O Conceito de Sentença no Código de Processo Civil

27/10/2020 às 09:34

Resumo:


  • O artigo 203 do CPC/2015 categoriza os pronunciamentos judiciais em sentenças, decisões interlocutórias e despachos, aprimorando a compreensão sobre os atos do juiz em comparação com o CPC/1973.

  • A sentença é definida pelo seu conteúdo e função, conforme o art. 203, §1º do CPC/2015, e deve encerrar a fase cognitiva do procedimento comum ou extinguir a execução.

  • Decisões interlocutórias são pronunciamentos judiciais decisórios que não se enquadram como sentenças, resolvendo questões incidentes sem encerrar uma etapa do processo, e devem ser motivadas conforme a Constituição.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O artigo analisa a definição de sentença no CPC, com base nos critérios topológico e de conteúdo.

O art. 203 do CPC/2015, da mesma forma que o art. 162 do CPC/1973, divide os pronunciamentos do juiz em despachos, decisões interlocutórias e sentenças: “Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos”.

A principal diferença está na substituição da expressão genérica atos do juiz por pronunciamentos do juiz. Com isso, o CPC/2015 corrige uma falha do art. 162 do Código anterior, que podia levar à compreensão equivocada de que os atos do juiz no processo se limitam a despachos, decisões interlocutórias e sentenças, e deixa claro que são pronunciamentos judiciais, espécies do gênero atos do juiz (que compreende diversos outros, tais como a condução da audiência de instrução e julgamento – art. 358 do CPC – e a realização de inspeção judicial – art. 481 do CPC).

A definição de sentença é feita com base em dois elementos, que são o conteúdo e a função, conforme prevê o art. 203, em seu § 1º:

"Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução".

A primeira parte abrange o conteúdo, até “487”, enquanto de “põe fim... execução” trata da função da sentença

Desse modo, a sentença é o pronunciamento do juiz com o conteúdo do art. 485 ou do 487, que encerra a fase de conhecimento ou extingue o processo de execução (de título executivo extrajudicial). A decisão judicial só é uma sentença quando os dois elementos (conteúdo e função) estiverem presentes. Por estar localizada como ato final de uma fase, também se pode dizer que se trata de um critério topológico para conceituar a sentença, ainda que não encerre a prestação jurisdicional. Contudo, ao contrário do CPC/1973, que fazia menção à extinção do processo com base nos arts. 267 e 269, o CPC/2015 observa o sincretismo adotado na íntegra com a realização das tutelas cautelar (inserida como espécie de tutela provisória), de cognição e de execução em um mesmo processo, razão pela qual os arts. 485 e 487 não preveem que a sentença extingue o processo.

Há, portanto, uma conjugação dos dois critérios, do conteúdo e da função (visto também como topológico). Em outras palavras, o CPC utiliza uma definição mista, de sentença, por identificá-la pelo conteúdo e pelo momento do processo em que é proferida (no final de uma etapa).

Essa compreensão completa, com a combinação dos dois elementos, é fundamental para entender a sentença e diferenciá-la das decisões interlocutórias, considerando que o conceito destas é residual, abrangendo toda decisão judicial que não se enquadrar no conceito de sentença.

Assim, os despachos e as decisões interlocutórias têm conceitos residuais ao da sentença e estão previstos na sequência do art. 203. Sobre estas, dispõe o § 2º que “decisão interlocutória é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1º”.

Enquanto o despacho somente impulsiona o andamento do processo, a decisão interlocutória possui uma característica adicional para resolver alguma questão incidente. Por outro lado, tem um elemento a menos do que a sentença, pois não encerra uma etapa do processo. Em outras palavras, há a resolução de uma questão durante o curso processual, sem causar o encerramento deste. Com fundamento no art. 93, IX, da Constituição, tais decisões devem ser motivadas, sob pena de nulidade. Exemplificando, são decisões interlocutórias as manifestações do juiz sobre a produção – ou não – de determinada prova (designação de perícia, de audiência para a oitiva das partes e de testemunhas), acerca da tempestividade – ou não – da defesa etc.

Além disso, o novo conceito de decisão interlocutória não descreve (logo, não limita) o seu objeto (diferentemente do CPC/1973, que, no art. 162, § 2º, mencionava a resolução de questão incidente). Portanto, o CPC/2015 não estabelece um critério objetivo para definir a decisão interlocutória, que se identifica apenas por exclusão em relação ao conceito de sentença. Por isso, por exemplo, o pronunciamento do art. 356 do CPC trata de uma decisão interlocutória – e não de uma sentença – que julga antecipadamente uma parcela do mérito, porque não se enquadra no conceito do § 1º do art. 203 (possui o conteúdo, mas não a localização). Em outras palavras, a decisão judicial será uma sentença apenas se encerrar a fase cognitiva do procedimento comum, ou extinguir a execução, caso contrário será decisão interlocutória.

Ademais, o CPC confere expressamente uma maior relevância à decisão de saneamento e organização do processo, que passa a ser um roteiro da sentença, porque descreve e delimita o conteúdo que terá a futura sentença do processo, com exceção da valoração das provas e das conclusões do julgador. Em especial, nessa decisão, o juiz deverá especificar as questões de fato controvertidas e quais meios de prova poderão ser produzidos para demonstrá-las, para estabelecer as regras de ônus da prova (com a eventual distribuição dinâmica ou diversa) e para especificar quais são as questões de direito relevantes para a decisão do mérito (art. 357, incisos II, III e IV, respectivamente).

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Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

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