Visão geral sobre o Princípio da Insignificância e sua aplicação no Direito Penal Brasileiro

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Estudo do princípio da insignificância, a partir de sua origem no mundo e sua implantação no Direito Penal Brasileiro, compreendendo as características e aplicabilidade.

Visão geral sobre o Princípio da Insignificância e sua aplicação no Direito Penal Brasileiro

 

INTRODUÇÃO

Os princípios no Direito Penal são valores fundamentais, que inspiram e manifestam a criação e a aplicação prática do Direito Penal. Os princípios são fontes básicas e elementares do Direito, estão acima da própria lei.

O princípio da insignificância, conhecido, também, como princípio da bagatela ou infração bagatelar própria, tem origem no Direito Romano. O aludido princípio, por intermédio do Direito Civil, surgiu na Europa, após a primeira guerra mundial, como um problema de índole geral.

Trata-se de um princípio muito importante para o Direito Penal Brasileiro, assim, também é tratado pelo doutrinador Fernando Capez, que cita o aludido princípio como sendo um dos mais “importantes princípios penais, derivados da dignidade humana” (Capez, 2011, p.27).

Por certo, este artigo tem por enfoque o estudo do princípio da insignificância, a partir de sua origem no mundo e sua implantação no Direito Penal Brasileiro, compreendendo as características e aplicabilidade, analisando, ainda, conceitos, previsão legal, requisitos e entendimentos jurisprudenciais.

 

1. ORIGEM DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

 

1.1   No mundo

O princípio da insignificância tem sua origem no Direito Romano, porém, era limitado ao direito privado. Referido princípio, por intermédio do Direito Civil, surgiu na Europa, após a primeira guerra mundial, como um problema de índole geral.

“Invocava-se o brocardo de minimus non curat praetor, ou seja, os juízes e os tribunais não devem se ocupar de assuntos irrelevantes”. (MASSON, 2016, p. 27). É algo como, o pretor – magistrado à época – cuida de bens importantes e não de coisas sem importância.

Inicialmente, o princípio da insignificância esteve ligado aos crimes patrimoniais.

O idealizador de tal princípio foi Claus Roxin, que no ano de 1964 publicou um artigo, no qual pregou-se o Princípio da Bagatela como sendo causa de excludente de tipicidade. Para o precursor, o princípio permite a exclusão da maioria dos tipos cujo dano seja irrisório, ou seja, abarcando não apenas os patrimoniais.

Segundo Bitencourt (2012), quem primeiro tratou sobre esse princípio no Direito Penal foi Claus Roxin em 1964. Posteriormente, voltou a repeti-lo em sua obra, chamada de Politica Criminal y Sistema Del Derecho Penal, partindo do velho adágio latino mínima non curat praetor.

O princípio da insignificância traz a ideia de que quando o agente pratica uma conduta insignificante, não haverá crime, uma vez que tanto a conduta, quanto seu resultado não causam efeitos agressivos suficientes a ponto de ser necessária a intervenção do Poder Judiciário.

 

1.2   No Brasil

O princípio da insignificância ou bagatela, não está previsto, formalmente, em nenhuma legislação ou na própria Constituição Federal Brasileira. A Carta Magna de 1988 faz referência a vários princípios que compõe o Direito Penal, porém nada fala do princípio da insignificância. Todavia, há uma exceção, prevista no artigo 98, I, da CF/88, o qual aduz que:

juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.

A criminalidade pequena ou média é diferenciada pela Teoria do Controle Social, bem como pela Teoria da Política Criminal da criminalidade de alta lesividade social.

A pequena ou média criminalidade, também denominada de criminalidade de bagatela, não tem, no Direito Brasileiro, seu conceito definido. Por isso, se oferece como parâmetro as infrações de menor potencial ofensivo, com previsto no artigo 98, I, da Nossa Carta Magna.

O princípio da insignificância é entendido como um princípio que determina a não punição de delitos que geram uma ofensa irrelevante ao bem jurídico tutelado, ou seja, produzem lesão ou perigo de lesão de escassa repercussão social. As contravenções penais e os delitos punidos com detenção, bem como alguns delitos não muito graves punidos com reclusão integram naquele conceito.

Dito isso, não restam dúvidas que o Princípio da Insignificância se vincula à antijuridicidade material. Entretanto, isso não é suficiente para defini-lo, mas tão somente para caracterizá-lo.

