O ADVENTO DA LEI 9099/95: BREVES APONTAMENTOS SOBRE OS INSTITUTOS DESPENALIZADORES DA COMPOSIÇÃO DOS DANOS CIVIS, TRANSAÇÃO PENAL E DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS.

04/11/2020 às 15:11
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O atual estudo tem como finalidade analisar o advento da lei 9099/95 que instaurou a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, será abordado ao longo da pesquisa todos os institutos despenalizantes nela contidos.

O ADVENTO DA LEI 9099/95: BREVES APONTAMENTOS SOBRE OS INSTITUTOS DESPENALIZADORES DA COMPOSIÇÃO DOS DANOS CIVIS, TRANSAÇÃO PENAL E DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS.

 

 

David Coelho da CONCEIÇÃO

IEC PUC MINAS, Programa de Pós-graduação, Ciências Penais 32

E-mail: [email protected]

Whatsapp: 031 97534-6123

 

 

RESUMO

 

O atual estudo tem como finalidade analisar o advento da lei 9099/95 que instaurou a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, será abordado ao longo da pesquisa os institutos despenalizantes da composição dos danos civis, a transação penal, e por fim a suspensão condicional do processo, tais regramentos abriram espaço para a justiça negocial, representando um marco no processo penal brasileiro sobre a ótica dos juizados especiais criminais.

 

Palavras-chave: Lei 9099/95. Composição dos Danos Civis. Transação Penal. Suspensão Condicional do Processo. Juizados Especiais Criminais.

 

 

ABSTRACT

 

The current study aims to analyze the advent of law 9099/95 that established the creation of Special Civil and Criminal Courts, will be addressed throughout the research the decriminalizing institutes of the composition of civil damages, the criminal transaction, and finally the conditional suspension During the process, these rules opened up space for business justice, representing a milestone in the Brazilian criminal process from the perspective of special criminal courts.

 

Keywords: Law 9099/95. Composition of Civil Damage. Criminal Transaction. Conditional Suspension of the Process. Special Criminal Courts.

 

I-INTRODUÇÃO

 

O presente artigo tem como objetivo fazer breves apontamentos sobre o surgimento da lei 9099/95 que deu origem a criação dos Juizados Especiais Criminais, ao passo que representou um marco no processo penal brasileiro, pois em seu teor foram instituídas a efetivação de medidas despenalizadoras para a solução dos conflitos, abrindo espaço para a Justiça Negocial e visando como alternativa a celeridade, a economia processual e a conciliação nos julgamentos dos crimes e contravenções de menor potencial ofensivo. No decorrer do estudo será abordado de forma incisiva o surgimento da mencionada lei, fazendo-se resumidas indicações sobre os institutos da Composição dos Danos Civis, Transação penal e da Suspensão Condicional do Processo, na qual será investigado de forma isolada cada um destes sistemas.

 

 

II- A ORIGEM DA LEI 9099/95

 

Em nossa sociedade existem modelos de atuações estatais que operam nos conflitos decorrentes das relações interpessoais, formalizando soluções ou meras decisões na interpretação de fatos socialmente possíveis, neste contexto as agências políticas programam sua intervenção nos desacordos mediante a aplicação da lei, regulando assim o comportamento das pessoas através da possibilidade de aplicação de uma pena. Antes da aprovação da lei 9099/95, foi levantado um estudo que em seu teor concluiu que muitas das causas que eram levadas ao judiciário, as causas extremamente complexas e importantes estavam ficando em segundo plano, ao passo que os litígios de menor complexidade e que poderiam ser resolvidos de forma simples, lotavam o Poder Judiciário, causando travamento da análise das demandas que necessitavam de um maior estudo, nesse contexto com a idéia em desenvolvimento de um Poder Judiciário que recepcionasse essas lides menos complexas, e que atendesse as causas cíveis e criminais, se teve a primeira  idéia para a solução do problema.

Após anos de discussão e delimitação do problema encontrado, ou seja ,a excessiva morosidade e o alto número de processos de baixa complexidade que lotavam o Judiciário, o legislador constituinte ao analisar o comando constitucional do artigo 98, inciso I, por meio da lei 9099/95 organizou em um dispositivo legal os paradigmas dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, tal dispositivo citado deu origem a ideia legislativa de criação da mencionada lei que implementou a formação dos Juizados Especiais.

