O ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO NO CRIME DE FURTO E A PROVA PERICIAL

14/10/2020 às 12:54
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE SOBRE A APLICAÇÃO DA QUALIFICADORA DE ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO NOS CASOS DE FURTO.

O ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO NO CRIME DE FURTO E A PROVA PERICIAL

Rogério Tadeu Romano

 

O furto é a subtração de coisa alheia móvel com o fim de apoderar-se dela de modo definitivo(artigo 155 do CP).

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a falta de laudo pericial no local do delito não impede o reconhecimento da qualificadora do rompimento de obstáculo quando realizada perícia indireta, além do mais as fotografias e filmagens juntadas aos autos comprovam o modus operandi da ação. A decisão (HC 583.044/SC) teve como relatora a ministra Laurita Vaz.

Ali se disse:

 Ementa

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA. LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO.  EXAME INDIRETO. PROVA IDÔNEA.  AUSÊNCIA DE EXAME PERICIAL. IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTES QUINTA E SEXTA TURMA DESTA CORTE. RÉU REINCIDENTE. REGIME SEMIABERTO. CABIMENTO. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a falta de laudo pericial no local do delito não impede o reconhecimento da qualificadora do rompimento de obstáculo quando “realizada perícia indireta, além do mais as fotografias e filmagens juntadas aos autos comprovam o modus operandi da ação (AgRg no REsp n. 1.715.910/RS, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 25/6/2018).” (AgRg no REsp 1.823.838/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 05/03/2020, DJe 16/03/2020). 2. No caso, além da confissão do Réu, o auto de verificação do local e o acervo fotográfico existente comprovam o arrombamento de uma das portas da residência da vítima. 3. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao réu reincidente condenado à pena inferior a quatro anos de reclusão aplica-se o regime prisional semiaberto, se consideradas favoráveis as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. Súmula n. 269/STJ. 4. Ordem de habeas corpus denegada. (HC 583.044/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/09/2020, DJe 06/10/2020)

As circunstâncias destacadas no artigo 155, § 4º, do Código Penal, configuram o furto qualificado, ao qual é cominada pena autônoma mais grave, de dois a oito anos, e multa se o crime for cometido:

a)      com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

b)      com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

c)       com emprego de chave falsa;

d)      mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Por sua vez, a Lei 9.426, de 24 de dezembro de 1996, inclui mais uma forma de furto qualificado, diante da redação que foi dada ao parágrafo quinto do artigo 155 do Código Penal: A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Assim levou-se em conta as dificuldades trazidas para a vítima que tem furtado o   veículo automotor, aquele que se move mecanicamente, diante das dificuldades de apreensão.

Resta discutir os demais casos que já existiam na redação do Código Penal.

De toda sorte, entende Júlio Fabbrini Mirabete(Manual de direito penal, volume II, 25ª edição, pág. 216) caso o furto se revista de mais de uma qualificadora uma delas irá qualificar o delito e as demais devem ser consideradas na qualificação da pena como agravantes.

Fico com a abalizada opinião de Heleno Cláudio Fragoso(Lições de direito penal, parte especial – artigos 121 a 212, pág. 278)para quem o concurso de duas ou mais circunstâncias que isoladamente já qualificam o furto, em nada altera a configuração jurídica do crime, embora possam ser consideradas pelo juiz na aplicação da pena uma vez que se tratam de circunstâncias judiciais, artigo 59 do Código Penal.

O que é o furto com rompimento de obstáculo ou destruição da coisa?

Era, sob o Código Penal de 1890, artigo 358, na linha do Código Imperial, uma modalidade de roubo.

O núcleo verbal é: destruir(fazer desaparecer em sua individualidade), romper(quebrar, rasgar, destruir parcialmente) qualquer obstáculo móvel ou imóvel, à apreensão e subtração da coisa(muros, portões, janelas, gavetas, cofres, portas, etc). Há de existir um dano efetivo à coisa.

Deve ocorrer a qualificadora se o rompimento ocorrer antes de consumado o delito de furto.

O rompimento de telhas, para penetrar na habitação, qualificará o crime pelo rompimento de obstáculo e não pela escalada(RF 179/407). Se houver simples remoção das telhas, sem fratura, haverá qualificação pela escalada.

Repito que não caracteriza a qualificadora a simples remoção de obstáculo, como desparafusar ou retirar telhas.

Deixando vestígio, o rompimento de obstáculo requer o exame de corpo delito(artigo 158 do CPP). Se não houver tal exame, será caso de nulidade absoluta do processo.

Segundo Guilherme de Souza Nucci, se o crime deixa vestígios, é indispensável o exame de corpo de delito (art. 158, CPP), não podendo supri-lo a prova testemunhal. Esta somente será admitida, em lugar do exame, caso os vestígios tenham desaparecido, conforme preceitua o art. 167 do Código de Processo Penal (Código Penal comentado. 9ª ed., RT, 2009, pág. 729).

A substituição do laudo pericial por outros meios de prova apenas pode ocorrer se o delito não deixar vestígios, se esses tiverem desparecido ou, ainda, se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo.

Nesse sentido, dentre muitos, colhem-se os seguintes precedentes: AgRg no AREsp n. 558.432⁄DF, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 20⁄10⁄2014; e AgRg no AREsp n. 352.699⁄RJ, Ministra Regina Helena Costa, Quinta Turma, DJe 19⁄5⁄2014.

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O STJ, no julgamento do AgRg no REsp n. 1.715.910, destacou que a ausência de perícia no local dos fatos não impede, no caso, a incidência da qualificadora do rompimento de obstáculo, uma vez que foi realizada perícia indireta, além do mais as fotografias e filmagens juntadas aos autos comprovam o modus operandi da ação.

Entendeu-se, assim, que é possível  a prova da qualificadora por outros meios que não somente o auto de verificação de violência. É possível a demonstração do arrombamento através da prova oral. No caso, os depoimentos da vítima e de sua esposa dão conta que os réus arrombaram a porta do local onde se encontravam guardados os objetos subtraídos.

Lembro que a  presença da circunstância qualificadora do rompimento de obstáculo não pode ser baseada tão somente na prova testemunhal colhida nos autos ou na confissão do acusado, mas também no exame pericial realizado de forma indireta, por meio de fotografias do local do crime e elaborado laudo por peritos oficiais, o que é admitido pela jurisprudência como prova idônea, não havendo, portanto, ilegalidade a ser reconhecida (AgRg no HC n. 503.569⁄MS, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 9⁄9⁄2019).

 

 

 

 

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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