 

1.3 Previsão legal

Conforme mencionado anteriormente, não se encontra a conceituação de tal princípio na dogmática jurídica, visto que, não está previsto, formalmente, em nenhuma legislação ou na própria Constituição Federal Brasileira, apenas pode ser inferido na exata proporção em que se aceita limites para a interpretação e das leis em geral.

Por conseguinte, tem-se sua existência apenas em interpretações doutrinarias e jurisprudenciais, sob o fundamento do princípio constitucional da ofensividade, o qual não há crime sem ofensa relevante a bem jurídico, além de ser um critério para determinar o injusto penal.

 

1.4 Finalidade

Por ser fundamentado em valores de política criminal ou ciência criminal, a qual trabalha as estratégias e os meios de controle social da criminalidade, ela ocupa-se do crime enquanto valor.

 

Pois bem, o princípio da insignificância irá auxiliar o interprete na análise do tipo penal, além de atuar, como um instrumento de interpretação restritiva da lei penal, que revela a natureza subsidiária e fragmentaria do direito penal. Trata-se de um tipo penal amplo e abrangente.

Desse modo o princípio da bagatela serve para limitar sua incidência prática, nas infrações de pequeno potencial ofensivo, encontrando seus alicerces nos princípios gerais do direito da equidade, bem como na distribuição igualitária da justiça.

Nesse sentido, é pacifico o julgado do Supremo Tribunal Federal (HC 104.787/RJ, Rel. Min. Ayres Britto), ao afirmar, que:

O princípio da insignificância é vetor interpretativo do tipo penal, tendo por escopo restringir a qualificação de condutas que se traduzam em ínfima lesão ao bem jurídico nele (tipo penal) albergado. Tal forma de interpretação insere-se num quadro de válida medida de política criminal, visando, para além da descarcerização, ao descongestionamento da Justiça Penal, que deve ocupar-se apenas das infrações tidas por socialmente mais graves. Numa visão humanitária do Direito Penal, então, é de se prestigiar esse princípio da tolerância, que, se bem aplicado, não chega a estimular a ideia de impunidade. Ao tempo que se verificam patentes a necessidade e a utilidade do princípio da insignificância, é imprescindível que a aplicação se dê de maneira criteriosa, contribuindo sempre tendo em conta a realidade brasileira, para evitar que a atuação estatal vá além dos limites do razoável na proteção do interesse público.

Outrossim, o Direito Penal não deve criminalizar comportamentos que produzam lesões insignificante, as condutas causadoras de danos ou perigos ínfimos aos bens penalmente protegidos são consideradas (materialmente) atípicas. (ESTEFAM e GONÇALVES, 2018).

O princípio da insignificância encontra-se em relação com o princípio da intervenção mínima e com o princípio da legalidade e, por isso, a uma preocupação no sentido de evitar que lesões insignificantes dirigidas a bens tutelados sofram os rigores das sanções penais.

Além do mais, o mencionado princípio tem como suposição o princípio da utilidade pública, em razão de que a punição somente será íntegra, quando a conduta atingir efetivamente a terceiros.

Para Bitencourt (2012, p. 110), “a insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido, mas especialmente em relação ao grau de sua intensidade, isto é, pela extensão da lesão produzida.”.

Ainda que a insignificância tenha como resultado final o desafogamento do judiciário, ela não pode ser vista desse modo, pois esse não é seu fundamento e nem mesmo a razão de ser. Há fatos que mesmo insignificantes podem receber a atenção do judiciário.

 

1.5 Natureza jurídica

Para a doutrina majoritária, o princípio da bagatela é uma causa supralegal de exclusão da tipicidade material.

Ensina Masson (2016, p. 28) que, “o princípio da insignificância é uma causa de exclusão da tipicidade. Sua presença acarreta na atipicidade do fato.”.

Para o Supremo Tribunal Federal (2012, HC 107082/RS, Rel. Min. Ayres Britto):

A insignificância penal expressa um necessário juízo de razoabilidade e proporcionalidade de condutas que, embora formalmente encaixadas no molde legal-punitivo, substancialmente escapam desse encaixe. E escapam desse molde simplesmente formal, como exigência mesma da própria justiça material enquanto valor ou bem coletivo que a nossa Constituição Federal prestigia desde o seu principiológico preâmbulo. Justiça como valor, a se concretizar mediante uma certa dosagem de razoabilidade e proporcionalidade na concretização dos valores da liberdade, igualdade, segurança, bem-estar, desenvolvimento, etc. Com o que ela, justiça, somente se realiza na medida em que os outros valores positivos se realizem por um modo peculiarmente razoável e proporcional.

 

2 DA TIPICIDADE

A tipicidade é o enquadramento da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na norma penal, ou seja, em um tipo penal incriminador.