Com base legal no preceito constitucional do artigo 98, inciso I da Constituição Federal da República, que dispõe a responsabilidade da União e dos Estados para a criação dos Juizados Especiais, foram instituídas as balizas de funcionamento e as regras de caráter geral para a sua formação, sendo assim tem como finalidade julgar as causas de menor complexidade e as infrações de menor potencial ofensivo, mediante procedimentos orais, simples, informais, e que visem a celeridade para a solução rápida dos litígios, sempre se organizando no dogma da economia processual, neste contexto é possível verificar a vontade dos constituintes em estabelecer a justiça consensual na esfera dos juizados especiais, possibilitando assim a consumação dos acordos entre as partes, seja na efetivação da reparação voluntária dos danos sofridos pela vítima, ou pela a aplicação de pena não privativa de liberdade, na qual se tem o objetivo de evitar a instauração de um processo penal ( no âmbito dos Juizados Especiais Criminais), seguindo assim o princípio da intervenção mínima.

Passando a explorar o campo dos Juizados Especiais Criminais, como primeira proposta de modelo consensual, a lei 9099/95, como plano de enfrentamento do fenômeno criminal, abarcou as demandas de menor complexidade, ou seja as infrações de menor potencial ofensivo, na qual se tem como objetivo principal, a celeridade da prestação jurisdicional e fomento para a solução dos conflitos através dos acordos, diante disso compete aos Juizados Especiais Criminais, no que tange ao julgamento, execução e conciliação das infrações, baseado no artigo 60 e seguintes da lei 9099/95, preceito este que sistematiza as disposições gerais, diz que só será matéria afeta aos Juizados Especiais Criminais as infrações penais de menor potencial ofensivo, desse modo abrange os crimes e as contravenções penais cuja a pena máxima não seja superior a dois anos.

A lei 9099/95 como inovação no ordenamento jurídico brasileiro não somente trouxe consigo a criação do JECRIM (Juizados Especiais Criminais), em suas normas foram organizadas no sistema processual a composição civil dos danos, a transação penal, e pôr fim a suspensão condicional do processo, que serão objetos de investigação desse estudo. Com o surgimento da citada lei, foram instituídas em sua forma medidas despenalizadoras que possuem a propriedade de se evitar os efeitos causantes da instauração de um processo, abordando de forma rasa estas medidas despenalizadoras, no que se refere a composição civil dos danos, tal medida busca de forma original a reparação dos danos causados a vítima sempre que possível, já a transação penal consiste no oferecimento da pena de multa ou restritiva de direitos quando satisfeitos os requisitos elencados na lei. Por fim temos o ultimo instituto despenalizador, a suspensão condicional do processo, que se resume em evitar a instauração de uma ação penal mediante o cumprimento de medidas alternativas impostas ao autor do fato por um período determinado, os institutos abordados, no decorrer deste estudo serão explicados com maior ênfase em capítulos separados para maior compreensão.

A lei 9099/95 teve surgimento em um período em que era notório observar a superlotação das cadeias e a politica de tolerância zero as infrações de menor potencial ofensivo, neste contexto foi fundamental como plano de enfrentamento da morosidade existente no Judiciário, garantindo a celeridade na análise dos processos e mostrando de forma concisa a eficiência do poder punitivo e a busca da paz social, sendo assim é possível concluir que a solução dos litígios de forma mais humana e menos autoritária contribui para a baixa dos índices de reincidência e por conseguinte temos a reinserção dos infratores a sociedade, mostrando que a aplicação da pena privativa de liberdade nem sempre satisfaz o caráter punitivo a qual ela se destina, pois amplia o seu raio de atuação, ultrapassando a pessoa e a lesividade ofertada pelo autor do fato. Ao se examinar a citada lei de forma restrita, é verificado que a mesma trouxe grandes inovações quanto a forma de abordagem e métodos para a solução dos conflitos, estimulando a aplicação de técnicas que objetivam a conciliação entre os litigantes, diante disso nas palavras de Aury Lopes Junior, temos a representação do marco inicial da lei 9099/95,em resumo ele diz:

 

