SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO TRABALHISTA. 2.1 REQUISITOS. 2.2 CABIMENTO. 2.3 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO DEVEDOR. 2.4 DO SÓCIO RETIRANTE. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
1. INTRODUÇÃO
Conforme leciona a doutrina (SCHIAVI, 2016, p.1082), a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas físicas que a compõem, consequentemente, os bens da pessoa jurídica, em princípio, não se confundem com aqueles de seus componentes. Cumpre salientar que essa diferença patrimonial se apresenta solar conforme previsão do art. 795 do novel código de processo civil.
Todavia, de acordo com o doutrinador (GARCIA, 2017, p. 421), a supramencionada distinção quanto à personalidade jurídica e à composição patrimonial, no entanto, não é absoluta. É possível observar situações em que os integrantes da pessoa jurídica são alcançados, mesmo em se tratando de relação jurídica pertinente à sociedade em si. Nesse cenário de relativação da autonomia é que se situa a teoria da desconsideração da personalidade jurídica
Com previsão expressa no art.28 do CDC e art.50 do Código Civil, a desconsideração da personalidade jurídica prevê que os atos executórios poderão incidir em bens pertencentes aos sócios, quando ficar comprovada a insuficiência de bens da pessoa jurídica e, conjuntamente, a violação à lei, fraude, desvio de patrimônio, entre outros.
O instituto a ser analisado busca evitar que a insuficiência de bens da executada prive o credor do recebimento dos seus créditos trabalhistas, enquanto o patrimônio dos sócios está repleto de bens passíveis de ser penhorados.
Diante do exposto, o breve artigo terá como objetivo apresentar os requisitos, o cabimento e o limite do patrimônio que será exigido na desconsideração da personalidade jurídica no processo de execução trabalhista, será abordado ainda a respeito da responsabilidade do sócio retirante há mais de dois anos da data do ingresso da ação.
Por fim, importa salientar que para o desenvolvimento da presente pesquisa foram levantadas informações em diversas fontes, não só a Consolidação das Leis Trabalhistas, mas também o Código de Processo Civil, o Código Civil Brasileiro, além de grandes obras doutrinárias que tratam a respeito da temática.
2. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO TRABALHISTA
2.1 Requisitos
Conforme preconiza os artigos: 28 do CDC e 50 do novel código de processo civil, em caso de abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito, violação de contrato social, ou seja, abuso da personalidade jurídica, caracterizado por desvio de finalidade ou confusão patrimonial, o juiz poderá a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade, fazendo com que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Cumpre ressaltar que, na atualidade, leciona (SARAIVA; LINHARES, 2018 p.420) que a moderna e majoritária doutrina e jurisprudência trabalhista vem adotando a teoria objetiva ou teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica para determinar os requisitos da sua decretação.
No processo de execução da seara trabalhista, será aplicada conforme doutrina majoritária, a teoria do disregard, independentemente de os atos dos sócios terem ou não violado, ou não o contrato, ou de haver abuso de poder, basta apenas que a pessoa jurídica, não possua bens para ter início a execução dos bens do sócio.
Consoante discorre a doutrina (SCHIAVI, 2016, p.1073), o presente entendimento é justificado em razão da hipossuficiência do trabalhador, da grande dificuldade que apresenta o reclamante em demonstrar a má-fé do administrador, além do caráter alimentar do crédito trabalhista. Nesse sentido, cumpre destacar as seguintes ementas que refletem o entendimento predominante da jurisprudência trabalhista:
"Execução sobre os bens dos sócios - Possibilidade - A execução pode ser processada contra os sócios, uma vez que respondem com os bens particulares, mesmo que não tenham participado na fase cognitiva. Na Justiça do Trabalho, basta que a empresa não possua bens para a penhora para que incida a teoria da desconsideração de personalidade jurídica da sociedade. O crédito trabalhista é privilegiado, tendo como base legal, de forma subsidiária, o art. 18 da Lei nº 8884/94 e CTN, art. 135, caput e inciso III, c/c art. 889 da CLT. (TRT 3ª região - 2ª Turma - AP n. 433/2004.098.03.00-7 - rel. João Bosco P. Lara - DJMG 9.9.04-p.11)."
AGRAVO DE PETIÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. TEORIA OBJETIVA. Pela moderna doutrina trabalhista, a execução poderá alcançar bens particulares dos sócios sempre que a empresa não apresentar patrimônio suficiente para satisfazer os débitos trabalhistas contra ela pendentes, independentemente de restcaracterizado o desvio de finalidade ou abuso de poder (TRT - 17ª Região R.- AC 02323.2005.132.17.00.0 - relª Carmen Vilma Garisto - j. 22.3.2010).