Preleciona Bitencourt (2012, p. 111) que, “a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar um injusto típico.” Aduz, ainda, que é necessário que haja proporcionalidade entre a gravidade da conduta e a drasticidade da intervenção estatal.

Caso a ação não seja justificada com fatos e condutas realmente danosas a terceiro, causaria um grave atentado contra a liberdade do indivíduo autor do delito.

Nesse sentido, é pacifico o julgado do STF (RHC 122.464/BA, Rel. Min. Celso De Mello), ao afirmar, que:

O princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal. O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada esta na perspectiva de seu caráter material.

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Posto isto, expõe, que o princípio da insignificância funciona como causa supralegal de exclusão da tipicidade. À vista disso, torna-se o fato atípico pela ausência da tipicidade material.

 

2.1 Da tipicidade conglobante

A tipicidade conglobante criada por Zaffaroni diz respeito à junção da tipicidade material com a conduta antinormativa do agente (atos não determinados e atos não incentivados por lei).

A tipicidade conglobante tem como proposta harmonizar os diversos ramos do Direito, partindo-se da premissa de unidade do ordenamento jurídico. Desse modo, não basta verificar a subsunção formal e a relevância da lesão ou o perigo de lesão, para se concluir pela tipicidade penal da conduta causadora do resultado, deve ser verificado também se o comportamento é antinormativo, ou seja, não determinado ou incentivado por qualquer ramo do Direito.

Rogério Sanches (2015, p. 71), que “A tendência atual, todavia, é a de conceituar a tipicidade penal pelo seu aspecto formal aliado à tipicidade conglobante.”.

 

2.2 Tipicidade formal

Também conhecida como tipicidade legal.

Trata-se de um juízo de adequação entre o fato praticado pelo agente na vida real e a conduta (crime) descrita na norma penal incriminadora, ou seja, a tipicidade formal vai analisar se o fato praticado pelo agente se amolda, ao descrito na lei penal. (MASSON, 2016).

Segundo Greco (2017, p. 143), “tipicidade formal é a adequação perfeita da conduta do agente ao modelo abstrato (tipo) previsto na lei penal.”.

Alicerçado no teorema, Nullum crime sine injuria, não haverá crime sem que ocorra lesividade ao bem jurídico, se a conduta não atingiu ou ao menos ameaçou o bem jurídico protegido pela norma, de fato, não há crime. O delito embora seja formalmente típico, ele não terá o condão de lesar o patrimônio do terceiro, para este será totalmente insignificante.

 

2. 3 Tipicidade material

Também chamada de tipicidade substancial.

É a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido pela norma penal. (MASSON, 2016).

Afirma o Supremo Tribunal Federal (HC 108946/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia), que:

1. A tipicidade penal não pode ser percebida como o trivial exercício de adequação do fato concreto à norma abstrata. Além da correspondência formal, para a configuração da tipicidade, é necessária uma análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, no sentido de se verificar a ocorrência de alguma lesão grave, contundente e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 2. O princípio da insignificância reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade lega l e, por consequência, torna atípico o fato na seara penal, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma pena.

 

Deve-se verificar se a conduta praticada pelo agente está prevista como crime e, se realmente produziu a lesão ou o perigo de lesão ao bem jurídico protegido por nosso ordenamento jurídico.

Conforme o exemplo, exposto, por Coêlho (2015, p. 39), “A, com a vontade de ter para si uma caneta “bic”, subtrai de Y sua caneta, não mais a devolvendo e passando a utilizá-la como se fosse sua.”.

Dito isso, Coêlho (2015), preleciona que conforme o Código Penal, a conduta de “A”, é criminosa, existe a tipicidade formal, pois “A” praticou o delito de furto, previsto no artigo 155, do Código Penal, entretanto, por ser a lesão considerada de pequeno valor, não há tipicidade material e, consequentemente exclui-se a tipicidade penal, ou seja, não será considerado delituosa a conduta do agente.

Corroborando ao exemplo, acima exposto, preleciona Estefam e Gonçalves, (2018, p. 129), “se um indivíduo ingressa num estabelecimento empresarial e, aproveitando‐se da distração do atendente, subtrai uma folha de papel sulfite, realiza uma ação formalmente típica, pois o ato se subsume aos elementos presentes no art. 155, caput, do CP.”.

Estefam e Gonçalves (2018) aduzem, ainda, que neste exemplo, a conduta praticada será materialmente atípica, pois o dano praticado ao patrimônio da pessoa jurídica vitimada é tão insignificante que não há justificativas para impor uma pena criminal ao agente.