Sem dúvida, a Lei n. 9.099/95 representou um marco no processo penal brasileiro, na medida em que, rompendo com a estrutura tradicional de solução dos conflitos, estabeleceu um substancial mudança na ideologia até então vigente. A adoção de medidas despenalizadoras e descarcerizadoras marcou um novo paradigma no tratamento da violência. Mas, principalmente: marcou o ingresso do “espaço negocial” no processo penal brasileiro, que só tende a ampliar, basta acompanhar as propostas discutidas no âmbito da reforma do CPP.( Lopes Junior, Aury Direito processual penal / Aury Lopes Junior. – 17. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Cap 3.6.1)

 

 

Após análise do marco inicial, não há dúvida que a criação dos Juizados Especiais, que surgiram com a lei 9099/95 trouxe consigo conteúdo transformador, garantindo a população acesso a justiça e abrindo espaço para a solução dos conflitos de forma consensual  se rendendo a tendência mundial de estabelecimento da Justiça negocial.

 

 

III- DA COMPOSIÇÃO DOS DANOS CIVIS E DA TRANSAÇÃO PENAL

 

Após abordarmos o tema referente ao surgimento da lei 9099/95, se faz necessário explorar todas as medidas despenalizadoras contidas no teor da mencionada lei, o primeiro instituto a ser verificado tem previsão legal nos artigos 74 e 75, trataremos da composição dos danos civis. Com relação ao delito que deu causa ao processo no âmbito dos Juizados Especiais Criminais, sempre que possível é averiguado a possibilidade de efetivação de um acordo entre autor e vítima, tal acordo tem como objetivo reparar os prejuízos sofridos pela vítima decorrentes da prática delituosa, onde é imputado ao réu a título de indenização o pagamento de uma quantia em dinheiro, tudo isso sendo estabelecido em audiência, na qual autor e vítima sempre devem estar acompanhados de advogado, sendo assim o réu presta o compromisso de pagar o prejuízo causado, colocando fim a questão criminal, em síntese a composição dos danos civis, busca a pretensão indenizatória a vítima de um fato. No que se refere ao ajuste firmado entre as partes, o juiz ao homologar esse consenso gera um título executivo judicial, tornando este título irrecorrível, pois essa decisão apenas garante o status judicial do pacto firmado entre os litigantes, ao passo que somente poderá haver a possibilidade de impetração de embargos de declaração, onde se buscará o esclarecimento de alguma obscuridade, ambiguidade, omissão ou contradição da decisão que fora concluída, em caso de não cumprimento da obrigação de forma voluntária, o título executivo judicial deve ser executado no Juízo Cível, após cumprimento da composição dos danos civis os autos são arquivados.

Após breves apontamentos sobre a sistematização da composição dos danos civis, nas palavras de RIBEIRO SANTOS temos a conclusão sobre o roteiro a ser seguido para a consumação do acordo entre as partes, tal instituto representa no âmbito da justiça negocial um grande avanço, pois visa primordialmente a reparação dos danos através da conciliação e a extinção da punibilidade do agente, em sua obra ele diz:

 

Na fase da composição dos danos civis não há a participação do Ministério Público, salvo se o ofendido for incapaz. Os danos de que se tratam a lei podem ser tanto materiais como morais. Tendo as partes acordado quanto à composição de danos, será o termo de acordo homologado, passando a ser irrecorrível e dotado de eficácia de título executivo judicial, podendo, inclusive, ser executado no cível. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada, o acordo homologado equivale à renúncia no direito de queixa ou de representação, e desta forma extingue-se a punibilidade do agente (art. 74, parágrafo único). Em relação à ação penal pública incondicionada, a composição dos danos civis não possui o mesmo efeito permitindo-se somente a eventual aplicação dos arts. 16 (arrependimento posterior) e 65, III, c (atenuante genérica), do CP. (Como se preparar para o exame de Ordem, 1.ª fase: processo penal / Vauledir Ribeiro Santos, Arthur da Motta Trigueiros Neto. - 14.ª ed. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014.  Cap.16.4 pág. 315)

 

 

No mesmo sentido, a fim de concluir o raciocínio sobre o sistema da composição dos danos civis e a reparação do dano existente, é definido na obra de CEBRIAN ALEXANDRE:

 

 

