apenas serem abatidas.
De forma sucinta os artigos 86 e 87 da Lei de Licitações dispõe respectivamente à aplicação de multa em caso de atraso injustificado na execução de contrato realizado com o poder público e diversas sanções aplicáveis em caso de ausência de execução ou execução parcial do previsto contratualmente com a Administração Pública.
Tais sanções, previstas na Lei n 8.666/93, podem ser cumuladas a outras penalidades seja na área cível, penal, e ate mesmo com as sanções descritas na Lei n 12.846/13. De forma que, só não há a possibilidade de criação de penalidades além das já citadas (HEINEN, 2015, p. 247).
Neste sentido, a jurisprudência,
“[...] Se não conta no rol do art. 87 da Lei 8.666/93 a retenção do pagamento pelos serviços prestados, não cabe aplicar tal sanção, sob pena de violar o Principio Constitucional da Legalidade. 6. Agravo Regimental não provido.” (STJ, AgRg no Resp. n° 1.048.984-DF, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, j. 18/08/2009).
Por fim, merece destaque a questão que a Lei Anticorrupção foi enfática ao restringir a possibilidade do acordo de leniência a três artigos da Lei de Licitações, de forma que diversas outras legislações que também possuem previsão de punições ficaram de fora do mencionado rol. (HEINEN, 2015, p. 248).
Analisada a questão do acordo de leniência, deve-se também merecida atenção aos mecanismos de denúncia, que permitem a instauração do processo contra a pessoa jurídica pela prática das infrações previstas na Lei Anticorrupção.
Há de se observar que a Lei Anticorrupção permite que a própria pessoa envolvida no ilícito realize a denúncia por meio do acordo de leniência, de forma que ao realizá-lo receba benefícios referentes as sanções como já discutido acima.
Ademais, nada impede que o próprio funcionário realize a denúncia, por meio dos programas de compliance desenvolvido no âmbito interno da pessoa jurídica, conforme art. 7°, VIII, da Lei Anticorrupção.
No entanto, por uma perspectiva crítica é notável que a Lei Anticorrupção deixou de oferecer proteção criminal aos indivíduos que realizem a denúncia. Desta forma, entendem diversos atuantes na área que isso dificultara a obtenção de denúncias e de realização de leniências. (ROCHA, 2014).
Se distanciando um pouco do acordo de leniência que é realizado por órgão administrativos do Poder Executivo, se tem também a delação premiada, esta por sua vez ocorre no âmbito do judiciário, ou seja, tem a participação do Ministério Público (MP) e se dá na esfera penal (BRASIL, 2014).
De fato, caso haja a punibilidade na esfera judicial a pessoa jurídica poderá socorrer-se de tal recurso (BRASIL, 2015).
A delação premiada possui força probatória, ou seja, não se trata de mero noticiamento do crime. Nesse caso, caberá ao juiz avaliar a força probatória dos fatos narrados, premiando assim, o delator com as vantagens auferidas em lei (PEREIRA, 2009, p. 32).
Enfim, em caso de possível aplicação do direito penal à Lei Anticorrupção poder- se-ia valer de tal mecanismo, que por sua vez aumentaria as chances de punibilidade daquele que praticou o ato de improbidade.
Outro mecanismo é o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), este recurso tem plena possibilidade de aplicação a Lei Anticorrupção, visto que ela estipula a responsabilização na esfera cível.
Por meio deste a pessoa jurídica que infringiu a norma prevista na Lei Anticorrupção pode firmar um acordo com o órgão competente se comprometendo a adequar sua conduta ao estabelecido em lei (COSTA, 2014).
Aqui merece devida atenção ao fato de que, independente do mecanismo adotado pela pessoa jurídica que infringiu a Lei Anticorrupção, aquela ainda permanece com o compromisso de devolver o benefício gerado por meio da infração. Assim, em hipótese alguma o recurso advindo da corrupção poderá ser negociado.