Não há motivos para o direito penal atuar frente aos princípios da intervenção mínima, bem como da ultima ratio.

Deve-se verificar se a conduta do agente se enquadra em algum crime descrito na norma legal. Se se enquadrar, posteriormente, analisa se a conduta produziu lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico, que a norma penal protege.

Se houve a lesão ou, ainda, o perigo de lesão o fato além de ser formal, será também materialmente típico. Entretanto, se não houver, será, o fato então, materialmente atípico, ou seja, se não causou nenhuma das hipóteses o fato é penalmente insignificante e deverá o acusado ser absolvido por atipicidade material, com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.

 

3       REQUISITOS ADOTADOS PELA JURISPRUDÊNCIA

De acordo com Masson (2018), para que o princípio da insignificância seja reconhecido, depende de requisitos objetivos, relacionados ao fato, e de requisitos subjetivos, vinculados ao agente e à vítima.

Deve ser analisado conforme o caso concreto, e não conforme o plano abstrato.

 

3.1. Requisitos objetivos

Ensina Rogério Sanches (2015, p. 72), que:

A aplicação do princípio da insignificância não é irrestrita. Não é suficiente que o valor do bem subtraído seja irrelevante (furtar uma caneta da marca "Bic", por exemplo). Os Tribunais Superiores estabelecem alguns requisitos necessários para que se possa alegar a insignificância da conduta. São eles: (A) a mínima ofensividade da conduta do agente, (B) a ausência de periculosidade social da ação, (C) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e, por fim, (D) a inexpressividade da lesão jurídica causada.

Nas palavras de Márcio André Lopes (2019, p. 851):

Segundo a jurisprudência, somente se aplica o princípio da insignificância se estiverem presentes os seguintes requisitos cumulativos:

a)   mínima ofensividade da conduta;

b)   nenhuma periculosidade social da ação;

c)   reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e

d)   inexpressividade da lesão jurídica provocada.

No ano de 2004, o Ministro Celso de Mello, por meio do HC 84.412-0/SP, concedeu uma liminar, impetrada no Supremo Tribunal Federal. Nesta liminar o Ministro idealizou quatro requisitos objetivos para a aplicação do princípio da insignificância, e tais requisitos são adotados tanto pelo Supremo Tribunal Federal, quanto pelo Superior Tribunal de Justiça.

Desse modo, afirma o Supremo Tribunal Federal (HC 84.412-0/SP, rel. Min. Celso De Mello), que:

O princípio da insignificância - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público em matéria penal.

Diante disso, para a jurisprudência dos Tribunais Superiores, o princípio da insignificância, somente será aplicado se estiverem presentes os requisitos cumulativos.

Corroborando com o exposto, aduz o Supremo Tribunal Federal (RHC 118.972/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, rel. do acórdão Min. Cármen Lúcia), que:

Para a incidência do princípio da insignificância, devem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato, tais como, a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada.

O Supremo Tribunal Federal não faz distinção entre os requisitos objetivos. A insignificância penal é um fator de política criminal, sendo mais do que um princípio. Desse modo, deve o julgador ter ampla flexibilidade, para negá-lo ou aplicá-lo, levando em conta as peculiaridades do caso concreto (MASSON, 2018).

 

3.2 Requisitos subjetivos

Tais requisitos não se relacionam ao fato, mas sim ao agente e à vítima do fato descrito em lei como crime ou contravenção penal.

Para Masson (2019), são requisitos subjetivos a importância do objeto material para a vítima, bem como as circunstâncias e resultados do crime.

Prelecionam Estefam e Gonçalves (2018, p. 129), que:

A jurisprudência nacional prestigia grandemente o princípio da insignificância ou bagatela, já tendo sido acolhido em inúmeras decisões de nossos tribunais, notadamente do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Este, inclusive, desenvolveu quatro vetores para sua aplicação, de tal modo que a apreciação concreta da insignificância do comportamento não fique adstrita à dimensão econômica do prejuízo sofrido pela vítima, mas seja pautada por uma análise global da conduta e do agente.

Conforme Masson (2018), as condições pessoais do agente e as condições da vítima, são os dois requisitos subjetivos, para o reconhecimento do princípio da insignificância.

Sustenta Masson (2018), em relação ao reincidente, existem duas posições sobre a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, a primeira, veda a incidência de tal princípio, asseverando que não há interesse da sociedade no deferimento do benefício ao condenado definitivo.