No que se refere à reparação do dano, a Lei n. 9.099/95 criou o instituto da composição de danos civis nos procedimentos de competência dos juizados, de sorte que a homologação do acordo realizado na audiência preliminar ou na própria audiência de instrução tem força de título executivo e impede a propositura de nova ação reparatória de danos na esfera cível. Essa composição de danos civis, nos crimes de ação privada e pública condicionada à representação, implica extinção da punibilidade do agente em face da renúncia automática ao direito de queixa ou de representação. (Reis, Alexandre Cebrian Araújo Direito processual penal esquematizado / Alexandre Cebrian Araújo Reis e Victor Eduardo Rios Gonçalves; coordenador Pedro Lenza. – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2013. 1. Processo penal – Legislação – Brasil I. Gonçalves, Victor Eduardo. II. Lenza, Pedro. III. Título. Pedro. III. Título. CDU-343. Cap. 12.4.3, pág. 586)

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Com base no comando normativo do artigo 75 da lei 9099/95, após seguimento de todo o trâmite reportado e caso ocorra a hipótese de não concretização da composição dos danos civis, deve ser dado de forma imediata ao ofendido oportunidade para que o mesmo exerça o seu direito de representação ou queixa, que neste caso deve ser reduzido a termo. Conforme narrado o JECRIM possui a competência limitada as infrações de menor potencial ofensivo (crimes e contravenções penais) cuja a pena máxima não ultrapasse 2 (dois) anos, é importante destacar que a demonstração e análise das condições da ação não são dispensáveis, ao passo que, é necessário averiguar os indícios de autoria e materialidade, como também a justa causa para a ação, a ilicitude, a tipicidade penal e a culpabilidade do agente.

Passando a analisar a sistematização do instituto da Transação penal, é possível concluir que tal norma consiste no oferecimento do benefício por parte do Ministério Público, que de modo instantâneo antecipa uma pena ao autor da infração penal, seja ela de multa ou restritiva de direitos, é importante salientar que nesta fase ainda não há oferecimento de denúncia, nesse contexto é predominado que o regimento da transação penal caracteriza um direito subjetivo do réu, desde que o mesmo preencha os requisitos objetivos elencados no dispositivo legal do artigo 76 da citada lei, sendo assim não será efetivada a proposta de transação penal se ficar comprovado que:

Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.

        § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade.

        § 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado:

        I - Ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;

        II - Ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo;

        III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.

Conforme dispositivo legal exposto acima, não será admitida a proposta de transação penal se o indivíduo, autor da infração já tiver sido beneficiado com  proposta despenalizante nos últimos 5 anos, ter sido condenado pela prática de crime com pena privativa de liberdade que resulte em sentença definitiva, e por fim, caso as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal não sejam favoráveis.

Diante os pontos citados, ao se analisar o regramento da transação penal, é notada uma relativização do princípio da obrigatoriedade da ação penal de iniciativa pública, pois permite ao Ministério Público fazer ponderações sobre o cabimento e oferecimento da denúncia, nesse sentido é necessário observar o seguinte ensejo referente a mitigação do princípio da obrigatoriedade no âmbito dos juizados especiais criminais:

Princípio da Obrigatoriedade – Havendo indícios de autoria e materialidade de um crime, o representante do Ministério Público deverá obrigatoriamente oferecer denúncia, sob pena de sofrer punição disciplinar dentro da instituição. Haverá exceção a esse princípio quando se tratar de infração de menor potencial ofensivo (Lei 9.099/1995), pois o promotor de justiça, em vez de oferecer a denúncia, pode, aliás deve, propor a transação penal. Assim, para os Juizados Especiais Criminais, vigora o princípio da obrigatoriedade mitigada (ou discricionariedade regrada)

 

Após o acusado preencher todos os requisitos elencados pela lei, conforme exposto no artigo 76 § 2° da aludida lei, e voluntariamente aceitar o acordo proposto pelo Ministério Público, deve o juiz homologar a negociação feita entre as partes, nesse sentido a natureza jurídica da decisão efetivada possui o status de um título executivo judicial e tem como vantagem a não geração dos efeitos da reincidência e de maus antecedentes, a decisão homologada apenas servirá para que o acusado não seja beneficiado novamente por um prazo de 5 anos, neste contexto não significa uma confirmação de culpa ou de responsabilidade, pois essa decisão não possui nível condenatório, se trata apenas da homologação de um acordo, nas palavras de ALEXANDRE CEBRIAN e VICTOR EDUARDO temos a confirmação do status conferido a homologação do acordo firmado:

Homologado o acordo, o juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa. Este acordo não retira a primariedade do acusado e tampouco pode ser considerado como maus antecedentes, já que não se trata de condenação. A existência da transação penal será registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de 5 anos (art. 76, § 4º, da Lei n. 9.099/95(Reis, Alexandre Cebrian Araújo Direito processual penal esquematizado/ Alexandre Cebrian Araújo Reis e Victor Eduardo Rios Gonçalves; coordenador Pedro Lenza. – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2013, pág. 592)

Umas das maiores polêmicas acerca da unidade da transação penal, é a subjetividade na escolha por parte do Ministério Público em oferecer ou não o aludido benefício, mesmo o acusado satisfazendo todos os requisitos dispostos em lei, é predominante o entendimento que se deve aplicar o artigo 28 do Código de Processo Penal, este dispositivo foi alterado de forma considerável pela lei 13.964/19 e atualmente está com a sua vigência suspensa, portanto, caso o Ministério Público não ofereça a vantagem reportada, deve o mesmo fundamentar a sua decisão, explicando o porquê da negativa, baseando sua decisão em fundamentos jurídicos. Por fim, após avaliados todos os métodos, e sendo efetivado o acordo entre o Ministério Público e o acusado, fica o agente adstrito aos termos pactuados no acordo homologado, e caso ocorra a hipótese de descumprimento, entende a jurisprudência através da Súmula Vinculante n° 35 que a homologação de ajustamento da transação penal não faz coisa julgada material, sendo assim caso ocorra a violação das cláusulas acordadas no pacto, é retomada de forma imediata a situação anterior a decisão, possibilitando o Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento da denúncia ou requisição do inquérito policial.

IV- DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

Conforme disposto em lei, a suspensão condicional do processo possui amparo legal no artigo 89 da lei 9099/95, tal benefício trata-se de uma negociação processual em que o Ministério Público abre mão do prosseguimento da ação sem discutir a responsabilidade criminal do acusado, sendo o mesmo submetido ao cumprimento de certas condições por um tempo determinado, na qual, ao fim deste prazo, que é conhecido como período de prova é extinta a punibilidade do agente. A suspensão condicional do processo  não possui caráter inconstitucional, pois não ofende os princípios basilares da presunção de inocência, nem tampouco o contraditório e a ampla defesa, o acusado não é considerado culpado, pois a responsabilização criminal sequer será discutida, a ele somente será imposta condições que devem ser aceitas de forma voluntária, trata-se do acordo entre o Ministério Público e o acusado, é importante salientar que na suspensão condicional do processo houve a mitigação do princípio da indisponibilidade da ação, pois permite ao Ministério Público abrir mão do prosseguimento por meio da suspensão condicional do processo, nesse sentido, nas palavras de AURY LOPES JR temos a conclusão do que seria a suspensão condicional do processo:

Durante o período de suspensão do processo, o réu ficará sujeito ao cumprimento de certas obrigações estabelecidas pelo Juiz, tais como de não se ausentar da comarca onde reside sem autorização, reparar o dano causado, comparecer mensalmente para justificar suas atividades e outras condições que lhe poderão ser estabelecidas. O não cumprimento das obrigações impostas não acarretará sua prisão, fazendo apenas com que o processo volte a tramitar a partir de onde parou. Trata-se de ato bilateral, em que o Ministério Público oferece (por escrito e na denúncia, podendo ser em peça separada) e o réu, analisando as condições propostas, aceita ou não. Toda a transação deve ser feita em juízo e na presença do defensor do réu, ainda que de forma oral e sem formalidade (Lopes Junior, Aury Direito processual penal / Aury Lopes Junior. – 17. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.cap 3.6.5.1)

Analisando as hipóteses de cabimento do instituto mencionado, se faz necessário dispor o artigo 89 da lei 9099/95 na íntegra:

 Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena.

Conforme constatado, a suspensão condicional do processo somente poderá ser aplicada nas infrações cujo a pena mínima cominada não ultrapasse o quantum de 1 ano, podendo esta isenção incidir nos crimes tipificados no Código Penal como também nas Leis Especiais. Caso aceite a proposta de suspensão condicional do processo ofertada pelo Ministério Público, conforme elucida o artigo 89 § 1º, fica a cargo do juiz estipular o período de prova, que poderá ser de 2 a 4 anos, nesse intervalo fica o denunciado obrigado a cumprir algumas condições, que podem variar da simples proibição de frequentar determinados lugares ou se ausentar da comarca na qual reside, até a reparação do dano causado, quando possível, é importante frisar que o não cumprimento das obrigações impostas pelo juízo não acarretará na prisão do agente, e sim na volta da tramitação do processo suspenso.