6. COMPARAÇÃO ENTRE A LEI ANTICORRUPÇÃO BRASILEIRA E A LEI ANTICORRUPÇÃO FRANCESA.
Tão logo supramencionado, tem-se a subjetiva compreensão que as Repúblicas brasileira e francesa adotaram programas de integridade empresarial com o objetivo de combater atos de corrupção empresariais, assim compreendido pela Lei Sapin II (França) e pela Lei 12.846/13 (Brasil).
Verifica-se a necessidade de cautela com tais institutos, em razão da dificuldade em aplicabilidade das normas em territórios jurídicos divergentes. Não obsta notabilizar que eventuais normas em desacordo com legislações internacionais podem acarretar severos prejuízos econômicos devido a intervenção estatal (ainda que com as boas intenções) nas empresas com sedes/filiais ou em operação em outros territórios jurisdicionais. Daí, observa-se o ponto nodal da crítica capitalista-empresarial quanto ao tema.
Ato contínuo, verifica-se que as normas legislativas brasileira e francesa possuem semelhanças, vale citar as astreintes, ferramenta do direito processual civil brasileiro curiosamente importadas do direito francês, se voltam à pressão do executado no sentido de efetivar a obrigação judicialmente imposta e se assemelham à opção legislativa francesa do artigo 17 da Lei Sapin II porque, atingindo diretamente as pessoas naturais que tomam as decisões da pessoa jurídica, compelem mais fortemente a entidade no sentido de um determinado comportamento.
Neste sentido, convém discorrer a importância em observar a evolução da responsabilidade no direito francês, a partir de Josserand (De Ia Responsabilité des Choses Inanimées, Paris, 1897; Cours de Droit Civil Positif Français, v. 2, n. 486) e Gaston Morin (La Revolte du Droit contre le Code, p. 62), tendo tais obras levado os juristas brasileiros à doutrina da responsabilidade objetiva, entre eles, os renomados: (Alvino Lima; José de Aguiar Dias; Wilson Melo da Silva e os diversos projetos de um novo Código Civil). Hoje, dessa matéria, procuramos também soluções do direito francês para os problemas dos direitos dos consumidores, apesar da existência de um Código de Defesa do Consumidor muito atual.
No que concerne as matérias postas pela Lei Sapin II, tem-se a obrigatoriedade em adotar-se programas de compliance determinado por sua vez, no item II do artigo 17, sendo-os oito elementos mínimos que devem ser adotados pelas empresas, apresentados conforme expostos: 1) código de conduta que defina e ilustre os diferentes tipos de comportamento banidos e que integre o regimento interno das empresas; 2) mecanismo interno de denúncias, destinado a permitir o recebimento de alertas de funcionários sobre a existência de condutas ou situações contrárias ao código de conduta da empresa; 3) mapeamento de riscos sob a forma de documento regularmente atualizado e destinado a identificar, analisar e hierarquizar os riscos de exposição da empresa a demandas externas de corrupção, organizado em função da área de atuação e das zonas geográficas nas quais a entidade exerce suas atividades; 4) procedimentos de avaliação da situação de clientes e fornecedores (diretos e indiretos) para o mapeamento de riscos; 5) procedimentos de controle contábil, internos ou externos, destinados a assegurar que os livros, registros e contas não sejam utilizados para mascarar práticas de corrupção ou tráfico de influência; 6) dispositivo de treinamento destinado especialmente aos executivos e colaboradores mais expostos aos riscos de corrupção e tráfico de influência; 7) regime disciplinar que permita sancionar os empregados em caso de violação ao código de conduta da empresa; 8) dispositivo de controle e avaliação interna das medidas implementadas.
Em hipóteses pontuais e bastante recentes, dispostas em leis esparsas e regulamentos limitados a determinados circunstâncias, o Brasil iniciou a proposição da obrigatoriedade de compliance a algumas entidades. A disciplina geral prevista na Lei 12.846/2013 ainda é de facultatividade na adoção dessas medidas, portanto, tidas como simples atenuantes.
Compreende-se desde logo que tal situação é incompleta e contraditória, uma vez que apenas reconhece o valor do compliance, uma ferramenta voltada precipuamente à redução dos riscos de ilícitos de corrupção, após a concretização do injusto.