Assim, já foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal (HC 123.108/MG):

No HC 123.108/MG, o paciente fora condenado à pena de um ano de reclusão e dez dias-multa pelo crime de furto simples de chinelo avaliado em R$ 16,00. Embora o bem tenha sido restituído à vítima, o tribunal local não substituíra a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência. Nesse caso, o Colegiado, por decisão majoritária, denegou a ordem, mas concedeu “habeas corpus” de ofício para fixar o regime aberto para cumprimento de pena.

Já a segunda posição é que se admite o princípio da insignificância em favor do reincidente, assim, exclui-se a tipicidade do fato, e a reincidência é utilizada somente na dosimetria da pena.

Desse modo, há pronunciamento do Supremo Tribunal de Federal (HC 114.723/MG), aduzindo que:

1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para se caracterizar hipótese de aplicação do denominado “princípio da insignificância” e, assim, afastar a recriminação penal, é indispensável que a conduta do agente seja marcada por ofensividade mínima ao bem jurídico tutelado, reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e nenhuma periculosidade social.

2. Nesse sentido, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante, muito mais abrangente que a simples expressão do resultado da conduta. Importa investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, de modo a impedir que, a pretexto da insignificância apenas do resultado material, acabe desvirtuado o objetivo a que visou o legislador quando formulou a tipificação legal. Assim, há de se considerar que “a insignificância só pode surgir à luz da finalidade geral que dá sentido à ordem normativa” (Zaffaroni), levando em conta também que o próprio legislador já considerou hipóteses de irrelevância penal, por ele erigidas, não para excluir a tipicidade, mas para mitigar a pena ou a persecução penal.

O Superior Tribunal Federal entende que a decisão ou não do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso.

Confirma Márcio André Lopes (2019, p. 851), “a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.”.

As condições da vítima também dependem das condições do ofendido. Deve-se combinar a importância do objeto material para a vítima, levando-se em consideração a condição econômica, o valor sentimental do bem, assim como também as circunstâncias e o resultado do crime, tudo de modo a determinar, subjetivamente, se houve relevante lesão (MASSON, 2018).

 

4      CONCLUSÃO

Conforme dito, o princípio da insignificância é fundamentado em valores de política criminal ou ciência criminal, a qual trabalha as estratégias e os meios de controle social da criminalidade, ela ocupa-se do crime enquanto valor.

De acordo com a doutrina majoritária, o princípio da bagatela atua como causa supralegal de exclusão da tipicidade material. A tipicidade penal é a união da tipicidade formal com a tipicidade material, uma trata do juízo de adequação e a outra da lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.

A aplicação do princípio da insignificância deve ser analisado de acordo com o caso concreto, dependendo de requisitos objetivos e requisitos subjetivos.

O Ministro Celso de Mello idealizou quatro requisitos objetivos, os quais são adotados tanto pelo Supremo Tribunal Federal, quanto pelo Superior Tribunal de Justiça. São eles: mínima ofensividade da conduta; nenhuma periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e inexpressividade da lesão jurídica provocada. Para a jurisprudência dos Tribunais Superiores, o princípio da bagatela, somente será aplicado se estiverem presentes os requisitos cumulativos.

Os requisitos subjetivos relacionam-se as condições pessoais do agente como reincidência, criminoso habitual e crime militar, e ainda as condições da vítima do fato descrito na norma penal, trata-se da importância do objeto para vítima, as circunstâncias e o resultado que se deram do crime.

Conclui-se, portanto, que o aludido princípio pode ser aplicado em qualquer crime, desde que seja compatível e que estejam presentes seus requisitos. Entretanto sua maior incidência de aplicação é nos delitos contra o patrimônio.

 

REFERÊNCIAS

 

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Sobre os autores
Karen Larissa Klem Pinheiro

Bacharela em Direito pela Universidade do Oeste Paulista - UNOESTE Pós - graduanda em Direito Previdenciário - Faculdade Legale

Emerson Almeida Nogueira

Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente (2009); Tem experiência na área de Direito. Advogado atuante com ênfase em Direito, desde 15.01.2010; Inscrito até 2018, junto ao Serviço Público Federal - MJSP - Polícia Federal, como Instrutor do Curso de Formação de Vigilantes; Pós Graduado em Direito Penal, Processo Penal e Legislação Especial no Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente; Membro suplente, representante da OAB/SP, junto ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Tecnologia - UNESP - Campus de Presidente Prudente - SP; Especializando em Direito Público e Gestão Pública, pelo Instituto Damásio de Direito / Ibmec.

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