Em concordância com o tema proposto, a suspensão condicional do processo consiste em um acordo bilateral entre o Ministério Público e o denunciado, neste contexto não deve ser confundido com o instituto da suspensão condicional da pena, pois tal regramento tem como requisito objetivo uma sentença penal condenatória, o que não acontece na suspensão condicional do processo. Por fim, como na Transação Penal, a Suspensão Condicional do Processo, ainda que o dispositivo legal mencione uma subjetividade do Ministério Público em oferecer ou não a citada vantagem, caso o acusado faça jus ao benefício e tenha preenchido todos os requisitos elencados pela lei, e mesmo assim o Ministério Público optar pelo não oferecimento da Suspensão Condicional do Processo, deve o órgão acusador fundamentar o porquê da negativa através dos fundamentos jurídicos, explicando a perspectiva da não negociação.

 

V- CONSIDERAÇÕES FINAIS

A lei 9099/95, na época da sua homologação simbolizou um marco no Processo Penal Brasileiro, na medida que abriu espaço para a justiça negocial e solução dos conflitos de forma diferenciada através dos institutos despenalizadores que estão contidos neste dispositivo legal e que privilegiam o desencarceramento e tratam a violência de forma substancial através dos procedimentos dos Juizados Especiais Criminais, que são pautados pela oralidade, simplicidade, celeridade e que visam a economia processual. Diante o apresentado, a lei 9099/95 trouxe consigo institutos de grande importância para a sistematização processual brasileira, neste contexto foram inseridas as regras da Composição dos Danos Civis, a Transação Penal e a Suspensão Condicional do Processo, que consistem na feitura de acordos entre o órgão acusador e o denunciado.

Conforme observado, os Juizados Especiais Criminais possuem grandes vantagens que são observadas através dos benefícios contidos em lei, mas também possuem graves defeitos, é importante salientar que a negociação no âmbito do processo penal sempre será tratada de forma frágil, é necessário que ajustes sejam feitos para aprimoramento dos institutos despenalizantes citados, ao passo que não se deve banalizar a aplicação da justiça negocial para ostentar a eficiência punitiva do Estado sem que sejam observadas as funcionalidades das normas desencarceirizadoras, portanto a justiça negocial deve-se pautar através de leis claras e que possuam limites demarcados de atuação, sem a violação de princípios constitucionais apregoados, sendo assim é necessário um amplo debate, pois muitas questões ainda precisam ser ponderadas de forma incisiva, portanto é necessário um estudo da realidade de aplicação e aparelhamento com o sistema penal acusatório para uma ampliação de forma racional no que se refere a justiça negocial no Brasil.

 

VI- REFERÊNCIAS

LOPES, Junior, Aury Direito processual penal / Aury Lopes Junior. – 17. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

REIS, Alexandre Cebrian Araújo Direito processual penal esquematizado / Alexandre Cebrian Araújo Reis e Victor Eduardo Rios Gonçalves; coordenador Pedro Lenza. – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2013. 1. Processo penal – Legislação – Brasil I. Gonçalves, Victor Eduardo. II. Lenza, Pedro. III. Título. Pedro. III.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas,

2017.

 

RIBEIRO, VAULEDIR. Como se preparar para o exame de Ordem, 1.ª fase: processo penal / Vauledir Ribeiro Santos, Arthur da Motta Trigueiros Neto. - 14.ª ed. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014.  Cap.16.4 pág. 315)

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 05 set. 2020.

 

 

BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm> Acesso em 05 set 2020

 

 

 

BRASIL. Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm> Acesso em 07 de set 2020

 

 

BRASIL. Lei 9099/95, Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>Acesso em 07 de set 2020.

 

 

Sobre o autor
David Coelho da Conceição

David Coelho é graduado em direito pela Faculdade de Minas FAMINAS- BH e pós graduando em Ciências Penais pela PUC- MINAS.

Informações sobre o texto

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