Além disso, com um tratamento geral de facultatividade, a adoção dos programas de integridade pelas empresas do país é lenta e frágil – apenas o setor das instituições 90 financeiras, que possuem o dever de implantação por um dos normativos acima mencionados, se destaca pela maturidade do compliance. Isso abre frestas perigosas para a ocorrência de corrupção no âmbito das empresas.
Entende-se por ora, que o instituto normativo da Lei 12.846/13 (Lei anticorrupção brasileiro) possui diferenças contundentes quanto a Lei Sapin II, de recente entrada em vigor da França, que estabelece a obrigatoriedade na adoção de programas de compliance anticorrupção em empresas sob sua jurisdição que possuam determinadas características, afetas principalmente ao porte da instituição.
Isso aponta direcionamento a ser seguido internacionalmente na ampliação da severidade com a qual se repelem as práticas se suborno, ante a importância da atuação coordenada e a padronização de políticas anticorrupção entre os países, sob pena de não haver combate efetivo à corrupção, mas apenas desvio de seus caminhos.
É de suma importância rememorarmos as eficácias executivas normativas (aplicabilidade da lei), nos territórios francês e brasileiro, haja vista as eficiências do Poder Judiciário de ambos.
CONCLUSÃO
A Lei n. 12.846/2013, também conhecida como Lei Anticorrupção adveio de pressão social, quando em meio a diversas denúncias de escândalos de corrupção, o povo brasileiro envolvido pelo “espírito” do combate à corrupção, saiu as ruas protestando por melhorias nas leis de combate a improbidade.
Dessa maneira surge o marco legal, com o intuito de punir a pessoa jurídica envolvida em atos de corrupção contra a Administração Pública nacional ou estrangeira e incentivar a adoção de programas de integridade.
De fato diversos estudos e pesquisas já apontavam alto teor de corrupção de forma que, o Brasil sempre aparece no ranking de países com grandes índices de improbidade. Assim, a corrupção surge como um problema endêmico, que merece ser estudado levando-se em conta fatores históricos e sociológicos.
Dessa forma, o desenvolvimento de mecanismos de combate a corrupção de compliance no interior das pessoas jurídicas se fazem de extrema necessidade. A Lei Anticorrupção brasileira e francesa veio então com o objetivo de incentivar tais práticas oferecendo determinados benefícios como atenuante em caso de processo administrativo e judicial a quem a desenvolve.
No entanto, contraditoriamente a Lei Anticorrupção brasileira pune objetivamente as pessoas jurídicas envolvidas em atos atentatórios à Administração Pública nacional ou estrangeira, no que as boas práticas de gestão ética e a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de código de ética e de conduta, são tidas apenas como um dos requisitos para dosimetria da pena, consoante o artigo 7° da Lei Anticorrupção brasileira.
A lei ainda estabelece que a responsabilização judicial e administrativa se dará de forma objetiva, ou seja independentemente de dolo ou culpa a pessoa jurídica será responsabilizada pela infração que gerou o ganho de benefício advindo de práticas corruptas.
Essa grande contradição na lei se torna mais complexa no momento em que o ato corrupto é praticado por terceiro sem a anuência da pessoa jurídica. De fato, nesse caso esta que não possui culpabilidade responderá objetivamente pelo dano causado por terceiro de má- fé.
Logo, o trabalho teve como justificativa a busca por uma compreensão justa da Lei Anticorrupção, comparando-a com a Lei francesa (Lei Sapin II) para que aquela sirva como referencial de aplicação de medidas efetivas que punam a pessoa jurídica envolvida em atos de corrupção na esfera penal e administrativa mas também incentive as demais a desenvolverem mecanismos de auditoria e compliance, não havendo que se falar em responsabilidade objetiva na esfera cível, restando as pessoa jurídicas de boa-fé apenas a restituição dos valores advindos do ilícito.
