Nos últimos dias ganhou noticiário na imprensa nacional, a decisão liminar do Ministro Marco Aurélio que determinou a soltura de um cidadão pelo fato de ter ultrapassado 90 dias da prisão preventiva decretada sem a revisão da medida pelo Juiz que a decretou, consoante previsão do art. 316, parágrafo único do CPP.
O aludido habeas corpus foi apreciado de forma monocrática e teve repercussão nos meios de comunicação porque o paciente do HC é suspeito de integrar o PCC e um dos maiores traficantes de drogas do país.
Cumpre pontuar que, o Ministro Relator Marco Aurélio cumpriu apenas o texto literal da lei, tendo em vista que o artigo do CPP é claro em determinar que o juiz reavalie a prisão preventiva a cada 90 dias. Pois, no nosso ordenamento jurídico, a prisão preventiva não tem prazo, logo o legislador com a inserção do parágrafo único no art. 316 do CPP após a Lei 13.964/2019 tinha a finalidade de evitar prisões cautelares com tempo excessivo, tornando mais gravosa que a pena hipotética a ser imposta.
Dessa forma, se o art. 316, parágrafo único do CPP prevê que o Juiz reavalie o decreto prisional com decisão fundamentada, se assim não foi feito, quem praticou ato ilegal foi o Juiz que decretou a preventiva e não a revisou, bem como o Ministério Público que não foi diligente em provocar o Juiz em reavaliar a manutenção da prisão preventiva. E não o Ministro Relator Marco Aurélio que cumpriu apenas a lei.
Não abunda repisar que, no caso em tela, o cidadão está preso há mais de 10 meses e apesar de ter sido uma sentença condenatória, o processo ainda não transitou em julgado. Portanto deve imperar a proteção do princípio constitucional da presunção de inocência, independentemente, de quem seja o réu.
As leis devem ser cumpridas pelas autoridades, inclusive, o Supremo Tribunal Federal, independente, de quem esteja sendo julgado. As regras do jogo não podem ser alteradas de acordo a conveniência do julgador nem tampouco da pessoa do réu.
Os julgadores assumiram a responsabilidade ao exercer a função de ser imparcial, não devendo julgar com suas opiniões nem tampouco se valer da opinião da sociedade para proferir seus votos. Estamos vivendo numa sociedade intolerante, racista, segregadora, punitivista, no qual é desejado o extermínio de alguns criminosos da sociedade. Alguns porque a sociedade é hipócrita, não é todo criminoso que deseja ser exterminado só aqueles que não são seus iguais.
Como bem ensinado por Francesco Carnelutti ser juiz é uma das profissões mais difíceis por ter que julgar seus semelhantes, de modo que, é um ato complexo que necessita ter coragem para desagradar os anseios de uma sociedade cruel que deseja exterminar aquele que não é seu semelhante. É preciso ter bravura para julgar contra a “torcida” desde que encontre amparo na lei.
Nesse processo penal midiático, as regras do jogo são invertidas, ou seja, a liberdade é exceção. Pois o Julgador manter alguém preso é muito fácil, o complicado é decidir pela soltura, pois manter preso nesta sociedade não exige explicações, o que não acontece quando é concedido a liberdade, no qual é exigido explicações dos julgadores, a espetacularização do processo penal.
Por fim, concluo pontuando que antigamente ser um Juiz positivista era deplorável por não julgar com a realidade, princípios do Direito. Na atualidade, nós defensores de um processo penal democrático defendemos apenas que o Juiz aplique as normas previstas em lei.
Referências Bibliográficas
LOPES Júnior. Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 10º ed. 2013.
ROSA, Alexandre Morais da. Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2º edição, 2014.
Alberto Ribeiro Mariano Júnior. Advogado Criminalista. Professor universitário. Sócio do escritório Pinheiro & Mariano Advocacia e Consultoria. Especialista em Ciências Criminais pelo JusPodivm. Especialista em Direito do Estado pela UFBA. www.pmadvocacia.adv.br – [email protected] @prof.albertomariano