Já não mais remonta recente e fresca, a história emblemática de origem da nossa mater legis — a Carta Magna, nossa Constituição Federal, apregoando em seu famoso artigo 5º, dentre outros direitos e garantias fundamentais, o direito de petição e proteção contra lesão ou ameaça a direito, outro não é o sentido dos incisos II, X, XXXIII,XXXIV e XXXV, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
Passados exatos vinte e oito anos de sua entrada em vigor; o Tribunal Superior Eleitoral em sessão transcorrida na data de 10.05.2016, sob relatoria do então Presidente e Ministro do STF, Dias Tofolli, com participação dos também Ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux; publicaram no Diário de Justiça Eletrônica de 24 a 28/06/2016, a Súmula n.º 41, firmando o temerário entendimento, in verbis:
“Não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade.”
O desastre de tal norma apenas nos últimos quatro anos de sua vigência, já começa a ter a sua mensuração devidamente delineada, e não se duvida, tende a ser revisada em pouco tempo, dada a sua aberrante inconstitucionalidade em linhas objetivas e diretas — permitir que erros (mesmos os crassos e de ordem material), ocasionados por decisões dos tribunais de contas (incluindo o da União), não sejam objeto de análise alguma pela Justiça Eleitoral quando em testilha, a análise de inelegibilidade em processos eleitorais de registro de candidatura. Não adentrar no mérito de decisões colegiadas tudo bem, mas e quando atos e decisões de expediente violarem direitos constitucionais sagrados como a ampla defesa?
Como assim?! Pois é, se por exemplo o cidadão condenado pelo tribunal de contas em processo no qual opôs defesa com advogado vir a ser notificado no diário oficial sem vinculação do nome de seu advogado, a notificação é nula, e o prazo reaberto, logo, esse cidadão estaria plenamente elegível.
Ocorre, entretanto, que para a supra referida súmula, no pleito eleitoral a Justiça das eleições, não estaria obrigada a analisar a questão de erro ou acerto do tribunal de contas para fins de julgamento da elegibilidade ou não do cidadão candidato, e tal situação lhe ocasionaria o INDEFERIMENTO sumário do registro.
Este exemplo bem dimensiona o quanto o entendimento perfilado na citada súmula é falho e temerário, pois gera imunidade para maus feitos dos tribunais de contas e vai na contramão da linha constitucional e garantista da Constituição Federal de impedir lesão ou ameaça a direitos do cidadão, no exemplo, ao menos, da ampla defesa e devido processo legal. Ora, atos de expediente, não necessariamente relacionados às decisões de mérito podem lesar e ameaçar direitos!
No caso da inelegibilidade relacionada à tribunais de contas, a sua barreira é formulada no artigo 1º, I, g da Lei Complementar n.º 64/90, a qual preconiza que aqueles que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição.
A “formalização da omissão” pela Justiça Eleitoral de analisar ainda que superficialmente e limitadamente ao mérito eleitoral, QUALQUER DECISÃO do Tribunal de Contas para fins de elegibilidade, mesmo, erros materiais e procedimentais não relacionados ao mérito das contas, parece demasiadamente simplista, constituindo-se em derradeiro atentado ao Estado Democrático de Direito, pois oficializa aberrações jurídico-formais e possibilita lesões e ameaças crassas ao direito de cidadãos concorrerem ao pleito eleitoral que por disposição do artigo 14, § 3º e outros da Carta Magna; é via de regra, extensível a todos.