O objetivo geral do trabalho foi o estudo e a compreensão dos programas de integridade empresariais concernente a adoção das práticas de compliance, alusivo a pessoa jurídica que desenvolvem boas práticas, auditorias e compliance. Como objetivos específicos estão a avaliação do combate a corrupção no contexto histórico, filosófico e sociológico; a análise da figura do compliance, que por sua vez, trata-se de uma inovação trazida pela lei, inspirada em mecanismos já desenvolvidos no exterior; e por fim elucidar os aspectos da Lei Anticorrupção em relação à responsabilização objetiva estipulada pela lei tanto na esfera administrativa como na judicial. Há também, a comparação da norma brasileira com a francesa, e até que ponto as redações legislativas podem de um certo modo, atrapalhar o desenvolvimento econômicos das empresas mercantis.
Assim, o trabalho procurou demonstrar a eficácia da aplicação da Lei 12.846/15 e a Lei Sapin II, notadamente com a necessidade de cautela no momento de elaboração e aplicação das normas, como dito anteriormente. Houve em ato contínuo o entendimento pormenorizado quando a necessidade e os fatos sociais que possibilitou a edição da Lei Anticorrupção Brasileira, além de institutos adotados pelo Ministério Público que desvendou operações e levou a prisão grandes personalidades nacionais.
Vale acrescentar que, no âmbito penal, por mais que haja entendimento pacificado acerca de que a pessoa jurídica só responde criminalmente em casos de ilícitos contra o meio ambiente, vale ressaltar que a corrupção é endêmica e que se esta não for coibida por meios mais repressivos, consequentemente continuará a se difundir.
Outro fator amplamente discutido foi a questão da responsabilização objetiva da pessoa jurídica. Isto ocorre porque a Lei Anticorrupção dispôs que a pessoa jurídica responde por ato de terceiro, o que nos afigura como desarrazoado e desproporcional, especialmente em vista do princípio da individualização da pena, e quando a própria legislação indica a responsabilidade dos dirigentes e administradores, previsão que “somente serão responsabilizados por atos ilícitos na medida de sua culpabilidade”.
Assim, ao que tudo indica e de lege ferenda, a legislação ou o intérprete deveria premiar as boas práticas de conduta, para que efetivamente haja um estimulo ao exercício da compliance de forma vigorosa, como forma de elidir sanções administrativas ou judiciais quando não fosse constatado dolo ou culpa, ou seja, estabelecendo, ainda que excepcionalmente, a subjetivação da responsabilização em alguma hipóteses.
É certo que parte da doutrina já abarca uma relativização quando, por exemplo indica que na ausência de dolo ou culpa restaria a pessoa jurídica apenas o dever de restituir o benefício decorrente do dano, não sendo assim aplicadas as multas e sanções previstas pela Lei Anticorrupção.
Por fim, resta demonstrar que presente trabalho teve por objetivo contribuir ao estudo da Lei Anticorrupção brasileira, abrindo um ponto para mencionar a Lei Sapin II, visto que estas são um mecanismo que visa o combate efetivo a corrupção merecendo claro, como já indicado no trabalho, de reparos e interpretações diversas para que gere os efeitos esperados, trazendo a nação brasileira uma perspectiva de futuro que é desejada.
Deseja este autor, que sem afetar o desenvolvimento mercantil das empresas, desde que agindo licitamente, possam as sociedades francesa e, em especial a brasileira se livrar de boa parte dos grandes esquemas sistémicos de corrupção, para que nos próximos anos a nação brasileira tenha a dignidade de competir financeiramente com os chamados “países ricos” (França já incluída) haja vista dimensão territorial do Brasil, os recursos naturais e organização republicana. Cumpre-me ressaltar que o ponto nodal para que esse objetivo seja atingido é o enriquecimento das empresas nacionais, a segurança jurídica, e a distribuição de renda com a geração de empregos. Desta forma, a República Federativa do Brasil e o seu povo sairá do plano utópico e passará a de fato conquistar seu espaço no mundo.
[1] Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada: Ipea.gov.br – Atlas da Violência – seção 2 – acesso em 07/05/2019.
[2] pt.wikipedia.org/wiki/compliance – acesso em 7/05/2019.