Todavia, a reforma trabalhista (Lei 13.467/17) no bojo do seu art. 855-A determina que aplicar-se-á ao processo do trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto nos arts. 133 a 137 do novel CPC/15, que não versa sobre os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, instituindo apenas as regras para o seu processamento.
Cumpre apontar que a aplicação supramencionada vem gerando certo desconforto em muitos magistrados, que entendem que a morosidade relacionada à necessidade de intimação do sócio impedirá qualquer constrição de bens particulares.
2.2 Cabimento
Embora o CPC determine que o incidente será instaurado apenas a pedido da parte ou do Ministério Público, ou seja, não sendo processado de ofício, sendo cabível na fase de execução fundada em título extrajudicial, devendo inclusive haver a citação do executado para manifestação e requerimento de provas no prazo de 15 dias, a doutrina majoritária processual trabalhista encabeçada por Mauro Schiavi e Maurício Godinho Delgado leciona que a desconsideração da personalidade jurídica na fase executória, poderá ser determinada de ofício pelo magistrado, independentemente de requerimento da parte, em sede de decisão interlocutória, desde que devidamente fundamentada.
Contudo, o sócio, uma vez tendo seus bens constritos para a garantia da execução, lhe é cabível o direito de invocar o benefício de ordem e requerer que primeiramente sejam constritos os bens da sociedade, todavia, para que esse direito seja exercido é necessária a indicação de bens que estão os bens livres e desembarcados para penhora, além disso, que sejam de fácil liquidez e obedeçam à ordem de preferência prevista no art.835 do CPC.
Por fim, ressalta-se que conforme preconiza o novel CPC a instauração do incidente suspenderá o processo, sem prejuízo de concessão da tutela de urgência de natureza cautelar, além disso, cumpre instar que dispõe o art.855-A, § 1°, que da decisão interlocutória que acolher ou rejeitar o incidente na fase de execução, caberá agravo de petição, independentemente de garantia do juízo.
2.3 Responsabilidade patrimonial do sócio devedor
Conforme menciona o art. 789 do CPC, o devedor responderá com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas na legislação. Por conseguinte, a execução é real, causando um dever para o executado e uma responsabilidade para o seu patrimônio.
Conforme leciona a doutrina (SARAIVA, Renato; LINHARES, Aryanna, 2018, p.425), no momento da desconsideração estarão sujeitos à constrição não apenas os bens que o sócio possuía ao tempo em que a execução foi iniciada, mas, também, todos que venham a ser adquiridos ou integrados ao seu patrimônio enquanto não satisfeita a obrigação.
2.4 Do sócio retirante
De acordo com entendimento doutrinário majoritário (SCHIAVI, 2016, p.1082), na desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao sócio retirante o previsto no art. 1003 do código civil, ou seja, o sócio retirante responderá solidariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos após averbada a modificação do contrato.
Posicionamento diferente da responsabilidade prevista no corpo do art.10-A da CLT, trazido com a reforma trabalhista, artigo esse que determina que a responsabilidade do sócio retirante será sempre subsidiária.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo buscou analisar de forma breve como é processada a desconsideração da personalidade jurídica no processo de execução trabalhista, apresentando os requisitos, o cabimento, o limite de responsabilidade que será exigido e o entendimento doutrinário a respeito da responsabilidade do sócio retirante no momento da desconsideração.
É possível perceber que tal temática abordada ver trazendo diversas divergências após a reforma trabalhista aprovada em 2017, demonstrando o quanto a doutrina e a jurisprudência trabalhista apresenta inúmeras divergências com o novo texto da lei 13.467/17, que possivelmente desencadearão em novos posicionamentos.
Conclui-se dessa maneira, que este artigo buscou elucidar questões do processamento da desconsideração da personalidade jurídica na execução trabalhista.
REFERÊNCIAS
DELGADO, Maurício Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no Brasil: Comentários a Lei 13.467/2017. São Paulo: LTr, 2017.
GARCIA, Filipe Barbosa Garcia. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6º ed. Rio de Janeiro: Forense,2017.
SARAIVA, Renato; LINHARES, Aryanna. Processo do Trabalho. 14º Edição. Salvador: JusPodivm,2018.
SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 10º ed. São Paulo: LTR,2016.